Processo nº 217/2011
(Recurso civil e laboral)
Data: 19 de Maio de 2011
ASSUNTO:
- Acidente de trabalho
SUMÁRIOS:
- Os acidentes ocorridos na ida para o local de trabalho ou no regresso deste como acidente de trabalho, só são considerados como acidente de trabalho quando for utilizado meio de transporte fornecido pelo empregador.
- No entanto, a entidade patronal pode, nos termos do artº 13º da Portaria nº 236/95/M e mediante prémio extra, incluir no seguro de acidente de trabalho a cobertura dos acidentes que possam ocorrer durante o trajecto para o local de trabalho ou no regresso deste, independentemente do meio de transporte utilizado.
- Neste caso, o direito de indemnização do sinistrado não resulta das normas do DL nº 40/95/M, mas sim da cláusula especial do contrato de seguro de acidente de trabalho.
O Relator,
Ho Wai Neng
Processo nº 217/2011
(Recurso civil e laboral)
Data: 19 de Maio de 2011
Recorrente: A
Recorrida: Companhia de Seguros de Macau, S.A.
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I – Relatório
Por sentença proferida nos presentes autos, decidiu-se julgar improcedente o pedido interposto pelo Autor A, pelo qual pede a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de MOP$107.146,70, acrescida de juros de mora, devida à Incapacidade Temporária Absoluta (ITA) resultante do acidente de trabalho.
Dessa decisão vem recorrer o Autor, patrocinado pelo MP, com fundamentos constantes a fls. 196v a 202v dos autos, cujo teor aqui se dá integralmente reproduzido1.
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A Companhia de Seguros de Macau, S.A., não contra alegou.
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Foram colhidos os vistos legais.
II – Factos
Vêm provados os factos seguintes:
a) Em 1 de Abril de 2008, o Autor começou a trabalhar para a Venetian Macau Ltd., auferindo diariamente $560.00 patacas de salário.
b) A responsabilidade da entidade patronal ao autor pela reparação de danos decorrentes de acidente de trabalho havia sido transferida, através da apólice de seguro n.º 001100001801, para a ré relativamente ao período de 1/4/2008 a 30/4/2008.
c) A R., já pagou as quantias de MOP$21.447,00 a título de despesas médicas e medicamentosas e MOP$7.093,30, a título de 19 dias de Incapacidade Temporária Absoluta (I.T.A.).
d) O autor desempenhava o cargo de técnico do departamento de obras de exposições temporárias.
e) Recebia ordens, comando e direcção de trabalho da Venetian Macau Ltd. e trabalhava sob indicação e orientação da mesma.
f) Em 9 de Abril de 2008, pelas 7:50 horas, o Autor utilizou a sua mota para se deslocar ao serviço.
g) Quando o autor circulava na Ponte da Amizade, em direcção à Taipa, indo no caminho para o serviço, perdeu o controlo da mota e tombou para o chão, sofrendo ferimentos nos joelhos, braço e palma da mão directa.
h) Após o acontecimento, o Autor continuou a conduzir a mota para se dirigir ao serviço.
i) No serviço, o Autor depois de ter posto mercúrio na ferida, começou gradualmente a sentir intensas dores que o levou a dirigir-se ao Hospital Kiang Wu para se submeter a tratamentos.
j) Em consequência do acidente, o autor sofreu fractura do rádio do lado lateral esquerdo e lesões superficiais.
k) E sofreu “incapacidade temporária absoluta” desde o dia 10 de Abril de 2008 a 9 de Fevereiro de 2009, no total de 306 dias.
III – Fundamentos
O presente recurso consiste em saber:
- se o acidente que o Autor alegou é acidente de trabalho;
- no caso negativo, se o Autor continuaria a ter o direito de ser indemnizado nos termos do contrato de seguro de acidente de trabalho; e
- no caso da resposta afirmativa da segunda, qual o montante da indemnização.
I. Da natureza do acidente:
Segundo os factos provados, o acidente ocorreu-se no caminho de ida para o serviço e o autor, na altura, andava com a sua mota.
O tribunal a quo não o considerou como acidente no trabalho, por entender que, apesar o acidente ter ocorrido na ida para o local de trabalho, o Autor não estava a utilizar o meio de transporte fornecido pela entidade patronal, mas sim mota própria, daí que não cabia no conceito de “acidente de trabalho” legalmente definido pelo artº 3º do DL nº 40/95/M, de 14 de Agosto.
Não nos parece que a qualificação em causa merece alguma censura ou reparação.
Vejamos.
A definição legal do conceito do acidente de trabalho é o seguinte:
Artigo 3.º
(Conceitos)
Para efeitos do presente diploma, considera-se:
a) «Acidente de trabalho» ou «Acidente» — o acidente que se verifique no local e no tempo de trabalho e produza, directa ou indirectamente, lesão corporal, perturbação funcional ou doença de que resulte a morte ou incapacidade temporária ou permanente de trabalho ou de ganho.
É igualmente considerado como acidente de trabalho o ocorrido:
(1) Fora do local ou do tempo de trabalho, quando verificado na execução da actividade laboral ou de serviços determinados pelo empregador ou por este consentidos;
(2) Na execução de serviços espontaneamente prestados e de que possa resultar proveito económico para o empregador;
(3) No local de pagamento da retribuição, enquanto o trabalhador aí permanecer para tal efeito, excepto se aquele for efectuado por crédito em conta bancária;
(4) No trajecto para o local onde deva ser prestada ao trabalhador qualquer forma de assistência ou tratamento por causa de anterior acidente, no regresso desse local e enquanto neste permanecer para esses fins;
(5) Na ida para o local de trabalho ou no regresso deste, quando for utilizado meio de transporte fornecido pelo empregador;
Como se vê, o legislador não tem a intenção de qualificar todos os acidentes ocorridos na ida para o local de trabalho ou no regresso deste como acidente de trabalho, só aqueles quando for utilizado meio de transporte fornecido pelo empregador, que não é o caso.
Outra evidência desta intenção legislativa é justamente o disposto do artº 13º da Portaria nº 236/95/M, nos termos do qual “quando o segurado pretenda incluir no seguro a cobertura dos acidentes que possam ocorrer durante o trajecto para o local de trabalho ou no regresso deste, há lugar à aplicação da sobretaxa mínima de 0.4%.”
Ora, se o legislador quisesse abranger todos acidentes ocorridos no trajecto para o local de serviço ou no regresso deste, independentemente do meio de transporte utilizado, como acidente de trabalho, já não precisaria estabelecer que o segurado pode, mediante prémio extra, incluir no seguro de acidente de trabalho a cobertura dos acidentes que possam ocorrer durante o trajecto para o local de trabalho ou no regresso deste, pois, se já fosse acidente de trabalho, ficaria logo coberto no seguro em causa.
Improcede assim este argumento do recurso.
II. Da questão do direito de indemnização:
Uma vez afastado o acidente em questão como acidente de trabalho, o Autor teria ainda o direito de ser indemnizado nos termos do contrato de seguro em causa?
Na óptica do Autor, ora recorrente, mesmo que o acidente não fosse qualificado como acidente de trabalho, ele continua a ter o direito de ser indemnizado nos termos do contrato de seguro de acidente de trabalho, visto que a sua situação fica coberta na cláusula G3 do contrato de seguro em referência.
Cremos que tem razão.
A referida cláusula G3 tem o seguinte teor:
“This insurance is extended to cover accident sustained by employees during usual travel to and from the place of employment, even when the transportation so utilized is not supplied by the employer.” (v. 153 e 154 dos autos).
Como referimos anteriormente, nos termos do artº 13º da Portaria nº 236/95/M, o segurado pode, mediante prémio extra, incluir no seguro de acidente de trabalho a cobertura dos acidentes que possam ocorrer durante o trajecto para o local de trabalho ou no regresso deste, que é o caso.
Nesta conformidade, o direito de indemnização do Autor não resulta das normas do DL nº 40/95/M, mas sim da cláusula especial do contrato de seguro de acidente de trabalho.
III. Do quantum indemnizatório:
De acordo com os factos provados, em consequência do acidente, o Autor sofreu fractura do rádio do lado lateral esquerdo e lesões superficiais e sofreu “incapacidade temporária absoluta” desde o dia 10 de Abril de 2008 a 9 de Fevereiro de 2009, no total de 306 dias.
O seu vencimento era, à data do acidente, MOP$560/dia.
Assim, nos termos do artºs 47º, nº 1, al. a), 52º, nº 1 e 54º, nº 1, todos do DL nº 40/95/M, o valor indemnizatório é de MOP$114.240,00 (MOP$560x306x2/3), deduzido a quantia de MOP$7.093,30 que o Autor já recebeu, resta ainda MOP$107.146,70.
IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em conceder provimento ao recurso interposto, revogando a sentença recorrida e condenando a Ré, ora recorrida, Companhia de Seguros de Macau, S.A. pagar ao Autor, ora recorrente, a quantia de MOP$107.146,70 (cento e sete mil e cento e quarenta e seis patacas e setenta avos), acrescida de juros de mora nos termos legais.
Custas pela Ré, ora recorrida, em ambas as instâncias.
Notifique e registe.
RAEM, aos 19 de Maio de 2011
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Lai Kin Hong
1 原告上訴結論如下:
A. 尊敬的原審法院法官認為第40/95/M號法令第3條a款第5項規定了,在使用由僱主提供之交通工具而往返工作地點途中發生者,方視為工作意外。
B. 上訴人在意外發生當日是駕駛自己的電單車上班,有關意外不是在工作時間和地點發生,因此,原審法院認為不存在工作意外。
C. 除了對不同意見的應有尊重外,上訴人並不同意原審法院的理解。
D. 事實上,第40/95/M號法令內就“工作意外”的界定,只規定了一個最基本的制度,但其沒有排除在對勞工更有利的情況下,能透過協議擴大“工作意外”的範圍的可能性。
E. 在本案中,僱主實體已透過保單編號001100001801將有關意外賠償責任移轉予被上訴人,有關保單已明確載有“G3”的特別條款,使該保單的保障範圍包括勞工在上、下班之正常途中可能遭受之意外,即使所使用之運輸工具非為僱主實提供亦然。
F. 因此,僱主實體與被告(承保人)已透過協議的方式,把勞工在上、下班之正常途中可能遭受之意外也視為“工作意外”。
G. 在面對僱主給予僱員更有利的工作條件之情況下,無任何理由反對透過協議方式訂定一個比該法令賦予的更佳保障(可參考葡國最高法院1984年12月20日的合議庭裁判) ,包括擴大“工作意外”的概念範圍。
H. 因此,原審法院錯誤理解了第40/95/M號法令第3條a款內的“工作意外”的概念。
I. 倘不如此認為,亦不妨礙上訴人繼續提出如下理據:
J. 即使原審法院認為,原告在上班途中發生的事故不構成第40/95/M號法令所界定的“工作意外”,但亦不能排除原告在本勞動訴訟程序中獲賠償的權利。
K. 根據第236/95/M號訓令第13條及237/95/M號訓令內的特別條款三的規定,投保人是可以透過相應的附加費率,來保障勞工在上、下班之正常途中可能遭受之意外,即使所使用之運輸工具非為僱主實提供亦然。
L. 由此可知,儘管認為立法者沒有將僱員在非使用僱主提供的運輸工具的情況下而在上、下班之正常途中遭受之意外納入在“工作意外”的概念內,但同時亦沒有否定僱員在相關情況下發生的意外是可受到第40/95/M號法令的保障,只要投保人以附加保費的方式,擴大保單的保障範園。
M. 既然本案的僱主實體已將保險保障範圍延伸至僱員正常上、下班途中發生意外,那麼,便沒理由因為本案的意外不屬“工作意外”的範園,便認為上訴人不能按照第40/95/M號法令獲得賠償。
N. 關於這一方面,從比較法角度出發,葡國最高法院亦曾作出相關的司法見解,並認為僱員在上、下班之正常途中遭受的意外是與工作本身之間具有一定連繫,而僱員能按照工作意外的法例獲得賠償的依據是基於保險合同的保障範圍能覆蓋有關意外(參見葡國STJ Ac. 18-06-2003, n.º02S2677)。
O. 因此,原審法院認為本案意外不構成“工作意外”便馬上排除上訴人不能按照第40/95/M號法令獲得賠償的理解是不正確的,因為,在本案中,上訴人獲得賠償的基礎是僱主實體(投保人)與被上訴(承保人)的保險合同。
P. 另一方面,鑑於上訴人受到保單內的特別條款三所保障,而意外發生當日仍然在保險合同生效的期間內,因此,被上訴人有義務根據相關保險合同,向上訴人支付暫時絕對無能力的賠償。
Q. 根據案中的獲證事實,上訴人收取的日薪為澳門幣560元,而因意外導致的“暫時絕對無能力”的日數為306日。
R. 換言之,按照第40/95/M號法令第47條第1款a項,第52條第1款及第54條第1款a項規定的計算方式並扣除上訴人已收取的部份賠償,就“暫時絕對無能力”的部分,上訴人尚有權收取澳門幣107,146.70元。
S. 綜上所述,基於在本案中僱主實體已透過與被上訴人訂立的保險合同,把上訴人在上、下班之正常途中發生的意外納入“工作意外”的概念範圍,因此,上訴人有權獲得按照第40/95/M號法令規定的計算方式獲得賠償;倘不視有關意外屬於該法令規定的“工作意外”,然而,該法令亦承認僱員能按照保單條款的內容獲得賠償,因此,本案被上訴人應按照該法令的規定向上訴人支付有關“暫時絕對無能力”的賠償。
T. 鑑於原審法院的裁判錯誤理解第40/95/M號法令第3條a款中的“工作意外”的概念及違反了同法令第72條的規定,故上訴人認為有關裁判應被廢止,同時請求上訴法院根據候補適用的《民事訴訟法典》第630條第2款的規定,取代原審裁判而直接判處被上訴人向上訴人支付起訴狀所請求的賠償金額。
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Proc. nº 217/2011