Reclamação nº 15/2010
A sócia da Ré B, nos autos de processo nº CV2-08-0067-CAO-C, posteriormente admitida a intervir como assistente nos mesmos autos, interpôs no âmbito desses autos recurso da decisão proferida a fls. 507, 508 e 590 dos autos.
Por douto despacho da Mmª Juiz a quo, não foi admitido esse recurso com fundamento na falta de legitimidade para recorrer.
E porque não lhe foi admitido o recurso, veio formular a presente reclamação nos seguintes termos:
RECLAMAÇÃO CONTRA NÃO ADMISSÃO DE RECURSO
O que faz, muito respeitosamente, nos termos do art. 595°/1 e ss. do CPC com os fundamentos seguintes:
1. Acórdão do TSI de 11/02/2010
Quando o Tribunal a quo decidiu sobre a admissibilidade do recurso da Reclamante (em 25/02/2010), esta não era parte na acção. De facto, a sua admissão como parte (acessória) havia sido indeferida por despacho de 10102/2009 (fls. 251-252).
Todavia, esta decisão de 10/02/2009 (doc. 1) foi entretanto revogada pelo Tribunal de Segunda Instância (TSI), por Acórdão de 11/02/2010, o qual concedeu provimento ao recurso da ora requerente, e admitiu a ora requerente a intervir na acção como assistente (doc. 2).
Deste Acórdão foi interposto recurso, pela Autora (C), para o Tribunal de Última Instância, ao qual o TSI fixou, por despacho de 09/03/2010, efeito meramente devolutivo (doc. 3). Assim, o recurso interposto para o TUI não suspende os efeitos do Acórdão do TSI, que se aplica imediatamente.
Quer tal dizer que a ora Requerente é parte na acção desde 09/03/2010 (doze dias depois do despacho Reclamado).
Tal facto superveniente releva, estamos em crer, para efeitos da presente Reclamação.
2. Igualdade substantiva, igualdade processual
Começamos por notar que estão nesta acção três sociedades: a Autora, a Assistente, e a Ré. Destas, as duas primeiras são sócias da Ré.
Sendo a Autora e a Assistente sócias da Ré, têm os mesmos direitos societários, isto é, os mesmo direitos substantivos. Uma vez que, nos termos da lei processual civil estabelece, por via da tutela jurisdicional efectiva, uma correspondência entre direitos substantivos e direitos adjectivos, à igualdade de direitos substantivos societários deverá corresponder uma igualdade de direitos adjectivos ou processuais.
Isto é dizer, se a sócia autora tem direito de recurso, a tendência interpretativa é a de que a sócia assistente também tenha direito de recurso. Pelo menos, estamos em crer que deverá haver esta directriz interpretativa quando passarmos à análise mais técnica do direito ao recurso.
3. Arts. 585°/2 e 276°/1 do CPC
Cremos, sem originalidade, que o art. 585°/2, quando aplicado à parte acessária (parte final), deve ser lido em conjugação com o art. 276°/1, o qual estabelece o direito da assistente intervir para auxiliar a parte principal.
Se o art. 276°/1 concede à assistente o direito geral de intervir em auxílio da parte principal, concede-lhe também o direito de recorrer (e de alegar) quando a parte assistida tenha recorrido.
Caso contrário, a assistente teria direito de intervir na acção, mas não no recurso. Tal não teria sentido e contrariaria princípios estruturantes do processo civil.
Por isso, o art. 585°/2 tem sido interpretado, na parte relativa ao assistente, como sendo aplicável às situações em que a parte principal não recorreu e o assistente recorreu. Nestes casos há que analisar se a assistente sofre, ela mesma, um prejuízo directo e efectivo, independentemente de já ter o "interesse jurídico em que a decisão da causa seja favorável" à parte principal (art. 276°/1).
Isto é, se decisão é desfavorável à parte principal, esta pode recorrer e a assistente pode auxiliá-la recorrendo, tudo nos termos do art. 276°/1. De facto, para que seja admitida a intervir na acção basta à assistente ter "interesse jurídico em que a decisão da causa seja favorável" à parte principal (art. 276°/1), não é necessário ser directa e efectivamente prejudicada pela decisão da acção.
Logo, à assistente - como parte acessória e auxilar da parte principal - tem direito de assistir a parte principal no recurso, recorrendo e alegando com aquela, em virtude do disposto no art. 276°/1 do CPC.
O art. 585°/1 só releva para os casos em que seja necessário demonstrar que a decisão em causa prejudica directa e efectivamente a assistente. Só é necessário fazer tal demonstração quando a parte principal não recorreu, isto é, quando a parte principal entendeu - para usar a linguagem do art. 276°/1 - que a decisão em causa não lhe é desfavorável. Se a decisão em causa lhe for desfavorável, ela recorre e a assistente pode auxiliá-la por a decisão ser desfavorável à parte principal (não necessariamente à assistente): art. 276°/1.
Se a decisão não for desfavorável à parte principal (ou se ela entender que não é), esta não recorre. Neste caso, a assistente para recorrer tem de demonstrar (art. 585°/2) - como qualquer pessoa que não seja parte - que é directa e efectivamente prejudicada pela decisão: que é ela própria, assistente, directa e efectivamente prejudicada, e não a parte principal.
Resulta, assim, da conjungação dos arts. 276°/1 e 585°/2 do CPC, que, quando cabe recurso da parte principal, a assistente tem direito de recurso como auxiliar, nos termos gerais do art. 276°/1. Quando não cabe ou não for interposto recurso pela parte principal, a parte acessória só pode interpor recurso, extravasando da sua missão de parte auxiliar, caso seja ela mesma directa e efectivamente visada pela decisão. Neste último caso, não é na sua condição de parte auxiliar que ela intervém, mas na condição de parte directa e efectivamente afectada pela decisão (como qualquer terceiro).
Logo, no caso em apreço, tendo a B (parte principal) interposto recurso, tal é suficiente para que a assistente possa ela mesma interpor recurso (e alegar) em auxílio da parte principal, nos termos gerais do art. 276°/1.
Cabe sublinhar - uma vez mais - que quando o Tribunal a quo decidiu sobre a admissibilidade do recurso, a Reclamante não tinha ainda sido reconhecida como parte acessória, pelo que não se pode criticar a decisão reclamada por não ter tido em conta a linha de argumentação assente no art. 276°/1, pois na altura não o poderia ter feito.
4. Noção de prejuízo directo e efectivo
Sem prejuízo do alegado na secção anterior, vejamos sumariamente o que diz a jurisprudência e a doutrina sobre a noção de prejuízo directo e efectivo, que se encontra no art. 585°/2 do CPC.
Lê-se no Ac. STJ, 23/11/2005, relativamente à norma processual portuguesa que corresponde ao art. 585°/2 do CPC, o seguinte (relativamente à discussão do anteprojecto do Código de Processo Civil de 1939):
"Foi a propósito observado que a expressão prejuízo directo se prestava a interpretação ampla e geradora de obstáculos à margem dos processos, mas que tal era preferível à solução de afectar ilegitimamente o interesse de quem não foi ouvido nem provocou a decisão.
(...) foi considerado nessa discussão que o prejuízo directo excluía o prejuízo indirecto ou reflexo, que o relevante devia ser actual e positivo, o que excluiria o prejuízo eventual, incerto e longínquo."
Já o Ac. STJ, de 7/12/93, decidiu que "Este prejuízo, para poder classificar-se de directo e imediato, tem de resultar da própria decisão e de ser actual e positivo, no sentido de impor responsabilidades ou implicar a imediata afectação de direitos ou interesses juridicamente tutelados, isto é, tem de ser real e jurídico".
Já Alberto dos Reis ensinava, no seu Cód. Proc. Civil Anotado, V, 272, que o prejuízo há-de ser actual e positivo. Não é suficiente o prejuízo eventual, incerto e longínquo.
Em suma, a expressão "prejuízo directo e efectivo" não tem de ser necessariamente levado à letra, devendo ser interpretado no sentido de ser actual, efectivo, real, isto é, de não ser prejuízo eventual, incerto e longínquo.
O critério, lê-se, é a afectação de direitos ou interesses juridicamente tutelados.
Veremos que o prejuízo sofrido pela decisão que afasta a B do processo (representada pelo Conselho de Administração em efectividade de funções) e rejeita a sua Contestação afecta direitos e interesses reais da Reclamante.
5. Prejuízos sofridos: constituição do Conselho de Administração
Como se disse, o mero facto de a decisão ser desfavorável à Ré, parte principal, concede à assistente direito de a auxiliar, recorrendo (art. 276°/1). Todavia, vamos aqui demonstrar que, mesmo à luz do art. 585°/2, a assistente tem direito de recurso.
Para aplicação deste artigo releva que a Reclamanete tenha interesse na improcedência da acção e, no que respeita às decisões em pareço, que destas resulte um prejuízo que directa e efectivamente se repercuta na sua esfera jurídica (no sentido referido na secção anterior desta Reclamação). O que se verifica, como passa sumariamente a justificar.
Com efeito, na presente acção é peticionada a declaração de nulidade da deliberação social de Junho de 2006 que elegeu para o Conselho de Administração dois novos membros indicados pela ora Reclamante, como já foi reconhecidos nos autos pelas partes.
Esta composição do Conselho de Administração é uma parte do equilíbrio global de interesses então definido para a sociedade pela ora Reclamante e pela ora Autora, que acabavam de se tornar accionistas da mesma: C ora Autora, accionista maioritária, ficou com dois terços dos votos na Assembleia Geral, e a A, ora Reclamante, accionista minoritária, ficou com dois terços dos votos do Conselho de Administração.
Com a anulação da deliberação em apreço a Autora pretende apenas eliminar este equilíbrio de poderes. Pois se a deliberação for declarada nula, o Conselho de Administração passará a ser composto exclusivamente por membros afectos à Autora, accionista C. Ou seja, a presente acção destina-se a afastar a Reclamante dos destinos da sociedades e a permitir o seu controlo absoluto pela Autora.
De resto, os fundamentos alegados na acção pela Autora são em si manifestação disso mesmo: alega que a reunião deve ser declarada nula por não ter sido convocada, apesar de ter sido participada por mais de 99% do capital social, mas precisamente 99,728%!
Como se os dois faltosos - que nunca compareceram a nenhuma reunião, pudessem ter alguma relevância em decisões aprovadas com mais de 99% dos votos. É patente que a Autora procura um pretexto para fazer, por via da presente acção, aquilo que não consegue fazer pelo voto.
Na verdade, toda esta acção revela demasiado pouca boa fé, pois a própria Autora em várias outras acções adiantou que os dois accionistas faltosos, residentes na RPC, estão desaparecidos desde sempre, há inúmeros anos, nunca tendo participado em qualquer reunião actividade societária.
Querer ver declarada nula uma reunião por não terem comparecido dois accionistas que não poderiam comparecer e que, se pudessem, não poderiam influenciar qualquer decisão (pois têm muito menos de 1 %), revela por si só que algo de estranho anima esta estranha acção judicial, intentada - note-se - cerca de três anos depois da deliberação em causa! Ou seja, o que nunca foi nulo durante cerca de três anos, parece ter-se tornado subitamente grave e nulo.
Pelos motivos supra referidos relativos ao equilíbrio interno de poderes, a ora Recorrente tem interesse na improcedência da acção. Este interesse ajuda a explicar porque é que a Recorrente é directa e efectivamente prejudicada pela decisão recorrida, como passa a justificar.
De facto, o que está em causa é a constituição do Conselho de Administração, e a constituição do Conselho de Administração é algo que é do interesse real, efectivo, real das sócias. É por isso que são as sócias que elegem o Conselho de Administração, pois este exprime a vontade societária. Logo, a Reclamante tem interesse directo e efectivo em ver esta decisão alterada, e não um mero prejuízo eventual, incerto e longínquo. A decisão afecta interesses juridicamente tutelados da Reclamante, pelo que - conforme jurisprudência acima citada - esta tem direito de recurso à luz do art. 585°/2 do CPC.
6. Prejuízos sofridos: Contestação confessória da Ré
A Ré B, representada por advogados constituídos por um Conselho de Administração de que era membro D, apresentou, em 10-11-2008 (f1s. 92), uma Contestação em que confessou todos os factos aduzidos contra si por D (em representação da Autora): doc. 4.
D presta serviço no escritório dos então advogados da B e já os havia ele mesmo constituído advogados da B numa acção em que continua a representar a B.
Mais precisamente, D constituiu advogados para representar, quer a Ré (doc. 5), quer a Autora (fls. 97 destes autos).
por outro lado, os advogados que confessaram, em nome da Ré (B), a acção intentada pela Autora (C), representam quer a Ré, quer a Autora (docs. 5 e 6).
Nos presentes autos, D agiu contra a B (quando antes agira em sua representação) e viu os advogados (que ele mesmo constituíra para representar a B) serem constituídos para confessarem os factos que ele veio (em representação da Autora) alegar contra ela. Este factos falam por si.
Ou seja, quer D (do anterior Cons. de Administração da Ré), quer os mandatários da Ré que vieram apressadamente confessar a acção, estão dos dois lados da "barricada": representaram simultaneamente a Autora e a Ré.
Não admira, pois, que tenham confessado esta acção.
Esta triste narração não termina, infelizmente, aqui.
Mais tarde, a Autora convocou uma assembleia geral da Ré que reuniu em 5 de Novembro de 2009. Nessa assembleia geral a Autora apresentou - entre outras - uma proposta de deliberação que incluia a ratificação da intervenção processual da Ré nestes autos (nº CV2-08-0067-CAO). A Autora votou sózinha, favoravelmente, esta deliberação (que recebeu contra da ora Reclamante) (doc. 7).
Ou seja, a Autora, através de um então administrador comum à Autora e Ré, intentou uma acção contra a Ré, que constituiu seus mandatários advogados do escritório do próprio representante da Autora, advogados esses que são advogados da Ré e da Autora. Estes advogados confessaram, em nome da Ré, a acção movida pela Autora. Não satisfeita, a Autora convocou uma assembleia geral para ratificar, com os votos únicos da ora Autora, a Contestação que confessara a acção movida pela própria Autora.
Resumindo: a Autora intentou uma acção contra a Ré, fez a Ré confessar a acção e a seguira própria Autora aprovou uma deliberação que ratifica a contestação em que a Ré confessa a acção da Autora.
Assim, nesta acção a ora Autora desempenha o papel de Autora e de Ré: fez a Petição Inicial e "fez" a Contestação, tudo numa situação de manifesto conflito de interesses (arts. 219° e 225/2 do Cód. Com.).
O Tribunal apreciará se estes factos justificam algum juízo que a Reclamante não tenha sido capaz de formular.
Neste contexto, percebe-se o interesse da ora Reclamante em interpor um recurso destinado a assegurar que os actuais membros do Conselho de Administração da Ré possam representar a Ré nesta acção.
Mais tarde, na sequência da suspensão, por ilegalidade, da deliberação que elegeu os membros do Conselho de Administração (incluindo D) que constituíram os advogados da Ré B, foi convocada uma reunião do legítimo Conselho de Administração da Ré, no qual os dois membros presentes declaram não ratificar a Contestação confessória, por a mesma não defender os interesses da Ré, mas sim os interesses da Autora.
Esses dois membros vieram, em representação da Ré B, e na sequência do douto despacho de fls. 419-20, declarar não pretender ratificar a Contestação de fls. 92, tendo, ainda, nos termos do art. 55°, nº 2, parte final, do CPC, renovado desde logo o acto, apresentando uma nova Contestação.
Esta Contestação não confessa os factos, defendendo antes, como não poderia deixar de ser, a validade de uma deliberação da Assembleia Geral que nunca em cerca de 3 anos havia sido contestada ou posta em causa, quer pela Autora ou outros accionistas, quer por qualquer dos administradores. Trata-se, como se pode ver, de uma Contestação séria e juridicamente sustentada: doc. 8.
A ora Reclamante tem interesse na admissão e procedência desta Contestação porque ela pugna pela improcedência da acção e - como vimos - a Recorrente tem interesse na improcedência da acção.
E a ora Reclamante tem também interesse em que a sociedade Fonk Keng Van seja representada pelos administradores legalmente eleitos e que foram por si indicados para a realização do interesse social e para impedirem a realização exclusiva dos interesses da accionista maioritária C.
Assim como tem interesse em que a sociedade seja representada nos aspectos técnicos jurídicos da causa pelos advogados constituídos pelos seus legítimos administradores, e não por advogados que representam simultaneamente a Autora e a Ré (doc. 5 e 6). É que tratando-se de uma acção movida pela Autora contra a Ré, interessa à auxiliar da Ré (ora Reclamante) que a Ré seja representada por quem não represente também a Autora.
É que não deixa de causar algum desconforto à Reclamante saber que a Ré está a ser representada por advogados que serão (também) pagos pela Autora.
O Tribunal, por via dos despachos recorridos, determinou que a Ré não estava regularmente representada pelos seus administradores nem pelo mandatário constituído em 29-07-2009, de onde resultaria que a Ré B ficaria sem representação nos presentes autos, podendo mesmo vir a ser ser condenada à revelia.
Da manutenção dos doutos despachos recorridos resultaria, ainda, necessariamente a rejeição da Contestação, que, pugnando pela improcedência da acção, serve os interesses da ora Reclamante.
Assim, os despachos recorridos prejudicam "directa e efectivamente" a ora Reclamante, donde a legitimidade para interpor o recurso ao abrigo do disposto no art. 585°/2 do CPC, sem prejuízo do supra afirmado direito de auxiliar a Ré Recorrente, acompanhando o recurso desta, ao abrigo do art. 276°/1 do mesmo código.
Face ao exposto, deverá ser admitido o recurso da Reclamante, ao qual deverá ser fixado o regime de subida imediata (art. 601°/2 do CPC) e efeito suspensivo (art. 607º/2-e) do CPC), em vista das graves consequências que teria para a Ré e Assistente o prosseguimento da acção em circunstâncias em que os representantes da Autora representam e/ou controlam a Ré, que já confessou a acção, como referido supra.
II - Fundamentação
Passemos pois a apreciar a reclamação.
Ora, a única questão levantada pela reclamante é saber se ela tem legitimidade para interpor o recurso do despacho a fls. 590 dos autos principais.
O artº 585º do CPC dispõe:
(Legitimidade para recorrer)
1. Os recursos, exceptuada a oposição de terceiro, só podem ser interpostos por quem, sendo parte principal na causa, tenha ficado vencido.
2. As pessoas directa e efectivamente prejudicadas pela decisão podem dela recorrer, ainda que não sejam partes na causa ou sejam apenas partes acessórias.
Atendendo ao que foi alegado pela reclamante, esta defende ter legitimidade para recorrer ora na qualidade da parte acessória, ora na veste da “pessoa directa e efectivamente prejudicada” pela decisão de que pretende recorrer.
Quer numa quer noutra qualidade, a boa decisão da presente reclamação deve ser encontrada com a correcta interpretação do número dois do artigo acima citado, pois in casu obviamente não estamos perante a situação prevista no número um.
Tanto age na veste da parte acessória como na do terceiro prejudicado, a sua legitimidade só se verifica quando a decisão de que pretende recorrer lhe causar um prejuízo directo e efectivo – artº 585º/2 do CPC.
O que a lei exige é prejuízo directo e efectivo, e não prejuízo remoto, potencial, indirecto ou longíguo.
Lendo com alguma atenção a decisão de que pretende recorrer, verifica-se que o que está em causa ai é a questão da representação da B, Ré na acção de anulação de deliberação social.
Se é certo que a ora Reclamante, enquanto sócia da Ré, tem interesse na improcedência da acção de anulação de deliberação social face ao disposto no artº 231º/3 do Código Comercial, não o é menos que a decisão no incidente da representação da sociedade Ré de per si não lhe poderá causar prejuízo directo e efectivo.
Na verdade, a simples circunstância de a sociedade Ré estar representada por A ou por B não gera directamente prejuízo efectivo dos interesses da ora reclamante.
Ora, tudo quanto que a ora reclamante expôs ao longo das suas alegações extensas foi procurar convencer o tribunal de que a decisão, de que pretende recorrer, iria causar-lhe prejuízos.
Só que os prejuízos por ela invocados não deixam de ser apenas prejuízos que lhe poderiam causar eventualmente por via indirecta e sinuosa.
Ou seja, o que lhe poderá causar prejuízos é a actuação dos mandatários que, na óptica da ora reclamante, não deveriam estar habilitados para representar a Ré, pois esses foram escolhidos pela Autora para defender apenas interesses da Autora, e não da Ré.
De facto, os interesses que a ora reclamante pretende acautelar, mediante a interposição do recurso cuja não admissão originou a presente reclamação, podem e devem ser salvaguardados por via da sua intervenção nos autos como assistente e do desencadeamento do mecanismo a que se refere 53º/2 do CPC.
Andou mal ao optar por recorrer.
Pois, a inverificação dos prejuízos directos e efectivos, a que alude o artº 585º/2 do CPC não justifica a atribuição à ora reclamante da legitimidade para recorrer, quer na veste da parte acessória quer na do terceiro prejudicado.
III - Decisão
É assim altura para decidir.
Por razões acima expostas e sem necessidade de mais considerações, indefiro a reclamação confirmando a decisão constante do despacho reclamando de não admissão do recurso.
Custas pela reclamante.
Fixo a taxa de justiça em 1/8.
Cumpra o disposto no artº 597º/4 do CPC.
RAEM, 01AGO2010
O presidente do TSI
Recl. 15/2010-1