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Processo nº 58/2011 Data: 14.04.2011
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Concurso de crimes.
Crime de “tráfico de estupefacientes”, “detenção de estupefacientes para consumo” e “detenção de utensilagem”.
Medida da pena (única).




SUMÁRIO

1. Na fixação da pena para o crime de “tráfico de estupefacientes” deve-se ponderar também nas espécies de estupefaciente pelo agente detidas e destinadas à venda ou cedência a terceiros, (para além das quantidades e necessidades de prevenção criminal).

2. Não merece censura a pena única de 8 anos e 9 meses de prisão fixada em resultado do cúmulo jurídico efectuado de três penas parcelares, uma de 6 anos e 8 meses de prisão aplicada pela prática de 1 crime de “tráfico de estupefacientes” (no qual se provou que o arguido detinha diversas espécies de estupefaciente para tal fim), e outras duas de 4 anos e 3 meses de prisão e de 2 meses de prisão, fixadas noutro processo, pois que na determinação da pena única deve-se considerar, “em conjunto, os factos e a personalidade do agente”; (cfr., art. 75°, n.° 2 do C.P.M.).

O relator,

______________________
José Maria Dias Azedo




Processo nº 58/2011
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Por Acórdão do Colectivo decidiu-se:
– condenar o (1°) arguido A, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de:
- um crime de “tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas”, p. e p. pelo art.º 8º, n.º 1 da Lei n.º 17/2009, na pena de 6 anos e 8 meses de prisão efectiva; e,
- em concurso com os crimes cometidos no Processo Comum Colectivo n.º CR4-10-0131-PCC, foi o arguido condenado na pena única de 8 anos e 9 meses de prisão;
– condenar o (2º) arguido B, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de:
- um crime de “tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas”, p. e p. pelo art.º 8º, n.º 1 da Lei n.º 17/2009, em concurso ideal com o crime de “aquisição ou detenção ilícita de drogas para consumo”, p. e p. pelo art.º 23º, al. a) do Decreto-Lei n.º 5/91/M, na pena de 6 anos e 8 meses de prisão;
- um crime de “detenção indevida de utensílio para consumo de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas”, p. e p. pelo art.º 15º da Lei n.º 17/2009, na pena de 45 dias de prisão; e,
- em cúmulo jurídico foi o 2º arguido condenado na pena única de 6 anos e 9 meses de prisão; (cfr., fls. 677 a 678-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

*

Inconformados, os arguidos recorreram.
Na sua motivação, assim conclui o (1°) arguido A:
“O recorrente A foi condenado, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de:
- Um crime de tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas, p. e p. pelo art.º 8º, n.º 1 da Lei n.º 12/2009 (sic), na pena de 6 anos e 8 meses de prisão;
- Por haver concurso de crimes com o Processo Comum Colectivo n.º CR4-10-0131-PCC, em cúmulo jurídico dos quatro crimes, vai ser condenado na pena de 8 anos e 9 meses de prisão efectiva.
2. Atendendo às diversas circunstâncias do crime do recorrente, tais como ao grau de ilicitude, à intensidade do dolo, à prevenção criminal e à atitude manifestada após o cometimento do crime, conclui-se que não se deve condená-lo na pena de 6 anos e 9 meses de prisão.
3. Porém, o recorrente considera que, neste caso, é mais adequado ser condenado numa pena de 3 anos e 6 meses de prisão efectiva.
4. Deste modo, o recorrente considera que, por haver concurso de crimes com o Processo Comum Colectivo n.º CR4-10-0131-PCC, em cúmulo jurídico dos quatro crimes, é mais adequado ser condenado na pena de 5 anos de prisão efectiva.
5. Na determinação da pena, o Tribunal a quo não abordou rigorosamente sobre a circunstância da reintegração do recorrente na sociedade, ou seja, não observou de forma integral o disposto no art.º 40º do Código Penal, não tendo em consideração as exigências da prevenção especial do recorrente.
6. Assim sendo, o recorrente considera que o Tribunal a quo determinou uma pena excessivamente pesada sem ter atendido suficientemente à sua situação, pelo que, violou os dispostos nos art.ºs 40º e 65º do Código Penal.”; (cfr., fls. 703 a 707 e 810 a 818).

*

Por sua vez, eis as conclusões do recorrente B:
“1. B foi condenado, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de:
- Um crime de tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas, p. e p. pelo art.º 8º, n.º 1 da Lei n.º 12/2009 (sic), em concurso ideal com o crime de aquisição ou detenção ilícita de drogas para consumo, p. e p. pelo art.º 23º, al. a) do Decreto-Lei n.º 5/91/M, na pena de 6 anos e 8 meses de prisão;
- Um crime de detenção indevida de utensílio para consumo de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas, p. e p. pelo art.º 15º da Lei n.º 17/2009, na pena de 45 dias de prisão.
Em cúmulo jurídico dos dois crimes, o mesmo foi condenado numa única pena de 6 anos e 9 meses de prisão efectiva.
2. Atendendo às diversas circunstâncias do crime do recorrente, tais como ao grau de ilicitude, à intensidade do dolo, à prevenção criminal e à atitude manifestada após o cometimento do crime, conclui-se que não se deve condená-lo na pena de 6 anos e 9 meses de prisão.
3. O recorrente considera que é mais adequado ser condenado numa pena de 3 anos e 6 meses de prisão efectiva.
4. Na determinação da pena, o Tribunal a quo não abordou rigorosamente sobre a circunstância da reintegração do recorrente na sociedade, ou seja, não observou de forma integral o disposto no art.º 40º do Código Penal, não tendo em consideração as exigências da prevenção especial do recorrente.
5. Assim sendo, o recorrente considera que o Tribunal a quo determinou uma pena excessivamente pesada sem ter atendido suficientemente à sua situação, pelo que, violou os dispostos nos art.ºs 40º e 65º do Código Penal.”; (cfr., fls. 699 a 702 e 802 a 809).

*

Em resposta, pugna o Exm° Magistrado do Ministério Público no sentido da improcedência dos recursos; (cfr., fls. 710 a 714-v ).

*

Nesta Instância, e em sede de vista, juntou o Exm° Representante do Ministério Público o seguinte Parecer:
“Mostram-se ambos os recorrentes inconformados com a medida concreta das penas que lhes foram aplicadas, almejando a redução respectiva.
Contudo, atentos os parâmetros estabelecidos nos art°s 40°, 45° e 65° do CPM e os circunstancialismos apurados relativamente às respectivas condutas, afiguram-se-nos aquelas medidas adequadas e sensatas, tendo-se usado de dosimetria penal justa, razão por que, verdadeiramente, nada de relevante temos a acrescentar ao já expendido pela Exma Colega junto da 1ª instância, cujo entendimento subscrevemos, afigurando-se-nos, sem necessidade de maiores considerações ou alongamentos, não merecer provimento o presente recurso.” ; (cfr., fls. 835).

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Cumpre decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados os factos seguintes:
“Desde cerca de Julho de 2009, o arguido A começou a traficar drogas em Macau junto com o arguido B.
No decurso do tráfico de drogas, o arguido A responsabilizava-se pela aquisição de estupefacientes e pelo contacto com as pessoas que os pretendessem comprar, enquanto o arguido B responsabilizava-se pela entrega dos estupefacientes às pessoas que os pretendessem comprar, segundo as indicações dadas pelo arguido A, ou pela colocação dos mesmos no local determinado pelo arguido A para serem buscados pelas pessoas que os pretendessem comprar.
Para facilitar a prática do tráfico de drogas e para fugir da vigilância policial, os arguidos A e B costumavam colocar antecipadamente os estupefacientes no apartamento, sito na Avenida da Amizade, Edf. Hong On, Torre 3, XXº andar XX, e, quando houvesse comprador de drogas, o arguido A dava indicações ao arguido B para buscar estupefacientes no referido apartamento e entregá-los ao comprador ou colocá-los no local determinado pelo arguido A.
Na noite do dia 26 de Agosto de 2009, os arguidos C e D telefonaram ao arguido A, demonstrando a pretensão de comprar estupefacientes em MOP$300,00.
Depois, o arguido A deu indicações ao arguido B para trazer consigo os estupefacientes e efectuar a transacção de drogas com os arguidos C e D nas proximidades do London Hotel, sito na Praça de Ponte e Horta.
No dia 27 de Agosto de 2009, por volta das 00H15, nas proximidades do Restaurante “Tau Lou (豆撈)”, sito na Rua do Almirante Sérgio, agentes da Polícia Judiciária interceptaram os arguidos C e D que tinham adquirido recentemente estupefacientes ao arguido B.
Agentes da P.J. encontraram um saco de pós brancos (vide auto de apreensão de fls. 11 dos autos) no bolso das calças do arguido C.
Após o exame laboratorial, averigua-se que as referidas pós brancas contêm “Ketamina” abrangida pela tabela II-C anexa ao Decreto-Lei n.º 5/91/M, com peso líquido de 1,145 gramas (após a análise de métodos quantitativos, verifica-se que a percentagem da “Ketamina” é de 71,72% e tem o peso líquido de 0,821 gramas).
Os aludidos estupefacientes foram adquiridos pelos arguidos C e D, por via telefónica, ao arguido A e foram-lhes entregues pelo arguido B.
Os arguidos C e D compraram os aludidos estupefacientes, com a finalidade de consumo em conjunto.
No mesmo dia, cerca das 02H00, no exterior da entrada do Edf. Hong On, Torre 3, sito na Av. da Amizade, agentes da P.J. interceptaram o arguido B e encontraram na posse deste 2 telemóveis, 1 conjunto de chaves, 1 agenda, HKD$14.200,00 e MOP$5.100,00 (vide auto de apreensão de fls. 17 dos autos).
Em seguida, agentes da P.J. procederam à busca domiciliária no referido apartamento, sito no Edf. Hong On, Torre 3, 8º andar U, local onde foram guardados os estupefacientes dos arguidos A e B, e encontraram na gaveta esquerda do toucador dum quarto 1 saco plástico transparente com vestígios de pó (vide objecto apreendido n.º 2 de fls. 21 dos autos).
Após o exame laboratorial, averigua-se que as referidas pós contêm “Ketamina” abrangida pela tabela II-C anexa ao Decreto-Lei n.º 5/91/M.
Agentes da P.J. encontraram na gaveta direita do referido toucador 1 pedaço de palhinha azul, 1 folha de papel alumínio, 5 sacos plásticos transparentes com vestígios de pó, 2 sacos de comprimidos brancos, 3 sacos plásticos transparentes, 1 saco plástico transparente (contém 1 palhinha cuja ponta desta está acompanhada do papel alumínio), 3 folhas de papel alumínio, 1 isqueiro, 2 palhinhas, 1 saco de comprimidos brancos e 2 pesos electrónicos com vestígios de pó (vide objectos apreendidos n.º 3 de fls. 21 dos autos).
Após o exame laboratorial, averigua-se que os referidos 2 sacos de comprimidos brancos e 1 saco de comprimidos brancos contêm “Metanfetamina” abrangida pela tabela II-B anexa ao Decreto-Lei n.º 5/91/M, com, respectivamente, peso líquido de 0,336g e 0,087g (após a análise de métodos quantitativos, verifica-se que a percentagem da “Metanfetamina” é, respectivamente, de 75,60% e 74,49% e, com respectivamente peso líquido de 0,254g e 0,065g).
Os referidos 8 sacos plásticos transparentes e 3 folhas de papel alumínio contêm vestígios da “Metanfetamina” abrangida pela tabela II-B anexa ao Decreto-Lei n.º 5/91/M; o referido saco plástico transparente, onde se encontra 1 palhinha cuja ponta desta está acompanhada do papel alumínio, contém vestígios da “Anfetamina” e “Metanfetamina” abrangidas pela tabela II-B; as referidas 2 palhinhas contêm vestígios da “Metanfetamina” abrangida pela tabela III-B (sic) e “Ketamina” abrangida pela tabela II-C; e os referidos pesos electrónicos contêm vestígios da “Cocaína” abrangida pela tabela I-B.
Agentes da P.J. encontraram na gaveta esquerda inferior do aludido toucador 1 garrafa plástica com líquido e duas palhinhas, uma azul e outra roxa, 1 garrafa de vidro com líquido e duas palhinhas, uma amarela e outra amarela alaranjada, 2 maços de palhinhas (um com 45 palhinhas e outro com 54 palhinhas) e 2 rolos de papel alumínio (vide objectos apreendidos n.ºs 4 e 5 de fls. 22 e fls.465 dos autos).
Após o exame laboratorial, averigua-se que o líquido a 420 ml, encontrado na referida garrafa plástica com duas palhinhas, contém “Anfetamina” e “Metanfetamina” abrangidas pela tabela II-B anexa ao Decreto-Lei n.º 5/91/M; e o líquido a 140 ml, encontrado na referida garrafa de vidro com duas palhinhas, uma amarela e outra amarela alaranjada, contém “Metanfetamina” abrangida pela tabela II-B anexa ao mesmo Decreto-Lei.
Além disso, agentes da P.J. encontraram na mala de viagem do arguido B 1 saco plástico transparente (contém 10 sacos plásticos transparentes, 1 saco plástico transparente com 10 folhas de papel alumínio e 2 cartolinas com vestígios de pó), 1 peso electrónico com vestígios de pó, 1 caixa de papel alumínio, 68 palhinhas coloridas, 2 sacos plásticos com saquetes plásticos transparentes (no total 186 saquetes) (vide objectos apreendidos n.ºs 6 e 7 de fls. 22 e fls.465 dos autos).
Após o exame laboratorial, averigua-se que os vestígios encontrados nos 10 sacos plásticos transparentes que estavam contidos num saco plástico transparente contêm “Cocaína” abrangida pela tabela I-B, “Metanfetamina” abrangida pela tabela II-B e “Ketamina” abrangida pela tabela II-C todas anexam ao Decreto-Lei n.º 5/91/M; e os vestígios de pós encontrados nas referidas 2 cartolinas e 1 peso electrónico contêm “Cocaína” abrangida pela tabela I-B e “Ketamina” abrangida pela tabela II-C todas anexam ao mesmo Decreto-Lei.
No apartamento em causa, agentes da P.J. encontraram na gaveta da cama do arguido B os seguintes objectos (vide objectos apreendidos n.ºs 8 a 10 de fls. 23 dos autos):
1 saco plástico transparente com 11 sacos de comprimidos da cor de iogurte;
1 saco plástico transparente com 36 sacos de comprimidos da cor de iogurte;
1 saco plástico transparente com 30 sacos de pós brancos;
1 saco plástico transparente com 90 sacos de pós brancos;
1 folha de registo;
1217 sacos plásticos transparentes, um deles contém objectos cristalizados da cor amarela clara.
Após o exame laboratorial, averigua-se que os referidos 11 sacos de comprimidos da cor de iogurte contêm “Cocaína” abrangida pela tabela I-B anexa ao Decreto-Lei n.º 5/91/M, com peso líquido total de 2,700g (após a análise de métodos quantitativos, verifica-se que a percentagem da “Cocaína” é de 86,07%, com peso líquido de 2,324g); os referidos 36 sacos de comprimidos da cor de iogurte contêm “Cocaína” abrangida pela tabela I-B anexa ao mesmo Decreto-Lei, com peso líquido total de 12,362g (após a análise de métodos quantitativos, verifica-se que a percentagem da “Cocaína” é de 80,44%, com peso líquido de 9,944g); os referidos 30 sacos de pós brancos e 90 sacos de pós brancos contêm “Ketamina” abrangida pela tabela II-C, com, respectivamente, peso líquido total de 28,421g e 87,443g (após a análise de métodos quantitativos, verifica-se que a percentagem da “Ketamina” é, respectivamente, de 70,17% e 72,30% e, com respectivamente peso líquido de 19,943g e 63,221g); e o referido saco de objectos cristalizados da cor amarela clara contêm “Ketamina” abrangida pela tabela II-C anexa ao Decreto-Lei n.º 5/91/M, com peso líquido de 0,867g (após a análise de métodos quantitativos, verifica-se que a percentagem da “Ketamina” é de 73,78%, com peso líquido de 0,640g).
Os estupefacientes acima mencionados foram depositados no apartamento em apreço pelos arguidos A e B, cuja maior parte se destinava à venda a outrem e, às vezes, o arguido B guardava uma parte reduzida dos mesmos para consumo pessoal.
Os aludidos sacos plásticos e pesos electrónicos foram instrumentos detidos pelos arguidos A e B que serviram para empacotar e examinar o peso dos estupefacientes; e, registaram-se na folha de registo e na agenda as situações da venda de estupefacientes.
O papel alumínio e as garrafas de plástico e de vidro supramencionados foram utensílios para consumo de droga detidos pelo arguido B.
O dinheiro e os telemóveis supracitados foram, respectivamente, lucros obtidos e instrumentos de comunicação utilizados pelo arguido B no tráfico de drogas.
No mesmo dia, agentes da P.J. encontraram 1 saco de comprimidos brancos (vide auto de apreensão de fls. 25 dos autos) em cima do tapete que ficava junto da porta do assento do lado esquerdo da parte traseira da viatura da P.J. (de matrícula MC-06-XX) usada para transportar o arguido B.
Após o exame laboratorial, averigua-se que os referidos comprimidos brancos contêm “Cocaína” abrangida pela tabela I-B anexa ao Decreto-Lei n.º 5/91/M, com peso líquido de 0,256g (após a análise de métodos quantitativos, verifica-se que a percentagem da “Cocaína” é de 88,72%, com peso líquido de 0,227g).
Os estupefacientes em apreço foram abandonados na referida viatura pública pelo arguido B após a sua detenção.
Os estupefacientes em apreço faziam parte das drogas que foram entregues pelo arguido A ao arguido B para serem vendidos. O arguido B abandonou os estupefacientes na referida viatura pública, com o objectivo de se furtar à responsabilidade jurídica proveniente da detenção de drogas.
Os arguidos A, B, C e D agiram livre, voluntária, consciente e deliberadamente os actos supramencionados.
Os arguidos A e B agiram de comum acordo, dividindo tarefas entre si, os actos supramencionados.
Os arguidos A, B, C e D tinham perfeito conhecimento da natureza e características dos estupefacientes.
O acto praticado pelos arguidos A, B, C e D não foi permitido por lei.
Os arguidos A, B, C e D sabiam perfeitamente que a referida conduta era proibida e punida por lei.
Mais se provaram:
O 3º arguido submeteu-se voluntariamente à terapia de desintoxicação.
Segundo o certificado de registo criminal, o 1º arguido tem antecedentes criminais: 1) No Processo Comum Colectivo n.º CR4-10-0131-PCC, em 29 de Outubro de 2010, o tribunal condenou o arguido, da prática de um crime de tráfico de drogas, na pena de prisão de 4 anos e 3 meses; da prática de um crime de detenção de utensilagem para consumo de drogas, na pena de prisão de 2 meses; da prática de um crime de consumo de drogas, na pena de prisão de 2 meses; e, em cúmulo jurídico dos três crimes, foi condenado numa pena única de 4 anos e 6 meses de prisão, ora em cumprimento da pena do referido processo. 2) O 1º arguido foi acusado no processo n.º CR2-10-0124-PCC, ora aguardando pela audiência de julgamento.
Segundo o certificado de registo criminal, no Processo Sumário n.º CR2-08-0029-PSM, em 4 de Fevereiro de 2008, o tribunal condenou o 3º arguido, da prática do crime de detenção ilícita de medicamento sob controlo para consumo pessoal, na pena de multa de MOP$4.000,00, cuja referida pena foi já executada.
Segundo o certificado de registo criminal, os 2º e 4ª arguidos não têm antecedentes criminais.
O 1º arguido A alegou que antes de ser preso preventivamente era bate-fichas, auferindo o salário mensal de MOP$8.000,00 a MOP$10.000,00; tem três filhos e a mãe a seu cargo; e, tem como habilitações literárias o 3º ano do ensino secundário incompleto.
O 2º arguido B alegou que antes de ser preso preventivamente era bate-fichas, auferindo o salário mensal de MOP$8.000,00 a MOP$10.000,00; tem dois filhos a seu cargo; e, tem como habilitações literárias o 3º ano do ensino secundário geral.
O 3º arguido C alegou que era escriturário duma companhia de computadores, auferindo o salário mensal de cerca de MOP$8.000,00; sem encargo familiar; e, tem como habilitações literárias o 6º ano do ensino secundário.
A 4ª arguida D alegou que era desempregada; tem a mãe a seu cargo; e, tem como habilitações literárias o 3º ano do ensino secundário geral.”; (cfr., fls. 671 a 674 e 776 a 786).

Do direito

3. Dois são os recursos trazidos à apreciação deste T.S.I..

— Mostra-se de se começar pelo recurso do (1°) arguido A.

No seu recurso, coloca apenas o (1°) arguido a questão da pena.
Considera pois que excessiva é a pena de 6 anos e 8 meses de prisão que lhe foi aplicada pela prática de 1 crime de “tráfico de estupefacientes” p. e p. pelo art. 8°, n° 1 da Lei n° 17/2009, o mesmo sucedendo com a pena única – de 8 anos e 9 meses de prisão – que lhe foi fixada em resultado do cúmulo jurídico efectuado com os crimes em que foi condenado no âmbito do Proc. n° CR4-10-0131-PCC.

Vejamos.

Ao crime de “tráfico de estupefaciente” p. e p. pelo art. 8°, n° 1 da Lei n° 17/2009 cabe a pena de 3 a 15 anos de prisão.

E, ponderando nas quantidades (líquidas) dos estupefacientes em causa, sendo também de notar que em questão estão diversos tipos de estupefacientes, (pois que detinha o recorrente para tráfico “Ketamina”, “Metafetamina”, “Anfetamina”, e “Cocaína”), cremos que censura não merece a pena de 6 anos e 8 meses que lhe foi imposta por tal crime de “tráfico”, pois que não se nos mostra excessiva nem desrespeitadora do estatuído no art. 40° e 65° do C.P.M..

Quanto à “pena única”.

Pois bem, nos termos do art. 71°, n° 2 do C.P.M.:
   “A pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 30 anos tratando-se de pena de prisão e 600 dias tratando-se de pena de multa, e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.”
Ora, no caso, e no âmbito do Proc. n° CR4-10-0131-PCC, foi o ora recorrente condenado em duas penas parcelares de 2 meses de prisão, e uma outra de 4 anos e 3 meses de prisão.

Confrontamo-nos assim como uma pena com um limite mínimo de 6 anos e 8 meses de prisão e com um limite máximo de 11 anos e 3 meses de prisão.

Atento o estatuído no n° 1 do citado comando legal, que preceitua também que na determinação da pena única se considere, “em conjunto, os factos e a personalidade do agente”, cremos que excessiva não é a pena única de 8 anos e 9 meses de prisão pelo Tribunal a quo fixada, nenhuma violação ao art. 40° e 65° do C.P.M. havendo.
Com efeito, e tendo presente os tipos de crime cometidos, prementes são as necessidades de prevenção.

Assim, improcede o recurso.

— Do recurso do (2°) arguido B.

Insurge-se o arguido ora recorrente, pedindo também e apenas a redução da(s) pena(s) em que foi condenado.

Vejamos.

Foi o recorrente condenado pela prática de:
- um crime de “tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas”, p. e p. pelo art.º 8º, n.º 1 da Lei n.º 17/2009, em concurso ideal com o crime de “aquisição ou detenção ilícita de drogas para consumo”, p. e p. pelo art.º 23º, al. a) do Decreto-Lei n.º 5/91/M, na pena de 6 anos e 8 meses de prisão;
- um crime de “detenção indevida de utensílio para consumo de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas”, p. e p. pelo art.º 15º da Lei n.º 17/2009, na pena de 45 dias de prisão; e,
- em cúmulo jurídico foi o 2º arguido condenado na pena única de 6 anos e 9 meses de prisão.

Pois bem, no que toca às penas parcelares e atentas as molduras para os crimes cometidos, cremos que razoável não é considerar as mesmas excessivas ou inflaccionadas.

De facto, em relação ao crime de “tráfico de estupefacientes” vale aqui o que atrás se consignou aquando da apreciação do recurso do (1°) arguido A.

E, o mesmo sucede com a pena parcelar de 45 dias de prisão fixada para o crime p. e p. pelo art. 15° da Lei n° 17/2009, assim como a pena única de 6 anos e 9 meses de prisão em resultado do cúmulo efectuado, pois que se mostram de harmonia com os critérios do art. 65° e 71° do C.P.M., reflectindo adequadamente as necessidades de prevenção criminal.

— Aqui chegados, um outro aspecto importa ponderar.

Como se viu, decidiu o Colectivo a quo condenar o ora recorrente (B) como autor de um crime de “tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas”, p. e p. pelo art.º 8º, n.º 1 da Lei n.º 17/2009, em concurso ideal com o crime de “aquisição ou detenção ilícita de drogas para consumo”, p. e p. pelo art.º 23º, al. a) do Decreto-Lei n.º 5/91/M.

E podendo este T.S.I. alterar a qualificação jurídica penal efectuada pelo T.J.B., (sem prejuízo do princípio da “proibição da reformatio in pejus”; art. 399° do C.P.P.M.), será de manter o assim decidido?

Cremos que adequado não é o entendimento pelo T.J.B. assumido.

De facto, distintos são os bens jurídicos tutelados com as respectivas normas em questão, evidente nos parecendo assim que se devia considerar o recorrente autor material dos referidos crimes em concurso real, o que ora se declara, (certo sendo que observado foi o contraditório).
Tendo também em consideração o estatuído no art. 399° do C.P.P.M., (“proibição da reformatio in pejus”), mantem-se a pena que ao recorrente foi imposta.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos nega-se provimento aos recursos.

Custas pelos recorrentes, com taxa de justiça individual que se fixa em 10 UCs.

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.000.00.


Macau, aos 14 de Abril de 2011

José Maria Dias Azedo
Com a seguinte declaração [Não obstante ter relatado o Acórdão que antecede, considero o recurso do 1° arguido A tempestivo apenas por que transitada em julgado está a decisão que (inadequadamente) considerou haver “justo impedimento” na apresentação tardia da respectiva motivação de recurso, não subscrevendo a solução dada ao recurso do 2° arguido B, pois que como em declaração de voto anexa ao recente Acórdão deste T.S.I. de 30.03.2011, Processo n.° 81/2011, considero que em situações como a dos presentes autos, existe “concurso aparente” entre os crimes de “detenção ilícita de estupefacientes para consumo” e de “detenção de utensilagem”, p.e p. pelos art. 14° e 15° da Lei n.° 17/2009].

Tam Hio Wa
Chan Kuong Seng (subscrevo a decisão, porque para mim, a pena aplicada pelo Tribunal “a quo” já é demasiado leve no crime de tráfico)
Proc. 58/2011 Pág. 26

Proc. 58/2011 Pág. 1