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Processo n.º 655/2007
Recorrente : A
Recorrido: Secretário para a Segurança (保安司司長)





Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.:
A, residente em Macau, vem interpor Recurso Contencioso de Anulação do Despacho do Exmº Senhor Secretário para a Segurança, alegando que:
A. Nos termos da Lei, deve aplicar-se o recorrente o artigo 180º n.º 1 e seguintes do ETAPM de acordo com os direitos anteriormente adquiridos pela legislação em vigor à data dos factos e sem qualquer espécie de aplicação retroactiva da lei;
B. Ao fundamentar o Despacho recorrido no artigo 9º do DL 60/92/M e outras similares, não aplicável ao casu sub judicio, quando a própria Lei geral se desaplica a si própria e existe regra especial que regulamenta a situação em apreço, a Autoridade recorrida viola o disposto no art. 181º do ETAPM, violando claramente o Princípio da Legalidade que a devia nortear.
C. Incorre, pois, o Despacho recorrido, nesta dimensão que expusemos, no Vício de Violação de Lei, pois violam todas as disposições citadas, ferindo, no seu núcleo essencial, Direitos Liberdades e Garantias da recorrente, de caracter constitucional pois consagrados na Lei Básica da R.A.E.M., designadamente o Princípio da Legalidade, com o que, desde já, em função desde vício, se considera o Acto ferido de nulidade – cfr. art. 122º, n.º 2 alínea d) e 123º do C.P.A..
D. Ao não seguir as regras de interpretação das Leis, previstas no art. 8º e seguintes do Código Civil, e interpretando erroneamente o disposto no art. 9º do DL 60/92/M, e sem atender, quer ao conteúdo da Lei especial, quer ao conteúdo da Lei geral, a Autoridade recorrida incorreu, uma vez mais, no vício de Violação da Lei, pois violou todos as disposições legais citadas, designadamente, o art. 8º do C.C., os arts. 2º, 180º e 181º do ETAPM e os arts. 3º, 4º, 5º, 7º e 8º do Código de Procedimento Administrativo.
E. Pois, ao agir de forma arbitrária, aplicando e interpretando erroneamente a Lei, nos termos das alíneas anteriores, mais concretamente as disposições enumeradas nesta petição, por forma a prejudica deliberadamente os direitos e interesses da recorrente, uma vez que até à data em que foi proferido Despacho pela Direcção das Forças de Segurança de Macau, o recorrente estava a receber, legal e correctamente, os seus prémios de antiguidade, em função da correcta atribuição do primeiro prémio, a autoridade recorrida violou Princípios de caracter constitucional no seu núcleo essencial, consagrados na Lei Básica da R.A.E.M., que constituem Direitos Liberdades e Garantias do recorrente, designadamente os Princípios da Legalidade, da Prossecução do Interesse Público e da Protecção dos Direitos e Interesses dos Residentes, da Proporcionalidade, da Justiça e Imparcialidade e da Boa Fé, com o que, também nesta dimensão, em função deste vício, se consideram os Actos feridos de nulidade – cfr. art. 122º, n.º 2 alínea d) e 123º do C.P.A..
F. Da articulação do Princípio da Legalidade, consagrado na Lei Básica e no art. 3º do C.P.A., resulta claramente a subordinação da Autoridade recorrida à Lei, sendo certo que a mesma não conformou assim as suas acções e decisões.
G. Sempre sem conceder e apenas por mera cautela de raciocínio e patrocínio, mesmo que se entendesse de forma diferente do que se expôs nesta peça processual, o recorrente e na exacta senda do que é entendido pela Autoridade recorrida, mesmo que a Lei em causa tivesse os contornos que esta lhe atribui, tinha a mesma o dever de não ter produzido o Despacho recorrido que a aplicasse, porque seria a Lei violadora dos Princípio da Igualdade de dos Direitos Adquiridos, bem como da Prossecução do Interesse Público e Defesa dos Direitos e Interesses dos Cidadãos, consagrados nos arts. 4º, 8º, 11º, 25º, 36º, 39º, 40º, 41º da Lei Básica da R.A.E.M. e arts. 2º, 180º e 181º do ETAPM, e arts. 33º e 34º, arts. 2º, 3º, 4º e 5º do C.P.A.
H. Assim, está o Despacho recorrido, nesta vertente, ferido, também e uma vez mais, do Vício de Violação de Lei, culminado com a sua nulidade – cfr. arts. 122º, n.º 2 alínea d) e 123º do C.P.A..
I. Todos os Vícios assacados ao acto recorrido constituem fundamento de recurso contencioso – art. 21º do C.P.A.C.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, declarando-se nulo, pelas apontadas ilegalidade, o acto recorrido, com todas as consequências legais.

Citada, a entidade recorrida limitou-se a juntar aos autos o despacho de nomeação do Licenciado em direito.

Não houve alegações facultativas.

Nesta Instância, o digno Magistrado do Ministério Público apresentou o seu douto parecer que se transcreve o seguinte:
“Vem A impugnar o despacho do Secretário para a Segurança de 19/9/07 que, em sede de recurso hierárquico, manteve despacho do Director substituto dos Serviços da FSM, relativo à atribuição de prémios de antiguidade e que determinou a reposição de quantias alegadamente recebida em excesso a tal título pelo recorrente, no montante de 14.402,30, assacando-lhe vasta panóplia de vícios, a saber:
- afronta, no seu núcleo essencial, dos Direitos, Liberdades e Garantias do recorrente, consagrados na LBRAEM (artºs 4º, 8º, 11º, 25º, 26º, 39º, 40º e 41º);
- violação do preceituado no art.º 8º, C.C., 2º, 180º e 181º, ETAPM e 3º, 4º, 5º, 7º e 8º do CPA;
- afronta dos princípios da Legalidade, Prossecução do Interesse Público, Protecção dos Direitos e Interesses do Residentes, Proporcionalidade, Justiça, Imparcialidade, Igualdade e Boa Fé.
Tornando-se ingrata, penosa e inútil a tarefa de tentativa de análise “pari passu” dos vícios invocados, até por que, na sua grande maioria, os mesmos se não encontram devidamente determinados, caracterizados e consubstanciados, designadamente no que concerne à invocação dos grandes princípios e direitos com consagração em diplomas fundamentais, começaremos por referir que a situação factual do recorrente se encontra vertida, de forma clara, sintética e não contestada no corpo do despacho do Director substituto dos Serviços das FSM a que a recorrida anuiu e para o qual remetemos e, por ocioso, nos dispensaremos de reproduzir.
Perante esse situação, entendeu a recorrida, em síntese que o recorrente.
- por um lado, não preencherá o previsto no artº 9º do Dec Lei 60/92/M de 24/8, o qual só terá aplicabilidade quando não haja interrupção de funções, sendo que tal terá ocorrido em relação àquele durante os períodos em que prestou serviço militar, frequentou a Escola de Polícia e esteve ao serviço desta, em Portugal, partindo-se, pois, do princípio que, quando regressou a Macau em 6/7/86 o fez “ex novo”, para frequentar o Serviço de Segurança Territorial, com visa ao ingresso nas fileiras da forças de segurança (CPSP), iniciando novo vínculo funcional à Administração Pública de Macau, vínculo esse que em nada se relaciona ou subordina ao anterior ao seu regresso a Portugal.;
- por outro, não se encontrava a exercer funções em 1 de Janeiro de 1986 na Administração de Macau, nem se encontrava inscrito no Fundo de Pensões à data de entrada em vigor do ETAPM, pelo que não satisfaria os requisitos previstos nos n.ºs 4 e 5 do artº 20º das “Disposições transitórias”, atinentes à “Salvaguarda de direitos” do Dec Lei 87/89/M de 21/12 que aprovou aquele diploma legal e expressamente revogou o Dec Lei 100/84/M de 25/8, à luz do qual o recorrente pretende fazer valer os seus direitos.
E, dizemos, nós, com razão.
Não questionando a interpretação efectuada relativamente à ocorrência daqueles requisitos, reportados aos diplomas legais assinalados, somos, porém, a considerar que o cerne da questão assentará, fundamentalmente, na problemática da sucessão e aplicação da lei no tempo.
Como a própria entidade recorrida adianta e reconhece, o 1º prémio de antiguidade foi atribuído ao recorrente por despacho de 27/12/88, com referência a 3/3/88, data em que o mesmo adquiriu o direito, por ter completado 5 anos de serviço efectivo prestado ao Estado, nos termos do n.º 2 do artº 5º do Dec Lei 100/84 de 25/8, que dispunha que “A contagem do de tempo de serviço para atribuição do 1º período do prémio de antiguidade é feita a partir da data de ingresso na função pública, quer em organismos dependentes de órgãos de soberania da República, quer em Macau, quer na ex-Administração Ultramarina”.
O Dec. Lei 87/89/M, que aprovou o ETAPM, revogou, como se disse, expressamente aquele diploma, introduzindo novos regras e requisitos quanto ao prémio de antiguidade – artºs 180º a 183º - sendo que, a partir da sua entrada em vigor passou a não ser contado o tempo de serviço prestado ao Estado que não contasse para a aposentação, através do Fundo de Pensões de Macau, ao que acresce que, como também já se frisou, não seria aplicável ao recorrente a “Salvaguarda de direitos” prevista no art.º 20º da sua secção V, por se não encontrar em exercício de funções a 1 de Janeiro de 1986 e não estar, à data de entrada em vigor do diploma, inscrito no Fundo de Pensões.
Finalmente, ainda segundo a recorrida (a qual, nos termos que exprime, parece ter tentado alguma saída que se revelasse mais consentânea e adequada “por razões de justiça e pelo facto de ter prestado serviço ao então Território de Macau na qualidade de recrutado à República”), sendo certo que o disposto no art.º 9º do Dec Lei 60/92/M de 24/8 poderia, de alguma forma resolver o problema da situação do recorrente, o mesmo ser-lhe-ia inaplicável por ter existido interrupção da sua prestação de serviço público em Macau, nos termos sobreditos.
Ora, dispunha o artº 12º do Cód. Civil de 1966, à altura aplicável, que “1 – A lei só dispõe para o futuro, ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular.
2 – Quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial; ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos; mas quando dispuser directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes dera origem, entender-se-à que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor”.
Da análise relativa à constituição, modificação ou extinção da situação jurídica atinente ao direito à percepção do 1º período do prémio de antiguidade resulta que com as novas normas introduzidas pelo ETAPM a esse propósito se assiste à introdução de regulamentação alusiva a novos contornos, novos requisitos da mesma.
E, embora se descortinem alguns elementos que parecem pressupor a respectiva aplicação a situações anteriormente constituídas, tal como a preocupação que o legislador parece ter tido de “salvaguarda de direitos” a que já nos reportámos e a que alude o n.º 5 do artº 20º das “Disposições transitórias”, é inquestionável que essa “salvaguarda” se apresenta, ela própria, com a exigência de requisitos “novos” (n.ºs 4 e 5 da norma) relativamente à norma legal que concedia (e concedeu) ao requerente o direito ao 1º período do prémio de antiguidade.
E, essa situação pré constituída de aquisição do direito do 1º período do prémio de antiguidade não poderá deixar de ser considerada como situação duradoura, não estando em causa, com a aplicação da lei nova (como se expressa no Ac. deste Tribunal de 22/5/03-proc. 104/2001, relativo a questão de necessidade de inscrição expressa no Fundo de Pensões), “...regulamentação do conteúdo dessa situação jurídica, mas apenas a regulamentação de novos requisitos de inscrição, situação esta instantânea e abrangida pela nova lei”.
Cremos, pois, que a lei nova – ETAPM – não pode extinguir ou modificar uma situação jurídica constitutiva de direitos anteriormente consolidados à luz dos parâmetro legais então vigentes, a tal não obstando a eventual inaplicabilidade das “salvaguardas” contidas nessa lei, quando as mesmas, como é o caso, pressupõem requisitos e contornos não exigíveis face à lei anterior, à luz da qual aquela situação se firmou, sob pena de grava afronta da segurança e confiança que devem reger as relações entre a Administração e administrados.
Donde, dada a diferente interpretação seguida e consequente violação dos dispositivos atinentes à aplicação da lei no tempo, sermos a pugnar pelo provimento do presente recurso.

Cumpre conhecer.
Foram colhidos os vistos legais.

Consideram-se pertinentes os seguintes elementos fácticos:
- Por ofício n° 0694/NOF/2007, o recorrente foi notificado o seguinte termo de contagem dos prémio de antiguidade:
“Notifica-se o Chefe de 6.° escalão, n.o XX, A, do CPSP, de que, em relação aos seus prémios de antiguidade, transcreve-se o despacho de 9 Julho de 2007, do Director, Substituto, desta DSFSM, cujo teor é o seguinte:
“Tendo sido examinados e verificados os 1 ° a 5° prémios de antiguidade abonados ao Chefe do 6.° escalão, n.º XX, A, do CPSP (adiante designado por interessado), e segundo as informações fornecidas pelo CPSP, os prémios abonados ao interessado incluem o tempo efectivo prestado no serviço militar de Portugal, na Escola de Polícia de Portugal e na Polícia de Portugal, em que houve interrupção de funções:
12/05/1980 - 05/09/1981 - serviço militar de Portugal
10/05/1982 - 31/08/1982 - Escola de Polícia de Portugal
01109/1982 - 31/08/1985 - comissão de serviço (Macau)
01/09/1985 - 30/06/1986 - Polícia de Portugal
06/07/1987 - 05107/1988 - Instruendo das Forças de Segurança de Macau (Serviço de Segurança Territorial)
De 06/07/1988 até agora - Corpo de Polícia de Segurança Pública
Embora o interessado tenha pago descontos à entidade responsável pelas pensões em Portugal de 1 de Setembro de 1982 a 31 de Julho de 1985, houve interrupção no seu tempo de serviço. Assim, não satisfaz a disposição do artigo 9.° do Decreto-Lei n.º 60/92/M, que diz:
“1. O tempo de serviço prestado em serviço público ou empresa pública na República Portuguesa releva para os seguintes efeitos:
a) ...
...
c) Prémio de antiguidade, desde que o tempo de serviço haja sido contado para efeitos de aposentação e de reforma.
...
2. O tempo de serviço do no número anterior só releva se o trabalhador dele fizer prova, mediante documento emitido pela entidade competente e quando não haja interrupção de funções.”
O Decreto-Lei n.º 87/89/M, que aprovou o Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, tem as seguintes disposições transitórias: o tempo de serviço prestado em serviço público de Portugal ou na antiga administração ultramarina é contado para efeitos de aposentação e sobrevivência, desde que os trabalhadores se encontrassem a exercer funções em 1 de Janeiro de 1986 na administração de Macau daquela altura, que se tivessem inscrito no Fundo de Pensões antes da entrada em vigor daquele Decreto-Lei e que pagassem os correspondentes encargos. Embora o interessado tenha prestado serviço na administração de Macau durante o período de 1982 a 1985, trabalhou como polícia de Portugal durante o período de 1 de Setembro de 1985 a 30 de Junho de 1986. Assim, não satisfaz o requisito legal supra-mencionado de se encontrar a exercer funções em 1 de Janeiro de 1986 na administração de Macau daquela altura, resultando em não se poder contar o tempo de serviço prestado pelo interessado na administração de Macau antes da sua integração, para os efeitos de aposentação e sobrevivência. Segundo as informações, o interessado ingressou no Serviço de Segurança Territorial em 6 de Julho de 1987 e começou a efectuar os descontos para o Fundo de Pensões. Entrou no CPSP em 6 de Julho de 1988 e vem prestando serviço até agora sem interrupção. Por isso, a sua contagem de prémio de antiguidade no Fundo de Pensões devia ser feita a partir de 6 de Julho de 1987.
Em síntese, nos termos da alínea 4) do n.º 1 do Despacho n.º 9/2005 do Secretário para a Segurança, determino o seguinte:
1. Nos termos do artigo 180.° e do n. ° 1 do artigo 181.° do ETAPM, os funcionários e agentes em efectividade de serviço têm direito a um prémio de antiguidade por cada 5 anos de serviço prestado, até ao limite de 7. Para este efeito, é levado em conta apenas o tempo de serviço que por lei deva ser considerado para efeitos de aposentação. Agora, indicam-se de novo as seguintes datas em que o interessado tinha direito a receber os prémios de antiguidade:
N.º de prémio de antiguidade
Data original de abono de prémio de antiguidade
Data de vigência de prémio de antiguidade após ajustamento
Duração contada para o prémio de antiguidade
1
03/03/1988
06/07/1992
06/07/1987 – 05/07/1992
2
03/03/1993
06/07/1997
06/07/1992 – 05/07/1997
3
03/03/1998
06/07/2002
06/07/1997 – 05/07/2002
4
12/02/2002
06/07/2007
06/07/2002 – 05/07/2007
5
12/02/2007
-
-
2. Nos termos do n.º 1 do artigo 35.° do Regulamento Administrativo n.º 6/2006, que refere: “A obrigatoriedade de reposição das quantias recebidas prescreve decorridos cinco anos após o seu recebimento.”, o interessado deve repor as quantias recebidas em excesso, no montante total de MOP 14.402,30.
3. A Divisão de Gestão Administrativa e Orçamental desta DSFSM acompanhe o ajustamento das datas de abono de prémio de antiguidade ao interessado e exija ao interessado a reposição das quantias recebidas em excesso.
4. Notifique-se o Fundo de Pensões sobre o ponto 1 acima mencionado e notifique-se o interessado do despacho e dos seus direitos pertinentes.
Direcção dos Serviços das Forças de Segurança de Macau, aos 9 de Julho de 2007.”
- Reclamou o recorrente perante o Director dos Serviços das Forças de Segurança de Macau, à que foi indeferida nos seguintes termos:
“Despacho
Face à reclamação apresentada em 26 de Julho p.p. por A, Chefe n.º XX do CPSP, e respeitante ao nosso despacho de 9 de Julho p.p., que aprovou a rectificação das datas de atribuição dos prémios de antiguidade do reclamante e determinou a respectiva reposição de quantias indevidamente pagas, há a dizer o seguinte:
1. O primeiro prémio de antiguidade foi atribuído ao reclamante por despacho de 27 de Dezembro de 1988 e com referência a 3 de Março de 1988, data em que adquiriu o direito por ter completado cinco anos de serviço efectivo prestado ao Estado, tal como então determinava o Decreto-Lei n.º 100/84/M, de 25 de Agosto, no seu artigo 5.°, n.º 2.
2. Pelo facto de os respectivos documentos terem dado entrada apenas em Dezembro de 1988 o abono desse primeiro prémio de antiguidade começou a processar-se a partir de 1 de Janeiro de 1989, como determinava o n.º 3 do artigo 6.° daquele diploma legal.
Norma essa que expressamente referia que o atraso na entrega dos documentos não prejudicava o direito ao prémio mas apenas o seu recebimento.
3. O tempo de serviço ao Estado então computado incluía não só o tempo de serviço prestado, a partir de 6 Julho de 1987, como instruendo do Centro de Instrução Conjunto e depois como Guarda do CPSP, como também o tempo de serviço que antes prestara em Macau, requisitado à República e em comissão de serviço, para além do tempo de serviço prestado na Escola Prática de Polícia da PSP portuguesa.
Não foi incluído nessa contagem de tempo de serviço para o 1.° prémio de antiguidade o período compreendido entre a data de regresso a Portugal, finda a comissão de serviço, e a data de ingresso no Centro de Instrução Conjunto, após voltar para Macau.
4. O Decreto-Lei n.º 87/89/M, de 21 de Dezembro, aprovou o ETAPM-Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau -- o qual introduziu novas regras quanto ao prémio de antiguidade --, revogando expressamente o Decreto-Lei n° 100/84/M, de 25 de Agosto.
5. Assim, no cômputo dos períodos para atribuição do prémio de antiguidade passou a ser levado em conta apenas o《tempo de serviço que por lei deva ser considerado para efeitos de aposentação, com excepção dos acréscimos anteriormente concedidos, em virtude do exercício de funções em Macau.》, como dispõe o n.º 1 do artigo 181.° do ETAPM.
Quer isto dizer que, ao contrário do que determinava o Decreto-Lei n.º 100/84/M, passou a não ser contado, a partir da entrada em vigor do ETAPM (29 de Dezembro de 1989), o tempo de serviço prestado ao Estado que não contasse para a aposentação através do Fundo de Pensões de Macau.
6. Todavia, no sentido de imprimir justiça e acautelar determinadas situações face ao novo regime, o Decreto-Lei n.º 87/89/M fez valer disposições transitórias, nomeadamente as contidas na Secção V-Aposentação e prémio de antiguidade, artigo 20.° (com a epígrafe 《Salvaguarda de direitos》).
Ali se determinou, no n.º 4, que o tempo de serviço prestado em serviço público de Portugal ou da ex-Administração Ultramarina seria contado, para efeitos de aposentação, pensão de sobrevivência e antiguidade《desde que o trabalhador se encontrasse a exercer funções em 1 de Janeiro de 1986.》.
7. Ora o reclamante, embora tivesse prestado serviço em serviço público de Portugal (Polícia de Segurança Pública), não estava a exercer funções na Administração Pública de Macau em 1 de Janeiro de 1986.
8. Nem, por outro lado, estava nessa mesma data inscrito no Fundo de Pensões de Macau, como o exigia o n.º 5 do mesmo artigo 20.°.
9. A não satisfação dos dois referidos requisitos determinou, consequentemente, a não salvaguarda do direito até aí detido pelo reclamante - conferido pelo artigo 2.°, n.º 4, do Decreto-Lei n° 100/84/M - que era o de a contagem do tempo de serviço para atribuição do 1.° período do prémio de antiguidade ser feita a partir da data do ingresso na função pública, quer em organismos dependentes de órgãos de soberania da República, quer em Macau, quer na ex-Administração Ultramarina.
10. Não salvaguardado esse seu direito, passaram a aplicar-se ao reclamante, apenas, as novas regras do prémio de antiguidade contidas nos artigos 180.° a 183.° do ETAPM.
Uma eventual aplicação, ao caso do reclamante, do Decreto-Lei n° 60/92/M, de 24 de Agosto, por razões de justiça e pelo facto de ter prestado serviço ao então Território de Macau na qualidade de recrutado à República, não se justificaria nem seria possivel, dado ter havido interrupção na prestação do serviço público.
11. Dessa forma, a contagem do tempo de serviço para efeitos de prémio de antiguidade passou a dever fazer-se, no caso do reclamante, e nos termos do n.º 1 do artigo 181.°, a partir de 6 de Julho de 1987, data em que iniciou a instrução no Centro de Instrução Conjunto, pois que, tendo ingressado depois no CPSP, o tempo de instrução foi contado para efeitos de aposentação, sendo a sua inscrição no Fundo de Pensões reportada a essa data.
12. Todavia, os serviços não suspenderam então o abono do 1.º prémio de antiguidade que o reclamante vinha recebendo, daí resultando que esse mesmo prémio foi indevidamente abonado desde a entrada em vigor do ET APM até à data em que o reclamante perfez cinco anos de serviço efectivo, ou seja, até 5 de Julho de 1992.
E, por outro lado, levou a que posteriormente lhe fossem contados pelo CPSP prémios de antiguidade a que, na realidade, não tinha direito.
13. A constatação recente dessa realidade anómala levou a que fosse feito o levantamento da situação, culminando com o nosso despacho agora objecto de reclamação, que rectificou as datas de vencimento dos prémios e exigiu ao reclamante a reposição, dentro dos limites da lei, das quantias indevidamente abonadas no passado, no total de MOP 14.402,30, e de acordo com a discriminação de que foi dado conhecimento ao reclamante através da Notificação n.º 0693/2007, de 13 de Julho.
14. Assim sendo, e com fundamento em tudo o exposto, indefiro a reclamação, mantendo o despacho que foi objecto de impugnação.
Notifique-se.
DSFSM, aos 7 de Agosto de 2007
O Director, Substituo
Chan Peng Sam”
- Desta decisão o recorrente interpôs recurso hierárquico para o Senhor secretário para a Segurança, onde obteve improcedência pelo despacho seguinte:
“O despacho recorrido segue aquela que tem sido a doutrina do Fundo de Pensões, a qual vem autovinculando a administração, não podendo, assim, por esta via graciosa modificar o sentido da decisão.
Nestes termos, e nos de facto e de direito de que se prevalece o despacho impugnado e que aqui se dá por inteiramente reproduzido, Nego Provimento ao presente recuso.
Macau, 19 de Setembro de 2007
O Secretário para a Segurança
Cheong Kuoc Vá”

Conhecendo.
Independentemente de que o recorrente impugnou o despacho recorrido pelos vários vícios, vastos, sem devidamente determinados e consubstanciados, tais como a violação aos Direitos, Liberdades e Garantias do recorrente, consagrados na LBRAEM (artºs 4º, 8º, 11º, 25º, 26º, 39º, 40º e 41º), ao preceituado no art.º 8º, C.C., 2º, 180º e 181º, ETAPM e 3º, 4º, 5º, 7º e 8º do CPA e aos princípios da Legalidade, Prossecução do Interesse Público, Protecção dos Direitos e Interesses do Residentes, Proporcionalidade, Justiça, Imparcialidade, Igualdade e Boa Fé, vejamos directamente o mérito da causa de que o recorrente levou para o juízo.
O que está em causa é que o recorrente, aquando no Serviço militar de Portugal, na Escola de Polícia de Portugal e Comissão de Serviço (Macau), respectivamente durante 12/5/1980 – 5/9/1981, 10/5/1982 – 31/8/1982, 1/9/1982 – 31/8/1985, tinha pago por via de desconta na fonte à entidade responsável pelas pensões em Portugal e por isso teria direito a receber o prémio de antiguidade nos termos do disposto no D.L. n° 100/84/M. Porém, em 2007, os Serviços de Força de Segurança de Macau determinou a reposição do prémio de antiguidade recebido pelo recorrete contando em MOP$14.402,30, seguindo o disposto no artigo 9° do D.L. n° 60/92/M, quanto à contagem do tempo do serviço nomeadamente para o efeito de antiguidade, que se dispunha: “O tempo de serviço referido no número anterior só releva se o trabalhador dele fizer prova, mediante documento emitido pela entidade competente e quando não haja interrupção de funções”.
A solução não será difícil.
A questão crucial consiste na aplicação da lei no tempo, ou seja é aplicável o princípio geral de não aplicação retroactiva da lei, princípio este que se encontrava já consagrado no artigo 12° do Código Civil do então.
O facto de o recorrente ter interrupção do tempo no serviço mas não do desconto para a aposentação releva ou não para a contagem do tempo de serviço e consequente recebimento do prémio da antiguidade.
Resultou dos autos, e tal como a própria entidade recorrida reconheceu, o 1º prémio de antiguidade foi atribuído ao recorrente por despacho de 27/12/88, com referência a 3/3/88, data em que o mesmo adquiriu o direito, por ter completado 5 anos de serviço efectivo prestado ao Estado, nos termos do n.º 2 do artº 5º do Dec Lei 100/84 de 25/8.
Dispunha este artigo que:
“1. No cômputo dos períodos para aplicação do disposto no artigo 4º é levado em conta todo o tempo de serviço que por lei deva ser considerado para efeitos de aposentação, exceptuado o acréscimo de 20% conferido por virtude do exercício de funções em Macau e demais percentagens de idêntica natureza legalmente concedidas.
2. A contagem do tempo de serviço para atribuição do 1.º período do prémio de antiguidade, é feita a partir da data do ingresso na função pública, quer em organismos dependentes de órgãos de soberania da República, quer em Macau, quer na ex-Administração Ultramarina.
3. Para o segundo período e seguintes, a contagem de tempo de serviço faz-se a partir do dia em que foi completado o período imediatamente anterior.”
E no Artigo 4º, sob epígrafe de “Atribuição do direito e montante”, dispunha que:
“1. Os funcionários e agentes em efectividade de serviço, ou em situação legal que lhes confira direito a auferir vencimento, perceberão um prémio de antiguidade no valor de 170 patacas por cada período de 5 anos, até ao limite máximo de 7 períodos. **1
2. O disposto no número anterior abrange também os assalariados eventuais que prestem serviço em regime de tempo completo, desde que este esteja a ser contado para efeitos de aposentação, em Macau ou nos quadros dos órgãos de soberania da República, e efectuem os respectivos descontos.*2
3. Os reformados e aposentados que prestem serviço à Administração do Território, a qualquer título, não adquirem por esse facto direito ao prémio de antiguidade.”
Os artigos 180º a 183º do ETAPM, aprovado pelo D. L. n° 87/89/M, revogando o D.L. n° 100/84/M, mantém-se essencialmente as regras e requisitos quanto ao prémio de antiguidade, apesar das novas regras e requisitos introduzidas, em conformidade dos quais, a partir da sua entrada em vigor passou a não ser contado o tempo de serviço prestado ao Estado que não contasse para a aposentação, através do Fundo de Pensões de Macau. E ao mesmo tempo no próprio D.L. n° 20 fez o disposto de “Salvaguarda de direitos” nos seguintes termos:
“Artigo 20º (Salvaguarda de direitos)
1. A bonificação do tempo de serviço prestado antes de 1 de Janeiro de 1986 continua a relevar para efeitos de aposentação e sobrevivência.
2. O pessoal militarizado e do Corpo de Bombeiros das Forças de Segurança de Macau, de investigação criminal da Polícia Judiciária e os guardas prisionais que se encontrem a prestar serviço à data da entrada em vigor deste diploma, mantêm o direito à bonificação de 20% sobre o respectivo tempo de serviço para os efeitos do número anterior.
3. A compensação para aposentação devida pelo pessoal a que se refere o número anterior é de 30%, sendo suportada em 20% pela Administração e em 10% pelo interessado.3
4. O tempo de serviço prestado em serviço público de Portugal ou da antiga administração ultramarina é contado para efeitos de aposentação, pensão de sobrevivência e antiguidade, desde que o trabalhador se encontrasse a exercer funções em 1 de Janeiro de 1986.
5. A manutenção dos direitos previstos neste artigo pressupõe a inscrição no Fundo de Pensões à data da entrada em vigor do presente diploma e a satisfação dos correspondentes encargos.
6. Os trabalhadores que se encontrassem inscritos no Fundo de Pensões em 1 de Janeiro de 1986 podem requerer a contagem do tempo de serviço prestado antes daquela data e relativamente ao qual não hajam procedido a descontos para efeitos de aposentação e sobrevivência, mediante pagamento dos mesmos.
7. O requerimento a que se refere o número anterior deve dar entrada no Fundo de Pensões no prazo de 6 meses, a contar da data da entrada em vigor deste diploma, acompanhado dos meios de prova adequados.
8. A regularização dos descontos a que se refere o n.º 6 pode efectuar-se em prestações mensais de número não superior a 90.” (sub. nosso)
Parecia que ao recorrente não fosse aplicável estas “Salvaguarda de direitos”, por não se encontrar em exercício de funções a 1 de Janeiro de 1986 e não estar, à data de entrada em vigor do diploma, inscrito no Fundo de Pensões.
E, tal como foi levada a aplicação ao recorrente, o D.L. n° 60/92/M que previa o regime especialmente de recrutamento do exterior de Macau para a Função pública, no qual, quanto ao regime de prémio de antiguidade, dispunha:
“Artigo 9.º (Tempo de serviço)
1. O tempo de serviço prestado em serviço público ou empresa pública na República Portuguesa releva para os seguintes efeitos:
a) Férias e faltas;
b) Subsídios de férias e de Natal;
c) Prémio de antiguidade, desde que o tempo de serviço haja sido contado para efeitos de aposentação e de reforma.
2. O tempo de serviço referido no número anterior só releva se o trabalhador dele fizer prova, mediante documento emitido pela entidade competente e quando não haja interrupção de funções.”
Introduziu-se expresamente o requisito de, para a contagem de tempo do serviço e consequente para prémio de antiguidade, não haver interrupção de funções.
E foi por este disposto legal levado à consideração por o recorrente não ter direito ao prémio de antiguidade por virtude de ter encontrado a interrupção de funções, no período de 6/9/1981 a 9/5/1982.
Neste periodo, o D.L. 100/84/M era aplicável e em conformidade com o memso a sua situação tinha sido determinada e foi atribuído o direito ao primeiro prémio de antiguidade por ter completado primeiro 5 anos de serviço, enquanto ainda não havia aprovação do novo regime. Ainda por cima, foi por um acto administrativo reconhecido deste direito adquirido, o despacho de 27/12/88, com referência a 3/3/88, em que foi atribuído ao recorrente o 1º prémio de antiguidade, por ter completado 5 anos de serviço efectivo prestado ao Estado, nos termos do nº 2 do artigo 5º do D. L. n° 100/84, de 25 de Agosoto.
Como é óbvio, o acto de 2007 ora recorrido, que mandou repor o prémio de antiguidade recebido efectuou uma interpretação e aplicação errada da lei, nomeadamente violou a regra geral de não aplicação retroactiva da lei que dispõe só para o futuro.
Dispunha o artº 12º do Código Civil de 1966, à altura aplicável, que:
“1 – A lei só dispõe para o futuro, ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular.
2 – Quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial; ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos; mas quando dispuser directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes dera origem, entender-se-à que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor”.
Tal como a consideração do douto parecer do Minsitério Público, “da análise relativa à constituição, modificação ou extinção da situação jurídica atinente ao direito à percepção do 1º período do prémio de antiguidade resulta que com as novas normas introduzidas pelo ETAPM a esse propósito se assiste à introdução de regulamentação alusiva a novos contornos, novos requisitos da mesma. E, embora se descortinem alguns elementos que parecem pressupor a respectiva aplicação a situações anteriormente constituídas, tal como a preocupação que o legislador parece ter tido de “salvaguarda de direitos” a que já nos reportámos e a que alude o n.º 5 do artº 20º das “Disposições transitórias”, é inquestionável que essa “salvaguarda” se apresenta, ela própria, com a exigência de requisitos “novos” (n.ºs 4 e 5 da norma) relativamente à norma legal que concedia (e concedeu) ao requerente o direito ao 1º período do prémio de antiguidade. E, essa situação pré constituída de aquisição do direito do 1º período do prémio de antiguidade não poderá deixar de ser considerada como situação duradoura, não estando em causa, com a aplicação da lei nova ... .”
A lei nova, seja o ETAPM seja o D.L. n° 60/92/M, não pode modificar muito menos pode fazer extinguir um direito ou direitos ou uma situação jurídica constitutiva de direitos previamente consolidados no âmbito da disposição legal então vigente, pois quando os mesmos direito ou direitos ou situação jurídica constitutiva de direitos se firmaram, com pressupostos e requisitos não exigíveis face à lei anterior, como no caso o D.L. n° 100/84/M, de modo algum pode impor a aplicação da nova lei que prevê novos requisitos para repor uma situação jurídica anteriormente estabelecida, sob pena de grava afronta da segurança e confiança que devem reger as relações entre a Administração e administrados.
Tal com confirmou no Acórdão deste Tribunal de 22/5/03 no Processo n°104/2001, “A lei nova não se aplica a factos constitutivos (modificativos ou extintivos) verificados antes do seu início de vigência”.
E pelo facto de ter-se uma diferente interpretação seguida e consequente violação dos dispositivos atinentes à aplicação da lei no tempo, é de, sem necessidade de maiores considerações, anular o acto recorrido, dando assim provimento ao recurso.
Pelo exposto, acordam neste Tribunal de Segunda Instância em conceder provimento ao recurso interposto por A, anulando o acto recorrido.
Não há condenação nas custas por não serem devidas.
RAEM, aos 8 de Julho de 2010

Choi Mou Pan (Relator)
João A. G. Gil de Oliveira (Primeiro Juiz-Adjunto)
Lai Kin Hong (Segundo Juiz-Adjunto)

Presente
Vitor Coelho
1 Alteradopela redacção dada pela Lei n.º 4/87/M.
2 Alterado pela redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 109/85/M.
3 Redacção dada pelo artigo 1.º da Lei n.º 11/92/M, de 17 de Agosto.
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TSI-655/2007 Página 1