Processo n.º 24/2009 Data do acórdão: 2010-11-25
Assuntos:
– prescrição do procedimento por contravenção laboral
– art.o 94.o do Código de Processo do Trabalho
– subsídio de longo serviço
– salário do trabalhador
– art.o 25.o, n.o 2, do Decreto-Lei n.o 24/89/M
S U M Á R I O
1. Como a última data referente ao cancelamento da atribuição do subsídio de longo serviço aos quatro trabalhadores dos autos foi de Junho de 2006, o prazo de dois anos de prescrição do procedimento por respectivas quatro contravenções em questão já se completou antes do dia 17 de Julho de 2008 em que vinha a arguida empregadora notificada do despacho de designação da data para o julgamento na Primeira Instância (como hipotética causa de interrupção do prazo de prescrição, a que alude inclusivamente o n.o 2 do art.o 94.o do vigente Código de Processo do Trabalho).
2. Estando provado que a arguida, ao empregar os quatro trabalhadores referidos, convencionou com cada um desses que depois de perfeito um ano de prestação de serviço por cada um deles, a arguida ia atribuir MOP$30,00 por mês como subsídio de longo serviço, isto representa que a atribuição desse subsídio foi convencionada entre as duas partes empregadora e empregada, pelo que esse subsídio faz parte integrante do salário dos trabalhadores, a partir do segundo ano de serviço.
3. Ademais, por força do art.o 25.o, n.o 2, do Decreto-Lei n.o 24/89/M, de 3 de Abril: “Entende-se por salário toda e qualquer prestação, susceptível de avaliação em dinheiro, seja qual for a sua designação ou forma de cálculo, devida em função da prestação de trabalho e fixada ou por acordo entre empregador e trabalhador, ou por regulamento ou norma convencional ou por norma legal”.
4. Ao ter cancelado a atribuição desse inicialmente convencionado subsídio, ficou a arguida correspectivamente responsável – sobretudo por disposições conjugadas do art.o 25.o, n.o 2, e do art.o 9.o, n.o 1, alínea d), do Decreto-Lei n.o 24/89/M, de 3 de Abril – pela obrigação civil de indemnizar pecuniariamente os mesmos trabalhadores dos montantes por conta desse subsídio em falta.
O relator,
Chan Kuong Seng
Processo n.º 24/2009
(Autos de recurso penal)
Recorrente: A
Tribunal a quo: 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base
Número do processo no Tribunal a quo: CR2-08-0019-LCT
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Por sentença proferida pelo 2.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base a fls. 1883 a 1885 dos autos de contravenção laboral n.o CR2-08-0019-LCT, ficou a aí melhor identificada arguida sociedade comercial “A”, condenada como autora de quatro contravenções (por diminuição, não previamente autorizada por quem de direito, da retribuição do trabalhador) previstas e puníveis pelos art.os 9.o, n.o 1, alínea d), e 50.o, n.o 1, alínea d), do Decreto-Lei n.o 24/89/M, de 3 de Abril, respeitantes aos quatro trabalhadores seus, chamados B, C, D e E, com condenação no pagamento a estes, de MOP$17.170,00, MOP$8.537,10, MOP$12.424,40 e MOP$11.711,00, respectivamente, a título de indemnização da soma de montantes do subsídio de longo serviço que a própria arguida tinha deixado de pagar aos mesmos como parte integrante da remuneração inicialmente convencionada entre as duas partes empregadora e trabalhadora, com juros legais desde o trânsito em julgado da decisão até integral e efectivo pagamento.
Inconformada com essa sentença, cujo teor se dá por aqui integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, veio a arguida recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para rogar a invalidação dessa decisão, com consequente substituição da mesma por outra que levasse à declaração da extinção, por já prescrição, do procedimento contravencional nos termos do art.o 94.o, n.o 1, do vigente Código de Processo do Trabalho (CPT), bem como à revogação da decisão condenatória no pagamento de montantes indemnizatórios do subsídio de longo serviço (cfr. o teor da motivação do recurso, a fls. 1888 a 1897 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso, respondeu a Digna Delegada do Procurador junto do Tribunal recorrido no sentido de provimento do recurso apenas na parte relativa à rogada declaração da extinção do procedimento contravencional (cfr. o teor da resposta de fls. 1899 a 1901 dos autos).
Subido o recurso, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer a fls. 1915 a 1916v, pugnando pela procedência do recurso tão-só na suscitada prescrição do procedimento contravencional.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, realizou-se a audiência de julgamento neste TSI com observância do formalismo do art.o 414.o do Código de Processo Penal.
Cumpre decidir do recurso.
II – DOS FACTOS
Para o efeito, é de relembrar, de antemão, que em conformidade com a matéria de facto já julgada e dada por provada na Primeira Instância (e como tal descrita na Parte II do texto da sentença recorrida, a fls. 1883 a 1883v), ficou provado que a arguida, ao empregar os quatro trabalhadores acima referidos, convencionou com cada um desses que depois de perfeito um ano de prestação de serviço por cada um deles, a arguida ia atribuir MOP$30,00 por mês como subsídio de longo serviço (a calcular em função dos dias de prestação efectiva de trabalho no mês em consideração), subsídio mensal esse que ia ter aumento de MOP$30,00 mensais no ano seguinte, e assim sucessivamente, até ao montante máximo de MOP$300,00 mensais (cfr. o facto provado descrito sob o n.o 5, na página 2 desse texto decisório, a fl. 1883v).
Outrossim, ficou referido no facto provado descrito sob o n.o 10 (na mesma página do texto da sentença recorrida), o mês de Junho de 2006 como último mês em que a arguida tinha cancelado a atribuição do mencionado subsídio aos quatros trabalhadores em causa.
E segundo o teor da certidão de notificação lavrada em 17 de Julho de 2008 a fl. 1872 dos autos, a arguida foi notificada (na pessoa da sua representante) nesse dia, do despacho de designação da data para o julgamento.
III – DO DIREITO
A montante, a arguida defende, na sua motivação do recurso vertente, a já extinção do procedimento contravencional, nos termos do art.o 94.o, n.o 1, do CPT, e com razão.
Na verdade, independentemente da questão de qualificação da conduta contravencional da arguida como sendo “contravenção continuada” ou não, como a última data referente ao cancelamento da atribuição do subsídio de longo serviço foi de Junho de 2006, o prazo de dois anos de prescrição do procedimento por quatro contravenções em causa já se completou antes do dia 17 de Julho de 2008 em que vinha a arguida notificada do despacho de designação da data para o julgamento na Primeira Instância (como hipotética causa de interrupção do prazo de prescrição, a que alude inclusivamente o n.o 2 do art.o 94.o do CPT).
Procede, pois, o recurso nesta primeira parte, com necessária declaração da já extinção do procedimento contravencional, nos termos previstos no art.o 94.o do CPT.
Entretanto, no tocante à remanescente fundamentação do recurso, relativa à preconizada tese de qualificação do subsídio de longo serviço como uma mera liberalidade e não parte integrante da remuneração, já não assiste razão à recorrente, porquanto, para já, essa sua posição contraria frontalmente com o conteúdo do facto provado descrito sob o n.o 5 na Parte II da sentença recorrida, de acordo com o qual a arguida, ao empregar os quatro trabalhadores acima referidos, convencionou com cada um desses que depois de perfeito um ano de prestação de serviço por cada um deles, a arguida ia atribuir MOP$30,00 por mês como subsídio de longo serviço (...).
Com efeito, desse facto provado resulta claro que a atribuição desse subsídio foi convencionada entre as duas partes empregadora e empregada, pelo que não se mostra plausível qualquer tese no sentido de defender a existência de uma mera “liberalidade” por parte da empregadora a favor desses trabalhadores, ou preconizar que esse subsídio “não foi acordado pelas partes”.
Ademais, por força do art.o 25.o, n.o 2, do Decreto-Lei n.o 24/89/M, de 3 de Abril: “Entende-se por salário toda e qualquer prestação, susceptível de avaliação em dinheiro, seja qual for a sua designação ou forma de cálculo, devida em função da prestação de trabalho e fixada ou por acordo entre empregador e trabalhador, ou por regulamento ou norma convencional ou por norma legal” (com sublinhado só agora posto).
Faz realmente o subsídio de longo serviço parte integrante do salário dos acima identificados quatro trabalhadores ofendidos, a partir do segundo ano (inclusive) de prestação do serviço.
E ao ter cancelado a atribuição desse inicialmente convencionado subsídio, ficou a arguida correspectivamente responsável – sobretudo por disposições conjugadas do art.o 25.o, n.o 2, e do art.o 9.o, n.o 1, alínea d), do Decreto-Lei n.o 24/89/M, de 3 de Abril – pela obrigação civil de indemnizar pecuniariamente os mesmos trabalhadores dos montantes por conta desse subsídio em falta.
E como a declaração da extinção do procedimento contravencional não afecta, por decorrência lógica do art.o 100.o do CPT, a vida da decisão tomada na sentença recorrida a nível de arbitramento oficioso da indemnização, e estando toda a questão posta pela arguida (consistente unicamente na questão de qualificação jurídica do subsídio de longo serviço) no recurso em torno desta parte já resolvida acima concretamente, é de manter intacto o julgado já feito pela Primeira Instância no tangente à indemnização pecuniária.
IV – DECISÃO
Em harmonia com o exposto, acordam em julgar parcialmente provido o recurso, declarando extinto, por prescrição, o procedimento contravencional então instaurado contra a recorrente “A”, o que faz invalidar a sentença recorrida apenas na parte condenatória contravencional, sendo, pois, intacta a decisão aí já feita referente à indemnização civil pecuniária dos quatros trabalhadores acima identificados da recorrente.
Sem custas pelo procedimento contravencional nas Primeira e Segunda Instâncias.
As custas dos autos em ambas as Instâncias por causa da indemnização civil pecuniária ficam a cargo da recorrente, a calcular em função do montante global indemnizatório em que fica condenada.
Notifique o presente acórdão também aos quatro trabalhadores referidos.
Macau, 25 de Novembro de 2010.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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João Augusto Gonçalves Gil de Oliveira
(Primeiro Juiz-Adjunto)
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Lai Kin Hong
(Segundo Juiz-Adjunto)
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