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ACÓRDÃO DO RECURSO PENAL
【刑 事 上 訴 裁 判 書】
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PROCSSO DO RECURSO Nº (上訴卷宗編號): 1019/2009
【Nº do processo da 1ª Instância: CR1-06-0193-PCC】
ESPÉCIE: Recurso penal
DATA DE ACÓRDÃO: 17-12-2009.
* * *
* RECORRENTE:
A
* RECORRIDO:
TRIBUNAL “A QUO” (1ª Instância)
* OBJECTO DO RECURSO:
ACÓRDÃO CONDENATÓRIO DE 1ª INSTÂNCIA
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S U M Á R I O 【裁判要旨】
1 - Quanto aos danos não patrimoniais, o artigo 489º/3 do CCM, manda fixar o montante da respectiva indemnização eciuitativamente, tendo em atenção as circunstâncias referidas no artigo 487º, ou seja, o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso, entre as quais se contam as lesões sofridas e os correspondentes sofrimentos, não devendo esquecer-se ainda, para evitar soluções demasiadamente marcadas pelo subjectivismo, os padrões de indemnização geralmente adoptados na jurisprudência, ou as flutuações do valor da moeda.
2 - O montante da indemnização deve ser proporcionado à gravidade do dano, devendo ter-se em conta na sua fixação todas as regras de prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida.
O relator,

Fong Man Chong


PROCSSO DO RECURSO Nº (上訴卷宗編號): 1019/2009
【Nº do processo da 1ª Instância: CR1-06-0193-PCC】
ESPÉCIE: Recurso penal
DATA DE ACÓRDÃO: 17-12-2009.
* * *
* RECORRENTE:
A
* RECORRIDO:
TRIBUNAL “A QUO” (1ª Instância)
* OBJECTO DO RECURSO:
ACÓRDÃO CONDENATÓRIO DE 1ª INSTÂNCIA
* * *

ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO:
1. No processo acima referido do 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Base, após julgamento em processo comum e perante tribunal colectivo, foi julgada a acusação procedente por provada, foi a ora Recorrente “A” condenada, no que para nós releva, no pagamento de uma indemnização civil no valor de MOP$515,213.10, composta pelos seguintes itens:
- Danos patrimoniais: MOP$22,459.00;
- Danos morais: MOP$550,000.00
Total: MOP$572,459.00
Como o lesado (parte cível: B) tem também culpa que foi fixada em 10%, o direito que lhe se assiste é o de reclamar MOP$515,213.10 (90% do valor total).
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2. Inconformado, a Seguradora (para ela foi transferida a responsabilidade civil), ora Recorrente interpôs recurso da sentença, tendo oferecido as seguintes conclusões:
(1) O presente recurso é interposto do douto Acórdão “a quo” que decidiu condenar a demandada seguradora, ora recorrente, no pagamento ao lesado B de uma indemnização por danos não patrimoniais no valor de MOP$550.000,00, circunscrevendo-se o recurso a tal matéria, por não se poder conformar com o elevado e exagerado montante atribuído a esse título;
(2) A sentença de que ora se recorre enferma de erro na aplicação da Lei (artigo 400º, n° 1 do C.P.P.M.).
(3) A fixação da indemnização ao lesado a título de danos morais teria que ser efectuada com justiça e equidade, em face das circunstâncias dadas por assentes no texto da decisão recorrida, aos valores constantes da jurisprudência da R.A.E.M. e à luz dos critérios previstos nos artigos 487º e 489º do Código Civil, o que não aconteceu nos presentes autos, violando por isso o douto Acórdão o disposto nas identificadas normas legais;
(4) Tanto o ofendido como o lesante pertencem a uma classe económica baixa, sendo que o ofendido tem já mais de 70 anos de idade, o que implica necessariamente uma esperança de vida curta e vive sózinho.
(5) Estas circunstâncias são absolutamente relevantes na apreciação e fixação “in casu” do montante indemnizatório pois, pelo facto de haver um seguro obrigatório de responsabilidade civil, não pode o douto Tribunal atribuir montantes compensatórios que (nenhum) lesante teria a mínima hipótese de ressarcir.
(6) O valor atribuído aos danos não patrimoniais deverá ser reduzido para uma quantia que se situe à volta das MOP$150.000,00, atendendo aos danos efectivamente sofridos pelo lesado e a tudo o acima exposto.
(7) O valor encontrado pelo douto colectivo é demasiado elevado face aos valores correntemente atribuídos em situações semelhantes sendo até semelhante ao que é usualmente atribuído ao dano mais importante de todos, isto é, à perca de uma vida humana.
Nestes termos, nos melhores de Direito e sempre com o Mui Douto suprimento de V. Excelências, deve, pelas apontadas razões, ser julgado procedente o presente recurso, assim se fazendo a esperada a sã.
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3. Foi admitido o recurso (fls. 318).
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4. Nesta Instância, o Exmo. Procurador-Adjunto pronunciou-se nos termos de fls. 328.
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5. Realizado o exame preliminar e colhidos os vistos, prosseguiram os autos para audiência, a qual se realizou com observância do formalismo legal, tendo sido produzidas alegações orais, que se mantiveram no âmbito das questões postas no recurso.
Cumpre decidir.
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II – FUNDAMENTOS:
O Tribunal “a quo” deu como provados os seguintes factos:
   「2002年3月17日中午約12時,嫌犯C駕駛輕型汽車MX-XX-XX,在本澳姑娘街倒後出車時,其車輛的右邊車尾撞倒在斑馬綫附近橫過馬路的被害人B右邊身軀。當時,被害人正從其車右邊往左邊步行。該碰撞直接引致被害人倒地受傷。
   被害人B傷勢之直接檢查報告、醫療報告及臨床法醫學鑑定書參見本案卷宗第9頁、第26頁、第27頁及第35頁,在此被視為全部轉錄。
   此次交通事故造成被害人左側股骨頸受骨折、左臗部可見一張13cm的孤形疤痕、左髖關節屈申、內外旋活動無明顯受限,但伴疼痛、並伴長期左下肢活動時疼痛,該傷患需164日康復,將來或需再次接受左側人工股骨頭置換手術,已對被害人身體的完整性造成嚴重傷害,符合澳門《刑法典》第138條c)項之規定(參見本案卷宗第35頁之臨床法醫學鑑定書)。(sublinhado nosso)
   事故發生時,天氣晴朗,路面正常,交通密度一般。
   上述交通事故的發生主要是由於嫌犯沒有遵守《道路法典》的規定,在進行倒車時對交通構成危險,以致造成是次事故,導致被害人被撞受傷。
   嫌犯在自由、自願及有意識的情況下作出上述行為,違反《道路法典》的規定,過失導致傷害他人身體的完整性。
   嫌犯也清楚知道其行為是法律所不容,會受到法律之相應制裁。
   嫌犯聲稱無業、離婚,無需供養任何人。
   嫌犯承認部份事實,為初犯。
   由於上述交通事故,導致被害人B須在山頂醫院做外科手術,並留院18日治療,花了澳門幣4,274元醫療費用。
   被害人亦於鏡湖醫院接受治療,共花了澳門幣685元醫療費用。
   本身被害人獨居,在出院後,亦需別人照顧,故此,唯有從2002年4月至8月間暫居“XX”老人院,每月費用澳門幣3,500元,共花費澳門幣17,500元。
   被害人之主要受傷部份在於左股骨及左髋部,並已造成永久性的長短脚。
   另外,被害人在發生交通事故後,心理由亦受到嚴重之創傷,以致其過馬路時有恐懼。(sublinhado nosso)
***
   由編號MX-XX-XX的車輛造成的交通事故所引起的第三者民事責任已透過編號XXXXXXX之保險單轉移予A。(卷宗第166頁)」
Quid Juris? Perante este quadro fáctico assente?
A única questão colocada neste recurso é a de saber se o valor da indemnização pelo dano moral sofrido pelo lesado, arbitrado pelo Tribunal “a quo”, é justo ou não.
O lesado B (B) pediu neste domínio um montante total no valor de MOP$788,000.00 (fls. 134). Ora, segundo o padrão seguido pela jurisprudência nesta matéria, entendemos que tal pedido é exagerado, e como tal merece algum reparo.
Quanto aos danos não patrimoniais, o artigo 489º/3 do CCM, manda fixar o montante da respectiva indemnização eciuitativamente, tendo em atenção as circunstâncias referidas no artigo 487º, ou seja, o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso, entre as quais se contam as lesões sofridas e os correspondentes sofrimentos, não devendo esquecer-se ainda, para evitar soluções demasiadamente marcadas pelo subjectivismo, os padrões de indemnização geralmente adoptados na jurisprudência, ou as flutuações do valor da moeda.
   A título de direito comparado, o Supremo Tribunal de Portugal em matéria de danos não patrimoniais tem evoluído no sentido de considerar que a indemnização, ou compensação, deverá constituir um lenitivo para os danos suportados, não devendo, portanto, ser miserabilista. Como se decidiu recentemente, a compensação por danos não patrimoniais, para responder actualizadamente ao comando do artigo 489º e constituir uma efectiva possibilidade compensatória, tem de ser significativa, viabilizando um lenitivo para os danos suportados e, porventura, a suporta.
   As dores e sequelas que, do ponto de vista da perda de qualidade de vida, irão prolongar-se no tempo, são padecimentos subsumíveis à categoria dos prejuízos não patrimoniais. Segundo um Autor italiano (G. Verga, em II reato di lesione personale e la valutazione civile del danno da lesione, 1967) citado por Antunes Varela, incluem-se entre os danos não patrimoniais indemnizáveis as dores físicas e psíquicas, a perturbação da pessoa, os sofrimentos morias, os prejuízos na vida de relação, sobretudo os provenientes de deformações estéticas.
   A este propósito, Antunes Varela desenvolve algumas reflexões que é útil recordar: “O montante da indemnização deve ser proporcionado à gravidade do dano, devendo ter-se em conta na sua fixação todas as regras de prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida. E este, como já foi observador por alguns autores, um dos domínios onde mais necessários se tornam o bom senso, o equilíbrio e a noção das proporções com que o julgador deve decidir”.
   E, citando o Autor italiano G. Verga, a propósito da orientação do Tribunal de Cassação de Roma, mais escreve Antunes Varela: “Embora a determinação dos danos desta natureza – danos não patrimoniais indemnizáveis – e do seu montante dependa do prudente arbítrio do juiz, deve este referir sempre com a necessária precisão o objecto do dano, para evitar que a sua liquidação se converta num acto puramente arbitrário do tribunal”.
   Para Dano Martins de Almeida, “quando se faz apelo a critérios de equidade, pretende-se encontrar somente aquilo que, no caso concreto, pode ser a solução mais justa a equidade está assim limitada sempre pelos imperativos da justiça real (a justiça ajustada às circunstâncias) em oposição á justiça meramente formal. Por isso se entende que a equidade é sempre uma forma de justiça. A equidade é a resposta àquelas perguntas em que está em causa o que é justo ou o que é mais justo”.
   Segundo Mota Pinto, os interesses cuja lesão desencadeia um dano não patrimonial são infungíveis; não podem ser reintegrados mesmo por equivalente. Mas é possível, em certa medida, contrabalançar o dano, compensá-lo mediante satisfações derivadas da utilização. Não se trata, portanto, de atribuir ao lesado um “preço de dor” ou um “preço de sangue”, mas de lhe proporcionar uma satisfação em virtude da aptidão do dinheiro para propiciar a realização de uma ampla gama de interesses, na qual se podem incluir mesmo interesses de ordem refinadamente ideal.
   Resulta do exposto que o juiz, para a decisão a proferir no que respeita à valoração pecuniária dos danos não patrimoniais, em cumprimento da prescrição legal que o manda julgar de harmonia com a equidade, deverá atender aos factores expressamente referidos na lei e, bem assim, a outras circunstâncias que emergem da factualidade provada. Tudo como o objectivo de, após a adequada ponderação, poder concluir a respeito do valor pecuniário que considere justo para, no caso concreto, compensar o lesado pelos danos não patrimoniais que sofreu.
   Assim se compreende que a actividade do juiz no domínio do julgamento à luz da equidade, não obstante se ver enformada por uma importante componente subjectiva, não se reconduza ao puro arbítrio.
Escreveu-se, nesta matéria:
“O dano moral será função da idade do lesado? Dependerá de o lesado ter atingido já o uso da razão que lhe permita ponderar a gravidade do acidente, repercutindo-se-lhe na alma o pesar pela falta de um pai, da mãe, ou de um irmão, vitimados num acidente de viação?
A terna idade de um órfão preserva-o do sofrimento, da dor moral derivada da perda de um ente querido, e, assim, admite-se que o dano moral, nele, pelo falecimento inesperado do seu progenitor, seja nulo para efeitos de indemnização (Ac. da Rel. Coimbra, de 17-1-1964).
Poderá porventura dizer-se que é essa mesma idade que agrava a dor e suas inevitáveis consequências, à medida que a capacidade sensitiva ou de sofrimento se desenvolve quando se atinge o uso da razão sobretudo com as dificuldades económicas sobrevindas ao núcleo familiar (Ac. do STJ, de 20-10-1964, BMJ, 140º - 438; no mesmo sentido, Ac. do STJ, de 5-2-1980, BMJ, 294º - 301). Mas trata-se, em nossa opinião, de um dano virtual hipotético, que está fora do alcance social da indemnização. De qualquer modo, a idade é um elemento que não poderá deixar de ser tomado em consideração na apreciação equitativa que deve ser feita pelo julgador.” (In “Código da Estrada”, Manuel de Oliveira Matos, 5ª ed., Almedina, pág. 490).
No caso, o Tribunal a quo fundamentou a sua decisão aos seguintes termos:
   「3. 根據證明之事實,是次交通事故的發生主要是由於嫌犯沒有遵守《道路法典》的規定,在進行倒車時對交通構成危險,以致造成是次事故,導致被害人被撞受傷。因此,嫌犯之行為已觸犯一項過失傷害身體完整性罪。
   另一方面,雖然被害人並不是使用斑馬綫橫過馬路,但嫌犯在進行倒車時必須留意後方的情況,故此,是次交通意外是在雙方的過失情況下造成,但嫌犯應負上大部份責任,而過錯比例則為百分之九十是嫌犯之過錯,而百分之十是被害人之過錯。」
E,
   「在財產損害方面,根據已證事實,被害人所花的醫療費用合共澳門幣4,959元,以及“XX”老人院費用合共澳門幣17,500元,因此,合共澳門幣22,459元。
*
   在定出損害賠償時,應考慮非財產之損害,只要基於其嚴重性而應受法律保護者(原《民法典》第496條第1款即現行《民法典》第489條)。
   損害賠償之金額,由法院按衡平原則定出,而在任何情況下,均須考慮第487條所指之情況(《民法典》第489條)。
   現將對被害人B的非財產損害的賠償金額定為澳門幣550,000元。
*
考慮到上述損害及根據嫌犯及被害人的過錯比例,訂定對被害人之財產及非財產損害的賠償金額為澳門幣515,213.10元(= 澳門幣22,459元(財產損害賠償)+澳門幣550,000元(非財產損害賠償) = 澳門幣572,459元 x 90%)。」
No caso, importa realçar também os seguintes elementos:
- 此次交通事故造成被害人左側股骨頸受骨折、左臗部可見一張13cm的孤形疤痕、左髖關節屈申、內外旋活動無明顯受限,但伴疼痛、並伴長期左下肢活動時疼痛,該傷患需164日康復,將來或需再次接受左側人工股骨頭置換手術,已對被害人身體的完整性造成嚴重傷害,符合澳門《刑法典》第138條c)項之規定(參見本案卷宗第35頁之臨床法醫學鑑定書)。(sublinhado nosso)
- 被害人之主要受傷部份在於左股骨及左髋部,並已造成永久性的長短脚。
- 另外,被害人在發生交通事故後,心理由亦受到嚴重之創傷,以致其過馬路時有恐懼。(sublinhado nosso)
Ora, para o caso da perda de vida no acidente de viação, o valor indemnizatório seguido pela jurisprudência é mais ou menos entre MOP$500,000.00 e MOP$700,000.00, parece-nos um pouco exagerado o valor arbitrado pelo Tribunal a quo a favor do lesado dos autos, atendendo todo o circunstancialismo do caso.
Nestes termos, ponderados os elementos acima referidos, achamos por justo e proporcional arbitrar a favor do ofendido um montante, a título de indemnização moral, no valor de MOP$330,000.00 (trezentos e trinta mil patacas),e, como o lesado tem também 10% da culpa, então o valor que pode reclamar será MOP$330,000.00 x 90% = MOP$297,000.00.
Tudo visto e ponderado, resta decidir.
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III – DECISÃO:
Pela apontadas razões, acordam os juizes do TSI em julgar procedente o recurso interposto pela Recorrente/Seguradora, fixando-se no valor de MOP$297,000.00 (duzentos e noventa e sete mil patacas) a título de dano não patrimonial sofrido pelo lesado B (B).
* * *
Quanto ao demais, mantém-se o já decidido na douta sentença recorrida.
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Sem custas no recurso.
* * *
Macau, aos 17 de Dezembro de 2009.


_________________
Fong Man Chong
(Relator)


_________________
Tam Hio Wa
(Primeira Juiz-Adjunta)



_________________
Lai Kin Hong
(Segundo Juiz-Adjunto)




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TSI-1019/2009-AV-indem-civel