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Processo n.º 676/2008 Data do acórdão: 2010-7-29
 Assuntos:
– fixação equitativa da indemnização
– danos não patrimoniais
S U M Á R I O
Não há fórmula sacramental na fixação equitativa da quantia indemnizatória de danos não patrimoniais, por cada caso ser um caso, cuja solução depende naturalmente dos ingredientes em concreto apurados.
O relator,

Chan Kuong Seng

Processo n.º 676/2008
(Autos de recurso penal)
  Recorrente: A Companhia
Tribunal a quo: 3.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base




ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU


A A Companhia, demandada já melhor identificada no pedido cível de indemnização enxertado nos autos de processo penal comum com intervenção de tribunal colectivo n.º CR3-06-0238-PCC do 3.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base (TJB), veio recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), do acórdão final aí proferido na parte apenas respeitante à quantia arbitrada em MOP$250.000,00 para reparação, em sede de responsabilidade pelo risco, dos danos morais sofridos pela ofendida B do acidente de viação em causa (vide o teor desse acórdão, a fls. 259 a 264 dos presentes autos correspondentes, cujo teor se dá por aqui totalmente reproduzido para todos os efeitos legais).
Pediu, pois, a seguradora recorrente tão-só a redução dessa parcela indemnizatória para um montante não superior a MOP$100.000,00, através das seguintes considerações essenciais vertidas mormente na parte final da sua motivação de recurso de fls. 248 a 270v dos autos:
– a fixação da indemnização por parte do Tribunal a quo a título de danos não patrimoniais teria que ser operada com base na factualidade dada como provada e em termos equitativos e equilibrados, nos termos do disposto nos art.os 487.o e 489.o do vigente Código Civil, tomando ainda em conta os valores correntes adoptados pela jurisprudência, o que manifestamente não se verificou no caso sub judice, pelo que a decisão recorrida violou estes dois preceitos legais, ao não ter fixado de forma equitativa o montante da respectiva indemnização, tendo em atenção a inexistência do grau de culpabilidade e a situação económica do agente e do lesado e as demais circunstâncias do caso.
Ao recurso, não foi oferecida nenhuma resposta pela parte autora do pedido cível.
Subido o recurso, o Ministério Público junto desta Segunda Instância declarou em sede de vista que não tinha legitimidade para emitir parecer, por estar em causa um recurso relativo à indemnização civil.
Em sede de exame preliminar feito em seguida pelo relator, foi exarado despacho no sentido de poder o presente recurso ser julgado directamente em conferência, na esteira do entendimento já assumido nos processos n.os 266/2004, 285/2004, 294/2004 e 104/2008 do TSI.
E corridos depois os vistos legais, cumpre agora decidir.
Ora, desde já, cabe afirmar que o recurso vertente, dados os termos pelos quais foi interposto pela seguradora, pode efectivamente ser directamente julgado em conferência tal como o que acontece em outros recursos civis em geral, por se tratar de um recurso interposto no âmbito do enxerto cível de indemnização em que se discute uma questão meramente civil.
E voltando agora ao cerne do recurso em apreço, cumpre notar, de antemão, que este TSI, como tribunal ad quem, só tem obrigação de decidir da única questão material e concretamente colocada pela recorrente nas conclusões da sua motivação, qual seja, a de pretendida redução do quantum indemnizatório fixado pelo Tribunal a quo para a reparação dos danos morais sofridos pela vítima do acidente de viação em causa, e já não de aquilatar da justeza ou não de todos os argumentos invocados pela recorrente na mesma motivação para sustentar a procedência da sua pretensão (neste sentido, cfr., nomeadamente, os arestos deste TSI nos seguintes processos penais: de 4/3/2004 no processo n.° 44/2004, de 12/2/2004 no processo n.º 300/2003, de 20/11/2003 no processo n.º 225/2003, de 6/11/2003 no processo n.° 215/2003, de 30/10/2003 no processo n.° 226/2003, de 23/10/2003 no processo n.° 201/2003, de 25/9/2003 no processo n.º 186/2003, de 18/7/2002 no processo n.º 125/2002, de 20/6/2002 no processo n.º 242/2001, de 30/5/2002 no processo n.º 84/2002, de 17/5/2001 no processo n.º 63/2001, e de 7/12/2000 no processo n.º 130/2000).
E a propósito dessa questão única a conhecer, afigura-se ser de diminuir a quantia indemnizatória em questão, atenta, em especial, a falta de prova, tal como concluída na fundamentação jurídica do acórdão recorrido, da culpa do arguido na produção do acidente (se bem que a ofendida tenha chegado a ficar hospitalizada por um período total de um pouco mais de cinco semanas, e tenha necessitado de 150 dias para tratamento das suas lesões, sobretudo ocorridas na parte da cabeça, com graves dores nomeadamente de cabeça, e com fractura óssea, com sujeição continuada a várias consultas médicas). Assim sendo, parece mais equitativa a fixação da parcela indemnizatória em apreço em MOP$200.000,00 (duzentas mil patacas), à luz do disposto no art.° 487.°, ex vi do art.° 489.°, ambos do Código Civil de Macau, sendo certo que não há nenhuma fórmula sacramental para a matéria em causa, por cada caso ser um caso, cuja solução depende naturalmente dos ingredientes em concreto apurados.
Sendo, por fim, de notar que de todo o acima relatado e analisado, decorre naturalmente já transitada em julgado (logo após completado o prazo legal de dez dias contado da notificação das duas partes do pedido civil do veredicto final da Primeira Instância), precisamente por falta de impugnação quer pela própria parte demandada quer pela parte demandante, toda a remanescente decisão já tomada no acórdão recorrido, pelo que os juros legais das quantias indemnizatórias de danos patrimonais por que a seguradora ora recorrente já vinha condenada no acórdão recorrido serão contados desde a data do trânsito em julgado dessa parte da decisão até integral e efectivo pagamento.
Dest’arte, e em harmonia com o exposto, acordam em julgar, directamente em conferência, parcialmente procedente o recurso, com consequente redução da quantia indemnizatória dos danos morais da vítima do acidente de viação dos autos, de MOP$250.000,00 (duzentas e cinquenta mil patacas) para apenas MOP$200.000,00 (duzentas mil patacas), sendo intacto, pois, todo o restante já decidido no acórdão recorrido, que já transitou em julgado há muito por falta de impugnação pelas partes.
Sendo objecto do recurso apenas o decidido pela Primeira Instância no respeitante à fixação da quantia para reparação de danos morais, só há condenação, nesta Segunda Instância, de custas correspondentes a essa parte, pelo que as custas do pedido cível nas duas Instâncias referente à questão de danos morais são contadas na proporção do decaimento final das partes em função do acima decidido, enquanto as custas do pedido cível na Primeira Instância relativas a todo o demais então peticionado pela parte demandante civil são por conta das duas partes, na proporção dos respectivos decaimentos finais de acordo com o veredicto final da Primeira Instância, e isto tudo sem prejuízo dos efeitos do apoio judiciário já concedido à parte demandante civil na modalidade de dispensa de pagamento de custas. E fixam em setecentas patacas os honorários, na Segunda Instância, da Ilustre Patrona Oficiosa da demandante, a suportar pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância.
Macau, 29 de Julho de 2010.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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João Augusto Gonçalves Gil de Oliveira
(Primeiro Juiz-Adjunto)
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Lai Kin Hong
(Segundo Juiz-Adjunto)



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