Processo nº 524/2010
(Autos de recurso penal)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. A, com os sinais dos autos, veio recorrer da sentença proferida pelo Mm° Juiz do T.J.B. com a qual foi condenado pela prática em autoria material e na forma consumada, dum “crime de tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas”, p. e p. pelo art.º 8º, n.º1 da Lei n.º17/2009, na pena de 6 anos e 8 meses de prisão, e dum “crime de detenção indevida de cachimbos e outra utensilagem”, p. e p. pelo art.º 15º da Lei n.º17/2009, na pena de 45 dias de prisão.
Em cúmulo jurídico foi o arguido condenado na pena única de 6 anos e 9 meses de prisão; (cfr., fls. 238 a 238-v).
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Inconformado, o arguido recorreu.
Motivou apresentando as seguintes conclusões:
“1. No douto acórdão, o Tribunal, por um lado levou em consideração a confissão do recorrente, por outro lado, na incriminação e determinação da pena, não mencionou a confissão dele, evidentemente, quanto a esse aspecto, o Tribunal Judicial de Base está em contradição.
2. Segundo a nova lei n.º17/2009, face à determinação de pena da prática do crime de tráfico de droga, a pena é fixada só a partir de 3 anos de prisão. Os estupefacientes detidos pelo recorrente eram cerca de 20 gramas de peso líquido total e foi o mesmo condenado pelo Tribunal Judicial de Base na pena de 6 anos e 8 meses de prisão, evidentemente, esta pena aplicada é demasiado gravosa.”
Afinal pede para “Condenar o arguido na pena única de 4 anos de prisão pela prática do crime de tráfico de droga, em vez da pena anteriormente aplicada pelo Tribunal de 1ª instância, pelo mesmo tribunal totalmente não ter levado em consideração todas as circunstâncias que se mostram favoráveis ao arguido.”; (cfr., fls. 246 a 247 e 291 a 292).
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Respondendo, diz o Exm° Magistrado do Ministério Público que:
“1. Alegou o recorrente que o acórdão a quo não tinha considerado a sua confissão, tendo-o condenado na pena de 6 anos e 8 meses de prisão, pelo que, é demasiado gravosa a fixação da pena, devendo ser reduzida.
2. Não tendo o recorrente, contudo, indicado qual o vício que o Tribunal a quo padece e qual o erro tem, só veio simplesmente pedir a redução da pena.
3. Quanto ao ponto de vista do recorrente, o Ministério Público não está de acordo.
4. Na determinação da pena, o Tribunal a quo indicou expressamente que tinha levado em consideração todo o disposto nos art.ºs 40º e 65º do Código Penal e todas as circunstâncias existentes nos autos, decidiu então a pena ora aplicada.
5. O recorrente cometeu um crime de tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas, previsto e punido pelo art.º 8º, n.º1 da Lei n.º17/2009, é punido com pena de 3 a 15 anos de prisão, mas actualmente o mesmo foi condenado na pena de 6 anos e 8 meses de prisão; e mais cometeu um crime de detenção indevida de cachimbos e outra utensilagem, previsto e punido pelo art.º 15º da mesma lei, é punido com pena de prisão até 3 meses ou com pena de multa até 60 dias, mas actualmente foi condenado na pena de 45 dias de prisão, e em cúmulo jurídico de dois crimes, o recorrente foi condenado na única pena de 6 anos e 9 meses de prisão, sendo adequada a pena aplicada.
Face ao exposto, não se verifica a questão da pena aplicada excessiva tal como indicada pelo recorrente.
Pelo que, o Ministério Público entende que a motivação do recorrente não procede, devendo ser, por isso, mantido o acórdão a quo.”; (cfr., fls. 249 a 250-v e 293 a 294).
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Remetidos os autos a este T.S.I. e em sede de vista, emitiu o Exm° Representante do Ministério Público o seguinte douto Parecer:
“Mostra-se o recorrente inconformado com a pena concreta que lhe foi aplicada, que considera excessiva, aduzindo em seu abono a existência da confissão dos factos que, a seu ver, se não mostra adequadamente sopesada.
Verifica-se, porém, do texto da decisão, que, pese embora o mesmo tenha admitido a prática dos crimes de consumo e detenção de utensilagem, negou ter vendido droga, isto é, bem vistas as coisas, negou a prática do tráfico, por que foi condenado, sobejando, pois apenas a confissão parcial, esta de reduzidíssimo valor, atentas a circunstâncias específicas em que o arguido foi detectado com os estupefacientes.
Seja como for, a pena concretamente aplicada afigura-se-nos justa, adequada e proporcional, não merecendo, pois provimento o presente recurso.”; (cfr., fls. 296).
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Cumpre decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Vem dados como provados os factos seguintes:
“No dia 23 de Abril de 2009, pelas 23H15, os agentes da Polícia Judiciária interceptaram o arguido A na zona de slot machine do Casino XX sito na ZAPE, tendo-o conduzido para proceder à revista junto do lavatório do sexo masculino que se situa nas proximidades do local.
Na altura, foram encontrados pelos agentes da Polícia Judiciária, no bolso das calças do lado esquerdo do arguido, três sacos de plástico transparente contendo substância cristalina (vd. auto de revista e de apreensão, fls. 9 e 10 dos autos)
Após feito o exame laboratorial, verificou-se que os três sacos de substância cristalina continham “Anfetamina”, “Metanfetamina” e “N,N-Dimetanfetamina”, substâncias abrangidas respectivamente pelas Tabela II–B do D.L.n.º5/91/M, com peso líquido total de 0.977 gramas (feita a análise quantitativa, a metanfetamina pesa 0.682 gramas).
De seguida, os agentes da Polícia Judiciária encontraram na mala de mão de cor preta que levava o arguido, uma caixa de cigarro de “Chunghwa” que nela continha 2 sacos de plástico transparente contendo pós brancos, sete sacos de plástico transparente contendo substância cristalina, um comprimido de cor de laranja clara embalado por papel de estanho de cor vermelha, uma caixa metálica com letra “Mentos” que nela continha nove sacos de plástico transparente contendo substância cristalina, bem como oito comprimidos de cor vermelha embalados por saco de plástico transparente (vd. auto de revista e de apreensão, fls. 9 e 10 dos autos).
Após feito o exame laboratorial, verificou-se que os dois sacos de pós brancos encontrados na caixa de cigarros de “Chunghwa” continham “Metanfetamina” e “Ketamina”, substâncias abrangidas pela Tabela II–B e II–C do D.L.n.º5/91/M, com peso líquido total de 1.554 gramas (feita a análise quantitativa, a ketamina pesa 0.982 gramas); Os sete sacos de substância cristalina continham “Anfetamina” e “Metanfetamina”, substâncias abrangidas pela Tabela II–B do mesmo decreto-lei, com peso líquido total de 2.340 gramas (feita a análise quantitativa, a metanfetamina pesa 1.586 gramas); Um comprimido de cor de laranja clara continha “Nimetazepam” abrangida pela Tabela IV do mesmo decreto-lei, com peso líquido total de 0.186 gramas; Os nove sacos de substância cristalina encontrados na caixa metálica com letra “Mentos”, continham “Metanfetamina” abrangida pela Tabela II-B do mesmo decreto-lei, com peso liquido total de 3.002 gramas (feita a análise quantitativa, a metanfetamina pesa 2.225 gramas); Os oito comprimidos de cor vermelha continham “Metanfetamina” abrangida pela Tabela II-B do mesmo decreto-lei, com peso líquido total de 0.759 gramas (feita a análise quantitativa, metanfetamina pesa 0.112 gramas)
Além disso, os agentes da Polícia Judiciária ainda encontraram na mala de mão de cor preta do arguido A, três telemóveis, RMB900,00 e HK$12.500,00 (vd. auto de revista e de apreensão, fls. 9 a 10 dos autos)
No dia 24 de Abril de 2009, pela 0H15 da madrugada, os agentes da Polícia Judiciária, na companhia do arguido, deslocaram-se à residência por este arrendada, sita na Alameda Dr. Carlos D’Assumpção, Edifício “XXX”, XXº andar “X” para efectuar uma busca, tendo encontrado por debaixo da almofada na cama do quarto onde residia o arguido, uma caixa de papel de cor branca com letras “PHILIPS” contendo os seguintes objectos (vd. auto de revista e de apreensão, fls. 13 a 14 dos autos):
- um envelope vermelho de “Lai Si” que continha dez sacos de plástico transparente contendo pós brancos;
- uma caixa de papel de cor de rosa que continha um saco de plástico transparente contendo pós brancos;
- uma caixa de rebuçado de cor branca e vermelha com letras “Extra” que continha oito sacos de plástico transparente contendo substância cristalina de cor branca;
- um saco de renda de cor branca com borda de cor azul que continha um saco de plástico transparente contendo trinta e cinco comprimidos de cor de rosa, cinco comprimidos de cor de rosa clara; Um saco de plástico transparente que continha sete saquitos de plástico transparente contendo sessenta e nove comprimidos de cor vermelha; Uma garrafa de plástico transparente com tampa de cor prateada que continha dois saquitos de plástico transparente contendo cada um, dez comprimidos de cor vermelha;
- um saco que continha planta embrulhada por folha de papel branca;
- quatro sacos de plástico transparente tinham vestígios de pó branco e, uma palhinha de cor verde;
- um saco de plástico do Hotel “XXXX” que continha alguns saquitos de plástico transparente e 1 balança electrónica de cor preta.
Após feito o exame laboratorial, verificou-se que os supracitados dez sacos de pós brancos encontrados no envelope vermelho de “Lai Si”, continham “Ketamina” abrangida pela Tabela II–C do D.L n.º5/91/M, com peso líquido total de 10.374 gramas (feita a análise quantitativa, a ketaminna pesa 6.604 gramas); O supracitado saco de substância cristalina encontrado na caixa de papel de cor de rosa, continha “Metanfetamina” abrangida pela Tabela II–B do mesmo decreto-lei, com peso líquido total de 0.696 gramas (feita a análise quantitativa, a metanfetamina pesa 0.503 gramas); Quanto aos supracitados oito sacos de substância cristalina encontrados na caixa de rebuçado de cor branca e vermelha com letra “Extra”, dos quais, quatro sacos de substância cristalina de cor de rosa clara continham “Metanfetamina” abrangida pela Tabela II–B do mesmo decreto-lei, com peso líquido total de 1.745 gramas (feita a análise quantitativa, a metanfetamina pesa 1.215 gramas), e um saco de substância cristalina de cor branca continha “Metanfetamina” abrangida pela Tabela II–B do mesmo decreto-lei, com peso líquido total de 0.427 gramas (feita a análise quantitativa, a metanfetamina pesa 0.286 gramas), e dois sacos de substância cristalina de cor amarela continham “Metanfetamina” abrangida pela Tabela II–B do mesmo decreto-lei, com peso líquido total de 0.905 gramas (feita a análise quantitativa, a metanfetamina pesa 0.646 gramas), e um saco de substância cristalina de cor amarela clara continha “Metanfetamina” abrangida pela Tabela II–B do mesmo decreto-lei, com peso líquido total de 0.131 gramas (feita a análise quantitativa, a metanfetamina pesa 0.089 gramas); Quanto aos quarenta comprimidos de cor de rosa encontrados no saco de renda de cor branca com borda de cor azul, dos quais, 35 comprimidos de cor de rosa continham “MDMA” abrangida pela Tabela II-A do mesmo decreto-lei, com peso líquido total de 9.369 gramas (feita a análise quantitativa, a MDMA pesa 2.970 gramas), e cinco comprimidos de cor de rosa clara continham “MDMA” abrangida pela Tabela II-A do mesmo decreto-lei, com peso líquido total de 1.087 gramas; Quanto aos supracitados 69 comprimidos de cor vermelha, do quais, dez comprimidos continham “Anfetamina” e “Metanfetamina” e “N, N-Dimetanfetamina”, substâncias abrangidas pela Tabela II-B do mesmo decreto-lei, com peso líquido total de 0.936 gramas (feita a análise quantitativa, a metanfetamina pesa 0.141 gramas), e os restantes comprimidos de cor vermelha continham “metanfetamina” abrangida pela Tabela II-B do mesmo decreto-lei, com peso líquido total de 4.624 gramas (feita a análise quantitativa, a metanfetamina pesa 0.278 gramas); Quanto aos 20 comprimidos de cor vermelha encontrados na garrafa de plástico transparente, dos quais, dez comprimidos continham “metanfetamina” abrangida pela Tabela II-B do mesmo decreto-lei, com peso líquido total de 0.927 gramas (feita a análise quantitativa, a metanfetamina pesa 0.140 gramas), e os restantes comprimidos de cor vermelhas continham “metanfetamina” abrangida pela Tabela II-B do mesmo decreto-lei, com peso líquido total de 0.780 gramas (feita a análise quantitativa, a metanfetamina pesa 0.051 gramas); O supracitado saco de planta continha “Canabis” abrangida pela Tabela I-C do mesmo decreto-lei, com peso líquido total de 5.583 gramas; Os quatro sacos de plástico transparente apresentavam vestígio de “Anfetamina” e “Metanfetamina” abrangidas na Tabela II-B do mesmo decreto-lei; A supracitada palhinha de cor verde apresentava vestígio de “Metanfetamina” abrangida pela Tabela II-B do mesmo decreto-lei.
De seguida, os agentes da Polícia Judiciária encontraram na gaveta superior da mesa de cabeceira existente no quarto do arguido, uma garrafa de plástico com palhinha, um saco de plástico transparente contendo substância cristalina, sete tiras de papel de estanho e um rolo de papel de estanho e, na gaveta inferior da mesma mesa de cabeceira, uma caixa de madeira que nela continha uma palhinha de cor de laranja e um colher de cor prateada (vd. auto de revista e de apreensão, fls. 14 a 15 dos autos)
Após feito o exame laboratorial, verificou-se que a supracitada garrafa de plástico com palhinha continha vestígio de “Metanfetamina” abrangida pela Tabela II-B do Decreto-Lei n.º5/91/M; O supracitado saco de substância cristalina continha “Metanfetamina” abrangida pela Tabela II-B do mesmo decreto-lei, com peso líquido total de 4.673 gramas (feita a análise quantitativa, a metanfetamina pesa 3.125 gramas); A supracitada palhinha de cor de laranja continha vestígio de “Metanfetamina” abrangida pela Tabela II-B do mesmo decreto-lei; O colher de cor prateada continha vestígio “Anfetamina” e “Metanfetamina”, substâncias abrangidas pela Tabela II-B do mesmo decreto-lei.
De seguida, os agentes da Polícia Judiciária mais encontraram, na parte superior do guarda-roupa existente no quarto do arguido, uma garrafa de plástico transparente com duas palhinhas e líquido, três sacos de plástico transparente (vd. auto de revista e de apreensão, fls. 14 a 15 dos autos)
Após feito o exame laboratorial, verificou-se que o líquido encontrado na supracitada garrafa de plástico transparente continha “Anfetamina”, “Metanfetamina” e “N, N-Dimetanfetamina”, com peso líquido total de 240 ml; Os três sacos de plástico transparente continham vestígio de “Metanfetamina” abrangida na Tabela II-B do mesmo decreto-lei.
No dia 24 de Abril de 2009, cerca das 22H00, guarda do Estabelecimento Prisional de Macau, ao verificar a mala de mão que o arguido levava, encontrou uma caixa de fósforo com letras “XX CLUB” que nela continha cinco saquitos de plástico transparente contendo dezasseis comprimidos de cor vermelha escura e treze comprimidos de cor vermelha (vd. auto de relatório elaborado pela Polícia Judiciária, a fls.57 e, auto de apreensão, a fls. 64 dos autos)
Após feito o exame laboratorial, verificou-se que os dezasseis comprimidos de cor vermelha escura continham “Metanfetamina” abrangida na Tabela II-B do D.L n.º5/91/M, com peso líquido total de 1.473 gramas (feita análise quantitativa, a metanfetamina pesa 0.272 gramas); Os treze comprimidos de cor vermelha continham “Metanfetamina” abrangida na Tabela II-B do mesmo decreto-lei, com peso líquido total de 1.004 gramas (feita análise quantitativa, a metanfetamina pesa 0.087 gramas);
Todos os estupefacientes acima referidos foram adquiridos pelo arguido A junta a um indivíduo não identificado, com a finalidade de vender maior parte dos estupefacientes a outra pessoa e de consumir por si próprio uma pequena parte destes.
Os supracitados telemóveis e quantias encontrados pelos agentes da Polícia Judiciária na posse do arguido serviam de instrumento de comunicação e de interesses obtidos na prática de tráfico de droga.
As garrafas de plásticos com palhinhas, as palhinhas, os papeis de estanho e o colher eram utensílios detidos pelo arguido para consumir droga.
Os sacos de plástico transparente e a balança electrónica acima referidos eram utensílios do arguido para efeitos de embalar e pesar os estupefacientes.
O arguido A, com dolo, agindo de forma livre, voluntária e consciente ao praticar as condutas acima referidas.
Tinha perfeito conhecimento da natureza e das características dos estupefacientes acima referidos.
As suas condutas não foram autorizadas por lei.
Bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
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Mais se provou:
De acordo com o certificado de regis1to criminal, o arguido é primário.
Declarou o arguido que antes de ser preso preventivamente, exerceu como motorista de veículo de contendores no Interior da China, auferindo mensalmente o salário de cerca de RMB3.000,00. Tem a seu cargo sua avó, seus pais e um filho e como habilitações literárias o ensino secundário geral.”; (cfr., fls. 233-v a 235-v e 273 a 281).
Do direito
3. Insurge-se o arguido A contra o Acordão que o condenou nos termos atrás explicitados, imputando ao mesmo – cremos nós – o vício de “contradição insanável” e considerando que excessiva é a pena que lhe foi fixada pelo crime de “tráfico de estupefacientes”.
Sem demoras, vejamos se tem razão.
— Da alegada “contradição”.
No ponto em questão, alega o ora recorrente que “No douto acórdão, o Tribunal, por um lado levou em consideração a confissão do recorrente, por outro lado, na incriminação e determinação da pena, não mencionou a confissão dele, evidentemente, quanto a esse aspecto, o Tribunal Judicial de Base está em contradição.”.
Ora, cremos haver equívoco, pois que percorrendo toda a factualidade dada como provada não se encontra nenhuma referência quanto à confissão – ainda que parcial – por parte do ora recorrente.
Desta forma, não se vislumbra o vício que pelo mesmo recorrente vem assacado.
Aliás, e seja como for, também não nos parece que pelo facto de não se referir expressamente à confissão do arguido em sede de determinação da pena se possa considerar ter-se incorrido em “contradição insanável”.
Ociosas sendo outras considerações, continuemos.
— Quanto à “pena”.
Aqui, diz o recorrente que:
“Segundo a nova lei n.º17/2009, face à determinação de pena da prática do crime de tráfico de droga, a pena é fixada só a partir de 3 anos de prisão. Os estupefacientes detidos pelo recorrente eram cerca de 20 gramas de peso líquido total e foi o mesmo condenado pelo Tribunal Judicial de Base na pena de 6 anos e 8 meses de prisão, evidentemente, esta pena aplicada é demasiado gravosa.”.
Vejamos.
É verdade que o crime de “tráfico de estupefacientes” pelo arguido cometido é pela Lei n° 17/2009 punido com a pena de prisão que vai dos 3 aos 15 anos, e que a pena que lhe foi fixada, de 6 anos e 8 meses de prisão, não é de considerar próxima do limite mínimo daquela moldura penal.
Todavia, importa ter presente que o ora recorrente detinha uma considerável variedade de produto estupefaciente destinado ao tráfico, o que terá que ser levado em conta na determinação da pena.
De facto, de tal circunstância se pode concluir que era intenção do arguido “satisfazer” qualquer pedido que lhe fosse feito, e, assim, (vir a) possuir um maior número de clientes, o que torna evidente o elevado o dolo da sua conduta.
Por sua vez, de olvidar não são as prementes necessidades de prevenção deste tipo de crime, sendo também de realçar que o mesmo recorrente, após interceptado e sujeito a revista e busca domiciliária, não deixou de manter à sua disposição produto estupefaciente, pois que, cerca de 24 horas após a sua intercepção por agentes da Polícia Judiciária, veio a ser encontrado por guardas prisionais produto estupefaciente na sua mala de mão.
Nesta conformidade, atenta também a quantidade total de estupefaciente detida pelo recorrente, e sendo que provado ficou que a maior parte desta era destinada à venda, adequada se nos afigura a pena de 5 anos e 8 meses de prisão, e, como “pena única”, em resultado do cúmulo com a que lhe foi fixada pelo crime de “detenção de utensilagem” do art. 15° da Lei n° 17/2009, a de 5 anos, 8 meses e 20 dias de prisão.
— Aqui chegados, outro aspecto importa considerar.
Provado está que todos os estupefacientes referidos foram adquiridos pelo arguido A junto de um indivíduo não identificado, com a finalidade de “vender a maior parte e de consumir uma pequena parte.”
Por sua vez, nos termos da acusação pública, ao ora recorrente era imputada a prática de “um crime de tráfico, p. p. pelo art.º 8º, n.º1 do D.L n.º5/91/M (concurso ideal com um crime de detenção de droga, p. p. pelo art.º 23º, al. a)), bem como um crime de detenção de utensílio para consumo droga, p. p, pelo art.º 12º do mesmo decreto-lei.”
Certo sendo que atento o estatuído no art. 2°, n° 4 do C.P.M. ao mesmo foi aplicada a Lei n° 17/2009 por se mostrar mais favorável, e não estando agora em causa o crime de “detenção indevida de cachimbos e outra utensilagem” p. e p. pelo art. 15°, da dita Lei n° 17/2009, cremos que evidente é que a conduta do ora recorrente integra, também, a prática, em concurso real, de 1 crime de “detenção de estupefaciente para consumo”, p. e p. pelo art. 23° do D.L. n° 5/91/M ou, caso mais favorável, do art. 14° da Lei n° 17/2009.
Nesta conformidade, podendo este T.S.I. alterar a qualificação jurídica efectuada, observado que foi o contraditório (em sede da audiência de julgamento do presente recurso), e, atento o estatuído no art. 399° do C.P.P.M., há pois que decidir em conformidade.
Tudo visto, resta decidir.
Decisão
4. Nos termos e fundamentos expostos, acordam:
– alterar, oficiosamente, e nos termos consignados a qualificação jurídica dos factos provados efectuada no acórdão recorrido; e,
– julgar parcialmente procedente o recurso, alterando-se a pena pelo T.J.B. fixada para o crime de “tráfico de estupefacientes” para 5 anos e 8 meses de prisão, ficando o arguido condenado na pena única de 5 anos, 8 meses e 20 dias de prisão
Pelo decaimento, pagará o recorrente a taxa de justiça de 5 UCs.
Honorários ao Ilustre Defensor no montante de MOP$800.00.
Macau, aos 22 de Julho de 2010
José Maria Dias Azedo (Relator)
João Augusto Gonçalves Gil de Oliveira (Primeiro Juiz-Adjunto)
Chan Kuong Seng (Segundo Juiz-Adjunto)
(vencido quanto à decisão, acima tomada pelo Colectivo “ad quem”, de redução da pena do tráfico de droga, e, consequentemente, também da pena única final, porquanto entendo que não há mais margem para a redução da pena, por força do meu entendimento já explanado na declaração de voto então junta ao Acórdão de 22/4/2010 deste T.S.I. no processo n.º 199/2010).
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