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Processo nº 956/2009
(Autos de recurso contencioso)




ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:




Relatório

1. A, com os sinais dos autos, veio recorrer da decisão proferida pelo EXM° CHEFE DO EXECUTIVO que indeferiu o seu pedido de autorização de residência nesta R.A.E.M..

Em sede de conclusões, afirma o que segue:
“a) A Recorrente A vem, respeitosamente, recorrer do Despacho de 24 de Setembro de 2009 de Sua Excelência o Senhor Chefe do Executivo e recebido por via postal no dia 8 de Outubro de 2009,
b) Conforme cópias aqui juntas como Documentos n.° 2 e n.° 3, para todos os devidos efeitos.
c) A Recorrente vem requerer a Autorização de Residência, com base nas previsões legais ínsitas nos artigos 9° a 11° da Lei n.° 4/2003, de 17 de Março,
d) Ou seja, o Reagrupamento Familiar da Recorrente com o seu companheiro (há mais de 6 anos) e Pai da filha menor de ambos, B,
e) Ou, em alternativa, com base em Razões humanitárias ("autorização excepcional" prevista no artigo 11 ° da referida Lei n. ° 4/2003, de 17 de Março),
f) Conforme o pedido inicial que fora submetido em 30 de Abril de 2009, apresentado a Sua Excelência o Senhor Chefe do Executivo e que, agora foi indeferido, Despacho que aqui se recorre,
g) Com base, designadamente, na previsão da alínea d) do número 1 do artigo 21 ° do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC),
h) Porque, entende a Recorrente que a decisão de não conceder a Autorização de Residência não é de todo razoável tendo em conta a Filha comum de ambos os Requerentes, nascida em Macau em XX de XX de XXXX (tendo como Pai o cidadão português C, residente em Macau e como Mãe a ora Recorrente), o que, só por si, deveria possibilitar a concessão do pedido apresentado em 30 de Abril de 2009 e
i) Um segundo pedido apresentado em 4 de Maio de 2009 (este segundo pedido, denominado "Aditamento ao Pedido de Autorização Excepcional de Residência e um Pedido de Autorização Especial de Permanência").
j) A decisão recorrida fundamenta o indeferimento da concessão do pedido apresentado pelo 1 ° Requerente C e pela 2.ª Requerente, aqui a Recorrente, no seguinte:
k) "B) Transcreve-se ainda o parecer do Assessor Jurídico do Gabinete do Secretário para a Segurança:
«Atento o teor da audiência escrita apresentada pelos interessados, afigura-se que a argumentação dos mesmos, por muito respeito que possa merecer, não possuem a virtualidade de alterar o quadro factual, circunstancial e legal descritos no parecer de 21/05/2009 que aqui se dá por reproduzido.
Também os factos que os interessados se propõem provar, aliás conhecidos, não possuem aquela virtualidade, por isso entendendo-se dever prescindir-se da audição das testemunhas arroladas na mesma audiência;
Pelo que sugerimos dever indeferir-se o pedido nos termos e com as disposições invocadas no supracitado parecer.
À consideração do Exm.° Secretário para a Segurança.»"
l) O "Parecer de 21/05/2009" que é referido no douto Parecer do Assessor Jurídico do Gabinete do Secretário para a Segurança é aqui junto com o presente recurso como Documento n.° 10 (acima já indicado e referido).
m) Afigura-se igualmente que a presente decisão recorrida e agora transcrita é pouco fundamentada e remete exclusivamente para o aludido parecer de 21 de Maio de 2009,
n) Não parecendo tendo em conta os seguintes factos supervenientes:
o) O nascimento e perfilhação da filha da Recorrente com o cidadão de nacionalidade Portuguesa e residente de Macau, C.
p) o nascimento da B deve, por si só, permitir o Reagrupamento Familiar e a concessão da respectiva Autorização de residência à ora Recorrente,
q) Tendo em conta que vive há mais de seis anos com o seu companheiro e que este custeia as despesas da Recorrente e da Filha de ambos, não sendo um encargo para a R.A.E.M.,
r) Nem constituindo a Recorrente um perigo para a ordem pública ou razão suficiente para ser expulsa de Macau,
s) Assim requerendo-se, novamente, como nos vários requerimentos então submetidos em 30 de Abril, 4 de Maio e 9 de Setembro do presente ano de 2009, a concessão de Autorização de Residência à ora Recorrente.
t) O que nesta fase jurisdicional e com o presente requerimento de recurso se solicita ao Douto Tribunal de Segunda Instância.
u) É que, actuando a Administração, neste domínio, no âmbito de poderes discricionários, tal não significa que possa violar a lei, como parece ter acontecido no caso particular ora em apreço;
v) Idêntica conclusão se chega se enquadrarmos o regime especial do artigo 27° da Lei 6/2004 de 2 de Agosto de 2004 com o artigo 11 ° da Lei n. ° 4/2003, de 17 de Março que prevêem ambas, a possibilidade de conceder o Perdão por parte de Sua Excelência o Senhor Chefe do Executivo, em casos de situação excepcional como é o do presente caso, com as razões humanitárias que o caso reveste e que permitem a concessão de Autorização de Residência à Recorrente, também pela Sua Excelência o Exmo. Senhor Chefe do Executivo, por razões humanitárias ou em casos excepcionais, como é o caso.
w) Existem 2 (duas) filhas menores, de 12 anos de idade e de 6 meses de idade, a Recorrente vive com um cidadão português residente em Macau, que vive com a Recorrente desde 2003, a Recorrente trabalhou como Ajudante Familiar até Abril de 2009 para um Cidadão de Nacionalidade Indonésia que atestou documentalmente em 24 de Junho de 2009 que a Recorrente trabalhava legalmente,
x) A mesma Recorrente apresentou um pedido de renovação do seu Título de Trabalho de Residente Não Permanente em 21 de Abril de 2009 ao Gabinete dos Recursos Humanos da R.A.E.M., para exercer as mesmas funções,
y) Ficou definitivamente averbado no registo de nascimento da B que o Senhor C, 1° Requerente da Autorização de Residência que a Recorrente procura obter, é o Pai da B, filha de ambos nascida em XX de XX do corrente ano de XXXX,
z) Pelo que, a não concessão de Autorização de Residência à Recorrente é excessiva mesmo no âmbito discricionário da Administração em face dos factos ocorridos, sobretudo desde o nascimento da filha menor B, e, portanto,
aa) Cuja decisão se pretende aqui que Vossas Excelências revoguem.
bb) É certo que os diplomas que fixam a Autorização de Residência e a Autorização de Permanência visam deixar um amplo espaço de decisão à Administração, embora, em entender da Recorrente, apenas se possa falar de discricionariedade técnica ou imprópria.
cc) Nesta medida, afigura-se oportuno o presente Recurso, porquanto visa revogar o acto administrativo ora recorrido, com fundamento na sua falta de conveniência/ oportunidade, nos termos do artigo 146° do CPA.
dd) A Recorrente nunca esteve em situação ilegal, na medida em que sempre manteve o seu "blue card" válido até ao dia em que tomou conhecimento da possível irregularidade, i.e., quando foi notificado do cancelamento, um dia antes de o mesmo caducar, quando se apresentou aos Serviços de Migração para o mesmo ser renovado, em 29 de Abril de 2009.
ee) A situação de clandestinidade não existe e a Recorrente vive com o Senhor C na casa deste desde 2003, não se tratando de imigração ilegal ou de trabalho clandestino e ilegal em Macau.
ff) Por todos os factos descritos e em face dos documentos apresentados, requer-se, quer o Reagrupamento Familiar, quer a concessão de Autorização de Residência por razões humanitárias e requer-se a revogação da ordem de expulsão do Território de Macau.
gg) Nos termos dos artigos 8°, 9° e 11°, todos da Lei n.° 4/2003, de 17 de Março.
hh) Assim, pedindo a Vossas Excelências para, na apreciação deste Recurso, atendam à situação material em que sempre se encontrou a Recorrente e, insistindo-se, nunca constituiu infracção às normas que disciplinam e fixam o critério de residência temporária da RAEM.
ii) E que não atendam à situação do formalismo de um casamento filipino que não pode dissolver-se, quando há 10 (dez) anos que o ainda marido da Recorrente vive nas Filipinas e não vê nem mantém qualquer contacto com a Recorrente desde 1999, um ano depois de casado e até hoje.
jj) Nestes termos e nos melhores de Direito, que Vossas Excelências melhor suprirão.

A final, pede que seja, “proferido Acórdão anulando e revogando o Despacho recorrido e determinando a prática de um outro, que defira a concessão da autorização de residência ao abrigo da Lei n.° 4/2003 de 17 de Março de 2003, bem como o Reagrupamento Familiar que permite a concessão da mesma Autorização de Residência, à luz, designadamente, dos artigos 9° a 11° da referida Lei n.° 4/2003.”; (cfr., fls. 2 a 29).

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Citada, a entidade recorrida contestou, alegando o que segue:
“Questão prévia
1.° O acto administrativo recorrido neste processo coincide com um dos actos impugnados no Proc. n.° 831/2009, do Tribunal de Segunda Instância, apresentado pela mesma recorrente e contestado pelo mesmo mandatário aqui designado por despacho de S. Ex.ª o Chefe do Executivo.
Impugnação
2.° A recorrente vem impugnar o acto de S. Ex.ª o Chefe do Executivo, de 10/09/2009 que indeferiu o seu pedido de residência, nas vertentes comum e excepcional, alegando, fundamentalmente, que a mesma decisão enferma de total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários (art.° 21.°, n.° 1, d), do CPAC), e a falta de elementos essenciais do acto (art.° 21.°, n.° 2, a), do CPAC) que se julga consistir na falta de menção obrigatória da respectiva fundamentação.
3.° No momento da prática do acto na sua vertente comum (art.° 9.° da Lei n.° 4/2003) a recorrente comprovadamente (nos termos da informação MIG 1831/2009/CI de fls. do processo instrutor) havia infringido as leis que regulam a permanência em Macau, o que motivara que fosse decretada a sua expulsão e interdição de entrada.
4.° Além disso, a recorrente prevalecia-se, apenas, de uma alegada união de facto não admitida, para fins de autorização de residência, nos termos das disposições conjugadas dos art.°s 2.° n.° 1, 2), do RA n.° 5/2003 e 1472.° do Código Civil, uma vez que a mesma mantém, no país de origem, um "casamento anterior não dissolvido", e não se encontrava ainda reconhecida a paternidade da menor, B, pelo que não era ainda esta considerada residente de Macau.
5.° De referir a propósito do "casamento não dissolvido" na República das Filipinas, que a Administração de Macau não pode substituir-se ao legislador excepcionando o que na lei é imperativo, menos ainda tratando-se de uma norma por si já revestida de um carácter de excepção relativamente ao comum regime dos efeitos do casamento.
6.° Pelo que o pedido da ora recorrente era destituído de qualquer fundamento legal (total ausência de laços familiares - biológicos ou legais ou equiparados - com residentes de Macau).
7.° E também o mesmo pedido se não mostrava merecedor de uma decisão positiva no âmbito do poder discricionário da Administração em face, designadamente, da infracção referida no art. ° 3.° e porque a situação do casal não se revestia "de uma tal penosidade e de um tal carácter humanitário e de interesse público" que a justificasse.
8.° Acresce que uma eventual autorização, por outro lado, também não era compaginável com as medidas de expulsão e interdição de entrada que, de seguida, viriam a ser aplicadas à recorrente.
9.° Igualmente se há-de ter por correcto o indeferimento do pedido na sua vertente de autorização excepcional, desde logo pelos motivos atrás referidos e porque a norma do art.° 11.° da Lei n.° 4/2003 só é aplicável quando de todo em todo inviável a "comum" autorização, a que nos vimos referindo, por virtude de impossibilidade de satisfação de requisitos ou formalismos em regra não imputável ao requerente, ou de vicissitudes de alguma forma alheias à vontade e acção do mesmo, e que não devam conduzir a uma situação de "non liquet" e quando em presença de superiores imperativos de cariz humanitário e de interesse público.
10.° Por outro lado, a mesma norma não consubstancia um direito na disponibilidade dos cidadãos mas tão somente uma prerrogativa de que o Chefe do Executivo pode lançar mão, oficiosamente, quando em presença de situações excepcionais e no quadro descrito no artigo anterior, não sendo, por isso, susceptível de anulação o acto que se demita da aplicação positiva desse normativo.
11.° Ora por todas estas razões, conjunta e separadamente, e que constam do acto administrativo recorrido, não podia nem devia a Administração autorizar o pedido da ora recorrente.
12.° Não podendo, pois, assacar-se ao acto administrativo recorrido qualquer desrazoabilidade, muito menos total, quando do mesmo se colhe, nos termos vistos, não só o desmerecimento da autorização como a ausência de fundamentos do pedido (a título comum ou excepcional) e inclusíve a incompatibilidade de uma autorização com as medidas sancionatórias aplicadas à recorrente.
13.° Tudo, aliás, na perspectiva da prossecução do interesse público na execução das políticas migratórias da RAEM e no cumprimento e execução das leis respectivas quanto à residência e permanência em Macau.
14.° O despacho de indeferimento de S. Ex.ª o Chefe do Executivo de 10/09/2009 é de concordância com a proposta de indeferimento do Secretário para a Segurança, de 04109/2009, por sua vez de concordância com o parecer técnico da mesma data, o qual além de se referir aos argumentos aduzidos pela ora recorrente em sede de audiência escrita, também remete para o parecer de 21/05/2009, dando-o por reproduzido.
15.° Naquele parecer de 21/05/2009 são apresentadas, de forma suficiente, clara e congruente, os fundamentos de facto e de direito da proposta de indeferimento do pedido que veio a ser sufragada por S. Ex.ª o Chefe do Executivo.
16.° Parecer esse, por outro lado, oportunamente notificado à ora recorrente para os fins a que aludem os art.°s 93.° e ss. do CPA, e do qual a mesma revela perfeito conhecimento, inclusíve juntando-o à sua douta petição de recurso.
17.° O art.° 115.°, n.° 1, do CPA estabelece que a fundamentação pode "... consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres...".
18.° Pelo que se há-de reconhecer que o acto administrativo recorrido se encontra devidamente fundamentado e lhe não faltam quaisquer dos seus elementos essenciais.
19.° Não é admissível o pedido inserto na douta petição de recurso, a final, alínea c), visto que o recurso contencioso administrativo é de mera legalidade e não de plena jurisdição – art.° 20.° do CPAC.”

Pugna assim pela improcedência do recurso; (cfr., fls. 89 a 93).

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O processo seguiu os seus termos com a inquirição de testemunhas e alegações facultativas da recorrente e entidade recorrida; (cfr., fls. 102 a 120 e 124 a 130).

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Nas sua alegações, oferece a recorrente as conclusões seguintes:
“I. A Recorrente A vem, respeitosamente, recorrer do Despacho de 24 de Setembro de 2009 de Sua Excelência o Senhor Chefe do Executivo.
II. A Recorrente vem requerer a Autorização de Residência, com base nas previsões legais ínsitas nos artigos 9° a 11 ° da Lei n.° 4/2003, de 17 de Março,
III. Ou seja, o Reagrupamento Familiar da Recorrente com o seu companheiro (há mais de 6 anos) e Pai da filha menor de ambos, B,
IV. Ou, em alternativa, com base em Razões Humanitárias ("autorização excepcional" prevista no artigo 11 ° da referida Lei n. ° 4/2003, de 17 de Março),
V. Conforme o pedido inicial que fora submetido em 30 de Abril de 2009, apresentado a Sua Excelência o Senhor Chefe do Executivo e que, agora foi indeferido, Despacho que aqui se recorre,
VI. Com base, designadamente, na previsão da alínea d) do número 1 do artigo 21° do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC),
VII. Porque, entende a Recorrente que a decisão de não conceder a Autorização de Residência não é de todo razoável tendo em conta a Filha comum de ambos os Requerentes, nascida em Macau em XX de XX de XXXX (tendo como Pai o cidadão português C, residente em Macau e como Mãe a ora Recorrente), o que, só por si, deveria possibilitar a concessão do pedido apresentado em 30 de Abril de 2009 e, .
VIII. Um segundo pedido apresentado em 4 de Maio de 2009 (este segundo pedido, denominado "Aditamento ao Pedido de Autorização Excepcional de Residência e um Pedido de Autorização Especial de Permanência").
IX. A decisão recorrida fundamenta o indeferimento da concessão do pedido apresentado pelo 1 ° Requerente C e pela 2.ª Requerente, aqui a Recorrente, no seguinte:
X. "B) Transcreve-se ainda o parecer do Assessor Jurídico do Gabinete do Secretário para a Segurança:
«Atento o teor da audiência escrita apresentada pelos interessados, afigura-se que a argumentação dos mesmos, por muito respeito que possa merecer, não possuem a virtualidade de alterar o quadro factual, circunstancial e legal descritos no parecer de 21/05/2009 que aqui se dá por reproduzido.
Também os factos que os interessados se propõem provar, aliás conhecidos, não possuem aquela virtualidade, por isso entendendo-se dever prescindir-se da audição das testemunhas arroladas na mesma audiência;
Pelo que sugerimos dever indeferir-se o pedido nos termos e com as disposições invocadas no supracitado parecer.
À consideração do Exm° Secretário para a Segurança.»"
XI. O "Parecer de 21/05/2009" que é referido no douto Parecer do Assessor Jurídico do Gabinete do Secretário para a Segurança, fora junto com a Petição de Recurso Contencioso como Documento n.° 10, cujo teor respeitosamente a Recorrente remete para a referida peça processual.
XII. Afigura-se igualmente que a presente decisão recorrida e agora transcrita é pouco fundamentada e remete exclusivamente para o aludido parecer de 21 de Maio de 2009,
XIII. Não parecendo tendo em conta os seguintes factos supervenientes:
XIV. O nascimento e perfilhação da filha da Recorrente com o cidadão de nacionalidade Portuguesa e residente de Macau, C.
XV. O nascimento da B deve, por si só, permitir o Reagrupamento Familiar e a concessão da respectiva Autorização de residência à ora Recorrente,
XVI. Tendo em conta que vive há mais de 7 (sete) anos com o seu companheiro e que este custeia as despesas da Recorrente e da Filha de ambos, não sendo um encargo para a R.A.E.M.,
XVII. Nem constituindo a Recorrente um perigo para a ordem pública ou razão suficiente para ser expulsa de Macau,
XVIII. Assim requerendo-se, novamente, como nos vários requerimentos então submetidos em 30 de Abril, 4 de Maio e 9 de Setembro do presente ano de 2009, a concessão de Autorização de Residência à ora Recorrente.
XIX. O que nesta fase jurisdicional e após a inquirição das 4 (quatro) Testemunhas arroladas pela Recorrente e inquiridas no dia 9 de Fevereiro de 2010 no douto Tribunal de Segunda Instância ora se requer.
XX. Ficou, aliás, amplamente provado que a Recorrente nunca se quis colocar numa situação de ilegalidade, clandestinidade e infracção às normas, à Lei e ao Direito de Macau.
XXI. Pelo que, existindo um estável agregado Familiar de quatro membros e estando ainda a viver em Macau a Mãe da Recorrente e um irmão, requer-se a concessão da Autorização de Residência.
XXII. Verificando-se todos os requisitos legais e processuais à luz do Direito em vigor em Macau para ser atribuída a concessão da Autorização de Residência à ora Recorrente.
XXIII. Devendo revogar-se o acto administrativo recorrido e conceder-se o Reagrupamento Familiar da Recorrente com o Senhor Arquitecto C, a B (filha de ambos) e a D, filha menor do Senhor Arquitecto C, todos vivendo sob o mesmo tecto e estavelmente há muito tempo, em Macau.
XXIV. Por outro lado, actuando a Administração, neste domínio, no âmbito de poderes discricionários, tal não significa que possa violar a lei, como parece ter acontecido no caso particular ora em apreço;
XXV. Idêntica conclusão se chega se enquadrarmos o regime especial do artigo 27° da Lei 6/2004 de 2 de Agosto de 2004 com o artigo 11° da Lei n.° 4/2003, de 17 de Março que prevêem ambas, a possibilidade de conceder o Perdão por parte de Sua Excelência o Senhor Chefe do Executivo, em casos de situação excepcional como é o do presente caso, com as razões humanitárias que o caso reveste e que permitem a concessão de Autorização de Residência à Recorrente, também pela Sua Excelência o Exmo. Senhor Chefe do Executivo, por razões humanitárias ou em casos excepcionais, como é o caso.
XXVI. Ficou definitivamente averbado no registo de nascimento da B que o Senhor C, 1° Requerente da Autorização de Residência que a Recorrente procura obter, é o Pai da B, filha de ambos nascida em XX de XX do passado ano de XXXX,
XXVII. Pelo que, a não concessão de Autorização de Residência à Recorrente é excessiva mesmo no âmbito discricionário da Administração em face dos factos ocorridos, sobretudo desde o nascimento da filha menor B, e, portanto,
XXVIII. Cuja decisão se pretende aqui que Vossas Excelências revoguem.
XXIX. É certo que os diplomas que fixam a Autorização de Residência e a Autorização de Permanência visam deixar um amplo espaço de decisão à Administração, embora, em entender da Recorrente, apenas se possa falar de discricionariedade técnica ou imprópria.
XXX. Nesta medida, afigura-se oportuno o presente processo instaurado no Tribunal de Segunda Instância, porquanto visa revogar o acto administrativo ora recorrido, com fundamento na sua falta de conveniência! oportunidade, nos termos do artigo 146° do CPA.
XXXI. Por todos os factos descritos e em face dos documentos apresentados, requer-se, quer o Reagrupamento Familiar, quer a concessão de Autorização de Residência por razões humanitárias e requer-se a revogação da ordem de expulsão do Território de Macau.
XXXII. Nos termos dos artigos 8°, 9° e 11°, todos da Lei n.° 4/2003, de 17 de Março de 2003.
XXXIII. Assim, pedindo a Vossas Excelências para, nestes autos, atendam à situação material em que sempre se encontrou a Recorrente e, insistindo-se, nunca constituiu infracção às normas que disciplinam e fixam o critério de residência temporária da R.A.E.M.;
XXXIV. E que não atendam à situação do formalismo de um casamento filipino que não pode dissolver-se, quando há 11 (onze) anos que o ainda marido da Recorrente vive nas Filipinas e não vê nem mantém qualquer contacto com a Recorrente desde 1999, um ano depois de casado e até hoje.
XXXV. Nestes termos e nos melhores de Direito, que Vossas Excelências melhor suprirão:
Requer-se a V. Exas que:
a) Revoguem o acto ilegal que indeferiu a concessão do pedido de Autorização de Residência à ora Recorrente, por manifesta desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários da Administração da R.A.E.M., violando a alínea d) do número 1 do artigo 21° do CPAC.
b) Mais V. Exas venham proferir um Acórdão anulando e revogando o Despacho recorrido e determinando a prática de um outro, que defira a concessão da autorização de residência ao abrigo da Lei n.° 4/2003 de 17 de Março de 2003, bem como o Reagrupamento Familiar que permite a concessão da mesma Autorização de Residência, à luz, designadamente, dos artigos 9° a 11 ° da referida Lei n.° 4/2003.”; (cfr., fls. 107 a 120).

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Por sua vez, nas alegações que apresentou conclui a entidade recorrida nos termos seguintes:
“1- Por virtude da existência de um erro nos pressupostos da informação n.° 1831/2009/CI o acto de expulsão da recorrente acabou por ser reformado por despacho do Secretário para a Segurança de 16/03/2010.
2 - Em 02/02/2009 foi formalmente cancelado o TI/TNR do cidadão indonésio E (que na qualidade de trabalhador não residente era por sua vez autorizado a manter ao seu serviço a trabalhadora A), razão pela qual foi também cancelado, na mesma data, pelo Serviço de Migração, o TI/TNR da recorrente.
3 - Segundo notícia formalmente o Serviço de Migração, o referido empregador abandonou a RAEM em 02/02/2009, e desde essa data e até 30/04/2009 (data do termo formal do contrato que o ligava à recorrente) só permaneceu em Macau por 1 dia em 22/02/2009. .
4 - Por seu turno a recorrente, segundo também informa o Serviço de Migração, permaneceu sempre em Macau até 30/04/2009, e o seu parto ocorreu em 16/02/2009.
5 - Considerando os factos e as datas referidas nas duas conclusões anteriores e os períodos mínimos exigíveis de inactividade no pré e no pos-parto, não é possível que a recorrente, após 02/02/2009, tenha prestado qualquer trabalho para o empregador nem recebido o seu salário.
6 - Após a cessação da sua relação laboral com uma empresa de Macau e o cancelamento do seu TI/TNR ao empregador não mais era legítimo, nem tecnicamente possível, manter em vigor a sua autorização de contratação de uma trabalhadora e consequentemente o TI/TNR desta (cessação formal da relação contratual).
7 - Demonstra-se que a trabalhadora, aqui recorrente, não continuou a prestar o seu trabalho e a receber o seu salário (cessação de facto da relação contratual), o que, aliás, a acontecer haveria de qualificar-se como trabalho ilegal nos termos da lei respectiva
8 - A declaração do empregador de 24/06/2009, junta aos autos a fls., cujo teor aqui se dá por reproduzido, apenas pretende simular uma relação contratual de facto falsa e ilegítima.
9 - O empregador e a empregada, aqui recorrente, não podiam deixar de ter a consciência de que a relação contratual, ainda que não fosse simulada era de qualquer modo ilegítima e ilegal.
10 - Em 02/02/2009 a recorrente não se apresentou no Serviço de Migração, como devia e se obrigava nos termos da notificação/declaração que assinara (a fls. do processo instrutor), ciente contudo do cancelamento do seu TI/TNR por caducidade da autorização de permanência, pelo que se constituiu em excesso de permanência com as consequências legais da expulsão e interdição de entrada.
11 - Não se produziu qualquer prova testemunhal, nem qualquer outra, pelo contrário, da manutenção fáctica da relação de trabalho da recorrente após a data de 02/02/2009.
12 - No mais reitera-se todo o conteúdo da contestação de fls.1, designadamente o que se refere à circunstância verdadeiramente preclusiva da existência de um “casamento anterior não dessolvido”, pugnado-se pela improcedência do presente recurso.”; (cfr., fls. 125 a 130).

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Oportunamente, juntou o Exm° Representante do Ministério Público douto Parecer, considerando que o recurso devia ser julgado improcedente.
Tem o referido Parecer o teor seguinte:
  “Vem A, de nacionalidade filipina, impugnar o despacho do Chefe do Executivo de 10/9/09 que indeferiu pedido seu de autorização de residência na RAEM, assacando-lhe, tanto quanto ousamos sintetizar, vícios de falta de fundamentação e total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários.
Cremos que, sem razão.
Desde logo, o despacho em questão anuiu a proposta do Secretário para a Segurança de 4/9/09, por sua vez de concordância com parecer técnico da mesma data, o qual, contemplando e escrutinando o argumentado em sede de audiência escrita, remete para parecer da mesma entidade de 21/5/09, o qual contém, de forma clara, suficiente e congruente, os motivos de facto e de direito que acabaram por presidir ao indeferimento registado, ficando um cidadão médio em perfeitas condições de apreender tais razões, o que não deixou de suceder com a recorrente, a avaliar pelo conteúdo da argumentação respectiva.
Depois, pese embora a união de facto alegada pela recorrente com um residente, o certo é que, tendo-se apurado ser aquela casada no país de origem, casamento não dissolvido nos termos legais, e, não tendo, à altura, ainda nascido, ou, pelo menos, sido reconhecida a paternidade da menor, B, o pedido da recorrente carecia, de facto, de substracto para a autorização almejada, nos termos da al 5) do nº 2 da Lei 4/2003, tal seja a existência de laços familiares (biológicos, legais, ou equiparados) com residente de Macau, que pudesse fazer valer.
Isto, para não fazer acrescer a eventual infracção das leis que regulam a residência e permanência na RAEM e que determinou a aplicação da medida de expulsão e interdição de entrada na mesma por parte da recorrente, matéria que, como vem sendo dado conhecimento nos autos se encontra a correr termos em processos ainda pendentes neste Tribunal.
Finalmente, sendo certo que, nos termos do artº 11º da Lei 4/2003, “O Chefe do Executivo pode, por razões humanitárias, ou em casos devidamente fundamentados, conceder a autorização de residência com dispensa dos requisitos e condições previstos na presente lei e das formalidades previstas em diploma complementar”, revela-se evidente a ampla discricionaridade em tal matéria, tratando-se de poder a ser utilizado na falência ou impossibilidade de autorização pelos meios comuns, não imputável ao recorrente e a conceder face a imperativos de cariz humanitário ou de iminente interesse público, o que, manifestamente, não opera no caso presente, revelando-se, por outra banda, no contexto apresentado, a decisão de indeferimento como correcta na perspectiva da defesa daquele interesse, designadamente no que concerne ao cumprimento e execução, quer das leis atinentes à residência e permanência na Região, quer quanto às políticas de migração na mesma, não se vendo, pois, onde ocorra a assacada desrazoabilidade da medida.”; (cfr., fls. 177 a 179).

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Cumpre decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Mostram-se assentes os seguintes factos com interesse para a decisão a proferir:
– A, ora recorrente, é natural da República das Filipinas, e detentora do Passaporte das Filipinas com o n° XXXXXXXX;
– em 22.08.2008, foi-lhe emitido o “T.I.T.N.R.” n° XXXXX/XXXX, fixando-se como prazo de validade a data de 30.04.2009;
– em 29.04.2009, e considerando o C.P.S.P. que a mesma se encontrava numa situação de clandestinidade, foi notificada para comparecer nos Serviços de Migração “a fim de tratar das formalidades necessárias no âmbito do processo de expulsão...”;
– em 30.04.2009, subscreveu a recorrente um “Pedido de Autorização Excepcional de Residência com o teor seguinte:
“Exmo. Senhor Chefe do Executivo
Pedido de Autorização Excepcional de Residência
1° Requerente:
C, solteiro, maior, de nacionalidade portuguesa, titular do Bilhete de Identidade de Residente não Permanente (BIR) de Macau n° XXXXXXX(X) emitido em 24 de Março de 2003 e válido até 24 de Março de 2013, residente na Avenida XXX, Ed. XXX, Bloco XX,XX, XX em Macau (cfr. Doc. n° 1, cópia do BIR);
2ª Requerente:
A, casada, de nacionalidade filipina, titular o passaporte da República das Filipinas n° XXXXXXXXX, residente na mesma morada do 1° Requerente (Cfr. Doc. n° 2, cópia da folha informativa do passaporte).
Vêm expor e requerer, a final, a V. Exa. o seguinte:
I. DA UNIÃO DE FACTO
1- O 1° Requerente e a 2ª Requerente vivem em condições análogas às dos cônjuges há mais de dois anos, numa relação de União de Facto, prevista no artigo 1471° do Código Civil.
2- A 2ª Requerente é, contudo, ainda, casada com outro homem, de nacionalidade filipina, que vive nas Filipinas, com quem não convive, já há mais de nove anos.
3- O casamento da 2ª Requerente ocorreu nas Filipinas, há mais de nove anos.
II. DA FILHA MENOR DOS REQUERENTES
3- Da união dos ora Requerentes nasceu, em Macau, no dia 16 de Fevereiro de 2009, uma filha, B, que conta, actualmente, dois meses e meio de idade (cfr. Doc. n°3, cópia de certidão de nascimento da menor).
4- Contudo, uma vez que a Mãe da menor e ora 2ª Requerente é casada com outro homem, não foi possível a inscrição, no assento de nascimento da menor, do nome do 1° Requerente, enquanto Pai, uma vez que, nos termos do 1685° do Código Civil, "Presume-se que o filho ou concebido na constância do matrimónio tem como pai o marido da mãe.".
5- Em virtude de tal impossibilidade, foi aberto um processo de "Afastamento da Presunção de Paternidade" a favor do marido da 2ª Requerente, que corre actualmente termos junto da Conservatória do Registo Civil de Macau (cfr. Doc. n° 4, cópia de Declaração passada pela Conservatória do Registo Civil de Macau).
6- Por cautela, e uma vez que não se sabe se será possível localizar, em tempo útil, o marido da 2ª Requerente, o 1° Requerente pediu já um "Relatório de Exame Laboratorial de Análise do DNA" a efectuar no Departamento de Ciências Forenses da Policia Judiciária, a fim de provar a filiação da menor (cfr. Doc. n° 5, cópia do Recibo de entrada do Requerimento), encontrando-se a aguardar a marcação do dia para a realização do exame.
III. DO PEDIDO EXCEPCIONAL DE RESIDÊNCIA
7- No âmbito daquele processo de "Afastamento da Presunção de Paternidade" foi já feita a prova testemunhal de que os ora Requerentes vivem voluntariamente em condições análogas às dos cônjuges há mais de dois anos.
8- Contudo, os ora Requerentes propõem-se fazer prova testemunhas do facto no âmbito do presente processo, protestando apresentar as testemunhas que deporão nesse sentido, assim que seja marcado dia e hora para o efeito.
9- Nos termos do artigo 4° da Lei n° 8/2002, a filha dos Requerentes, B, é residente da RAEM uma vez que, à data do seu nascimento, já o seu Pai, ora 1° Requerente, era titular do BIR acima identificado há mais de seis anos,
10- E a 2ª Requerente vivia em Macau ao abrigo do Título de Identificação de Trabalhador não Residente (TITNR) n° XXXXX/XXXX, com data de validade até 30 de Abril de 2009 (cfr. Doc. n° 6, Cópia do TITNR).
11- Termos em que se requer a V. Exa. a autorização de residência da 2ª Requerente para efeitos de reagrupamento do agregado familiar composto pelos dois requerentes e sua filha.
12- O presente Requerimento e o seu enquadramento a titulo de Pedido de Autorização Excepcional de Residência resulta dos seguintes factos:
13- De não ser possível, na presente data, apresentar prova bastante de que o 1° Requerente é Pai da menor, sendo certo, contudo, que todas as diligências estão a ser feitas para que tal prova seja efectuada o quanto antes;
14- Outro factor que leva a que se tenha optado pelo Pedido de Autorização Excepcional de Residência é o facto de o Título de Identificação de Trabalhador não Residente da 2ª não ser já válido e ser necessário assegurar que a mesma pode permanecer no Território da RAEM enquanto se aguarda pela presente autorização.
15- Quanto a esta questão, importa referir que no passado dia 29 de Abril de 2009, quando a 2ª Requerente se dirigiu ao Corpo de Polícia de Segurança Pública para entregar o seu Titulo de Identificação de Trabalhador não Residente, uma vez que o prazo de validade expiraria no dia seguinte, tomou conhecimento de que tal documento havia sido cancelado já há algum tempo.
16- Com efeito, o empregador da 2ª Requerente havia cancelado tal titulo sem lhe dar conhecimento do facto.
17- Até ao dia 29 de Abril de 2009 a 2ª Requerente estava convencida de que se encontrava legal na RAEM, uma vez que confiou no prazo de validade do seu Título de Identificação de Trabaihador não Residente.
18- Naquele mesmo dia 29 de Abril de 2009 a 2ª Requerente foi notificada de que "(...) em virtude de ter sido detectada em clandestinidade, deve apresentar-se neste Serviço nos dias determinados (...) a fim de tratar das formalidades necessária, no âmbito do processo de expulsão que lhe foi instaurado, em curso neste serviço.(...)" (cfr. Doc. 7, cópia da notificação).
19- Os ora Requerentes viram-se, de um momento para o outro, confrontados com a hipótese de desagregação de um lar harmonioso, com a possibilidade de tal separação não ser inferior a dois anos, caso o processo instaurado tenha procedimento e a 2ª Requerente seja, efectivamente expulsa.
20- A 2ª Requerente reitera que esteve sempre de boa fé e que nunca pretendeu ludibriar as autoridades ou permanecer ilegalmente no Território, motivo pelo qual espontânea e voluntariamente, foi apresentar o seu Título de Identificação de Trabalhador não Residente para renovação, um dia antes da sua expiração.
21- Mais se refira que em 21/04/2009 havia dado entrada junto do Gabinete para os Recursos Humanos um Requerimento para contratação da ora 2ª Requerente, e que deveria permitir a revalidação do seu Titulo de Identificação de Trabalhador não Residente (cfr. Doc. n° 8 - cópia do Recibo).
Face ao exposto, e porque de facto se encontram preenchidos os requisitos legais para que ambos os Requerentes e sua filha sejam autorizados a residir no Território, quer-se a V. Exa. seja proferido despacho nesse sentido.
Aguardam, respeitosamente, o deferimento de V. Exa., ficando aos dispor para qualquer esclarecimento adicional.
Juntam: Oito documentos
O 1° Requerente
(...)
A 2ª Requerente
(...)”;
– em 04.05.2009, e em aditamento ao pedido datado de 30.04.2009, apresentou o expediente seguinte:
“Exmo. Senhor Chefe do Executivo
Processo: Pedido de Autorização Excepcional de Residência
Assunto: Aditamento e Pedido de Autorização Especial de Permanência
C, e A, 1° Requerente e 2ª Requerentes no Pedido de Autorização Excepcional de Residência que deu entrada no passado dia 30 de Abril de 2009, cuja cópia junta para uma melhor identificação do assunto (cfr. Doc. 1), vêm requerer expor e requerer a V. Exa. o seguinte:
1- Vêm requerer a V. Exa. a junção de Cópia de Certidão de casamento da 2ª Requerente com E (cfr. Doc. 2).
2- Vem requerer a junção de cópia do M16 (cfr. Doc. 3) comprovativo dos Rendimentos sujeitos a Imposto Profissional do 1° Requerente, auferidos no âmbito do exercício da sua actividade profissional de arquitecto, e cópia do M12 (cfr. Doc. 4); comprovativo do pagamento do respectivo imposto, a fim de fazer prova da sua condição económica e da capacidade para sustentar o seu actual agregado familiar;
3- O actual agregado familiar dos Requerentes é composto pelos seguintes membros:
a) O Requerente, C e a Requerente A, que vivem um com o outro em condições análogas às dos cônjuges há mais de dois anos, numa relação de União de Facto;
b) A filha menor dos Requerentes, B, melhor identificada no processo;
c) Uma filha apenas do 1° Requerente, F, menor, nascida em XX de XX de XXXX em Pragal, Almada (cfr. Doc. 5 cópia do respectivo assento de nascimento), Portugal, titular do BIR de Macau número XXXXXXX(X) (cfr. Doc. 6, cópia do BIR), fruto de uma anterior relação que o 1° Requerente teve com a Mãe da mesma, G.
4- Mais declaram os Requerentes, sob compromisso de honra e protestando juntar as respectivas certidões de registo criminal, que não possuem quaisquer antecedentes criminais, e que a única situação que corre actualmente termos é a notificação feita à 2ª Requerente pelo Corpo de Polícia de Segurança Pública no passado dia 29 de Abril de 2009, cuja cópia foi junta como Documento 7 do Requerimento que deu entrada no dia 30 de Abril de 2009 que, contudo, não está ainda decidida e cujo esclarecimento se impõe.
5- A 2ª Requerente tem sempre trabalhado na RAEM como Ajudante Familiar e encontra-se em boas condições físicas para continuar a trabalhar, assim seja autorizada pelas autoridades competentes .
6- Mais referem os Requerentes que caso a 2ª Requerente se veja forçada a voltar para as Filipinas, não haverá condições para o 1° Requerente a acompanhar, uma vez que o seu emprego é em Macau e a situação económica das Filipinas não permitiria a obtenção de rendimentos que pudessem fazer face às despesas do agregado familiar.
7- Ainda, a expulsão da 2ª Requerente do Território implicaria uma quebra dramática do agregado familiar e a impossibilidade de acompanhamento, pelo 1° Requerente, do crescimento da sua filha, B, uma vez que, dado que a prova da paternidade não se encontra ainda feita, não poderia ficar com a mesma a seu cargo, bem como a separação das irmãs, F e B, com as inerentes consequências traumáticas para a primeira.
8- Termos em que, mais uma vez, se apela para a melhor compreensão no sentido da verificação de que, de facto, se encontram preenchidos todos os requisitos previstos no artigo 9° da Lei 4/2003, só não sendo possível fazer a prova imediata de todos os factos alegados, por impossibilidade temporária de apresentação, em tempo útil, dos competentes documentos, sendo certo que, contudo, todas as diligências possíveis para a obtenção de tais documentos estão já em curso e que os mesmos serão apresentados logo que obtidos.
9- Contudo, caso se entenda que não se encontram preenchidos todos os requisitos previstos no artigo 9° da Lei 4/2003, requer-se a V. Exa. seja dada uma autorização excepcional de residência nos termos do artigo 11° da Mesma Lei, por razões humanitárias, face à transparência do presente pedido e à evidência de que ambos os Requerentes sempre estiveram e boa fé existem de facto laços familiares e uma coabitação em condições análogas às dos cônjuges, e o 1° Requerente aufere um rendimento capaz de fazer face às despesas do agregado familiar.
10- Mais se requer a V. Exa., nos termos e para os efeitos do n° 6 do artigo 8° da Lei 4/2003, se digne autorizar especialmente a permanência da 2ª Requerente na RAEM, na pendência do Pedido de Fixação de Residência que deu entrada no passado dia 30 de Abril de 2009.
Juntam: Seis documentos
O 1° Requerente
(...)
A 2ª Requerente
(...)”;
– em 05.05.2009, apresentou ao Exm° Comandante do C.P.S.P. o expediente seguinte:
“Exmo. Senhor Comandante do Corpo de Policia de Segurança Pública
Notificação 792/2009/C.I.
A, notificada para se apresentar no Serviço de Migração no dia 4 de Maio de 2009 a de tratar das formalidades necessárias no âmbito do processo de expulsão que lhe foi instaurado virtude de lhe ter sido imputada uma situação de clandestinidade, vem expor e requerer a V. Exa. o seguinte:
1- A fim de não incorrer em Crime de Desobediência, nos termos advertidos, a ora Requerente apresenta a V. Exa. a quantia de MOP$1,200.00 (mil e duzentas Patacas), em numerário, conforme ordenado, por forma a garantir o pagamento de um bilhete de avião de regresso às Filipinas.
2- Contudo, e não se conformando com o teor na notificação recebida, vem referir que só no passado dia 29 de Abril de 2009, quando a Requerente se dirigiu ao Corpo de Polícia de Segurança Pública para entregar o seu Título de Identificação de Trabalhador não Residente, uma vez que o prazo de validade expiraria no dia seguinte, tomou conhecimento de que tal documento havia sido cancelado já há algum tempo.
3- Nunca, até àquela data, foi dado conhecimento de tal facto à Requerente.
4- Até ao dia 29 de Abril de 2009 a Requerente esteve sempre convencida de que se encontrava legal na RAEM, uma vez que confiou no prazo de validade do seu Título de Identificação de Trabalhador não Residente.
5- A Requerente esteve sempre de boa fé e que nunca pretendeu ludibriar as autoridades ou permanecer ilegalmente no Território, motivo pelo qual espontânea e voluntariamente, foi apresentar o seu Título de Identificação de Trabalhador não Residente para renovação, um dia antes da sua expiração.
6- A Requerente vive há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges, numa relação de União de Facto, com C, solteito, maior, de nacionalidade portuguesa, titular do Bilhete de Identidade de Residente não Permanente (BIR)de Macau n° XXXXXXX(X) emitido em 24 de Março de 2003 e válido até 24 de Março de 2013, residente na Avenida XX, Ed. XXX, Bloco XX, XX, X em Macau.
7- Desta união nasceu, em Macau, no dia XX de XX de XXXX, uma filha, B, que, conta, actualmente, dois meses e meio de idade.
8- Contudo, uma vez que a Mãe da menor e ora Requerente é ainda casada com outro homem, de nacionalidade filipina, que vive nas Filipinas, e com quem não convive já há mais de nove anos, não foi possível a inscrição, no assento de nascimento da menor, do nome do Pai da criança, uma vez que, nos termos do 1685° do Código Civil, "Presume-se que o filho ou concebido na constância do matrimónio tem como pai o marido da mãe.".
9- Em virtude de tal impossibilidade, foi aberto um processo de "Afastamento da Presunção de Paternidade" a favor do marido da Requerente, que corre actualmente termos junto da Conservatória do Registo Civil de Macau.
10- Por cautela, e uma vez que não se sabe se será possível localizar, em tempo útil, o marido da Requerente, o Pai da menor pediu já um "Relatório de Exame Laboratorial de Análise do DNA" a efectuar no Departamento de Ciências Forenses da Policia Judiciária, a fim de provar a filiação da menor, encontrando-se a aguardar a marcação do dia para a realização do exame.
11- Face à notificação supra identificada, a Requerente e o Pai da criança viram-se, de um momento para o outro, confrontados com a hipótese de desagregação de um lar harmonioso, com a possibilidade de tal separação não ser inferior a dois anos, caso o processo instaurado tenha procedimento e a Requerente seja, efectivamente expulsa.
12- Caso a Requerente se veja forçada a voltar para as Filipinas, não haverá condições para o Pai da criança a acompanhar, uma vez que o seu emprego é em Macau e a situação económica das Filipinas não permitiria a obtenção de rendimentos que pudessem fazer face às despesas do agregado familiar.
13- Ainda, a expulsão da Requerente do Território implicaria uma quebra dramática do agregado familiar que, adite-se, tem mais um membro, uma filha menor de C, F, e a impossibilidade de acompanhamento, pelo Pai da menor, do crescimento da sua filha, B, uma vez que, dado que a prova da paternidade não se encontra ainda feita, não poderia ficar com a mesma a seu cargo, para além da separação das irmãs, F e B, com as inerentes consequências traumáticas para a primeira.
14- Por tudo isto e porque a urgência da situação assim o impôs, no passado dia 30 de Abril de 2009 deu entrada junto do Gabinete do Chefe do Executivo um Pedido de Autorização Excepcional de Residência relativo à ora Requerente, subscrito pela mesma e pelo Pai da menor, cuja cópia se junta (cfr. Doc. 1), ao qual foi apresentado hoje, dia 4 de Maio de 2009, um Aditamento, cumulado com um Pedido de Autorização Especial de Permanência na RAEM enquanto corre termos o referido Pedido de Autorização Excepcional de Residência (cfr. Doc. 2).
15- Termos em que se apela para a melhor compreensão no sentido da verificação de que, de facto, a Requerente esteve sempre de boa fé, nunca teve a intenção de ludibriar as autoridades quanto à legalidade da sua situação da RAEM, e possui condições para que lhe seja deferida a autorização de residência, cujo pedido deu já entrada, por ser Mãe de uma residente de Macau, e por se encontrar a viver em União de Facto com um residente de Macau há já mais de dois anos.
Face ao exposto, requer a V. Exa. a suspensão do processo de expulsão em curso até que se encontrem decididos os seus Pedidos de Autorização Excepcional de Residência.
Junta: Dois documentos
(...)
A Requerente”;
– em 15.06.2009, foi a recorrente notificada do seguinte expediente:
“MIG. 165/2009/P.2.124/E
Requerentes C e A
Objecto do requerimento: Autorização de Residência
Data do requerimento: 04/05/2009
Notifico V. Ex.ª, nos termos e para os efeitos dos Art.°s 93° e 94.° do C.P.A., que Sua Ex.ª o Chefe do Executivo, por seu despacho de 1/Jun/2009, concordou com o parecer do Assessor do Gabinete do Secretário para a Segurança, sendo o sentido provável da decisão final, o indeferimento do seu pedido de autorização de residência.
A seguir se transcreve na íntegra o referido parecer:
Pedido:
É solicitada a autorização de residência a favor da requerente A, ao abrigo dos art. 9.° e ss. da Lei n.° 4/2003, para tanto invocando-se a união de facto nos termos do art.° 2°, n.° 1, 2), do RA n.° 5/2003, e a existência de uma filha menor de ambos os requerentes nascida em Macau, ou, em alternativa, a autorização excepcional de residência, por razões humanitárias, nos termos consentidos pelo art° 11° da citada Lei n.° 4/2003.
Situação:
O requerente é cidadão português, arquitecto, residente de Macau desde 2003.
A requerente é cidadã filipina, trabalhadora não residente de Agosto/2008 até Fevereiro/2009.
A requerente A mantém, formalmente, nas Filipinas, um casamento anterior não dissolvido.
Não se mostra ainda reconhecida a paternidade da menor atrás referida a favor do requerente C.2
Contra a requerente encontra-se pendente, no Departamento de Migração do CPSP, um processo de expulsão e interdição de entrada por excesso de permanência (imigração clandestina-INF.MIG 1831/2009/CI).
Análise:
Nos termos das disposições conjugadas dos art.°s 2.°, n.°1, 2), do RA n.°5/2003 e 1472.° do Código Civil, não é admitida a união de facto, para fins de autorização de residência, a favor de pessoa que mantenha um "casamento anterior não dissolvido".
O que, sendo o caso da requerente A. por si e inelutavelmente afasta a possibilidade de autorização de residência através da figura da união de facto.
Compulsado o processo de expulsão atrás referido, e em face dos factos dele constantes afigura-se-nos inevitável a expulsão da requerente, e a sua interdição de entrada por um período a determinar, o que só pode afastar-se mediante a concessão do "perdão" a que se refere o art.° 27.° da Lei n.°6/2004 quando em presença de excepcionais circunstâncias justificativas e à luz de ponderosas razões humanitárias e de interesse público.
A norma do art.° 11.° da Lei n.° 4/2003 (autorização excepcional) é, em nosso entender, aplicável quando de todo em todo inviável a "comum" autorização a que nos vimos referindo, por virtude de impossibilidade de satisfação de requisitos ou formalismos em regra não Imputável ao requerente, ou de vicissitudes de alguma forma alheias à vontade e acção do mesmo, e que não devem conduzir a uma situação de "non liquet" e quando em presença de superiores imperativos de cariz humanitário e de interesse público,
O que se não afigura ser o caso da requerente, em face dos factos atrás descritos, designadamente os que se referem ao seu estado civil e à situação de clandestinidade em que a mesma voluntariamente e culposamente se colocou, e que a nosso ver não deve enquadrar-se no quadro de excepcionalidade daquele normativo.
E isto a despeito da precária situação das crianças, e do próprio casal, que todavia não se reveste de uma tal penosidade e de um tal carácter humanitário e de interesse público que justifiquem a autorização de residência mediante o sacrifício dos requisitos e sanções estabelecidos na lei.
Conclusão/Proposta:
Por todo o exposto, somos de parecer que, com os fundamentos de facto e de direito aqui enunciados, deve indeferir-se o pedido em ambas as vertentes apresentadas pelos requerentes.
Para tanto, e caso V. Ex.ª entenda sufragar este nosso parecer, deve, a título prévio, notificar-se os requerentes para a audiência a que aludem os art.°s 93 e ss. do CPA.
Mais se notifica que poderá dizer o que se lhe oferecer, por escrito, no prazo de 10 dias, a contar do dia seguinte da presente notificação, podendo o processo ser consultado neste Serviço de Migração, todos os dias úteis, durante as horas normais de expediente.
Macau, aos 11 de Junho de 2009
CHEFE DO SERVIÇO
(...)”;
– em resposta, apresentou a recorrente o seguinte expediente:
“Exmo. Senhor
Comandante do Corpo de Polícia
de Segurança Pública de Macau
Ref.ª MIG. 165/2009/P.2.124/E
C, e A, notificados nos termos e para os efeitos dos art.°s 93.° e 94.° do C.P.A, que o Senhor Chefe do Executivo, por Despacho de 1/6/2009, concordou com o douto parecer do Assessor do Gabinete do Secretário para a Segurança, sendo o sentido provável da decisão final o indeferimento do pedido de autorização de residência, vêm oferecer por escrito o seguinte:
I. DO CASAMENTO DA REQUERENTE A
1- Confessadamente, e contra a sua vontade, a Requerente A mantém, nas Filipinas, o seu casamento anterior não dissolvido, apesar da separação de facto entre os cônjuges contar mais de nove anos.
2- Na verdade, tal casamento não se encontra ainda dissolvido porque, de acordo com a legislação da República das Filipinas, não existe a figura jurídica do Divórcio entre dois cidadãos de nacionalidade filipina.
3- Nos termos do Código Civil Filipino (CCF - Acto Republicano n° 386 de 18 de Junho de 1949, que aprova e põe em vigor o Código Civil das Filipinas), existem as figuras da anulação do casamento (artigos 80° a 91°) e da separação legal (artigos 97° e seguintes).
4- Nem a Requerente A, nem seu cônjuge se enquadram em qualquer das situações que possibilitam a anulação do casamento.
5- No que se refere á separação legal, ainda que decretada, o casamento não se dissolve, nos termos do parágrafo 1) do artigo 106 do CCF e os cônjuges passam a ter o direito a viver separados, mas os laços matrimoniais não se desfazem.
6- Acresce que, nos termos do artigo 99 do CCF, ninguém tem direito a obter a separação legal se não tiver residido nas Filipinas durante um ano antes de entregar o requerimento de separação legal, o que inviabiliza que a ora Requerente, A, possa requerer tal separação sendo certo que, ainda que o tivesse feito antes de sair das Filipinas, e a separação legal fosse decretada, o seu casamento não teria sido dissolvido.
7- Ainda, os cônjuges não podem requerer a separação legal por mútuo consentimento, nos termos do artigo 100 do CCF, uma vez que tal requerimento apenas pode ser apresentado com base em adultério ou concubinato ou atentado à vida pelo outro cônjuge, nos termos do artigo 97 do CCF.
8- Todos os artigos supra mencionados e respectivo teor podem ser vistos e transcritos no seguinte sítio da internet: http://XXX
9- Este regime da impossibilidade de dissolução do casamento não foi alterado pela Ordem Executiva n° 209, de 6 de Julho de 1987, que aprovou e pôs em vigor o Código da Família das Filipinas, cujo texto se pode encontrar, entre outros, no seguinte sitio da internet, para melhor informação e documentação:
http://XXX
10- Não obstante o rol de motivos que justificam o pedido da separação legal ter aumentado, nos termos do artigo 55° daquela Ordem Executiva continua a não ser possível pedir a separação legal por mútuo consentimento (parágrafo 4 do artigo 56°), uma vez que tal pedido só pode ser submetido com base em falta do outro cônjuge,
11- E a separação legal continua a não implicar a dissolução do casamento, cujos laços não se desfazem, nos termos do parágrafo n° 1 do artigo 63° da mesma Ordem Executiva.
12- A título exemplificativo, veja-se o "Fórum Legal" no sítio da internet que a seguir se transcreve e no qual são respondidas algumas perguntas relativamente a estas questões:
http://XXX
13- Estamos, assim, perante uma realidade diferente da do ordenamento jurídico da RAEM, que permite a dissolução voluntária do casamento através do Divórcio.
14- O regime estabelecido nos artigos 2°, n° 1 2) do Regulamento Administrativo 5/2003 e 1472° do Código Civil de Macau foi criado na base de um pressuposto que não existe no caso da ora Requerente A: a possibilidade de dissolução voluntária do casamento,
15- E nestes termos inexiste a possibilidade legal, face à legislação em vigor na República das Filipinas, de obter a dissolução do casamento da Requerente A, facto que esta não consegue contornar, ainda que o deseje.
16- O que é certo é que, face à legislação em vigor na RAEM, existem fundamentos legais para que se requeira o divórcio, uma vez que a Requerente A se encontra separada de facto do seu marido há mais de nove anos, facto cuja prova os requerentes se propõem por depoimento das testemunhas que a final identificam,
17- Realidade que se requer seja tida em conta para efeitos de se considerar que, não obstante ser essa a sua vontade e a menos que o casamento se dissolva automaticamente por decesso de um dos cônjuges, a Requerente A não poderá, pelo menos enquanto a legislação do seu país não for alterada, obter a dissolução do seu casamento, e
18- Ainda que a sua realidade factual seja igual à de tantos outros casais que vivem em comunhão conjugal de facto e que, por isso, vêm a sua situação reconhecida como passível de protecção legal,
19- Essa protecção periga não acontecer no caso concreto em virtude de factores alheios à vontade dos Requerentes e estranhos à previsão do sistema legal da RAEM, em que o regime da União de Facto assenta em pressupostos que, no caso concreto não é possível cumprir, sendo certo que tal impossibilidade não resulta de culpa ou negligência dos Requerentes,
20- Situação com a qual os Requerentes não se conformam e para a qual solicitam a melhor compreensão, uma vez que a impossibilidade de enquadramento da sua situação de facto na figura jurídica da "União de Facto" resulta de factores que lhes são alheios.
II. DA PATERNIDADE DA MENOR, B
21- O processo de "Afastamento de Presunção de Paternidade" em curso junto da Conservatória do Registo Civil de Macau encontra-se em fase de citação edital, já que a carta enviada para o marido da Requerente foi devolvida à referida Conservatória no dia 22 de Junho de 2009, conforme certidão passada pela mesma relativamente ao estado do processo (Doc. 1)
22- Não obstante, o ora Requerente, C, efectuou já o teste de DNA cujo resultado foi uma probabilidade de 99,9992232% de o mesmo ser Pai da menor B, conforme pode ler-se na cópia do Relatório de Exame Pericial que ora se junta (Doc. 2),
23- Pelo que o reconhecimento da Paternidade de C relativamente à menor B depende apenas de uma série de formalidades legais de natureza administrativa e registral, uma vez que é inexorável que tal reconhecimento seja decidido pelas autoridades competentes para o efeito, designadamente pela aplicação dos artigos 1692° do Código Civil e 211° e seguintes do Código de Registo Civil.
III. DO PROCESSO DE EXPULSÃO RELATIVO A A
24- Com o devido respeito, que é muito, a presunção de que a Requerente se colocou voluntária e culposamente em situação de clandestinidade não tem fundamento.
25- Com efeito, antes de sair da RAEM, o empregador de A disse-lhe que manteria o seu contrato de trabalho em vigor até que a autorização de trabalho da Requerente expirasse, dado que o nascimento da menor B estava para acontecer e a Requerente não estava em condições físicas de viajar,
26- Pelo que a Requerente convenceu-se de que a sua autorização de trabalho permaneceria em vigor até à data constante do Titulo de Identificação de Trabalhador não Residente,
27- Motivo pelo qual, aliás, se apresentou voluntariamente e de boa fé às autoridades de imigração no dia anterior à data em que tal título expirava.
28- Juntam (Doc.3) cópia de Declaração passada por E, antigo empregador da ora Requerente, recebida via correio electrónico cujo original protestam juntar assim que o recebam via correio postal.
29- Se a ora Requerente pretendesse colocar-se e permanecer voluntariamente numa situação de clandestinidade, com o intuito de enganar as autoridades da RAEM, não se teria exposto e ido entregar o seu Titulo de Identificação de Trabalhador não Residente no dia anterior à data em que o mesmo expiraria, apresentando-se no Corpo de Policia de Segurança Pública em 29 de Abril de 2009, para entrega desse mesmo documento.
30- A ora Requerente A esteve sempre de boa fé relativamente à legalidade da sua permanência na RAEM e nunca pretendeu ludibriar as autoridades, estando ciente de que vive num Pais que não é o seu, cuja lei e jurisdição deve e quer respeitar.
IV. DA INIMPUTABILlDADE DE CULPA OU NEGLIGÊNCIA DA REQUERENTE
31- Face aos factos supra alegados, e com o devido respeito, resta concluir que a impossibilidade de satisfação dos requisitos ou formalismos legais necessários á obtenção da autorização "comum" de residência é alheia á vontade e acção da Requerente, que esteve sempre de boa fé e actuou dentro desse espírito, nada mais podendo fazer, dentro do princípio da autonomia da sua vontade, respeitadora da lei, para por esta se pautar, como sempre foi seu apanágio.
32- Com efeito, se foi dito à Requerente que o Contrato de Trabalho vigorava até à data de validade do seu Título de Identificação de Trabalhador não Residente, esta agiu em conformidade e apresentou-se para devolução de tal título às autoridades competentes, dentro do prazo de validade do mesmo.
33- Os Requerentes não se conformam com a imputação de uma qualquer má intencionalidade ou voluntariedade quanto à situação de clandestinidade por parte da Requerente A, quando esta agiu sempre de forma transparente e convicta da legalidade da situação laboral que lhe havia sido transmitida pelo seu empregador.
V. DA EXISTÊNCIA DE MUI PONDEROSAS RAZÕES HUMANITÁRIAS E DA PROPORCIONALIDADE E FORÇA DE TAIS RAZÕES FACE À INEXISTÊNCIA DE CULPA NO NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS E, BEM ASSIM, NO QUE RESPEITA A SITUAÇAO DE CLANDESTINIDADE
34- Face aos factos expostos supra e á ausência de qualquer intencionalidade no sentido do incumprimento da lei por parte da Requerente, bem como à impossibilidade de preenchimento dos requisitos legais, alheia à vontade de ambos os Requerentes, e bem assim,
35- Face à manifesta injustiça que resultaria da não protecção de um agregado familiar que tem vivido sempre em harmonia e escrupuloso cumprimento das leis da Região, agindo de forma transparente, diligente e dentro da verdade,
36- À semelhança de tantos outros casais que vivem nas mesmas condições,
37- O sacrifício dos requisitos e sanções estabelecidos na lei apresenta-se, salvo melhor entendimento, manifestamente justificado pela ausência de culpa no não preenchimento de tais requisitos,
38- Bem como pela existência de condições de facto que, uma vez evidenciadas e conhecidas, indubitavelmente vão permitir o reagrupamento familiar dos ora Requerentes.
39- Com efeito, que má intencionalidade se pode imputar a uma cidadã filipina que, conscientemente, não prevaricou, que, conscientemente, agiu dentro da realidade dos factos que conhecia, que, conscientemente e sem receios, se apresentou ás autoridades de forma transparente e honesta, devolvendo, dentro do prazo de validade que julgava em vigor, o seu Título de Identificação de Trabalhador não Residente, sabendo que tal devolução implicaria a futura inexistência de título válido para a sua permanência na RAEM?
40- A resposta é inevitavelmente: nenhuma má intencionalidade.
41- Que justiça se servirá, ou que mal se pretende prevenir com a expulsão de uma pessoa que agiu sempre de forma transparente, julgando estar a cumprir a lei?
42- Que perigo representa para o Território da RAEM uma cidadã filipina que entrou na RAEM de forma legal e aí permaneceu sempre de forma legal, exerceu as funções para que foi contratada de forma diligente, contribuiu para a economia da RAEM pela satisfação de necessidades reais sentidas pela população residente e tem uma filha de um cidadão português residente, com quem vive em comunhão de mesa e habitação, em condições análogas ás dos cônjuges, há mais de dois anos?
43- Por outro lado, que requisitos legais, impossíveis de cumprir, sem que para isso concorra a culpa de qualquer dos Requerentes, justificam que o Requerente, Arquitecto C, se veja privado do convívio com a Requerente, Mãe de sua Filha e com quem vive há mais de dois anos como se Marido e Mulher fossem?
44- E que requisitos legais, impossíveis de cumprir sem que para isso concorra a culpa de qualquer dos Requerentes, justificam que a menor, B, se veja privada do convívio diário com um dos seus Pais?
VI. DA PARTICULAR SITUAÇÃO JURÍDlCA DA MENOR, B
45- B, a menor nascida em Macau, no dia XX de XX de XXXX, não possui ainda documento de viagem nem qualquer documento de identificação para além da certidão de nascimento, que lhe permita viajar e dar entrada na República das Filipinas.
46- Tal situação resulta do facto de não estar ainda concluído o processo de "Afastamento de Presunção de Paternidade", cujo desfecho se torna indispensável para que seja possível o registo da Paternidade a favor do ora Requerente.
47- Sendo certo que só nessa altura a menor B poderá ser reconhecida como residente da RAEM, por direito próprio, retroactivo à data do seu nascimento, e obter a documentação de viagem e de identificação a emitir pelas autoridades competentes da Região,
48- Documentação que tornará possível a saída da menor da RAEM e a respectiva entrada nas Filipinas.
49- Mais informam V. Exa. que a menor conta actualmente quatro meses de idade e ainda está em fase de amamentação, pelo que uma separação da Mãe, nesta altura, implicaria que a bébé deixasse de mamar e ficasse longe de sua Mãe por um intervalo de tempo tão crítico como o que viesse a ser estipulado em eventual despacho de expulsão e período de proibição de reentrada na Região.
50- Por último, ainda que se conseguisse a obtenção de documento suficiente que permitisse a salda da menor da Região e a sua entrada nas Filipinas, a ora Requerente não tem ninguém com quem deixar a sua Filha nas Filipinas, para poder procurar emprego e trabalhar, uma vez que não possui condições económicas que permitam providenciar para si e para sua Filha vida e alojamento condigno, saudável e suficiente e equiparável ao que possui actualmente, e respectivo sustento naquele pais, motivo pelo qual a menor não poderá deixar de permanecer em Macau, com seu Pai ora Requerente .
51- Ainda que o ora Requerente venha a suportar todas despesas de repatriamento da Requerente para a Filipinas, alojamento e sustento da Requerente e sua Filha, o que implica duplicar as despesas com dois lares, visto que terá de sustentar duas casas, tal participação não seria suficiente para dar uma vida condigna e o nível de conforto que o Requerente pretende e considera indispensável á Requerente e à Filha do casal.
CONCLUSÃO E PEDIDO
52- Face ao exposto, resta concluir que não houve nem há qualquer intencionalidade, nem tampouco negligência, por parte da Requerente A relativamente à situação de clandestinidade;
53- Não existindo, consequentemente, qualquer comportamento digno de censura ou sanção que justifique uma pena tão pesada como a expulsão da Requerente A,
54- Pelo que, com o devido respeito, consideram os Requerentes ser A merecedora da aplicação de causa de exclusão de culpabilidade e, em consequência, de não sanção ou de perdão legal.
55- Mais importa concluir que existe uma impossibilidade legal de preenchimento dos requisitos necessários ao reconhecimento de uma situação de União de Facto entre os ora Requerentes, impossibilidade essa, substantiva e adjectivamente, alheia à vontade ou capacidade de superação por parte de qualquer deles,
56- Uma vez que, de acordo com a legislação da República das Filipinas, não é possível obter a dissolução voluntária do casamento, pressuposto no qual assenta o regime dos artigos 2°, n° 1 2) do Regulamento Administrativo 5/2003 e 1472° do Código Civil de Macau.
57- À luz da legislação em vigor da RAEM, a Requerente preenche os requisitos legais necessários para obtenção do divórcio, designadamente, a separação de facto do seu marido há mais de dois anos.
58- Também à luz da legislação de Macau, caso a Requerente A pudesse apelar para o regime da separação de facto há mais de dois anos, o seu casamento poderia já estar dissolvido,
59- O que, também à luz do ordenamento jurídico da Região, viabilizaria o reconhecimento da existência de uma situação de "União de Facto" entre os ora Requerentes, que, consequentemente, seria merecedora de protecção legal.
60- A situação "de jure" e "de facto" relativa á paternidade da menor deverá ser indubitavelmente reconhecida uma vez que se encontre concluído o processo de "Afastamento de Presunção de Paternidade" em curso.
61- O teste de ADN já realizado pelo presunto Pai aponta para a probabilidade de 99,9992232% de o Requerente ser Pai da menor, B,
62- Pelo que se trata de uma série legal de diligências temporais, até que a Paternidade da menor seja declarada, sendo certo que tal declaração terá efeitos retroactivos à data do nascimento da menor, e que o reconhecimento da Paternidade permitirá o reconhecimento da qualidade de residente de Macau à menor,
63- O que, por sua vez, fará com que se encontrem preenchidos os requisitos legais necessários para que a Requerente obtenha autorização para o Reagrupamento Familiar relativamente à sua Filha residente.
Termos em que requerem a V. Exa. :
a) A aplicação de causa de exclusão de culpabilidade e, em consequência, de não sanção ou de perdão legal de A e o deferimento do pedido de autorização excepcional de residência, uma vez que o não preenchimento dos requisitos legais por parte dos Requerentes não provém de culpa ou negligência deles mas de uma impossibilidade legal e, bem assim, de formalidades de natureza administrativa que irão confirmar a realidade dos factos que, à presente data, existem, mas não estão ainda reconhecidos legalmente;
ou, em alternativa,
b) Seja a decisão relativa ao presente processo adiada para momento posterior, aguardando o presente processo a conclusão do processo de "Afastamento de Presunção de Paternidade", em curso junto da Conservatória do Registo Civil de Macau, a fim de que a menor B seja declarada Filha do ora Requerente e, consequentemente, residente da RAEM por direito próprio, por forma a que, nessa altura, possa também a ora Requerente preencher os requisitos legais necessários para o Reagrupamento Familiar com sua Filha residente e o ora Requerente.
Rol de Testemunhas
1. H de I, titular do passaporte da República das Filipinas n° - XXXXX, emitido em 02 de Abril de 2008 pelo Consulado Geral das Filipinas em Hong Kong, válido até 01 de Abril de 2013, residente na Av. XXX, Ed. XXX, XX°XX, Macau;
2. Elesea de I titular do passaporte da República das Filipinas n° - XXXXX, emitido em 07 de Setembro de 2007 pelo Consulado Geral das Filipinas em Hong Kong, válido até 07 de Setembro de 2012, residente na Av. XXX, Ed. XXX, XX°XX, Macau;
Juntam: três documentos
Os requerentes
(...)”;
– em 08.06.2009, e por despacho do Exm° Secretário para a Segurança foi indeferido o pedido apresentado em 05.05.2009 respeitante à suspensão do processo de expulsão, determinando-se a expulsão da mesma recorrente e a sua interdição de entrada por 1 ano;
– em 09.09.2009, apresentou a recorrente o seguinte expediente:
“Senhor
Chefe do Executivo
da Região Administrativa Especial de Macau
Excelência
Processo: Pedido de Autorização Excepcional de Residência
C e A, 1° Requerente e 2ª Requerente no Pedido de Autorização Excepcional de Residência que deu entrada no passado dia 30 de Abril de 2009 no Gabinete de Vossa Excelência, cuja cópia juntam para uma melhor identificação do assunto (Docs. 1 e 2), vêm, mui respeitosamente, expor e, a final, requerer a Vossa Excelência o seguinte:
1- Na ausência de qualquer decisão final referente ao supra pedido apresentado, está prevista uma data breve para que a 2ª Requerente deixe a Região Administrativa Especial de Macau;
2- Para tal, os Requerentes iniciaram diligências no sentido de obter um documento de viagem para a filha menor da 2ª Requerente, B;
3- Com esse propósito, dirigiram-se ao Consulado das Filipinas.
4- De acordo com a informação prestada, não é, de momento, possível obter o passaporte da menor B, visto que a 2ª Requerente se encontraria em situação irregular em Macau.
5- Apenas quando se encontrar em situação regular, i.e., quando tiver terminado o processo de afastamento da presunção de paternidade e, bem assim, quando a menor B seja declarada filha do 1° Requerente, poderá ser emitido um Passaporte que lhe permitirá viajar.
6- É intenção, quer do 1° Requerente, quer da 2ª Requerente, porquanto a 2ª Requerente não tem qualquer laço familiar, condições de vida ou apoio de qualquer espécie nas Filipinas, que a 2ª Requerente e a sua filha menor, B, possam passar a viver em Portugal, no período de interdição de entrada na RAEM que, eventualmente, venha a ser decretado.
7- No que toca ao processo de afastamento da presunção de paternidade, foi dado conhecimento por Certidão emitida pela Conservatória do Registo Civil (junta como Doc. n° 3), que o processo de afastamento da presunção da paternidade, que corre seus termos sob o n° 9/2009, ficará provavelmente findo dentro de 6 a 7 semanas;
8- Neste sentido, após esse curto período legal, poderá o Conservador do Registo Civil averbar ao registo de nascimento da B a paternidade do 1 ° Requerente.
9- E, em consequência, os Requerentes podem solicitar a residência da identificada menor, por direito próprio.
10- Sempre que excepcionais circunstâncias o justifiquem, pode o Chefe do Executivo, por despacho, dispensar, perdoar, atenuar ou reduzir quaisquer sanções de natureza não penal ou medidas previstas na presente lei.
11- Requerendo-se, assim, a Vossa Excelência se digne perdoar, ao abrigo do artigo 27° da Lei 6/2004, a 2ª Requerente, à luz das circunstâncias excepcionais e de ponderosas razões humanitárias, aqui expostas.
12- Os Requerentes pretendem, ainda, levar ao conhecimento de Vossa Excelência que, caso a 2ª Requerente se veja forçada a voltar para as Filipinas, não haverá condições para que o 1° Requerente a possa acompanhar e sua filha menor, uma vez que a sua actividade profissional é em Macau e a situação económica nas Filipinas não lhe permitirá a obtenção de rendimentos que possam fazer face às despesas do agregado familiar.
13- Termos em que, uma vez mais, se apela para a melhor compreensão no sentido da verificação que, de facto, se encontram preenchidos todos os requisitos previstos no artigo 9° da Lei 4/2003.
14- Contudo, caso se entenda que não se encontram preenchidos tais requisitos, requer-se a Vossa Excelência seja dada uma autorização excepcional de residência nos termos do artigo 11° da mesma Lei, por razões humanitárias, face à transparência do presente pedido e à evidência de que ambos os Requerentes sempre estiveram de boa fé, que existem de facto laços familiares e uma coabitação em condições análogas às dos cônjuges, e que o 1° Requerente aufere um rendimento capaz de fazer face às despesas de todo o agregado familiar.
15- Mais se requer a Vossa Excelência, nos termos e para os efeitos do n° 6 do artigo 8° da Lei 4/2003, se digne autorizar excepcionalmente a permanência da 2ª Requerente na RAEM, na pendência do Pedido de Fixação de Residência que deu entrada no passado dia 30 de Abril de 2009 e, bem assim, até que a situação da menor seja regularizada, que, de acordo com a Certidão da Conservatória do Registo Civil junta como Doc. n° 3 em anexo, ocorrerá no curto prazo.
Nestes termos, requer-se a Vossa Excelência se digne:
a) Deferir o requerido em 30 de Abril de 2009, nos termos legais;
b) Deferir o pedido de perdão da pena de expulsão, ao abrigo do artigo 27° da Lei 6/2004;
Caso assim não se entenda,
c) Mandar suspender o processo de expulsão até que o processo de afastamento da Presunção de Paternidade esteja findo e, bem assim, o processo de residência da menor B, esteja concluído;
d) Deferir o pedido de autorização especial de permanência da 2ª Requerente na RAEM.
Junta: 3 documentos”
                  O 1° Requerente
                  (...)
                  A 2ª Requerente
                  (...);
– em 11.09.2009 elaborou-se o parecer seguinte:
“Assunto: Autorização de residência
Interessados: C
A
Ref.ª: Oficio n.° 7325/GCE/2009
Expulsão
Interessada: A
Ref.ª: INF MIG 1831/2009/CI
Em face do requerimento de 09/09/2009, a coberto do Oficio n.° 7325/GCE/2009, afigura-se-nos como segue:
- O pedido de residência, nas suas vertentes comum e excepcional, encontra-se instruído, com proposta de indeferimento, e remetido ao Gabinete de S. Ex.ª o Chefe do Executivo, a coberto do Oficio n.° 20090907020/GSS;
- Por despacho do Secretário para a Segurança lançado sobre a INF. MIG 1831/2009/CI foi determinada a expulsão da interessada A e a sua interdição de entrada em Macau pelo período de 1 ano;
- O despacho atrás referido ainda não foi executado;
- Não existe qualquer impedimento para que a interessada A cumpra, de imediato, as medidas de expulsão e interdição que lhe foram aplicadas;
- No entanto, considerando o que vem alegado no requerimento de 09/09/2009, e designadamente o envolvimento de uma menor de muito tenra idade (cujo afastamento forçado da mãe não é de todo recomendável), julgo poder V. Ex.ª, sem sacrificio, mandar suspender a execução do despacho de expulsão e interdição de entrada, e concomitantemente autorizar a permanência, até que mostre emitido o passaporte da menor B, o que deverá ocorrer até finais de Outubro de 2009.
À consideração do Exm.° Secretário para a Segurança
Gabinete do Secretário para a Segurança da Região Administrativa Especial de Macau, aos 11 de Setembro de 2009
O Assessor
(…)”;
– em sua apreciação, e em 11.09.2009, proferiu o Exm° Secretário para a Segurança o despacho seguinte:
“Concordo.
À consideração da sua Exª. o Chefe do Executivo.
(...)”;
– em 05.11.2009, e na sequência do despacho do Exm° Chefe do Executivo de 18.09.2009, proferiu o Exm° Secretário para a Segurança despacho autorizando a suspensão da execução da expulsão da ora recorrente até ao fim do mês de Novembro de 2009;
– entretanto, em 04.11.2009 elaborou-se o seguinte parecer:
“Assunto: Autorização de residência
Interessados: C
A
Atento o teor da audiência escrita apresentada pelos interessados, afigura-se-nos que a argumentação dos mesmos, por muito respeito que possa merecer, não possui a virtualidade de alterar o quadro factual, circunstancial e legal descrito no parecer de 21/05/2009 que aqui se dá por reproduzido.
Também os factos que os interessados se propõem provar, aliás conhecidos, não possuem aquela virtualidade, por isso entendendo-se dever prescindir-se da audição das testemunhas arroladas na mesma audiência.
Pelo que sugerimos dever indeferir-se o pedido nos termos e com as disposições invocadas no supracitado parecer.
À consideração do Exm.° Secretário para a Segurança
Gabinete do Secretário para a Segurança da Região Administrativa Especial de Macau, aos 4 de Setembro de 2009
   O Assessor
   (…)”;
– em apreciação, proferiu o Secretário para a Segurança despacho concordando com o proposto e colocando o assunto à consideração do Exm° Chefe do Executivo;
– e em 10.09.2009, proferiu o Chefe do Executivo despacho, concordando com o proposto;
– o T.I.T.N.R. n° XXXXXX/XXXX, válido até 30.04.2009, foi emitido à recorrente devido ao facto de a sua contratação como “ajudante familiar” ter sido autorizada a pedido de E;
– E saiu de Macau no dia 22.02.2009, voltando a entrar no dia 15.07.2009; e,
– corre termos neste T.S.I. o Proc. n° 346/2010, respeitante ao recurso pela recorrente interposto do despacho com o qual se determinou a sua expulsão de Macau.

Do direito

3. Feito que está o relatório que antecede e elencada a factualidade considerada assente e relevante à decisão a proferir, vejamos se tem a recorrente razão.

— Mostra-se porém adequado aqui deixar duas notas prévias.

A primeira, para esclarecer que a decisão recorrida do Exm° Chefe do Executivo é a datada de “10.09.2009”, e não de “24.09.2009”, como, certamente por lapso, fez a recorrente constar nas suas alegações.

A segunda, para dizer que relevo não tem a “questão prévia” colocada na resposta da entidade recorrida, pois que no processo aí referido – n° 831/2009 – foi já julgada extinta a instância; (cfr., fls. 97), nada parecendo assim obstar o conhecimento do presente recurso.

— Clarificados estes aspectos, vejamos.

Pede a recorrente que seja “proferido Acórdão anulando e revogando o Despacho recorrido e determinando a prática de um outro, que defira a concessão da autorização de residência ao abrigo da Lei n.° 4/2003 de 17 de Março de 2003, bem como o Reagrupamento Familiar que permite a concessão da mesma Autorização de Residência, à luz, designadamente, dos artigos 9° a 11° da referida Lei n.° 4/2003”.

Antes de mais, e atento o preceituado no art. 20° do C.P.A.C. e ao “princípio da separação de poderes”, óbvio é que não se pode atender ao pedido no sentido de se determinar, no âmbito deste processo, a prática de acto administrativo que conceda à recorrente a pretendida autorização de residência, sendo pois de se rejeitar o recurso na parte em questão.

— Assim, vejamos se motivos existem para se anular o acto recorrido, a saber, o despacho do Exm° Chefe do Executivo de 10.09.2009 que indeferiu o(s) pedido(s) de autorização de residência em Macau pela recorrente deduzido(s).

Pois bem, como razões para a pedida anulação, invoca a recorrente a “falta de fundamentação” da decisão recorrida assim como a “desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários”.

Comecemos pela alegada “falta de fundamentação”.

Sobre a questão da “falta de fundamentação de um acto administrativo” tem este T.S.I. entendido que:
– “A fundamentação, ao servir para enunciar as razões de facto e de direito que levaram o autor do acto a praticá-lo com certo conteúdo, encobre duas exigências de natureza diferente: a exigência de o órgão administrativo justificar a decisão, identificando a situação real ocorrida, subsumindo-a na previsão legal e tirando a respectiva consequência e uma outra exigência, nas decisões discricionárias, de motivar a decisão, ou seja, explicar a escolha da medida adoptada, de forma a compreender-se quais foram os interesses e os factores considerados na opção tomada.” (cfr., v.g., o Ac. de 21.09.2006, Proc. n° 201/2004);
– “A fundamentação de um acto administrativo é uma exigência flexível e necessariamente adaptável às circunstâncias do acto em causa, nomeadamente, ao tipo e natureza do acto.
Todavia, em qualquer das circunstâncias, tem de ser facilmente intelegível por um destinatário dotado de um mediana capacidade de apreensão e normalmente atento” (cfr., v.g., o Ac. de 08.02.2007, Proc. n° 296/2006); e que,
– “É admissível exprimir uma fundamentação por referência, feita com remissão, mesmo parcial até essencialmente, expressa e inequívoca, de concordância acolhe as razões informadas que passam a constituir parte integrante do acto, nos termos do artigo 115º nº 1 do CPA.
Para a insuficiência da fundamentação equivaler à falta (absoluta) de fundamentação), é preciso ser manifesta a insuficiência, no sentido de ser tal que fiquem por determinar os factos ou as considerações que levaram o órgão a agir ou a tomar aquela decisão, ou então, que resulte evidente que o agente não realizou um exame sério e imparcial dos factos e das disposições legais, por não ter tomado em conta interesses necessariamente implicados.” (cfr., v.g., o Ac. de 02.12.2004, Proc. n° 70/2004).

Ora, no caso, tendo em conta o teor do acto recorrido, dúvidas não parece haver que o mesmo, absorveu a fundamentação exposta nas informações datadas de 11.06.2009 e 04.09.2009, atrás transcritas, onde, com clareza, se colhem os seus motivos de facto e de direito.

Com efeito, lendo-se o teor do despacho em questão assim como as mencionadas informações, evidente é que, expostos estão os motivos de facto e de direito da solução adoptada.

Pode-se (obviamente), discordar das razões aí expostas.

Porém, tal não equivale a falta de fundamentação.

Dito isto, à vista está a solução quanto à questão, sendo pois de se considerar o recurso improcedente na parte em apreciação.

Vejamos agora se é a decisão recorrida “desrazoável”.

Admitindo que sobre a questão outro entendimento possa haver, cremos porém que à recorrente não assiste razão, sendo antes de subscrever a posição pelo Exm° Magistrado do Ministério Público assumida no Parecer que se deixou transcrito.

Passa-se a (tentar) explicitar este nosso ponto de vista.

Invocando uma união de facto com um residente da R.A.E.M., assim como o nascimento de uma filha (menor), deduziu a ora recorrente por assim dizer, um “primeiro pedido” de autorização de residência, (datado de 30.04.2009).

Seguidamente, em 04.05.2009, apresentou um “segundo pedido”, (aditamento), onde, para a pretendida autorização, invoca também razões humanitárias.

Na decisão ora recorrida – que absorvendo o teor das informações de 11.06.2009 e 04.09.2009 e apreciou ambos os pedidos – ponderou-se, (em síntese), da forma seguinte:
“(...)
Nos termos das disposições conjugadas dos art.°s 2.°, n.°1, 2), do RA n.°5/2003 e 1472.° do Código Civil, não é admitida a união de facto, para fins de autorização de residência, a favor de pessoa que mantenha um "casamento anterior não dissolvido”; e que,
A norma do art.° 11.° da Lei n.° 4/2003 (autorização excepcional) é, em nosso entender, aplicável quando de todo em todo inviável a "comum" autorização a que nos vimos referindo, por virtude de impossibilidade de satisfação de requisitos ou formalismos em regra não Imputável ao requerente, ou de vicissitudes de alguma forma alheias à vontade e acção do mesmo, e que não devem conduzir a uma situação de "non liquet" e quando em presença de superiores imperativos de cariz humanitário e de interesse público,
O que se não afigura ser o caso da requerente, em face dos factos atrás descritos, designadamente os que se referem ao seu estado civil e à situação de clandestinidade em que a mesma voluntariamente e culposamente se colocou, e que a nosso ver não deve enquadrar-se no quadro de excepcionalidade daquele normativo.
E isto a despeito da precária situação das crianças, e do próprio casal, que todavia não se reveste de uma tal penosidade e de um tal carácter humanitário e de interesse público que justifiquem a autorização de residência mediante o sacrifício dos requisitos e sanções estabelecidos na lei.
Por todo o exposto, somos de parecer que, com os fundamentos de facto e de direito aqui enunciados, deve indeferir-se o pedido em ambas as vertentes apresentadas pelos requerentes.
(...)”

Ora, perante isto, e como já se deixou consignado, não vemos como considerar que houve “abuso” no exercício de poderes discricionários.

De facto, a invocada “união de facto” não releva, dado o facto de ter a recorrente um “casamento anterior não dissolvido”; (cfr., art. 2°, n° 1 e 2 do R.A. n° 5/2003 e art. 1472°, n° 1, al. b) do C.C.M.).

Por sua vez, não estando, no momento da prolação da decisão recorrida, reconhecida a paternidade da filha menor da recorrente, é também de dizer que tal circunstância em nada altera a conclusão a que se chegou.

Quanto à “autorização excepcional por motivos humanitários” – e certo sendo que nos termos do art. 11° da dita Lei n° 4/2003, “ O Chefe do Executivo pode, por razões humanitárias ou em casos excepcionais devidamente fundamentados, conceder a autorização de residência com dispensa dos requisitos e condições previstos na presente lei e das formalidades previstas em diploma complementar” – cremos que a decisão também não encerra uma “injustiça manifesta”, de forma a que possa este T.S.I. exercer a pretendida censura.

Como em sede do “princípio da proporcionalidade” tem este T.S.I. afirmado, o mesmo implica que “os meios utilizados devem situar-se numa «justa medida» em relação aos fins obtidos, impedindo-se assim a adopção de medidas desproporcionais, excessivas ou desequilibradas. Pretende-se pois saber se o custo ou o sacrifício provocado pela decisão é proporcional ao benefício com ela conseguido.”; (cfr., v.g., o Ac. de 11.03.2010, Proc. n° 756/2009).

Porém, temos também como adquirido que “A intervenção do juiz na apreciação do respeito do princípio da proporcionalidade, por parte da Administração, só deve ter lugar quando as decisões, de modo intolerável, o violem”; (cfr., vg., os Acs. do Vdo T.U.I. de 15.10.2003, Proc. n° 26/2003, de 29.06.2005, Proc. n° 15/2005 e de 06.07.2005, Proc. n° 14/2005).

Não nos parecendo ser o caso, (até mesmo porque provado não está que a recorrente se encontre numa “situação excepcional” ou de “extrema necessidade”), improcede o recurso.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, nega-se provimento ao recurso.

Custas pela recorrente com 6 UCs de taxa de justiça.

Macau, aos 14 de Outubro de 2010

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José Maria Dias Azedo Vitor Manuel CarvalhoCoelho
(Relator) (Presente)
(Magistrado do M.oP.o)
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Chan Kuong Seng
(Primeiro Juiz-Adjunto)

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João Augusto Gonçalves Gil de Oliveira
(Segundo Juiz-Adjunto)

1 Salvaguardada a rectificação que se faz nos parágrafos primeiro a terceiro das presentes alegações.
2 Corre os seus termos na Conservatória do Registo Civel o competento processo de afastamento da presunção de paternidade a favor do cônjuge da requerente A.
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Proc. 956/2009 Pág. 68

Proc. 956/2009 Pág. 1