Processo n.º 76/2009 Data do acórdão: 2010-11-25
Assuntos:
– prescrição do procedimento por contravenção laboral
– art.o 94.o do Código de Processo do Trabalho
– subsídio de longo serviço
– salário do trabalhador
– art.o 25.o, n.o 2, do Decreto-Lei n.o 24/89/M
S U M Á R I O
1. Como a última data referente ao não pagamento do subsídio de longo serviço ao trabalhador dos autos foi de 22 de Junho de 2006, o prazo de dois anos de prescrição do procedimento pela respectiva contravenção em questão já se completou às 24 horas do dia 22 de Junho de 2008, precisamente na véspera do dia 23 de Junho de 2008 em que vinha a arguida empregadora notificada do despacho de designação da data para o julgamento na Primeira Instância (como hipotética causa de interrupção do prazo de prescrição, a que alude inclusivamente o n.o 2 do art.o 94.o do vigente Código de Processo do Trabalho).
2. Nos autos, está provado que a arguida, a partir de Janeiro de 2000, começou a atribuir aos seus trabalhadores com funções de guarda de segurança com um ano de serviço completo o subsídio de longo serviço no valor mensal de MOP$30,00, e estipulou que nos anos subsequentes o montante mensal do subsídio ia ter aumento de MOP$30,00 por cada ano de serviço prestado.
3. O facto de ter sido a própria arguida quem estipulou a atribuição do subsídio de longo serviço (o que equivale a dizer que esse subsídio foi previsto como uma regra regulamentar criada pela arguida) já tornou esse subsídio como parte integrante do salário do trabalhador, a partir do segundo ano de prestação do serviço, sendo, assim, irrelevante a indagação sobre a veracidade do alegado facto de que esse subsídio não foi acordado pelas partes.
4. É que por força do art.o 25.o, n.o 2, do Decreto-Lei n.o 24/89/M, de 3 de Abril: “Entende-se por salário toda e qualquer prestação, susceptível de avaliação em dinheiro, seja qual for a sua designação ou forma de cálculo, devida em função da prestação de trabalho e fixada ou por acordo entre empregador e trabalhador, ou por regulamento ou norma convencional ou por norma legal”.
5. Ao ter deixado de pagar esse inicialmente estipulado subsídio, ficou a arguida correspectivamente responsável – sobretudo por disposições conjugadas do art.o 25.o, n.o 2, e do art.o 9.o, n.o 1, alínea d), do Decreto-Lei n.o 24/89/M, de 3 de Abril – pela obrigação civil de indemnizar pecuniariamente o seu trabalhador dos montantes por conta desse subsídio em falta.
O relator,
Chan Kuong Seng
Processo n.º 76/2009
(Autos de recurso penal)
Recorrente: A, Limitada
Tribunal a quo: 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base
Número do processo no Tribunal a quo: CR2-08-0014-LCT
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Por sentença proferida pelo 2.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base a fls. 224 a 226 dos autos de contravenção laboral n.o CR2-08-0014-LCT, ficou a aí melhor identificada arguida sociedade comercial “A, Limitada” condenada como autora de uma contravenção (por diminuição, não previamente autorizada por quem de direito, da retribuição do trabalhador) prevista e punível pelos art.os 9.o, n.o 1, alínea d), e 50.o, n.o 1, alínea d), do Decreto-Lei n.o 24/89/M, de 3 de Abril, respeitante a um trabalhador seu, chamado B, com condenação no pagamento a este, de MOP$7.679,00, a título de indemnização da soma de montantes do subsídio de longo serviço que a própria arguida tinha deixado, no período do Primeiro de Janeiro de 2002 a 22 de Junho de 2006, de pagar ao mesmo como parte integrante da remuneração, com juros legais desde o trânsito em julgado da decisão até integral e efectivo pagamento.
Inconformada com essa sentença, cujo teor se dá por aqui integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, veio a arguida recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para rogar a invalidação dessa decisão, com consequente substituição da mesma por outra que levasse à declaração da extinção, por já prescrição, do procedimento contravencional nos termos do art.o 94.o, n.o 1, do vigente Código de Processo do Trabalho (CPT), bem como à revogação da decisão condenatória no pagamento de montante indemnizatório do subsídio de longo serviço (cfr. o teor da motivação do recurso, a fls. 229 a 237 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso, respondeu a Digna Procuradora-Adjunta junto do Tribunal recorrido no sentido de provimento do recurso apenas na parte relativa à rogada declaração da extinção do procedimento contravencional (cfr. o teor da resposta de fls. 239 a 242 dos autos).
Subido o recurso, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer a fls. 254 a 256, pugnando pela procedência do recurso tão-só na suscitada prescrição do procedimento contravencional.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, realizou-se a audiência de julgamento neste TSI com observância do formalismo do art.o 414.o do Código de Processo Penal.
Cumpre decidir do recurso.
II – DOS FACTOS
Para o efeito, é de relembrar, de antemão, que foi dada como provada a seguinte matéria de facto na sentença recorrida:
– no período de 7 de Outubro de 1998 a 23 de Julho de 2006, o trabalhador B foi empregado pela arguida para o posto de guarda de segurança, com MOP$2.288,00 de última remuneração-base mensal (facto provado n.o 1);
– a partir de Janeiro de 2000, a arguida começou a atribuir aos guardas de segurança com um ano de serviço completo o subsídio de longo serviço no valor mensal de MOP$30,00, e estipulou que nos anos subsequentes o montante mensal do subsídio ia ter aumento de MOP$30,00 por cada ano de serviço prestado (facto provado n.o 2);
– de Janeiro a Novembro de 2000, a arguida atribuiu ao trabalhador B MOP$30,00 mensais de subsídio de longo serviço (facto provado n.o 3);
– de Janeiro a Dezembro de 2001, a arguida atribuiu ao trabalhador B MOP$60,00 mensais de subsídio de longo serviço (facto provado n.o 4);
– no período de investigação pela Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais, a arguida atribuiu, em segunda via, ao trabalhador B MOP30,00 patacas como subsídio de longo serviço não recebido por este no mês de Dezembro de 2000 (facto provado n.o 5);
– desde o Primeiro de Janeiro de 2002, a arguida cancelou o subsídio de longo serviço em relação ao trabalhador B (facto provado n.o 6).
Outrossim, do exame dos autos, este TSI verifica que:
– segundo o teor da certidão de notificação lavrada em 23 de Junho de 2008 a fl. 197 dos autos, a arguida foi notificada nesse dia, do despacho de designação da data para o julgamento.
III – DO DIREITO
A montante, a arguida defende, na sua motivação do recurso vertente, a já extinção do procedimento contravencional, nos termos do art.o 94.o, n.o 1, do CPT.
E com razão.
Na verdade, independentemente da questão de qualificação jurídica da conduta contravencional da arguida como sendo “contravenção continuada” ou não, como a última data referente ao não pagamento do subsídio de longo serviço foi de 22 de Junho de 2006 (cfr. a última parte da fundamentação e o dispositivo da sentença recorrida), o prazo de dois anos de prescrição do procedimento pela contravenção em questão já se completou – nos termos previstos no art.o 272.o, alínea c), do vigente Código Civil – às 24 horas do dia 22 de Junho de 2008, precisamente na véspera do dia 23 de Junho de 2008 em que vinha a arguida notificada do despacho de designação, pela primeira vez, da data para o julgamento na Primeira Instância (como hipotética causa de interrupção do prazo de prescrição, a que alude inclusivamente o n.o 2 do art.o 94.o do CPT).
Procede, pois, o recurso nesta primeira parte, com necessária declaração da já extinção do procedimento contravencional, nos termos previstos no art.o 94.o do CPT.
Entretanto, no tocante à remanescente fundamentação do recurso, relativa à preconizada tese de qualificação do subsídio de longo serviço como uma mera liberalidade e não parte integrante da remuneração, já não assiste razão à recorrente, porquanto, para já, essa sua posição contraria frontalmente com o conteúdo do facto provado descrito sob o n.o 2 na sentença recorrida, de acordo com o qual a partir de Janeiro de 2000, a arguida começou a atribuir aos guardas de segurança com um ano de serviço completo o subsídio de longo serviço no valor mensal de MOP$30,00, e estipulou que nos anos subsequentes o montante mensal do subsídio ia ter aumento de MOP$30,00 por cada ano de serviço prestado.
Com efeito, desse facto provado resulta claro que a atribuição desse subsídio foi estipulada pela própria arguida, pelo que não se mostra plausível qualquer tese no sentido de defender a existência de uma mera “liberalidade” por parte da empregadora, sendo irrelevante a indagação sobre a veracidade do alegado facto de que esse subsídio “não foi acordado pelas partes”.
É que por força do art.o 25.o, n.o 2, do Decreto-Lei n.o 24/89/M, de 3 de Abril: “Entende-se por salário toda e qualquer prestação, susceptível de avaliação em dinheiro, seja qual for a sua designação ou forma de cálculo, devida em função da prestação de trabalho e fixada ou por acordo entre empregador e trabalhador, ou por regulamento ou norma convencional ou por norma legal” (com sublinhado só agora posto).
O facto de ter sido a própria arguida quem estipulou a atribuição do subsídio de longo serviço (o que equivale a dizer que esse subsídio foi previsto como uma regra regulamentar criada pela arguida) já tornou esse subsídio como parte integrante do salário do trabalhador, a partir do segundo ano (inclusive) de prestação do serviço.
E ao ter cancelado a atribuição desse inicialmente estipulado subsídio, ficou a arguida correspectivamente responsável – sobretudo por disposições conjugadas do art.o 25.o, n.o 2, e do art.o 9.o, n.o 1, alínea d), do Decreto-Lei n.o 24/89/M – pela obrigação civil de indemnizar pecuniariamente o mesmo trabalhador dos montantes por conta desse subsídio em falta.
Como a declaração da extinção do procedimento contravencional não afecta, por decorrência lógica do art.o 100.o do CPT, a vida da decisão tomada na sentença recorrida a nível de arbitramento oficioso de indemnização, e estando toda a questão posta pela arguida (consistente unicamente na questão de qualificação jurídica do subsídio de longo serviço) no recurso em torno desta parte já resolvida acima concretamente, é de manter intacto o julgado já feito pela Primeira Instância em matéria de indemnização.
IV – DECISÃO
Em harmonia com o exposto, acordam em julgar parcialmente provido o recurso, declarando extinto, por prescrição, o procedimento contravencional então instaurado contra a recorrente “A, Limitada”, o que faz invalidar a sentença recorrida apenas na parte condenatória contravencional, sendo, pois, intacta a decisão aí já feita referente à indemnização civil pecuniária do trabalhador B.
Sem custas pelo procedimento contravencional nas Primeira e Segunda Instâncias.
As custas dos autos em ambas as Instâncias por causa da indemnização civil pecuniária ficam a cargo da recorrente, a calcular em função do montante global indemnizatório em que fica condenada.
Notifique o presente acórdão também ao trabalhador referido.
Macau, 25 de Novembro de 2010.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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João Augusto Gonçalves Gil de Oliveira
(Primeiro Juiz-Adjunto)
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Lai Kin Hong
(Segundo Juiz-Adjunto)
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