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Processo n.º 73/2008 Data do acórdão: 2010-07-29
(Autos de recurso penal)
  Assuntos:
– redução da retribuição do trabalhador
– contravenção
– art.o 9.o, n.o 1, alínea d), do Decreto-Lei n.o 24/89/M

S U M Á R I O
O empregador deve ser punido como autor da contravenção p. e p. pelos art.os 9.o, n.o 1, alínea d), e 50.o, n.o 1, alínea d), do Decreto-Lei n.o 24/89/M, de 3 de Abril, se, na vigência deste diploma legal, tiver procedido, sem autorização da competente entidade administrativa, à alteração da estrutura de composição do salário do trabalhador, com efeitos de redução da retribuição-base mensal do trabalhador.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 73/2008
(Autos de recurso penal)
  Recorrente: Ministério Público
  Recorrida: A, Limitada
  Trabalhador ofendido: B
  Tribunal a quo: 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base
  Número do processo no Tribunal a quo: CR2-07-0016-LCT



ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Por sentença proferida pelo 2.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base a fls. 172 a 173v dos autos de contravenção laboral n.o CR2-07-0016-LCT, foi absolvida a arguida sociedade comercial “A, Limitada”, da inicialmente acusada prática de uma contravenção (por diminuição, não previamente autorizada por quem de direito, da retribuição do trabalhador) prevista e punível pelos art.os 9.o, n.o 1, alínea d), e 50.o, n.o 1, alínea d), do Decreto-Lei n.o 24/89/M, de 3 de Abril, por o respectivo Mm.o Juiz a quo entender que não obstante a provada alteração, não previamente autorizada, da estrutura de composição do salário mensal do trabalhador ofendido B desde o Primeiro de Janeiro de 2003 até 4 de Março de 2006, não podia dar por provado que este tinha passado a ganhar menos MOP$1.390,00 por mês a partir do Primeiro de Janeiro de 2003.
Inconformado com essa sentença, cujo teor se dá por aqui integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, veio o Ministério Público recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para rogar a invalidação da decisão absolutória recorrida, com consequente substituição da mesma por outra que levasse à condenação da sociedade arguida na prática da contravenção inicialmente imputada, com necessário pagamento da indemnização pecuniária ao trabalhador ofendido, já calculada nos termos do mapa de apuramento constante dos autos, sendo as seguintes conclusões tecidas na motivação do recurso apresentada a fls. 177 a 183v:
– <<[...]
1- No caso em apreço, apesar de não haver uma diminuição quantitativa da retribuição do trabalhador, o facto é que a estrutura de retribuição foi substancialmente alterada;
2- De forma a que foi registada uma alteração qualitativa da retribuição, e faz com que o salário base do trabalhador saísse reduzido;
3- Com efeito, a introdução dos novos subsídios a título de boa conduta, de licença de condução no interior de China é sempre bem vinda, na condição de que o salário base não sofra qualquer diminuição;
4- Porém, o que se passa é que a sociedade arguida “observou” formalmente a lei e violou-a materialmente;
5- No que se concerne ao subsídio de boa conduta, pela natureza das coisas, o seu pagamento está sujeito à uma condição, o que equivale por dizer que a sua efectiva atribuição não é certa, e só por mera coincidência é que o trabalhador tem vindo a recebé-lo. E caso o trabalhador não venha a recebé-lo por qualquer motivo, nunca obteria a retribuição final de montante exactamente igual àquela que ele recebia, tornando a situação uma verdadeira diminuição da retribuição.
6- Mais estranho passa-se com o subsídio de licença de condução, é que o trabalhador possuía essa qualificação desde o início do contrato e segundo o contrato inicial celebrado entre as partes, nunca a entidade patronal pagou, por única vez que seja, qualquer subsídio da mesma natureza ao trabalhador;
7- Só a partir do momento da introdução do novo sistema de retribuição é que apareceu, pela primeira vez, na vigência do contrato, tal pagamento.
8- De facto, o trabalhador nunca foi exigido qualquer prestação de serviço no interior da China.
9- Como dizia antes, é sempre bem vindo a atribuição de qualquer aditivos ao salário base, por qualquer título que seja, com a condição de não trazer influência negativa à retribuição base, sob pena de se subverter o sentido real da lei;
10- Acresce que tal atribuição é de livre vontade da entidade patronal por não estar a mesma contratualmente vinculada, não pode ser imposta.
11- Significa que a entidade patronal pode cessar o seu pagamento em qualquer momento que apetece.
12- Se permitir a introdução de alteração como àquela que foi introduzida pela sociedade, não é mais do que uma situação de fraude à lei.
13- Relativamente ao pagamento fixo de horas extraordinárias, no entendimento da sociedade arguida, a prestação de trabalho que excede oito horas de trabalho é considerado como extraordinária, o que, em princípio, é de aplaudir.
14- Entretanto, a tal prestação de trabalho extraordinário é feita de forma sistemática, reiterada e continuadamente, e sem preencher os pressupostos legais necessários.
15- Frisa-se que o trabalhador não foi previamente consultado sobre tal introdução do novo sistema de retribuição, o que significa que a entidade patronal procedeu a uma alteração unilateral das condições de trabalho, matéria que carece sempre do consentimento do trabalhador por força do contrato celebrado,
16- Assim não se sucedeu, torna-se tal procedimento violador do contrato, deve considerar como não escrita a dita alteração, uma vez se trata de uma nulidade parcial do contrato;
17- Efectivamente, uma coisa não pode ser disfarçada é que a retribuição base do trabalhador foi diminuída;
18- Acresce que a D.S.A.L. não foi previamente comunicado da situação nem muito menos deu a sua autorização necessária;
19- Daí que art° 9, nº 1. al. d) do D/L nº 24/89/M, de 3 de Abril. foi violado de forma patente>>.
Sobre o recurso, pronunciou-se a arguida no sentido de manutenção do julgado, por um conjunto de razões assim sumariadas na parte final da sua resposta de fls. 185 a 200:
– <<[…]
I. Alega o Recorrente que in casu houve uma alteração qualitativa da retribuição do trabalhador o que se traduziu na redução do salário base, tendo assim sido violado o disposto no artigo 9° nº1 alínea d) do RJRL.
II. Sucede que não houve qualquer violação da Lei.
III. A questão fulcral resume-se à resolução de interpretação do conceito de Retribuição ou Salário, para que posteriormente se possa concluir o que se entende por “diminuição de retribuição”.
IV. Retribuição ou salário, em sentido jurídico, é toda e qualquer prestação, susceptível de avaliação em dinheiro, seja qual for a sua designação ou forma de cálculo, devida em função da prestação de trabalho e fixada ou por acordo entre empregador e trabalhador, ou por regulamento ou norma convencional ou por norma legal (artigo 25,nº2 RJRL)
V. Integra quatro elementos principais: é uma prestação regular e periódica; devida em dinheiro ou em espécie; a que o trabalhador tem direito, por título contratual e normativo e que corresponde a um dever da entidade patronal; como contrapartida do seu trabalho.
VI. O salário pode integrar uma única prestação ou várias prestações que, por serem pagas pela entidade patronal e recebidas pelo trabalhador regular e continuadamente fazem parte do salário.
VII. No caso sub judice, nunca houve uma diminuição da retribuição do trabalhador, mas antes uma reestruturação da composição salarial pois o salário que, desde o início da relação laboral e até Janeiro de 2003, integrava uma única prestação no valor global de MOP$5.500.00, passou a ser estruturado de forma diversa, integrando quatro prestações, a saber: (i) MOP$4,110.00 de salário (“salary”) + (ii) MOP$ 200.00 de subsídio de comportamento (“conduct allowance”) + (iii) MOP$890.00 subsídio de trabalho extraordinário (“overtime allowance”) + (iv) MOP$300.00 subsídio de carta de condução da China (“China driver allowance”), tudo num total de MOP$ 5,500.00.
VIII. Foi esse o entendimento do Tribunal a quo ao considerar que os três subsídios faziam parte do salário mensal do trabalhador não existindo, deste modo, nenhum prejuízo económico em virtude da alteração da sua composição.
IX. O artigo 9° do RJRL, não proíbe ao empregador a reestruturação dos elementos que compõem a retribuição nem tampouco o seu sistema de pagamento, proíbe sim, a diminuição da retribuição dos trabalhadores, servindo para efeitos do que deve ser entendido por retribuição a definição do artigo 25° n° 2 do RJRL.
X. O Recorrente aceita que não houve redução salarial ao afirmar que não houve qualquer alteração da remuneração final do trabalhador.
XI. Não tem razão o Recorrente ao alegar que o pagamento do subsídio de boa conduta depende de verificação de uma condição, isto é, caso o trabalhador, em determinado mês, tivesse faltado injustificadamente ao serviço ou violasse qualquer ordens ou instruções da entidade patronal, a entidade patronal já não tinha obrigação do seu pagamento, porquanto fundamentar a violação de determinado preceito legal em meras suposições - tivesse faltado - é argumento que não poderá proceder, pois os factos comprovam que o trabalhador sempre recebeu, de modo contínuo e regular, o subsídio de boa conduta, composição fixa do seu salário, tal como decidido pelo Tribunal a quo.
XII. Quanto ao subsídio de licença de condução da RPC tal como afirmado pelo Recorrente trata-se “de um subsídio de carácter fixo” que sempre foi pago ao trabalhador apesar da “entidade patronal nunca exigiu qualquer serviço no interior da China”. A quantia de MOP$ 300.00 paga mensalmente pela sua natureza, importância e regularidade não poderá deixar de considerar-se como fazendo parte do salário.
XIII. Quanto ao subsídio de MOP$890,00 apelidado de “overtime allowance” (trabalho extraordinário), também este era pago regular e continuadamente, mas quando a entidade patronal solicitava a prestação de trabalho extraordinário por parte do trabalhador este via o seu salário acrescido, recebendo uma compensação que em nada se confunde com as MOP$890,00 que mês após mês, ano após ano, regular e continuadamente recebia como parte integrante do seu salário.
XIV. Legalmente, o “acordo entre empregador e trabalhador” é obrigatório para a fixação do salário (artigo 25, nº 2 do RJRL) e para a sua diminuição (artigo 9° alínea d) do RJRL) e não para a reestruturação da composição salarial.
XV. No caso dos autos não houve diminuição da retribuição nem fixação ab initio do salário, mas sim a introdução de um “novo sistema” de composição do salário já existente que desde que foi implementado até à cessação da relação laboral, teve como única consequência que o trabalhador recebesse a quantia de MOP$5,500.00, tal como aliás anteriormente vinha acontecendo.
XVI. A Lei é clara ao definir o conceito de salário/retribuição, pelo que somente quando a entidade patronal diminui o quantitativo global da prestação obrigatória que está a seu cargo se pode falar em violação da Lei.
XVII. A retribuição global do trabalhador nunca sofreu qualquer alteração tendo o mesmo recebido sempre a quantia de MOP$5,500.00, não tendo, por isso, sofrido qualquer prejuízo patrimonial.
XVIII. Andou bem o Tribunal a quo ao decidir como decidiu não merecendo, por isso, a douta sentença qualquer reparo>>.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer a fls. 209 a 211, pugnando pelo provimento do recurso.
Feito o exame preliminar pelo relator e corridos os vistos legais pelos dois Mm.os Juízes-Adjuntos, realizou-se a audiência de julgamento neste TSI com observância do formalismo do art.o 414.o do Código de Processo Penal de Macau.
Cumpre, pois, decidir do recurso.
II – DOS FACTOS
Para o efeito, é de relembrar, desde já, os seguintes factos já materialmente dados por provados na Primeira Instância:
– no período do Primeiro de Novembro de 1998 a 4 de Março de 2006, a sociedade arguida empregou o trabalhador B para funções de motorista, tendo ambos convencionado que o salário mensal nos primeiros três meses de período experimental seria de MOP$5.200,00, sendo cada hora de trabalho extraordinário remunerada com MOP$14,00, e que findo o período experimental, o salário mensal passaria a ser de MOP$5.500,00, sendo cada hora de trabalho extraordinário remunerada com MOP$15,00;
– a partir do Primeiro de Janeiro de 2003, a arguida dividiu o salário mensal de MOP$5.500,00 desse trabalhador em seguintes componentes:
– MOP$4.110,00 (remuneração das 208 horas mensais de trabalho);
– MOP$300,00 (subsídio para a licença de condução na China);
– MOP$890,00 (subsídio do trabalho extraordinário);
– MOP$200,00 (subsídio de comportamento) (sendo este subsídio de comportamento ou de boa conduta referido na parte da fundamentação jurídica da sentença como efectivamente provado);
– a partir de Março de 2005, a remuneração das 208 horas mensais de trabalho do mesmo trabalhador passou a ser aumentada para MOP$4.210,00;
– no dia 6 de Novembro de 2002, a arguida chegou a escrever à Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais, para comunicar a alteração da estrutura salarial do dito trabalhador, mas essa alteração não veio obter a concordância desta Direcção de Serviços.
Outrossim, o Mm.o Juiz a quo deu como não provado que o referido trabalhador, depois do Primeiro de Janeiro de 2003, tinha passado a ganhar menos MOP$1.390,00 por mês.
III – DO DIREITO
Trata-se, no fundo, de um recurso cujo objecto se prende com uma questão eminentemente de direito, traduzida em saber se a já provada alteração, empreendida pela arguida, da estrutura do salário mensal do trabalhador, acarretou diminuição da retribuição-base mensal deste.
Tendo em conta os elementos fácticos acima coligidos, e vistas as posições assumidas pelo Ministério Público recorrente e pela arguida recorrida, é de louvar aqui a seguinte análise legal e sensata das coisas já doutamente empreendida pela Digna Procuradora-Adjunta no seu judicioso parecer, como solução concreta do recurso vertente:
– < De acordo com esta norma, é proibido ao empregador diminuir a retribuição dos trabalhadores, salvo nos casos em que, procedendo autorização da Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais, haja acordo do trabalhador.
E nos termos do art° 50° nº 1, al. d) do referido diploma, a infracção ao disposto no art° 9° é punida com a multa de MOP $500 a $2500.
No caso vertente, resulta da matéria de facto provada que, depois de ser contratado pela arguida e passado o período experimental, o trabalhador B auferia um salário mensal de MOP$5,500.00, para além de retribuição pela prestação de serviço nas horas extraordinárias, a calcular por MOP$15.00 por hora.
A partir de 1 de Janeiro de 2003 e por iniciativa da arguida, a quantia de MOP$5,500.00 passou a ser composto pelas seguintes partes:
﹣ Salário mensal de MOP$4,110.00 (que foi depois aumentado para MOP$4,210.00) para prestação de 208 horas de trabalho;
﹣ Subsídio de MOP$300.00 para licença de condução da RPC; e
﹣ Subsídio de MOP$890.00 para horas extraordinárias.
Ora, do cálculo matemático das quantias acima referidas resulta desde logo uma diferença de MOP$200.00 com o montante de MOP$5,500.00, devida a um manifesto lapso pela falta de indicação na matéria de facto provada de um chamado subsídio de “boa conduta” (Conduct Allowance) que compõe também aquele montante, tal como se pode ler na fundamentação da sentença onde se refere claramente que ficou provado o pagamento deste subsídio pela entidade patronal.
[...]
Na lógica do Tribunal a quo, com o pagamento dos três subsídios acima mencionados que eram sempre componentes do salário auferido pelo trabalhador, não se demonstra o imputado pagamento faltoso de salário devido ao trabalhador no montante de MOP$1,390.00 nem que o trabalhador sofreu algum prejuízo, pelo que a arguida deve ser absolvida.
No entanto, não podemos concordar com tal entendimento.
Por um lado, é de salientar que, com aquele novo sistema de cálculo, o trabalhador em causa deixa de receber retribuição para horas extraordinárias de acordo com o tempo em que presta serviço fora do horário normal de trabalho, não obstante tenha um subsídio, fixo, para este efeito.
De acordo com o contrato vigente antes de 1 de Janeiro de 2003 o mesmo trabalhador podia auferir mais do que MOP$5,500.00, desde que fizesse horas extraordinárias.
E no novo sistema a retribuição mensal auferida pelo trabalhador não pode ir além daquela quantia, independentemente do número das horas extraordinárias em que o trabalhador presta serviço.
Constata-se na douta sentença ora recorrida que o próprio Tribunal a quo afirmou que, antes de 1 de Janeiro de 2003, o salário mensal do trabalhador era de MOP$5,500.00, para além da retribuição por horas extraordinárias.
E com o recebimento da mesma quantia, fixa em todos os meses, por parte do trabalhador, como podia admitir que este não recebeu menos do que antes?
Tal como afirma o Magistrado do MP na sua motivação do recurso, parece-nos que o pagamento de subsídio fixo para horas extraordinárias se mostra contrário à natureza da prestação de trabalho extraordinário, já que este deve ter carácter excepcional e não habitual, sendo que o correspondente valor é variável, e não fixo, a calcular conforme o número das horas extraordinárias em que o trabalhador presta efectivamente serviço para a entidade patronal.
Por outro lado, é adquirido como experiência comum que o pagamento de subsídio de boa conduta por parte da entidade patronal depende sempre da verificação de uma condição, que é exactamente a boa conduta do trabalhador, daí que o carácter condicional desse subsídio.
Concluindo, parece-nos que, verificando uma situação em que o trabalhador recebe menos do que podia receber antes, claramente está em causa uma diminuição da retribuição devida ao trabalhador.
Chama-se ainda atenção para a importância do salário para a vida da trabalhador e da sua família bem como a consequente protecção legal no sistema jurídico de Macau.
Como se sabe, o conceito de salário é definido no actº 25° do DL n° 24/89/M como “toda e qualquer prestação, susceptível de avaliação em dinheiro, seja qual for a sua designação ou forma de cálculo, devida em função da prestação de trabalho e fixada ou por acordo entre empregador e trabalhador, ou por regulamento ou norma convencional ou por norma legal”.
Tal salário tem que ser justo, em função dos serviços ou actividade laboral prestados pelo trabalhador, ou seja, o salário tem que ser proporcionado aos serviços ou actividade laboral que o trabalhador prestou.
E constitui um dos deveres do empregador pagar ao trabalhador “um salário que, dentro das exigências do bem comum, seja justo e adequado ao seu trabalho”(al. b) do n° 1 do artº 7°).
O n° 1 do art° 27° do mesmo diploma prevê que o montante de salário será fixado por acordo entre o empregador e o trabalhador, com observância dos limites estabelecidos nos usos e costumes, regulamento da empresa, convenção ou disposição legal aplicáveis.
E o art° 9° nº 1, al. d) impõe que a diminuição de retribuição deve ser feita por autorização da DSAL e com acordo do trabalhador, sob pena de ser punida.
No caso vertente, ficou ainda provado que a alteração feita pela arguida quanto à estrutura da retribuição do trabalhador não obteve a autorização da DSAL.
Daí resulta que a conduta da arguida deve ser punida>>.
Como se vê, a arguida deve ser realmente punida como autora da contravenção p. e p. pelos art.os 9.o, n.o 1, alínea d), e 50.o, n.o 1, alínea d), do Decreto-Lei n.o 24/89/M, porquanto procedeu, sem autorização da competente entidade administrativa, à alteração da estrutura de composição do salário mensal do trabalhador ofendido, com efeitos de redução da retribuição-base mensal deste, de MOP$5.500,00 para MOP$4.110,00 (no período do Primeiro de Janeiro de 2003 a Fevereiro de 2005), e de MOP$5.500,00 para MOP$4.210,00 (no período de Março de 2005 a 4 de Março de 2006).
É, pois, de passar:
– 1) a condenar a arguida como autora de uma contravenção, p. e p. pelos art.os 9.o, n.o 1, alínea d), e 50.o, n.o 1, alínea d), do Decreto-Lei n.o 24/89/M, na multa de duas mil e trezentas patacas, graduada dentro da moldura de quinhentas a duas mil e quinhentas patacas nos termos do art.o 51.o do mesmo diploma, em função do elevado grau de culpabilidade da arguida (que arquitectou tal esquema de alteração da estrutura salarial do trabalhador como forma camuflada de redução da remuneração-base mensal deste), da elevada gravidade da infracção por causa do período relativamente não curto de redução da remuneração-base mensal, e da capacidade económica da arguida como uma sociedade comercial (nota-se que embora já tenha entrado em vigor no Primeiro de Janeiro de 2009 a nova “Lei das Relações de Trabalho”, i.e., a Lei n.o 7/2008, de 18 de Agosto, revogatória inclusivamente do Decreto-Lei n.o 24/89/M, é ainda de aplicar, à luz do art.o 2.o, n.o 4, do Código Penal de Macau, o regime sancionatório desse Decreto-Lei, então vigente à data da prática da contravenção ora em questão, por o regime sancionatório consagrado na dita Lei nova se mostrar patentemente muito mais gravoso, por a mesma contravenção passar a ser punível nos termos dos art.os 10.o, alínea 5), e 85.o, n.o 1, alínea 2), da Lei nova com multa de vinte a cinquenta mil patacas);
– 2) bem como (e com considerada observância já do contraditório, pois a arguida chegou inclusivamente a responder à motivação do recurso na qual pediu o Ministério Público também a condenação dela no pagamento ao trabalhador dos montantes salariais em dívida) a condenar a arguida a pagar ao trabalhador ofendido B a soma pecuniária total de MOP$51.792,00, com juros legais desde a data do presente acórdão até ao dia em que for integral e efectivamente paga (cfr. o art.o 794.o, n.o 2, alínea b), e n.o 4, primeira parte, do vigente Código Civil), soma essa que se apura nesta sede de seguinte maneira:
– sendo de MOP$1390 (MOP$5500 – MOP$4110) o montante de redução da remuneração-base mensal respeitante ao período de trabalho do Primeiro de Janeiro de 2003 a Fevereiro de 2005, e de MOP$1290 (MOP$5500 – MOP$4210) relativo ao subsequente período de Março de 2005 a 4 de Março de 2006, então:
– em 2003: $1390 x 12 = $16680;
– em 2004: $1390 x 12 = $16680;
– em Janeiro e Fevereiro de 2005: $1390 x 2 = $2780;
– nos restantes dez meses de 2005: $1290 x 10 = $12900;
– em Janeiro e Fevereiro de 2006: $1290 x 2 = $2580;
– 1 a 4 de Março de 2006: $1290/30 x 4 = $172;
– e, no total, são MOP$51.792,00.
IV – DECISÃO
Em harmonia com o exposto, acordam em julgar provido o recurso do Ministério Público, revogando a sentença absolutória recorrida, e passando a condenar a arguida sociedade comercial “A, Limitada”, como autora de uma contravenção, p. e p. pelos art.os 9.o, n.o 1, alínea d), e 50.o, n.o 1, alínea d), do Decreto-Lei n.o 24/89/M, de 3 de Abril, na multa de duas mil e trezentas patacas, bem como a condená-la a pagar ao trabalhador ofendido B a soma pecuniária total de MOP$51.792,00 (cinquenta e um mil, setecentas e noventa e duas patacas), com juros legais desde a data do presente acórdão até o dia em que for integral e efectivamente paga.
Custas do processo nas duas Instâncias pela arguida, com seis UC de taxa de justiça na Primeira, e quatro UC de taxa de justiça nesta Segunda.
Notifique o presente acórdão ao trabalhador ofendido B.
Macau, 29 de Julho de 2010.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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José Maria Dias Azedo
(Primeiro Juiz-Adjunto)
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Lai Kin Hong
(Segundo Juiz-Adjunto)



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