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Processo nº 63/2011- I
(Autos de recurso penal)
(INCIDENTE)





ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Por acórdão deste T.S.I. de 17.03.2011, julgou-se improcedente o recurso por A interposto do despacho pelo Mmo. Juiz do T.J.B. proferido que indeferiu um pedido pela mesma apresentado no sentido de se declarar prescrito o procedente criminal; (cfr., fls., 3472 a 3478 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Notificada do assim decidido, veio a mesma apresentar expediente com o teor seguinte:

“Por entender que o acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância em 17 de Março de 2011 incorre na existência de irregularidade e na falta de conhecimento das questões jurídicas apresentadas pela mesma, ora vem a recorrente apresentar impugnação face à irregularidade e pedir a nulidade da decisão impugnada.

Irregularidade
Em cima de tudo, a recorrente apresentou recurso contra o despacho do tribunal a quo com o objectivo eventual de ser declarada extinta a prescrição, porém, de facto, o teor prático do recurso reside na questão de se o teor da fls. 2042 dos autos preenche, em termos de forma e de declaração de vontade, os termos previstos no n.° 2 do art.° 315.° do Código de Processo Penal, mas não apresentou recurso contra a contagem concreta da prescrição.

Para além da contagem de prescrição, os objectivos do recurso abrangem ainda vários direitos da recorrente, tal como se se pode recorrer contra o teor concreto dos autos no futuro.
Sendo assim, é óbvio que não faz parte da impugnação do presente processo a disposição da alínea b) do n.° 2 do art.° 409° do Código de Processo Penal.
Nos termos do Código de Processo Penal, é necessário proceder-se à audiência de julgamento salvo as circunstâncias previstas nos artigos 409° e 410°, mas o Tribunal de Segunda Instância não realizou a audiência mas julgou improcedentes as motivações do recurso mediante conferência.
Nesse sentido, é óbvio que o colectivo do Tribunal de Segunda Instância incorre na violação ao art. o 411° do Código de Processo Penal por julgar improcedente o recurso mediante a realização de conferência.
Por força do art.° 110° do Código de Processo Penal, o erro acima referido constitui na irregularidade, contra qual a ora recorrente apresentar contenção.

A nulidade da decisão
Pelo exposto, o teor prático do recurso reside na questão: se o teor da fls. 2042 dos autos preenche, em termos de forma e de declaração de vontade, os termos previstos no n.° 2 do art.° 315° do Código de Processo Penal.
No entanto, no acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância, não se analisou detalhadamente se o teor constante da fls. 2042 preenchesse ou não os termos legais, mas deu-se importância na consequência jurídica da assinatura da declaração supramencionada.
A recorrente concorda completamente com a jurisprudência do Tribunal de Segunda Instância quanto à consequência jurídica da assinatura da declaração relativamente ao n.° 2 do art.° 315.° do Código de Processo Penal, entretanto, consiste porém na impugnação em causa que: a recorrente assinou a declaração que preenche o n.°2 do art.° 315.° do Código de Processo Penal mas nunca manifestou que concordasse com a realização da audiência na sua ausência.
Mesmo assim, segundo o acórdão do Tribunal de Segunda Instância, ainda foi analisada detalhadamente a questão de que se o teor constante da fls. 2042 preenchesse ou não o n.° 2 do art.° 315.° do Código de Processo Penal.
Entretanto, o Tribunal de Segunda Instância não fez análise sobre o respectivo teor mas deu apenas importância em analisar a consequência jurídica da assinatura da declaração supramencionada, faltando, obviamente, a análise sobre as questões jurídicas apresentadas pela recorrente.
Na alegação das motivações do recurso, a recorrente já manifestou explicitamente o seu entendimento jurídico de que o silêncio não implica o consentimento, entendimento esse é apoiado pelo professor hábil de Portugal.
Sob o pressuposto do respeito ao acórdão proferido pelo colectivo do Tribunal de Segunda Instância, a recorrente entende que o Tribunal de Segunda Instância não analisou as questões jurídicas apresentadas pela mesma.
O acórdão proferido pelo tribunal colectivo acima mencionado deve ser nulo nos termos dos artigos 633° e a alínea d) do n.° 1 do art.° 571° do Código de Processo Civil aplicados por força da remissão do art.° 3° do Código de Processo Penal.
Face ao expendido, pede-se que seja nulo o acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância por existir irregularidade ou por não manifestar a posição perante a questão referida no recurso, pede-se que reabra os respectivos procedimentos e manifeste a sua posição perante o ponto de vista jurídico da recorrente”; (cfr., fls. 3482 a 3484 e 3489 a 3492).

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Sobre o assim peticionado emitiu o Exmo. Magistrado do Ministério Público o seguinte Parecer:

“Sustenta a recorrente a ocorrência de irregularidade, por resolução do litígio em conferência e não em audiência de julgamento e de nulidade, por o tribunal ter omitido pronúncia sobre argumentação jurídica sua à cerca do valor e significado do seu “silêncio” após a assinatura da notificação constante de fls. 2042.
Afigura-se-nos evidente não lhe assistir qualquer razão, já que, por um lado, a decisão da matéria (recurso de despacho que rejeitou pedido de extinção do procedimento criminal, por prescrição) em conferência se limitou ao respeito do preceituado na al c) do n° 2 do art° 409°, CPP, inexistindo razão válida para o prosseguimento do processo nos termos do art° 411° do mesmo diploma e, por outra banda, da análise do teor do douto acórdão resulta claro o escrutínio da valoração do "silêncio" e ausência a julgamento da recorrente após a voluntária assinatura da notificação em questão, concluindo-se, a propósito que “…como sucedeu, nada dizendo e faltando a audiência “consentiu”que a mesma audiência e julgamento tivesse lugar sem a sua presença... ”, razão por que as questões relevantes suscitadas pela recorrente relacionadas com o valor e significado do seu “silêncio” se mostram devidamente equacionadas e ponderadas, não carecendo o tribunal, a tal propósito, de se pronunciar sobre todo e qualquer argumento jurídico apresentado pela parte, por mais estapafúrdio que se apresente.
Razões por que, sem necessidade de maiores considerações ou alongamentos, somos a entender ser de julgar improcedente a nulidade suscitada”; (cfr., fls. 3494 a 3495).

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Cumpre apreciar e decidir.

Fundamentação

2. Resulta do que se deixou relatado que com o seu expediente vem a arguida A suscitar duas questões: a primeira, por entender que o julgamento do seu recurso decidido por Acórdão de 17.03.2011 devia ocorrer em “audiência” (e não em “conferência”), e a segunda, por considerar que no dito Acórdão se omitiu a apreciação de uma questão.

É porém evidente que nenhuma razão tem a mesma arguida, passando-se a expor este nosso ponto de vista.

Vejamos.

–– Nos termos do art. 409° do C.P.P.M.:

“1. São decididas em conferência as questões suscitadas em exame preliminar.

2. O recurso é julgado em conferência quando:
a) Deva ser rejeitado;
b) Exista causa extintiva de procedimento ou da responsabilidade penal que ponha termo ao processo ou seja o único motivo do recurso; ou
c) A decisão recorrida não constitua decisão final”.

No caso dos presentes autos, e como se viu, com o seu recurso sindicava a mencionada arguida uma decisão proferida pelo Mmo Juiz do T.J.B. que lhe tinha indeferido um pedido no sentido de se declarar extinto o procedimento criminal.

E, assim, e independentemente do demais, não constituindo a dita “decisão recorrida” uma “decisão final” (para efeitos do art. 409°, n.° 2, al. c) ), motivos não haviam para que o julgamento do recurso pela arguida interposto não fosse julgado em conferência, como sucedeu.

Passemos, sem demoras, para a segunda questão.

–– Diz a arguida que este T.S.I. omitiu pronúncia sobre uma questão colocada no âmbito do seu recurso.

E, tanto quanto se colhe do expediente apresentado, entende pois a arguida que este T.S.I. não se pronunciou quanto à questão do valor e significado do seu silêncio perante a notificação que lhe foi feita da data do seu julgamento no T.J.B., e que se à mesma faltasse, nada dizendo, seria o julgamento realizado na sua ausência, sendo representada para todos os efeitos legais pelo seu Defensor, nos termos do art. 315° do C.P.P.M.; (cfr., fls. 2042).

Ora, das duas uma: ou a arguida não leu o acórdão por este T.S.I. prolatado em 17.03.2011, ou então, se o leu, não o fez com a devida atenção, pois que só por equívoco se poderá considerar que incorreu esta Instância na assacada omissão de pronúncia.

Vejamos.

No dito acórdão, e em sede de fundamentação, consignou-se o que segue:

“Cabe apreciar e decidir se prescrito está o procedimento criminal em relação à ora recorrente, adiantando-se desde já que não lhe assiste razão.
Importa desde já atentar no que segue:

- em 01.11.2006, foi a recorrente pessoalmente notificada da data designada para a audiência de julgamento (12.03.2007), e que se à mesma faltasse e nada dissesse, seria o julgamento realizado na sua ausência, sendo representada para todos os efeitos pelo seu Defensor, nos termos do art. 315° do C.P.P.M.; (cfr., fls. 2042).

- em 12.03.2007 e 13.03.2007, teve lugar a audiência de julgamento na ausência e silêncio da ora recorrente, estando a mesma representada pelo seu Defensor, e, em 22.03.2007, procedeu o Colectivo do T.J.B. à leitura do Acórdão, também com o seu Defensor presente, no qual foi a ora recorrente condenada pela prática em concurso real de 1 crime de "corrupção no recenseamento", p. e p. pelo art. 41°, n.° da Lei n. ° 12/2000, e 1 outro de "retenção do cartão de eleitor" p. e p. pelo art. 44°, n.° l da mesma Lei, na pena única de 4 anos de prisão; (cfr., fls. 2180 e seguintes).

- em 11.05.2007, e na ausência de recurso do assim decidido, lavrou-se cota consignando-se que a decisão ínsita no referido Acórdão tinha transitado em julgado em relação à ora recorrente ( e outros co-arguidos); (cfr., fls. 2279).
- em 11.10.2010, requereu a ora recorrente que se declarasse prescrito o procedimento criminal dos autos, (cfr., fls. 2400 a 2402), o que veio a ser indeferido pelo despacho objecto do presente recurso .

Tendo agora em atenção o que se deixou consignado, vejamos.

Nos termos do art. 315° do C.P.P.M.:

“1. Se ao caso couber processo sumaríssimo mas o procedimento tiver sido reenviado para a forma comum e se o arguido não puder ser notificado do despacho que designa dia para a audiência ou faltar a esta injustificadamente, o tribunal pode determinar que a audiência tenha lugar na ausência do arguido.
2. Sempre que o arguido se encontrar impossibilitado de comparecer à audiência, nomeadamente por idade, doença grave ou residência fora de Macau, pode requerer ou consentir que a audiência tenha lugar na sua ausência.
3. Sempre que a audiência tiver lugar na ausência do arguido, este é representado, para todos os efeitos possíveis, pelo defensor.
4. Se o tribunal vier a considerar absolutamente indispensável a comparência do arguido, ordena-a, interrompendo ou adiando a audiência se isso for necessário”.

In casu, e como se referiu, em 01.11.2006, foi a ora recorrente notificada da data do julgamento e que se à mesma faltasse e nada dissesse, seria representada, para todos os efeitos legais, pelo seu Defensor, nos termos do transcrito art. 315° do C.P.P.M. ; (cfr., fls. 2042).

Perante isso, dúvidas cremos que não há que, como sucedeu, nada dizendo, e faltando a audiência, “consentiu” que a mesma audiência de julgamento tivesse lugar sem a sua presença, (cfr., n.° 2 do transcrito art. 315° do C.P.P.M.), passando assim a ficar representada, “para todos os efeitos, pelo defensor”; (cfr., n. o 3).

Nesta conformidade, (e representada que foi, para “todos os efeitos legais” pelo seu Defensor), evidente é também que a leitura do Acórdão, efectuada em 22.03.2007, produziu todos os efeitos legais em relação à ora recorrente, nomeadamente, quanto ao início do prazo para o recurso, e, como sucedeu, quanto ao seu trânsito em julgado, o que, por sua vez, afasta, irremediavelmente, qualquer pretensão no sentido da prescrição do procedimento criminal por efeito do decurso do período de tempo entretanto decorrido.”

Perante isto, como dizer-se que incorreu este Tribunal em omissão de pronúncia?

Então, não se deixou consignado que “… como sucedeu, nada dizendo, e faltando a audiência, “consentiu” que a mesma audiência de julgamento tivesse lugar sem a sua presença, (cfr., n.° 2 do transcrito art. 315° do C.P.P.M.), passando assim a ficar representada, “para todos os efeitos, pelo defensor”; (cfr., n. o 3), e que, “nesta conformidade, (e representada que foi, para “todos os efeitos legais” pelo seu Defensor), evidente é também que a leitura do Acórdão, efectuada em 22.03.2007, produziu todos os efeitos legais em relação à ora recorrente, nomeadamente, quanto ao início do prazo para o recurso, e, como sucedeu, quanto ao seu trânsito em julgado…”.

É claro – e é óbvio – que mais se poderia dizer.

Porém, de forma alguma nos parece de considerar acertado o entendimento pela arguida assumido no sentido de que este T.S.I. não apreciou a questão colocada.

Assim, e ociosas sendo outras considerações, resta pois decidir.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam indeferir o pedido deduzido.

Custas pela requerente, com taxa de justiça que se fixa em 4 UCs.

Macau, aos 07 de Abril de 2011

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José Maria Dias Azedo
(Relator)

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Chan Kuong Seng
(Primeiro Juiz-Adjunto)

_________________________
Tam Hio Wa
(Segundo Juiz-Adjunto)

Proc. 63/2011 Pág. 16

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