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Processo nº 580/2010
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Por Acórdão do T.J.B. foi A (A), com os sinais dos autos, condenado como autor de um crime de “sequestro”, p. e p. pelo art. 152° do C.P.M., na pena de 1 ano e 6 meses de prisão suspensa na sua execução pelo período de 2 anos, na condição de, no prazo de 30 dias, pagar à R.A.E.M. o montante de MOP$10,000.00, determinando-se também ao arguido a proibição de entrada nos casinos pelo (mesmo) período de 2 anos; (cfr., fls. 465-v a 466-v).

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Inconformado com o assim decidido, o arguido recorreu.
Motivou para concluir nos seguintes termos:
“I. O presente recurso vem interposto do douto Acórdão, proferido nos vertentes autos, que condenou o ora Recorrente pela prática de um crime de sequestro p.p.p. n.° 1 do art. 152° do Código Penal de Macau na pena de 1 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos contra o pagamento da quantia de MOP$10,000.00 à RAEM a título de indemnização pelos prejuízos causados na sequência dos factos dado como provados e na pena acessória de proibição de entrada nos casinos pelo período de 2 anos,
II. Cingindo-se o presente recurso, apenas e só, à parte da condenação na pena acessória de proibição de entrada nos casinos pelo período de 2 anos.
III. Dispõe o n.° 1 do art. 60° do Código Penal de Macau que: "Nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de direitos civis, profissionais ou políticos.", mas possibilita-se no entanto, no seu n.° 2 a faculdade da lei poder fazer corresponder a certos crimes a proibição do exercício de determinados direitos ou profissões.
IV. Para a aplicação das penas acessórias exige-se sempre uma ligação, por intermédio do julgador, que consiste numa referência à concreta conduta ilícita do agente, à sua culpa, às consequências do crime, às exigências de prevenção criminal, e bem assim, à determinação da medida da pena.
V. No caso concreto o Recorrente foi condenado pela prática do crime de sequestro p.p.p. art. 152° do Código Penal de Macau e, no âmbito legal não existe qualquer disposição relativamente à faculdade de se poder aplicar a proibição do exercício de determinados direitos ou profissões, nomeadamente, a proibição de entrada nos casinos.
VI. O Tribunal "a quo" violou, as normas dos art. 60° e 65° do Código Penal, uma vez que silenciou a fundamentação e bem assim, os critérios em que assentou a aplicação da pena acessória imposta ao Recorrente.
VII. Dos factos imputados ao 3° Arguido, ora Recorrente, tanto na acusação como na própria decisão não foi feita qualquer referência a qualquer comando normativo que permitisse a aplicação da pena acessória que lhe foi imposta.
VIII. Em lado algum se dispõe que pelo facto do ora Recorrente ter sido condenado pelo crime de sequestro p.p.p. art 152° do Código Penal, lhe possa ser acessoriamente aplicada a pena de proibição de entrada nos casinos.
IX. A aplicação desta pena acessória está concretamente prevista para casos de condenação por crime de usura p.p.p. art. 15° da Lei 8/96 de 22 de Julho, pelo que, sempre seria exigível uma qualquer ligação, por intermédio do julgador, que consistisse num específico conteúdo de censura do facto, por aqui se estabelecendo a sua necessária ligação à concreta conduta ilícita do agente, à sua culpa, às consequências do crime, às exigências de prevenção criminal, bem assim, à determinação da medida da pena, a qual não foi feita.
X. Não obstante inexistir qualquer correspondência legal com o crime de sequestro p.p.p. art. 152° do Código Penal, nos termos e para os efeitos do n.° 2 do art. 60 do Código Penal, Também não foi, a aplicação da referida pena acessória fundamentada, como devia, nos termos do art. 65° do Código Penal, uma vez que, o que possibilita ao juiz medir a pena concreta a aplicar (ou a não aplicar) ao agente, são os princípios gerais de determinação da mesma, entre os quais avulta o princípio da culpa, da proporcionalidade e o da humanidade.
XI. Violando-se, por esta razão, as normas dos art. 60° n.° 1 e 65° ambos do Código Penal de Macau.
XII. Nestes termos e nos demais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá ser concedido provimento ao. presente recurso e consequentemente ser revogada a pena acessória aplicada ao Recorrente.”; (cfr., fls. 481 a 486).

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Respondendo, afirma o Exm° Magistrado do Ministério Público o que segue:
“O arguido A veio interpor recurso do douto acórdão que o condenou na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos, com a condição de pagar à RAEM uma indemnização de MOP$10.000,00, ficando ainda sujeito à proibição de entrada nas salas de jogos durante o período de suspensão da execução da pena.
O arguido limita o seu recurso à "condenação na pena acessória de proibição de entrada nos casinos pelo período de 2 anos".
Alega o arguido que o Tribunal não podia aplicar-lhe uma pena acessória porque "para a aplicação destas penas acessórias exige-se sempre uma ligação, por intermédio do julgador, que consiste numa referência à concreta conduta ilícita do agente, à sua culpa, às exigências de prevenção criminal, e bem assim, à determinação da medida da pena".
Cremos que não assiste razão ao arguido.
O arguido parece confundir, neste caso concreto, pena acessória com medidas ou regras de conduta, a cumprir durante o período de suspensão da execução da pena, destinadas a facilitar a reintegração do arguido na sociedade (are 50° do CPM).
De facto ao arguido foi apenas aplicada a pena de 1 ano e 6 meses de prisão. Nenhuma pena acessória lhe foi aplicada.
Apenas o douto acórdão ao decidir suspender a execução daquela pena, impôs como condição para a suspensão o pagamento de uma quantia à RAEM, sujeitando o arguido, durante o período de suspensão da execução da pena à proibição de entrada nos casinos.
Tal decisão está legalmente prevista e fundamentada no art° 50°,n°s 1 e 2, al.b) do CPM onde se dispõe que "o tribunal pode impor ao condenado o cumprimento, pelo tempo de duração da suspensão, regras de conduta destinadas a facilitar a sua reintegração na sociedade. Nomeadamente (...) impor ao condenado que (... não frequente certos meios ou lugares".
Carece assim de razão o arguido, pelo que nenhuma censura merece o douto acórdão recorrido devendo, em consequência, negar-se provimento ao recurso e confirmar-se o douto acórdão recorrido”; (cfr., fls. 491 a 493)

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Neste T.S.I., e em douto Parecer, opina também o Exm° Representante do Ministério Público que o recurso não merece provimento, considerando o que segue:
“Acompanham-se as judiciosas considerações do Exmo colega junto da 1ª Instância que, por ocioso, nos dispensaremos de reproduzir, que atestam, plenamente, a falta de fundamento do alegado e pretendido pelo recorrente.
A confusão, pelo mesmo, entre pena acessória e regras de conduta a cumprir durante o período de suspensão de execução da pena (art° 50°, CPM) afigura-se-nos evidente, sendo que, no caso vertente, foi, manifestamente, aplicada esta última, que não aquela, razão por que o argumentado a esse propósito pelo interessado se revela inócuo
Donde, inexistindo qualquer obstáculo legal à aplicação da regra de conduta em questão, somos, sem necessidade de maiores considerações ou alongamentos, a pugnar pela manutenção do decidido, negando-se provimento ao recurso”; (cfr., fls. 508).

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Cumpre decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados os factos descritos no Acórdão recorrido – que não foram impugnados – e que aqui se dão como reproduzidos para todos os efeitos legais; (cfr., fls. 464 a 464-v).

Do direito

3. Como se consignou em sede de exame preliminar, o presente recurso apresenta-se como manifestamente improcedente, sendo por isso de rejeitar.

Passa-se a expor este nosso ponto de vista.

Constitui objecto do presente recurso o segmento decisório com o qual se determinou ao arguido a “proibição de entrada nos casinos por um período de 2 anos”.

E, como bem se afirma na Resposta e Parecer dos Exm°s Representantes do Ministério Público, incorre o recorrente em equívoco, pois que tal “proibição” não constitui, (no caso), “pena acessória”, mas sim uma “regra de conduta” a cumprir durante o período de suspensão da execução da pena de 1 ano e 6 meses de prisão que lhe foi aplicada.

De facto, nos termos do art. 50° do C.P.M.:
“1. O tribunal pode impor ao condenado o cumprimento, pelo tempo de duração da suspensão, de regras de conduta destinadas a facilitar a sua reintegração na sociedade.
2. Nomeadamente, pode o tribunal impor ao condenado que:
a) Não exerça determinadas profissões;
b) Não frequente certos meios ou lugares;
c) Não resida em certos locais;
d) Não acompanhe, aloje ou receba determinadas pessoas;
e) Não frequente certas associações ou não participe em determinadas reuniões;
f) Não tenha em seu poder objectos capazes de facilitar a prática de crimes;
g) Se apresente periodicamente perante o tribunal, o técnico de reinserção social ou entidades não policiais.
3. O tribunal pode ainda, obtido o consentimento prévio e expresso do condenado, determinar a sujeição deste a tratamento médico ou a cura em instituição adequada.
4. É correspondentemente aplicável o disposto nos n.os 2 e 3 do artigo anterior.”

Assim, sendo que ao recorrente foi suspensa a execução da dita pena de 1 ano e 6 meses de prisão, e atento o estatuído no art. 50°, n° 1 e 2 al. b) do transcrito comando legal, evidente é que legal é a decisão em causa.

Por sua vez, verdade não é que a “medida” em causa em nada se relaciona com a conduta do ora recorrente.

De facto, o crime pelo qual foi condenado ocorreu na sequência de “condutas ocorridas num casino da R.A.E.M.”, (e que integram o crime de “usura”), razoável nos parecendo assim que, a título de prevenção, se tenha decidido da maneira que se deixou consignado.

Por fim, a referida “medida” também não se mostra excessiva, sendo assim, por manifesta improcedência, de se rejeitar o presente recurso.

Decisão

4. Nos termos que se deixam expostos, e em conferência, acordam rejeitar o recurso; (cfr., art°s 409°, n° 2, al. a) e 410°, n° 1 do C.P.P.M.).

Pagará o arguido a taxa de justiça de 5 UCs, e, pela rejeição, o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n° 4 do C.P.P.M.).

Macau, aos 29 de Julho de 2010


(Relator)
José Maria Dias Azedo


(Primeiro Juiz-Adjunto)
Chan Kuong Seng


(Segundo Juiz-Adjunto)
João A. G. Gil de Oliveira



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