Processo nº 691/2010
Data do Acórdão: 14ABR2011
Assuntos:
Acidente de trabalho
Presunção legal
Incapacidade temporária
Incapacidade permanente
SUMÁRIO
1. A presunção é uma operação lógica, feita pela lei ou pelo julgador que, de acordo com o vínculo de causalidade que liga uns com os outros acontecimentos, naturais ou humanos, deduz de um facto já conhecido a existência de um outro facto que não é conhecido.
2. As presunções juris tantum constituem a regra, ao passo que as presunções juris et de jure a excepção.
3. Se, decorrido o período de 24 meses a que se refere o artº 49º/1 do Decreto-Lei nº 40/95/M, persistir a incapacidade por não verificação da cura clínica, essa incapacidade ainda continua a ser tida por temporária, não se extinguindo consequentemente o direito à indemnização por incapacidade temporária.
O relator
Lai Kin Hong
Processo nº 691/2010
I
Acordam na Secção Cível e Administrativa do Tribunal de Segunda Instância da RAEM
No âmbito dos autos da acção de processo especial do trabalho (acidente de trabalho) nº CV2-08-0003-LAE, do Tribunal Judicial de Base, foi proferida a seguinte sentença:
判 決 書
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I. 敘述部份
檢察院根據1999年12月20日《司法組織綱要法》法律第9/1999號第五十六條二款九項以及《勞動訴訟法典》第四十七條之規定,代表原告人A(XXX)提起
工傷意外案的特別訴訟程序,針對
被告B保險有限公司,法人住址位於澳門XX大馬路XXX號澳門XXXX大廈XX樓。
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原告主張的主要事實理由為原告於2007年1月14日於工作時受傷,並由此引致遭受長期部份無能力,傷殘率為15%。
檢察院於2009年10月7日進行試行調解,各方當事人只能就意外的特性、侵害與意外之間的因果關係以及責任實體的認別資料達成協議。
被告不同意原告的長期部分無能力的傷殘率及暫時絕對無能力的期間,並拒絕支付由此引致的賠償。
因此,原告要求判處原告勝訴,並判處被告向原告支付澳門幣$284,816元及延遲支付所構成已到期及將到期之利息直到完全清付為止。
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已適當地傳喚被告,被告將委託訴訟代理人的授權書附入卷宗,在法定期限內呈交答辯狀。
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本院按照法定程序進行了辯論及審判之聽證。
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本院在事宜、等級及地域具有管轄權。
本案訴訟形式恰當。
雙方具有當事人資格及訴訟能力,以及具有正當性。
不存在必須依職權處理的妨礙審理事實問題的無效、抗辯或先決問題。
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II. 事實部份
經辯論及審判之聽證後,法院認定以下事實獲得證實:
C澳門股份有限公司將位於氹仔望德聖母灣C地盤的工程判給XX建築(澳門)有限公司,並由該公司將上述工程分判給YY工程(服務)有限公司,再由該公司判給ZZ裝飾工程有限公司。
從2006年11月22日起,原告受聘於上述ZZ裝飾工程有限公司,任職石膏板工人。
原告接受ZZ裝飾工程有限公司負責人的工作指令、指揮及領導,依從該公司負責人的指示及引導下工作。
於2007年1月14日約下午五時,原告按照雇主ZZ裝飾工程有限公司負責人的指示,在位於氹仔望德聖母灣C地盤內工作。
透過001100000127023號保單,C(澳門)股份有限公司將確定事實A)項所指的工程發生的工作意外所引致之賠償責任轉移予被告。
A Ré já pagou ao Autor a quantia de MP$148.200,00, enquanto montante indemnizatório correspondente a 494 dias de incapacidade temporária absoluta (ITA) e a quantia de MOP$8.283,10, a título de adiantamento para custeamento das despesas médicas derivadas do acidente de trabalho.
原告於2007年1月14日的日薪為澳門幣450元。
在確定事實D)所指的地盤內,原告在不足兩米高度的平台上工作,該平台裝有圍欄及踢腳板,當原告從設於平台中間的樓梯回到地面時,左手拿看電鑽,右手握着樓梯扶手,後因跣手從樓梯躍下,左腳足踝首先着地,導致左腳足踝骨折。
意外發生後,原告即時被送往仁伯爵綜合醫院接受治療,並須留院繼續治療。
原告的傷勢被診斷為左側距骨折併脫位。
上述意外導致原告自2007年1月15日至2009年3月3日,共779日期間,完全失去工作能力。
上述意外還導致原告往後的工作能力永遠下降,其傷殘率被評定為15%。
原告因是次工作意外使用了澳門幣$12,043.40元之醫藥費用。
原告尚未收取澳門幣$3,760.30元的醫藥費用
意外發生日,原告為48歲。
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III. 法律依據
本案涉及的為一宗工作意外引致的賠償責任。
關於工作意外的賠償制度,規範於八月十四日第40/95/M號法令的工作意外及職業病法例。
依照上述法令第三條a)項的規定 − 工作意外指在工作地點及工作時間內發生且直接或間接造成身體侵害,機能失調或疾病,並由此而引致死亡,暫時或長期無工作能力或謀生能力之意外。
除此之外,因執行勞務活動或提供僱主指定在經其同意之服務,而非在工作地點或工作時間內發生之意外亦視為工作意外。
在本案中,原告及被告均同意發生於原告身上並令其受傷的事故為一宗工作意外。
事實上,原告受聘於ZZ裝飾工程有限公司,原告按照僱主指示在氹仔C地盤內的不足兩米高的平台上工作,當原告從設於平台中間的樓梯回到地面時,因跌手從樓梯躍下而受傷,原告在工作時間因執行僱主的指示提供勞務活動而在工作地點內發生意外,以上事實切合上述法律規範的工作意外的定義,故此,此宗意外為一宗工作意外。
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確定了意外的性質,現可考慮就工作意外對原告造成的傷害引致的賠償問題。
八月十四日第40/95/M號法令第二條規定在任何行業提供服務的勞工,享有本法規所規定之對工作意外及職業病所引致之損害之彌補權。
彌補權包括特定給付及金錢給付(第二十七條)。
特定給付指在使受害人之健康、工作能力或謀生能力得以恢復,其中包括一般或專門之醫療及外科療程,包括必要之診斷及治療;藥物療理;護士護理;入住醫院;提供更新或維修假體及矯形器具;機能康復及第十四條所規定之運輸(第二十八條一款)。
金錢給付則包括:a)對絕對或部分暫時無工作能力之損害賠償;b)屬長期無能力之情況,對相應於工作能力或謀生能力下降程度之損害;c)屬死亡之情況,損害賠償及喪葬費(第四十六條)。
在本案中,已證明原告因受傷已總共使用了澳門幣$12,043.40元的醫療費用,醫療屬法律規定的特定給付,故此,原告有權獲得有關費用的補償。
由於被告已支付了澳門幣$8,283.10元的醫療費,故此,原告有權收取澳門幣$3,760.30元。
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原告還有權根據上述規定獲得金錢補償。
八月十四日第40/95/M號法令第47條的規定如下:
“一、如工作意外或職業病引致受害人之工作能力或謀生能力下降,受害人有權享有以下給付:
a) 暫時絕對無能力——相等於基本回報之三分之二之損害賠償;
b) 暫時部分無能力——相等於工作能力或謀生能力下降三分之二之損害賠償;
c)長期絕對無能力(100%之減值)——損害賠償之金額相等於:
1. 如勞工年齡小於二十五歲,每月基本回報之一百三十二倍;
2. 如勞工年齡為二十五歲或大於二十五歲而小於三十五歲,每月基本回報之一百二十倍;
3. 如勞工年齡為三十五歲或大於三十五歲而小於四十五歲,每月基本回報之一百零八倍;
4. 如勞工年齡為四十五歲或大於四十五歲而小於五十六歲,每月基本回報之九十六倍;
5. 如勞工年齡為五十六歲或大於五十六歲,每月基本回報之八十四倍;
d)長期部分無能力(小於100%之減值)——損害賠償之金額相應於遇難人如為長期絕對無能力而根據上款之規定應將款額乘以減值之百分率。
二)上款c項所規定之損害賠償以澳門幣十五萬元為下限及澳門幣四十五萬元為上限,而上款d項所規定之損害賠償以澳門幣四十五萬元為上限。
三)為第一款c項及d項規定之效力,受害人之年齡按以下方法計算:
a)屬工作意外之情況,受害人於發生工作意外之日之年齡;
b)屬職業病之情況,受害人於獲確定及明確診斷有關疾病之日之年齡。
四)在確定減值之系數時,應採用附於本法規之無能力表。
五)發生工作意外當日之工資由僱主負責。
六)第二款所規定之限額,可根據第二十八條第四款之規定調整。"
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基本回報的定義
依照上述法令第五十四條一款a)項,結合同一法令第五十四條八款的規定,如受害人於意外發生當日獲取之基本回報為其通常收取之基本回報,則以該回報為基礎計算賠償,而每月基本回報相等於每日基本回報乘三十。
原告在發生意外時,收取日薪澳門幣$450元。
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暫時絕對無能力
依據已證事實,認定原告因傷不能工作(即暫時絕對無能力)的期間為779天。
被告主張第40/95/M號法令第四十九條規定將為期超過二十四個月之暫時無能力推定為長期無能力,認為依據該法律推定,受害人應自發生意外起二十四個月期限屆滿後視為醫學上治癒,倘推定為治癒但仍存在無能力的狀況,則一概以長期部分無能力計算賠償,結論為暫時無能力的賠償最多以二十四個月的期限計算。
被告認為受害人自意外後二十四個月視為醫學上治癒,法律並沒有作出此規定或推定,相反,對於醫學上治療的定義,該法第十二條規定如下:
“為本法規之效力,當侵害或疾病完全消失時,或當顯示出儘管再予以適當治療亦不能再有進展時,視為醫學上治癒"。
因此,被告所言視原告的傷勢於二十四個月後為醫學上已治癒並不能採納。
對於第四十九條的規定,從文字上的表述,立法者只是表明超愈二十四個月的無能力,推定為具有長期無能力,因而須為受害人訂定無能力之減值系數,除此之外,並無其他。
再者,在第四十七條訂定所有無能力之給付時,對於長期絕對無能力賠償金額的上下限,立法者均有明確限制,如立法者有意限制暫時無能力之損害賠償,應該在同條文中同時作出明確限制。
故此,本院認為第四十九條只是推定受害人的傷勢超愈二十四個月時具有長期部分無能力的情況,但沒有因此限制受害人可以收取的暫時無能力的賠償。
故此,有關損害賠償應為該段暫時絕對無能力期間的基本回報乘三分之二。
由於遇言人A已收取了該494天不能上班的工資,故此,僱主尚須支付予王誠實285天不能上班的工資的賠償,即MOP$450元x 285 x 2/3 =MOP$85,500元。
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長期部份無能力
考慮到已證事實,原告於發生意外時,其年齡為48歲,在此次工作意外中被評定為具有長期絕對無能力,且依據上述法例的規定,其傷殘率(減值系數)為15%。
依據上列條文第一款c項第4點、d項以及第三款a項,有關賠償金額應為每月基本回報之九十六倍乘以減值之百分率。
基於上述公式,原告有權收取的長期無能力賠償為:MOP$450 x 30 x 96倍x 15% = MOP$194,400.00。
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上述賠償尚須附加按法定利率計算之利息,自本判決轉為確定之日起計。
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原告直接僱主為ZZ裝飾工程有限公司,其有責任對為其工作的員工作承擔第40/95/M號法令所定的補償,ZZ裝飾工程有限公司則為C(澳門)股份有取公司的地盤的其中一個分判商,後者作為委託人亦須對屬下受託人造成的損害負責(《民法典》第四百九十三條)。
由於C(澳門)股份有限公司已將賠償責任轉移予B保險有限公司,故此,應判處B保險有限公司作出賠償。
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IV. 決定
據上結論,本院裁定訴訟理由部份成立:
- 判處被告B保險有限公司支付予原告A澳門幣$283,660.30元(澳門幣$194,400元+澳門幣85,500元+澳門幣$3,760.30元)以作為支付長期部分無能力、暫時絕對無能力以及醫療費用的損害賠償,附加按法定利率計算之將來到期之利息,自本判決轉為確定之日起計,直至完全支付為止。
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由原告及被告按敗訴比例負擔本案訴訟費用,但不妨礙原告根據《法院訴訟費用制度》第二條一款g)項的規定獲豁免訴訟費用。
著令通知及作出登錄。
Não se conformando com a parte da sentença que diz respeito a uma parte da quantia, arbitrada pelo tribunal, a título da indemnização da incapacidade temporária absoluta, veio a ré recorrer concluindo que:
1ª - O nº 1 do artigo 49º do Decreto-Lei nº 40/95/M, de 14 de Agosto, prevê a conversão automática do período de Incapacidade Temporária (IT) que exceder os 24 meses em Incapacidade Permanente (IP).
2ª - O direito de indemnização por IT nasce com o acidente de trabalho e cessa com o momento da cura clínica.
3ª - A cura clínica tem-se por verificada logo após o decurso do período de 24 meses, a menos que resulte provado ser anterior.
4ª - A razão de ser do comando legal supra referido é proporcionar ao sinistrado um tratamento adequado e atempado.
5ª - Ora, é a interpretação daquele normativo propugnada pela Recorrente que se coaduna com os valores assim coroados pelo legislador, enquanto que a interpretação veiculada na douta sentença recorrida antes colide com esses mesmos valores.
6ª - O nº 1 do art. 49º do DL 40/95/M, de 14-08, corresponde ao antigo nº 1 do art. 37º do Decreto-Lei nº 78/85/M, de 10-08, diploma este que antecedeu o primeiro e que por ele foi revogado.
7ª - O nº 3 do mesmo art. 37º previa expressamente que em caso da conversão a que aludia o nº 1, o montante indemnizatório a título de IT que já houvesse sido liquidado pela entidade civilmente responsável seria deduzido do montante indemnizatório arbitrado a título de incapacidade permanente.
8ª - Tal previsão não consta da redacção em vigor porque o legislador considerou ser desnecessária uma previsão expressa, atento o seu carácter tão óbvio quanto pacífico na doutrina e jurisprudência que sobre o tema se debruçaram.
9ª - Um entendimento diverso dá origem a uma sobreposição de indemnizações despoletando uma potencial situação de enriquecimento sem causa a favor do sinistrado, com o correlativo empobrecimento da entidade civilmente responsável.
10ª - O montante indemnizatório que diz respeito a uma determinada IP depende apenas da sua gravidade, traduzindo-se num determinado coeficiente previsto na Tabela de Incapacidades em anexo ao mencionado DL 40/95/M, de 14-08.
11ª - Já o montante da indemnização a arbitrar a título de IT depende não só do grau de incapacidade, mas também do período de tempo durante o qual aquela se regista.
12ª - Embora por vias diversas, o legislador estabelece limites máximos para ambas as realidades.
13ª - Para a indemnização derivada de IP o legislador optou por limites quantificados de uma forma exacta, susceptíveis de actualização periódica.
14ª - Para a indemnização decorrente da ITA, o legislador optou, exactamente, por limites traduzidos numa moldura temporal, criando o mecanismo previsto no nº 1 do artigo 49º do DL 40/95/M, de 14-08, ou seja, por estabelecer um período máximo concreto de 24 meses quanto à duração da IT.
15ª - A parte da decisão que constitui objecto do presente recurso, viola aquele mesmo comando legal.
Nestes termos e nos mais de direito aplicável, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deve ser revogada a douta sentença na parte que constitui o objecto do presente recurso, sendo a Recorrente condenada no pagamento de uma indemnização correspondente a apenas 236 dias de incapacidade temporária absoluta para o trabalho, no valor de MOP$70.800,00 em lugar do valor de MOP$85.500,00, no qual foi condenada pela douta sentença recorrida, assim se fazendo Justiça.
Notificado o Autor ora recorrido, nos autos representado pelo Ministério, respondeu pugnando pela improcedência do recurso (vide as fls. 305 a 306v dos p. autos).
II
Foram colhidos os vistos, cumpre conhecer.
Ora, a única questão levantada pela recorrente prende-se com a interpretação do artº 49º/1 do D.L. nº 40/95/M de 14AGO.
Diz o artº 49º/1 do D.L. nº 40/95/M de 14AGO que “a incapacidade temporária por um período superior a vinte e quatro meses presume-se como permanente, devendo o médico assistente fixar o respectivo coeficiente, de acordo com a tabela de incapacidades anexa ao presente diploma”.
Para a recorrente, por força dessa norma, o nosso legislador pretende estabelecer um limite traduzido numa moldura temporal para a indemnização decorrente da incapacidade temporária, ou seja, estabelecer um período máximo concreto de 24 meses quanto à duração da incapacidade temporária.
Assim, na óptica da recorrente, ao atribuir a parte da indemnização, por causa da incapacidade temporária absoluta, que excede o período de 24 meses, a qual corresponde a 49 dias, quantificáveis em MOP$14.700,00, a sentença ora recorrida viola o artº 49º/1 do citado diploma.
Para sustentar a sua posição, a recorrente citou a jurisprudência portuguesa que preconiza a conversão automática da incapacidade temporária em incapacidade permanente, decorrido que seja o período fixado na lei.
No entanto, por razões que passemos a expor, não é de acolher a tese da recorrente essencialmente apoiada na jurisprudência portuguesa.
Antes de mais, há que reconhecer que a jurisprudência portuguesa nunca constitui jurisprudência obrigatória para os tribunais de Macau, apesar de poder ser citada a título de referência à doutrina em direito comparado com efeitos meramente persuasivos.
Por outro lado, no presente caso, há que frisar que a jurisprudência portuguesa citada pela recorrente funda-se no regime legal existente na lei portuguesa que, na matéria de acidente de trabalho, se apresente diferente do regime vigente na REAM, pelo menos nos seguintes aspectos:
1. Na matéria da conversão da incapacidade temporária em permanente, a lei portuguesa estabelece que “a incapacidade temporária converte-se em permanente decorridos 18 meses consecutivos, devendo o perito médico do tribunal reavaliar o respectivo grau de incapacidade”(cf. o artº 42/1 do D.L.nº 143/99 ), ao passo que a lei vigente na RAEM reza que “a incapacidade temporária por um período superior a vinte e quatro meses presume-se como permanente, devendo o médico assistente fixar o respectivo coeficiente, de acordo com a tabela de incapacidades anexa ao presente diploma”(cf. o artº 49º/2 do D.L. nº 40/95/M) (sub.nosso); e
2. Quanto às prestações em dinheiro como indemnização pela incapacidade permanente, a lei portuguesa estabelece, em relação aos sinistrados com incapacidade permanente absoluta ou incapacidade permanente parcial igual ou superior a 30%, uma pensão anual e vitalícia, e em relação aos sinistrados com incapacidade permanente paricial inferior a 30%, um capital de remição de uma pensão anual e vitalícia e que o direito às prestações, em ambas as modalidades, vence-se no dia seguinte ao da alta médica (cf. o artº 17º da Lei nº 100/97, que o referido decreto visa regulamentar), ao passo que face à lei vigente na RAEM, na matéria de prestações em dinheiro por incapacidade permanente, quer absoluta quer parcial, é estabelecido o pagamento de um só capital em dinheiro ao sinistrado, calculado de acordo com o grau de incapacidade de que o sinistrado fica definitivamente afectado após a cura clínica e a idade do sinistrado no momento da ocorrência do acidente, e não a idade no momento da alta clínica ou no momento em que se converte a incapacidade temporária em permanente (cf. o artº 47º/1-c) e d), 3-a) do D.L. nº 40/95/M);
Pondo a parte a questão da natureza da presunção, juris tantum ou juris et de jure, estabelecida no artº 49º/1 da lei de Macau e confrontando as modalidades de prestações em dinheiro por incapacidade permanente e as formas dos cálculos da indemnizações, especialmente as partes por nós sublinhhadas, previstas em ambas as leis, verifica-se que face à lei vigente na RAEM, a data da conversão da incapacidade temporária em permanente em nada influi na quantificação do capital de prestação em dinheiro, pois nos termos do disposto no artº 47º/1-c) e d) e 3-a) do D.L. nº 40/95/M, o tal capital é fixado de acordo com o grau de incapacidade permanente e a idade do sinistrado no momento da ocorrência do acidente.
Vistas as coisas sob outro prisma, em face da lei da RAEM, o direito do sinistrado à indemnização por perda permanente da capacidade surge com a ocorrência do acidente e vem a fixar-se no momento em que tiver sido convertida em permanente a incapacidade após a cura clínica, momento esse que, cedo ou tarde, em nada influi no cálculo do quantum da indemnização, ao contrário do que sucede no regime estabelecido na lei portuguesa, onde o quantum das prestações em dinheiro, por incapacidade permanente, quer na modalidde da pensão anual e vitalícia quer na do capital de remição da pensão, varia sempre de acordo com o momento, mais cedo ou mais tarde, em que se verifica a conversão da incapacidade temporária em permanente, pois só com a conversão se vencem as pensões ou o capital de remição das pensões (cf. o artº 17º/4 da Lei nº 100/97).
Assim, cai por terra toda a argumentação da tese da recorrente, nos termos da qual a atribuição ao sinistrado da indemnização por incapacidade temporária na parte que excede o período de 24 meses dá origem a uma sobreposição de indemnização – incapacidade temporária absoluta e incapacidade permanente parcial, o que, na sua óptica, equacionaria uma potencial situação de enriquecimento sem causa a favor do sinistrado, com o correlativo empobrecimento da entidade responsável (vide os parág.40 e 41 das alegações e os pontos 7 a 11 das conclusões do recurso), uma vez que face à lei vigente na RAEM, o cálculo do quantum das prestações em dinheiro por incapacidade permanente não fica condicionado pelo momento da conversão ou cura clínica, mas sim pelo grau da incapacidade apurado no momento da conversão ou da cura clínica.
É verdade que a indemnização por incapacidade permanente só se paga após a cura clínica e a conversão da incapacidade em permanente.
Mas é assim não porque a indemnização por incapacidade permanente é “sucessora” ou “substituta” da indemnização por incapacidade temporária, mas sim pura e simplesmente pela circunstância de somente vir a tornar-se possível a liquidação do quantum da indemnização por incapacidade permanente após a conversão e a subsequente fixação do grau da incapacidade permanente.
Assim sendo, dadas as diferenças existentes no correspectivo regime em ambas as leis, parece que não faz muito sentido debruçar-nos mais sobre os argumentos deduzidos pela recorrente nas suas alegações do recurso que, como vimos, são apoiados essencialmente na jurisprudência portuguesa tecida sobre o direito positivado não totalmente idêntico ao estabelecido na lei vigente na RAEM.
Passemos então a apurar qual é o verdadeiro sentido do artº 49º/1 do nosso Decreto-Lei nº 40/95/M.
Diz a tal norma que “a incapacidade temporária por um período superior a vinte e quatro meses presume-se como permanente, devendo o médico assistente fixar o respectivo coeficiente, de acordo com a tabela de incapacidades anexa ao presente diploma”.
Diversamente do que sucede com o artigo intitulado com a mesma epígrafe “conversão de incapacidade temporária em permanente” na lei portuguesa (artº 42º/1 do D.L.nº 143/99), onde se estabelece que a incapacidade temporária converte-se em permanente, a lei de Macau limita-se a instituir uma presunção legal de conversão.
Assim, é defensável que face à lei portuguesa a conversão será automática relativamente à natureza da incapacidade (de temporária passa a ser permanente), pois ao empregar a expressão “converte-se”, parece que o legislador português não quis deixar para o intérprete qualquer margem de liberdade para a não considerar como uma conversão ope legis com o simples decurso de 18 meses, mesmo não se verifique ainda a cura clínica.
Já não é bem assim na lei de Macau.
Pois ai está claramente estabelecida uma presunção legal, tal como a própria redacção “presume-se” indica.
Coloca-se então a questão de saber qual a natureza da presunção estabelecida no artº 49º/1 do D.L.nº 40/95/M, isto é, se juris et de jure, se juris tantum.
O Código Civil define no seu artº 342º as presunções como as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido.”.
Desenvolvendo-se essa definição legal, a presunção é uma operação lógica, feita pela lei ou pelo julgador que, de acordo com o vínculo de causalidade que liga uns com os outros acontecimentos, naturais ou humanos, deduz de um facto já conhecido a existência de um outro facto que não é conhecido.
Quando essa operação lógica é feita pela própria lei, estamos perante uma presunção legal.
Quando feita pelo tribunal, estamos perante uma presunção judicial, que é mais vulgarmente, embora não muito correctamente, conhecido em alguns sistemas por “prova indirecta”, pois para nós não se trata de um meio de prova propriamente dito, mas sim um processo lógico que proporciona indirectamnte o que se pretende provar.
No que diz respeito às presunções legais, temos as chamadas presunções juris et de jure, ou absoluta, quando a lei diz expressamente não admitir prova em contrário (cf. artº 343º/2, in fine, do Código Civil), e as denominadas presunções juris tantum, ou relativas, quando podem ser afastadas pela prova em contrário (cf. artº 343º/2, primeira parte, do Código Civil).
A propósito das presunções legais, o artº 343º/2 do Código Civil prescreve que “as presunções legais podem, todavia, ser ilididas mediante prova em contrário, excepto nos casos em que a lei proibir”.
Desse preceituado decorre que as presunções juris tantum constituem a regra, ao passo que as presunções juris et de jure a excepção.
Dito de outro modo, na falta da referência expressa da lei que se pretende proibir a produção de provas em contrário, estamos perante uma presunção juris tantum, ilidível mediante prova em contrário.
Aqui chegámos, munidos já dessas considerações doutrinárias, genéricas e abstractas, já estamos em condições para proceder à correcta interpretação do artº 49º/1 do D.L. nº 40/95/M para o esclareciemento da concreta questão que nos é colocada pela recorrente.
O artº 49º do D.L. nº 40/95/M preceitua:
(Conversão de incapacidade temporária em permanente)
1. A incapacidade temporária por um período superior a vinte e quatro meses presume-se como permanente, devendo o médico assistente fixar o respectivo coeficiente, de acordo com a tabela de incapacidades anexa ao presente diploma.
2. O coeficiente de incapacidade fica sujeito a homologação do tribunal, o qual pode prorrogar até mais doze meses o prazo previsto no número anterior, no caso de não estarem a ser prestados ao sinistrado os tratamentos clínicos e de recuperação necessários.
Da leitura do texto desse artigo o seu todo, não nos parece legítimo afirmar que a lei está a estabelecer no nº 1 uma presunção juris et de jure, pois ai não se vê nenhuma referência à proibição da produção das provas em contrário.
Nem do preceituado no seu nº 2 pode ser extraído qualquer indício dessa referência, pois o nº 2 limita-se a estabelecer a prorrogabilidade do período de tempo que funciona, na operação da presunção, como um facto conhecido a partir do qual se faz a ilação para afirmar a conversão da incapacidade.
In casu, perante a prova pericial produzida a fls.144, ficou assente que o sinistrado sofreu da incapacidade temporária absoluta durante o período compreendido entre 15JAN2007 e 03MAR2009, totalizando-se em 779 dias, é de afastar a presunção legal estabelecida no artº 49º/1 do Decreto-Lei nº 40/95/M, nos termos do qual se presume a conversão da incapacidade temporária em permanente decorridos que sejam os vinte e quatro meses.
Ou seja, durante o período de tempo que excede os vinte e quatro meses, que correspondente a quarente e nove dias, em que continuava a ser afectado de incapacidade temporária, o sinistrado ora recorrido não deixa de merecer o direito às prestações em dinheiro por incapacidade temporária correspondente a esse período de tempo, por força do disposto no artº 52º/1.
Assim, bem andou o Tribunal a quo ao decidir que são devidas as indemnizações por incapacidade temporária absoluta, durante todo o período compreendido entre 15JAN2007 e 03MAR2009, no qual o Autor estava afectado da incapacidade temporária absoluta.
Sumariando e concluindo, se, decorrido o período de 24 meses a que se refere o artº 49º/1 do Decreto-Lei nº 40/95/M, persistir a incapacidade por não verificação da cura clínica, essa incapacidade ainda continua a ser tida por temporária, não se extinguindo consequentemente o direito à indemnização por incapacidade temporária.
Improcedem assim quer as razões quer o pedido do recurso.
Tudo visto resta decidir.
III
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em conferência negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.
Notifique.
RAEM, 14ABR2011
Lai Kin Hong
Choi Mou Pan
João A. G. Gil de Oliveira
Ac. 691/2010-1