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Processo nº 734/2010
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. A, com os sinais dos autos, respondeu no T.J.B., vindo, a final, a ser condenada como autora da prática de um crime de “consumo ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas”, p. e p. pelo art. 14° da Lei n° 17/2009, na pena de multa de 45 dias, à taxa diária de MOP$100,00, perfazendo a multa de MOP$4,500.00 ou 30 dias de prisão subsidiária; (cfr., fls. 109 a 111-v).

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Inconformada com o decidido, a arguida recorreu.
Motivou para concluir nos termos seguintes:
“1 - Durante na fase de inquérito, não foram realizadas diligências que se reputam essencias para a descoberta da verdade material dos factos.
2 - Com efeito, tendo a arguida em inquérito prestado declarações no sentido de indicar o nome e o telefone de contacto da pessoa a quem pertence a droga encontrada, deveria a Polícia ou o Ministério Público realizar ou ordenar a realização de diligências no sentido de encontrar e aferir da veracidade daquelas declarações da arguida.
3 - Tal questão foi igualmente suscitada pela arguida em sede de contestação apresentada.
4 - A falta de realização de diligências essenciais para a descoberta da verdade material em fase de inquérito implica a nulidade insuficiência de inquérito, prevista na alínea d) do n.° 2 do artigo 107.° do CPPM.
5 - E, concomitantemente, tendo a mesma questão sido suscitada em contestação mas ignorada na sentença recorrida, tal implica a existência do vício de violação de lei, da norma legal contida no mesmo preceito legal - alínea d) do n.° 2 do artigo 107.° do CPPM.
6 - Os depoimentos das duas testemunhas de acusação - as agentes dos Serviços de Alfândega de Macau - que procederam à intercepção da recorrente são fragmentários, nebulosos e pouco convincentes.
7 - Limitam-se a descrever que viram a droga, mas não se recordando de tudo o resto que aconteceu logo depois na mesma sala de trabalho.
8 - As duas testemunhas de acusação não se recordam ao certo a forma como a nota com droga estava embrulhada, apenas uma delas se afirmando que "parece que foi ou estava assim.. Já não me recordo ao certo.". Tal incerteza nos depoimentos não pode servir de prova para sustentar uma condenação penal.
9 - Decidindo diversamente, e condenando a arguida com base nas provas acima referidas, a sentença recorrida está eivada dos vícios de de insuficiência para a decisão recorrida da matéria de facto provada e erro notório na apreciação da prova, previstos nas alíneas a) e c) do n.° 2 do artigo 400.° do Código de Processo Penal de Macau.”

Seguidamente, deduz o pedido seguinte:
“Tendo havido documentação das declarações prestadas oralmente pelo o Tribunal, e havendo os vícios referidos nas alíneas do n. ° 2 do artigo 400.° do CPPM, e havendo razões para crer que a renovação pemitirá o reenvio do processo a novo julgamento, requer-se que seja ordenada a renovação da prova produzida, em especial, os depoimentos das duas e únicas testemunhas de acusação - as agentes dos Serviços de Alfândega de Macau.
Os depoimentos dessas duas testemunhas, tal como foi referido supra, acham-se registados nos registos magnéticos digitais, nos intervalos de tempo de 12:01 a 12:05 e de 12:15 a 12:20 da sessão de audiência de discussão e julgamento realizada no dia 9-7-2010.”; (cfr., fls. 116 a 123).

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Respondendo, assim afirma o Exm° Magistrado do Ministério Público:
“I. A acusação apresentada pelo Ministério Público baseia-se na prática dum crime de detenção de drogas, p. p. pelo art.º 23.º al. a) do DL n.º 5/91/M, que tem como requisito de condenação “a aquisição ou detenção ilícita de substâncias ou preparados compreendidos nas tabelas I a IV, para consumo pessoal, fora da previsão do art.º 11.º, …”. De facto, segundo os dados constantes dos autos, os agentes alfandegários encontraram em flagrante no saco esquerdo das calças da arguida uma nota de RMB¥20 dobrada contendo cristais em forma de grão e de cor branca. A seguir, os respectivos objectos foram submetidos ao Departamento de Ciências Forenses da PJ para exame laboratorial, e o resultado revelou que os respectivos cristais em forma de grão e de cor branca são ketamina, com peso líquido de 0,182 gramas.
II. Durante toda a fase do inquérito, a recorrente não podia justificar porque é que deteve as drogas acima referidas, também não forneceu outras provas como contraprova, além disso, a recorrente alegou no auto de interrogatório elaborado no Ministério Público que é um consumidor de droga, e a espécie de droga consumida é igual àquela encontrada neste processo, ou seja ketamina.
III. A lei exige que o Ministério Público possua indícios suficientes na dedução de acusação, isto significa vestígios suficientes, e através de relação lógica, forma-se destes factos indiciados uma totalidade convincente de que a arguida é criminosa, bem como juízo condenatório.
IV. Segundos os dados supracitados constantes dos autos, são satisfeitas as exigências básicas da dedução de acusação, pelo que é obviamente improcedente o motivo do recurso apresentado pela recorrente de que a insuficiência do inquérito resultou nas nulidades previstas pelo art.º 107.º n.º 2 al. d) do Código de Processo Penal.
V. Além disso, de acordo com o disposto no art.º 107.º n.º 3 al. c) do Código de Processo Penal, apesar de existirem respectivas nulidades, devem estas ser arguidas até 10 dias após a notificação do despacho que tiver encerrado o inquérito, mas segundo os dados constantes dos autos, o Ministério Público notificou pessoalmente a recorrente da acusação em 10 de Setembro de 2008, e a recorrente só apresentou arguição da questão supracitada através de contestação em 13 de Maio de 2010, isto é obviamente apresentação extemporânea.
VI. A jurisprudência tem entendido como erro notório na apreciação das provas quando se reconheceram factos incompatíveis, ou quando se retirou dum facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável, ou se violam as regras de valor probatório ou critérios profissionais. O erro tem que ser tão evidente que não passa despercebido ao comum os observadores. (vide o acórdão do processo n.º 22/2009 do TUI)
VII. Ao abrigo do disposto no art.º 336.º do Código de Processo Penal, o tribunal recorrido apreciou todas as provas na audiência de julgamento, usou o direito de livre apreciação das provas, combinou as regras de experiência (art.º 114.º do Código de Processo Penal), fez juízo com base nos factos provados e não provados, e formou convicção de facto sobre o objecto do processo, não violando as regras de experiência, pelo que não existiu erro notório na apreciação das provas mencionado pela recorrente e é improcedente esta parte do recurso.
VIII. O chamado vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada deve ser entendido como “define-se, em função da matéria de facto tida como provada, com a sua inaptidão para o preenchimento do tipo legal de crime nos seus elementos objectivos e subjectivos”. (vide o acórdão do processo n.º 167/2001 do TSI)
IX. Com base nos factos provados na audiência de julgamento, e estes factos preencheram o tipo legal de crime nos seus elementos objectivos e subjectivos, o tribunal recorrido julgou que a recorrente praticou um crime de detenção de drogas, p. p. pelo art.º 23.º al. a) do DL n.º 5/91/M, e não existe o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.
X. Por não se verificar a existência do vício previsto pelo art.º 400.º, n.º 2, al.s a) e c) do Código de Processo Penal, não estão reunidos todos os requisitos previstos pelo art.º 415.º n.º 1 do mesmo Código, razão pela qual o pedido da recorrente deve ser rejeitado por falta de pressuposto legal.
XI. No pedido de renovação da prova, cabe ao recorrente indicar concretamente as provas a renovar, com menção relativamente a cada uma, dos factos a esclarecer e das razões justificativas da renovação. Mas é pena que estas exigências não estejam constantes da motivação do recurso da recorrente. (vide o acórdão do processo n.º 175/2002 do TSI)”; (cfr., fls. 125 a 127 e 149 a 159).

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Neste T.S.I., e em sede de vista, juntou o Exm° Representante do Ministério Público o seguinte Parecer:
“Assenta a recorrente a sua argumentação em pretendida ocorrência, na decisão controvertida, de 3 vícios :
- insuficiência de inquérito e omissão posterior de diligências essenciais para a descoberta da verdade, por se não ter investigado e aferido da veracidade das declarações da recorrente no sentido de a droga lhe não pertencer, matéria que alegou em sede de julgamento, tendo sido ignorada ;
- insuficiência para a decisão recorrida da matéria de facto provada e erro notório na apreciação da prova, resultantes, além do mais, de se terem levado em conta para a convicção formada os depoimentos de 2 agentes da Alfândega e Macau, os quais se revelam incertos e contraditórios, a não merecerem credibilidade.
Cremos, porém, não lhe assistir qualquer razão.
Desde logo, não corresponde à verdade que a douta sentença em crise tenha ignorado a alegação referente à assacada insuficiência do inquérito : conforme claramente decorre daquele aresto, “ O defensor alega na contestação que nos termos do artº 107º, nº 2 al. d) do Código de Processo Penal, a acusação é nula pela insuficiência do inquérito.
Porém, ao abrigo do disposto no artº 107º nº 3 al. c) do Código de Processo Penal, a nulidade deve ser arguida até 10 dias após a notificação do despacho que tiver encerrado o inquérito, pelo que a referida arguição é extemporânea”.
Nada mais claro e expresso...
Depois, no que tange à assacada insuficiência da matéria de facto provada para a decisão, revela-se inequívoco que, no caso, aquela contém toda a factualidade respeitante à efectiva detenção de estupefacientes por parte da recorrente e, consequentemente, pertinente à subsunção do tipo legal de crime indicado pelo tribunal para fundamentar a decisão de condenação, sendo que, por outra banda, se não vê que o tribunal, dentro dos seus poderes de cognição, não tenha investigado toda a matéria relevante, seja a carreada pela acusação e defesa, seja a resultante da própria discussão da causa.
Finalmente, na douta sentença em crise, o julgador não se eximiu a expressar, concreta e especìficamente a sua valoração da prova produzida e dos motivos que o levou às conclusões que formulou, não se divisando que tenham sido dados como provados factos incompatíveis entre si, ou que se tenham retirado de tais factos conclusões lògicamente inaceitáveis, não competindo a este Tribunal censurar o julgador por ter formado a sua convicção neste ou naquele sentido, quando na decisão recorrida, confirmado pelo senso comum, nada contraria as conclusões alcançadas, vendo-se bem que com a sua alegação, designadamente com a alusão à “pobreza” dos depoimentos prestados pelos agentes da Alfândega, ou ao facto de a droga lhe não pertencer, pretende a recorrente manifestar a sua discordância com a matéria de facto dada assente pelo tribunal, melhor dizendo, da interpretação que este faz dessa matéria no que tange à sua própria responsabilidade, limitando-se, em boa verdade, tão só a expressar a sua opinião ‘pessoalíssima” àcerca da apreciação e valoração da prova, quando, manifestamente, não se vê que do teor do texto da decisão em crise, por si só, ou conjugada com as regras da experiência comum, resulte patente, evidente, ostensivo que o Colectivo errou ao apreciar como apreciou.
Analisada, a decisão recorrida na sua globalidade, constata-se, pois ser a mesma lógica e coerente, não tendo o Tribunal decidido em contrário ao que ficou provado ou não provado, contra as regras da experiência ou em desrespeito dos ditames sobre o valor da prova vinculada ou das “legis artis”, não passando a invocação do erro notório da apreciação da prova de uma mera manifestação de discordância no quadro do julgamento da matéria de facto, questão do âmbito do princípio da livre apreciação da prova, insindicável em reexame de direito.
Razões por que, entendemos ser de manter o decidido.”; (cfr., fls. 163 a 165).

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Cumpre decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão dados como assentes os factos seguintes:
“1. Deram-se como provados os seguintes factos através da audiência:
Às 20h35 de 14 de Agosto de 2008, no posto fronteiriço das Portas do Cerco, os agentes alfandegários interceptaram a arguida A que acabou de entrar em Macau.
Os agentes alfandegários encontraram em flagrante no saco esquerdo das calças da arguida uma nota de RMB¥20 dobrada contendo pós de cor branca (vide o auto de apreensão constante das fls. 7 dos autos).
Submetidos a exame laboratorial, os supracitados pós de cor branca revelaram tratar-se de “ketamina”, substância abrangida pela tabela II-C anexa ao DL n.º 5/91/M, com peso líquido de 0,182 gramas (vide o relatório laboratorial constante das fls. 32 a 37 dos autos).
As drogas são para consumo pessoal da arguida.
A arguida A agiu de forma livre, voluntária e consciente ao praticar dolosamente as condutas acima referidas.
A arguida A conhecia bem a natureza e as características das drogas supracitadas.
As suas condutas não foram autorizadas por lei.
A arguida sabia bem que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
A polícia efectuou busca na residência da arguida e não encontrou qualquer objecto relacionado com droga (vide as fls. 9).
Ao mesmo tempo provou-se a situação económica da arguida:
A arguida tem como habilitações literárias ensino universitário e é empregada de escritório.
A arguida aufere mensalmente cerca de RMB¥4.000,00.
A arguida é casada e tem a seu cargo os pais e dois filhos.
A arguida não confessou a prática dos factos na audiência de julgamento.
A arguida é delinquente primária.”

Seguidamente, e como “Factos não provados”, consignou o que segue:
“A arguida adquiriu as supracitadas drogas junto do seu amigo “A Ian”.
Os outros factos constantes da contestação (vide as fls. 70 a 73).”; (cfr., fls. 142 a 143).

Do direito

3. Vem A recorrer da sentença que a condenou como autora da prática de um crime de “consumo ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas”, p. e p. pelo art. 14° da Lei n° 17/2009, na pena de multa de 45 dias, à taxa diária de MOP$100,00, perfazendo a multa de MOP$4,500.00 ou 30 dias de prisão subsidiária.

Colhe-se das conclusões que a recorrente produz a final da sua motivação de recurso que coloca as questões seguintes:
– “insuficiência de inquérito”;
– “insuficiente da matéria de facto para a decisão”; e,
– “erro notório na apreciação de prova”, pedindo também a renovação da prova produzida.

Como se consignou em sede de exame preliminar, considera-se ser o presente recurso “manifestamente improcedente”, e por isso, de rejeitar; (cfr., art. 410°, n°1 do C.P.P.M.).

Eis os motivos deste nosso entendimento.

— Quanto à “renovação da prova”.

Nos termos do art. 415° do C.P.P.M.:
“1. Quando tenha havido documentação das declarações prestadas oralmente perante o tribunal singular ou o tribunal colectivo, o Tribunal Superior de Justiça admite a renovação da prova se se verificarem os vícios referidos nas alíneas do n.º 2 do artigo 400.º e houver razões para crer que aquela permitirá evitar o reenvio do processo.
2. A decisão que admitir ou recusar a renovação da prova é definitiva e fixa os termos e a extensão com que a prova produzida em primeira instância pode ser renovada.
3. Se for determinada a renovação da prova, o arguido é convocado para a audiência.
4. Salvo decisão do tribunal em contrário, a falta de arguido regularmente convocado não dá lugar ao adiamento da audiência.”

Pronunciando-se sobre idênticos pedidos de “renovação de prova” tem este T.S.I. entendido que:
“Atento ao preceituado nos artºs 402º nº3 e 415º do C.P.P.M., quatro são os pressupostos – de verificação cumulativa – para se proceder à renovação da prova:
- que tenha havido documentação das declarações oralmente prestadas perante o Tribunal “a quo”;
- que o recorrente indique as provas a renovar, com menção relativamente a cada uma delas dos factos a esclarecer e das razões justificativas da sua renovação;
- que o recurso tenha por fundamento e se verifiquem os vícios referidos no nº 2 do artº 400º do C.P.P.M.; e,
- que existam razões para crer que a renovação permitirá evitar o reenvio do processo para novo julgamento, ou seja, que com a renovação, se consiga eliminar os vícios imputados à decisão recorrida.”; (cfr., v.g., o Ac. de 12.06.2003, Proc. n° 107/2003).

No caso, mostra-se de considerar que não se verificam os imputados vícios de “insuficiente da matéria de facto para a decisão” e “erro notório na apreciação de prova”, pelo que, também por aí, e necessariamente, improcede o pedido em questão.

De facto, o vício de “insuficiência” apenas ocorre quando o Tribunal deixe de emitir pronúncia sobre matéria “objecto do processo”.

Por sua vez, existe “erro notório” “quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores.”; (cfr., v.g., Ac. de 14.06.2001, Proc. n° 32/2001, do ora relator).

Com efeito, “É na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal.”; (cfr., v.g., Ac. de 20.09.01, Proc. n° 141/2001, do ora relator).”

Na situação sub judice, não deixou o Tribunal a quo de emitir pronúncia sobre toda a matéria “objecto do processo”, declarando qual a que resultou “provada” e “não provada”, não deixando de fundamentar de forma que se considera adequada a sua decisão.

Por sua vez, não tendo o Tribunal a quo violado as regras sobre o valor das provas , as legis artis ou as regras de experiência, óbvio se nos mostra que inexiste o assacado vício de “erro”.

Nesta conformidade, inexistindo o dito vícios da matéria de facto, evidente é que motivos não há para se avançar para a pretendida renovação de prova.

— Quanto à “insuficiência do inquérito”.

Nos termos do art. 107° do C.P.P.M.:
“1. Qualquer nulidade diversa das referidas no artigo anterior deve ser arguida pelos interessados e fica sujeita à disciplina prevista neste artigo e no artigo seguinte.
2. Constituem nulidades dependentes de arguição, além das que forem cominadas noutras disposições legais:
a) O emprego de uma forma de processo quando a lei determinar a utilização de outra, sem prejuízo do disposto na alínea f) do artigo anterior;
b) A ausência, por falta de notificação, do assistente ou da parte civil, nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência;
c) A falta de nomeação de intérprete, nos casos em que a lei a considerar obrigatória;
d) A insuficiência do inquérito ou da instrução e a omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade.
3. As nulidades referidas nos números anteriores devem ser arguidas:
a) Tratando-se de nulidade de acto a que o interessado assista, antes que o acto esteja terminado;
b) Tratando-se da nulidade referida na alínea b) do número anterior, até 5 dias após a notificação do despacho que designar dia para a audiência;
c) Tratando-se de nulidade respeitante ao inquérito ou à instrução, até ao encerramento do debate instrutório ou, não havendo lugar a instrução, até 5 dias após a notificação do despacho que tiver encerrado o inquérito;
d) Logo no início da audiência nas formas de processo especiais.”

Ora, a imputada “insuficiência do inquérito” é assim uma “nulidade dependente de arguição”, (cfr., n° 1, al. d)), cujo prazo para tal (arguição) é o previsto no n° 3 do mesmo preceito legal.

In casu, em sede de declarações prestadas pela ora recorrente perante o Exm° Magistrado do Ministério Público declarou a mesma que o estupefaciente que lhe foi apreendido não era da sua pertença, afirmando pertencer a uma sua amiga, de nome “Ah Ian”, titular do telemóvel n° (0086)1343439990; (cfr., fls. 23 e 24).

Posteriormente, e notificada da acusação que lhe foi deduzida em 18.09.2008, (cfr., fls. 41), nada disse.

Remetidos os autos ao T.J.B. e notificada do despacho que designou a data para a audiência de julgamento em 03.05.2010, (cfr., fls. 55), requereu, em 12.05.2010, a documentação da prova, e em 13.05.2010, “contestando”, insistiu na sua inocência, suscitando, tão só aí, a mencionada questão da “insuficiência do inquérito”; (cfr., fls. 61 a 69).

Como é bom de ver, mesmo a existir tal “insuficiência”, esgotado estava o prazo de 5 dias para a sua arguição, sendo de se concluir pela sua sanação.

Aliás, e como salienta o Exm° Magistrado do Ministério Público no seu Parecer, nesse sentido – e bem – decidiu o Mm° Juiz a quo, sendo assim de se considerar o presente recurso manifestamente improcedente, e por isso, de rejeitar,

Decisão

4. Nos termos que se deixam expostos, e em conferência, acordam rejeitar o recurso; (cfr., art°s 409°, n° 2, al. a) e 410°, n° 1 do C.P.P.M.).

Pagará a recorrente a taxa de justiça de 5 UCs, e, pela rejeição, o equivalente a 4 UCs; (cfr., art. 410°, n° 4 do C.P.P.M.).

Macau, aos 4 de Novembro de 2010
José Maria Dias Azedo (Relator)
Chan Kuong Seng (Primeiro Juiz-Adjunto)
João Augusto Gonçalves Gil de Oliveira (Segundo Juiz-Adjunto)
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