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Processo n.º 564/2010 Data do acórdão: 2010-07-22
(Autos de recurso penal)
  Assuntos:
– prisão preventiva
– tráfico de estupefacientes
– art.o 193.o, n.o 3, alínea c), do Código de Processo Penal
– rejeição do recurso
S U M Á R I O
1. Estando a arguida recorrente condenada em primeira instância como autora de um crime de tráfico de estupefacientes concretamente punível nos termos do art.o 8.o, n.o 1, da Lei n.o 17/2009, é de impor a medida coactiva máxima de prisão preventiva, nos termos ditados pelo art.o 193.o, n.o 3, alínea c), do Código de Processo Penal.
2. O recurso é rejeitado se for manifestamente improcedente.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 564/2010
(Autos de recurso penal)
Recorrente: A
Tribunal a quo: 4.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
1. A, arguida já melhor identificada no processo comum colectivo n.º CR4-07-0086-PCC do 4.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, veio recorrer para este Tribunal de Segunda Instância, do acórdão final ali proferido em 28 de Maio de 2010, que a tinha condenado como autora de um crime consumado de tráfico de estupefacientes praticado na madrugada do dia 12 de Abril de 2005, na pena de quatro anos de prisão, nos termos finalmente tidos como concretamente mais favoráveis do art.o 8.o, n.o 1, da Lei n.o 17/2009, de 10 de Agosto, bem como recorrer do despacho judicial ditado na acta da sessão de leitura pública desse acórdão que lhe tinha passado a impor a prisão preventiva.
Para o efeito:
– desde já, quanto ao recurso relativo à medida coactiva, a arguida pediu que fosse revogada a prisão preventiva, com fundamento nuclear na existência de razões humanitárias (pois tem dois bebés de tenra idade necessariamente a cuidar pessoalmente por ela conforme a recomendação médica, um dos quais acabou por nascer há poucos meses, com a agravante de ser impossível ao seu marido, que é polícia com escala de trabalho organizada em turnos, cuidar dos dois bebés), por um lado, e, por outro, na inexistência de qualquer violação, por ela, das medidas coactivas não privativas de liberdade, anteriormente aplicadas nos autos (cfr. nomeadamente as conclusões da motivação desse recurso a fls. 417 a 430 dos presentes autos correspondentes);
– e no tocante ao recurso final, imputou ao dito acórdão os três vícios previstos nas alíneas a), b) e c) do n.o 2 do art.o 400.o do Código de Processo Penal de Macau (CPP), e, subsidiariamente, o excesso na medida da pena (cfr. sobretudo o teor das conclusões da motivação de fls. 436 a 465).
Aos dois recursos, respondeu a Digna Procuradora-Adjunta (a fls. 547 a 551v) no sentido de manutenção do julgado.
Subidos os autos, foi emitido douto parecer pelo Digno Procurador-Adjunto (a fls. 595 a 601), pugnando pela improcedência do recurso da prisão preventiva e pela rejeição do recurso do acórdão condenatório, por manifestamente infundado.
Feito o exame preliminar (em sede do qual se entendeu deverem os dois recursos ser julgados em conferência) e corridos em seguida os vistos legais, cumpre decidir.
2. Para o efeito, é de relembrar aqui todo o teor do acórdão recorrido, constante de fls. 396 a 400v dos autos, bem como o do despacho de imposição da prisão preventiva de fl. 401v, cujo teor se dá por aqui integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
3. Ora, é de improceder, desde logo, o recurso atinente à prisão preventiva, visto que estando condenada em primeira instância como autora de um crime de tráfico de estupefacientes concretamente punível nos termos do art.o 8.o, n.o 1, da Lei n.o 17/2009, é de impor efectivamente essa medida coactiva máxima, nos termos ditados pelo art.o 193.o, n.o 3, alínea c), do CPP.
E agora no concernente ao recurso do acórdão condenatório, o seu mérito apresenta-se evidentemente inviável, porquanto:
– em primeiro lugar, a respeito da assacada “insuficiência para a decisão da matéria de facto provada”, não se pode dar por verificado este vício, já que depois de examinado todo o teor do acórdão recorrido, não se consegue vislumbrar que o Colectivo a quo se tenha esquecido de investigar algum ou alguns factos integradores do objecto probando, formado, no caso (devido à falta da apresentação da contestação em sentido próprio quer pela arguida ora recorrente quer pelo arguido não recorrido chamado B – cfr. o que resulta, a contrario sensu, e especialmente, do teor da contestação da arguida de fl. 303, na qual se limitou ela a oferecer “o merecimento dos autos”), apenas pelos factos descritos (a fls. 280v a 282) no despacho de pronúncia. Na verdade, o facto de estar provado, tal como já se tinha descrito no despacho de pronúnica, que o arguido não recorrente B adquiriu droga (que incluía 23,215 gramas líquidos de marijuana) à arguida recorrente (que lha forneceu) na madrugada do dia 12 de Abril de 2005, para ser consumida por ele próprio e ser cedida às vezes por ele à arguida para consumo desta, não implica necessariamente que o Tribunal a quo tenha que investigar também “por quantas vezes é que o arguido B tenha chegado a fornecer droga, e em quê quantidade, à arguida ora recorrente?”, ou investigar “onde ou de quem é que o arguido B tenha conseguido obter droga nessas vezes anteriores?”, ou investigar “por quê é que a arguida tenha necessitado de aguardar pelo regresso do marido à casa depois do serviço para fornecer droga ao arguido B na madrugada daquele dia 12 de Abril de 2005?”, pois todas essas perguntas não fizeram parte do acima referido objecto probando, sendo certo que a prova positiva do acto de fornecimento sobretudo de tal droga em tal quantidade (que não pode ser tida como diminuta), praticado pela arguida de modo livre, consciente e voluntário e com conhecimento das qualidades e caractéristicas da droga fornecida e sem prévia autorização legal, já dá para sustentar a verificação judicial do crime de tráfico de estupefacientes, inicialmente pronunciado nos termos do art.o 8.o, n.o 1, do Decreto-Lei n.o 5/91/M, de 28 de Janeiro, e depois concretamente punido nos termos tidos, pelo Colectivo a quo, como mais favoráveis do art.o 8.o, n.o 1, da Lei n.o 17/2009;
– em segundo lugar, a propósito da assacada “contradição insanável da fundamentação”, é patente a este Colectivo ad quem que para qualquer homem médio que consiga ler o texto da decisão condenatória recorrida, as razões então invocadas pelo Colectivo a quo para explicar a sua livre convicção formada acerca da entendida inverificação de qualquer motivo de denúncia caluniosa por parte do arguido B em relação à arguida ora recorrente, são ainda logicamente compatíveis com a restante fundamentação do mesmo acórdão recorrido, pelo que não pode a arguida vir agora atacar a fundamentação desse aresto com base na sua tese de “existência de motivo flagrantemente plausível de denúncia caluniosa por parte desse arguido contra ela com vista à pretendida atenuação livre da pena”;
– em terceiro lugar, e da mesma maneira, também não se consegue detectar, aos olhos de qualquer homem médio que saiba ler o mesmo texto decisório, algum “erro notório na apreciação da prova”, porque é, de facto, difícil afirmar que ao ter decidido por dar por provado que a droga concretamente apreendida na posse do arguido B foi fornecida pela arguida a esse arguido na madrugada do dia 12 de Abril de 2005 na residência da própria arguida, tenha o Colectivo a quo violado alguma regra da experiência da vida humana em normalidade de situações;
– e, por fim, há-de naufragar também obviamente a crítica da arguida quanto à justeza da sua pena concreta achada no acórdão recorrido, posto que a pena de quatro anos de prisão aí imposta, atentas todas as circunstâncias já apuradas pela Primeira Instância, não se mostra injusta, por se situar apenas um pouco acima do limite mínimo de três anos de prisão previsto na moldura do art.o 8.o, n.o 1, da Lei n.o 17/2009, pelo que essa pena concreta já não pode admitir mais redução, com o que fica prejudicada a questão de almejada suspensão de execução da pena.
Não padecendo, pois, a decisão recorrida de nenhuma das ilegalidades assacadas pela arguida, é de rejeitar efectivamente, nos termos do art.º 410.º, n.º 1, parte final, do CPP, o seu recurso final dada a manifesta improcedência do mesmo, sem mais alongamentos atento o espírito da norma do n.° 3 do art.° 410.° do mesmo Código.
4. Em harmonia com o exposto e em conferência, acordam em
– julgar improcedente o recurso interposto pela arguida A do despacho judicial de imposição de prisão preventiva;
– e rejeitar, por manifestamente infundado, o recurso da mesma arguida do acórdão final da Primeira Instância.
Custas dos presentes autos recursórios tudo pela arguida, que pagará ainda duas UC de taxa de justiça devidas no recurso da prisão preventiva, e cinco UC de taxa de justiça no recurso final, com quatro UC de sanção pecuniária devida pela rejeição deste (art.° 410.°, n.° 4, do Código de Processo Penal de Macau).
Comunique a decisão das duas Instâncias ao Senhor Director dos Serviços de Justiça de Macau, para efeitos tidos por convenientes quanto ao arguido B, funcionário da Conservatória do Registo Predial de Macau (com envio da cópia de fl.13 dos autos, alusiva ao cartão de identificação de funcionário deste arguido).
Macau, 22 de Julho de 2010.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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João Augusto Gonçalves Gil de Oliveira
(Primeiro Juiz-Adjunto)
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Tam Hio Wa
(Segunda Juíza-Adjunta)



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