Processo nº 25/2011 Data: 27.01.2011
(Autos de recurso penal)
Assuntos : Liberdade condicional.
SUMÁRIO
1. A liberdade condicional é de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social.
O relator,
José Maria Dias Azedo
Processo nº 25/2011
(Autos de recurso penal)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. A, com os restantes sinais dos autos e ora preso no Estabelecimento Prisional de Coloane (E.P.C.), vem recorrer da decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, motivando para, a final, concluir, imputando (em síntese) à decisão recorrida o vício de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão” e violação do disposto no artº 56º do C.P.M.; (cfr., fls. 293 a 296 que como as que adiante se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os legais efeitos).
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Sem resposta, vieram os autos a este T.S.I..
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Em sede de vista, e em douto Parecer, considera o Exm° Representante do Ministério Público que se deve julgar improcedente o recurso; (cfr. fls. 348 a 349).
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Corridos os vistos legais dos Mmºs Juízes-Adjuntos, e nada obstando, vieram os autos à conferência.
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Passa-se a decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Flui dos autos a factualidade seguinte (com relevo para a decisão a proferir):
– por Acórdão do T.J.B. de 22.03.2002, foi A, ora recorrente, condenado como autor da prática em concurso real de 2 crimes de “sequestro”, 2 crimes de “roubo” e outros 2 de “extorsão”, fixando-se-lhe a pena única de 11 anos e 6 meses de prisão;
– o mesmo recorrente deu entrada no E.P.C. como preso preventivamente em 03.03.2001, e em 02.11.2008, cumpriu dois terços da referida pena, vindo a expiar totalmente a mesma pena em 02.09.2012;
– durante a sua reclusão, foi por 3 vezes disciplinarmente punido, em 19.05.2003, 12.12.2003 e 28.08.2008;
– se lhe vier a ser concedida a liberdade condicional, irá viver com o seu filho em Macau, possuindo perspectivas de emprego numa oficina automóvel.
Do direito
3. Insurge-se o ora recorrente contra a decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, afirmando, em síntese, que se devia considerar que reunidos estão todos os pressupostos do artº 56º do C.P.M. para que tal libertação antecipada lhe fosse concedida, imputando também à mesma o vício de “insufuciência da matéria de facto provada para a decisão”.
Vejamos.
— Quanto ao vício de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão”, e, independentemente do demais, patente é que o mesmo inexiste, pois que de uma mera leitura à decisão recorrida se conclui que nela se encontra consignada toda a matéria relevante para a boa decisão da causa.
Assim, continuemos.
— Preceitua o citado artº 56º do C.P.M. (que regula os “Pressupostos e duração” da liberdade condicional) que:
“1. O tribunal coloca o condenado a pena de prisão em liberdade condicional quando se encontrarem cumpridos dois terços da pena e no mínimo 6 meses, se:
a) For fundamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; e
b) A libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social.
2. A liberdade condicional tem duração igual ao tempo de prisão que falte cumprir, mas nunca superior a 5 anos.
3. A aplicação da liberdade condicional depende do consentimento do condenado”; (sub. nosso).
Constituem, assim, “pressupostos objectivos” ou “formais”, a condenação em pena de prisão superior a seis (6) meses e o cumprimento de dois terços da pena, num mínimo de (também) seis (6) meses; (cfr. nº 1).
“In casu”, atenta a pena única que ao recorrente foi fixada, e visto que se encontra ininterruptamente preso desde 03.03.2001, expiados estão já dois terços de tal pena, pelo que preenchidos estão os ditos pressupostos formais.
Todavia, e como é sabido, tal “circunstancialismo” não basta, já que não sendo a liberdade condicional uma medida de concessão automática, impõe-se para a sua concessão, a verificação cumulativa de outros pressupostos de natureza “material”: os previstos nas alíneas a) e b) do nº 1 do referido artº 56º.
Na verdade, e na esteira do decidido nesta Instância, a liberdade condicional “é de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir óbviamente matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social”; (cfr., v.g., os Acs. deste T.S.I. de 31.01.2002, Proc. nº 6/2002, de 18.04.2002, Proc. nº 53/2002, o de 25.01.2007, Proc. nº 11/2007, de 08.02.2007, Proc. nº 17/2007, e o de 15.02.2007, Proc. nº 10/2007).
Assim, detenhamo-nos na apreciação de tais pressupostos de natureza material.
Ponderando na factualidade atrás retratada, poder-se-á dizer que é fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, mostrando-se a pretendida liberdade condicional compatível com a defesa da ordem jurídica e paz social?
Cremos que de sentido negativo deve ser a resposta.
De facto, atenta a conduta prisional do ora recorrente, (com 3 punições disciplinares) viável não é um juízo de prognose favorável, preenchido não estando assim o pressuposto da alínea a) do n° 1 do art. 56° do C.P.M..
Por sua vez, há também que ter em conta os tipos (e as circunstâncias de cometimento) dos crime pelo qual foi o recorrente condenado e a sua repercussão na sociedade, o que equivale a dizer que não podem ser postergadas as exigências de tutela do ordenamento jurídico; (cfr., F. Dias in “ Dto Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, pág. 528 e segs.), havendo igualmente que salvaguardar a confiança e as expectativas da comunidade no que toca à validade da norma violada através do “restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada”; (cfr., F. Dias in “Temas Básicos da Doutrina Penal”, pág. 106).
Assim, em face das expostas considerações, e verificados não estando os pressupostos do art. 56°, n.° 1, al. a) e b) do C.P.M., há que confirmar a decisão recorrida.
Decisão
4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam negar provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 4 UCs.
Honorários ao Exm° Defensor no montante de MOP$800,00.
Macau, aos 27 de Janeiro de 2011
José Maria Dias Azedo (Relator)
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa
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