Processo n.º 707/2010
(Recurso cível)
Data : 31/Março/2011
ASSUNTOS:
- Reprodução ou imitação de marcas
- Afinidade entre produtos ou serviços
- Marcas; confundibilidade
- Marca de prestígio
- Concorrência desleal
SUMÁRIO:
1. Para que se verifique reprodução ou imitação de marca é necessário que sejam cumulativos os requisitos do artigo 215º do CPC.
2. A afinidade entre dois produtos ou serviços pode encontrar-se na sua aparência ou conteúdo mas pode, também, basear-se na aplicação a que se destinam, na sua possibilidade de satisfazer a mesma ou idêntica função.
3. O prestígio mede-se pelo reconhecimento da qualidade de dada marca, o seu conhecimento generalizado, a ligação do consumidor à marca, seja em termos de se lhe ligar, usar os produtos ou serviços respectivos, seja em termos efectivos ou de apetência, tudo enquadrado por uma acção do titular da marca de prestígio no sentido de criar uma ligação entre a marca e o público em geral, não descurando a promoção e divulgação da mesma.
4. Só há confundibilidade quando há concorrência.
5. A lei não descreve as situações que podem configurar concorrência desleal, importando destacar casuisticamente situações integrantes dessa figura
O Relator,
João A. G. Gil de Oliveira
Processo n.º 707/2010
(Recurso Civil)
Data: 31/Março/2011
Recorrente: A
Recorridas: - B
- C
- D
- E
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
A - Valor da acção/recurso
Tendo a recorrente requerido que as Partes Contrárias viessem indicar o valor da acção foi indicado, o valor de MOP1.000.001 (um milhão e uma pataca).
Tal valor não foi impugnado.
Por se tratar de uma acção sobre interesses imateriais, a que portanto se aplica a norma do artigo 254.° do Código de Processo Civil, conforme decidido pelo douto Tribunal de Última Instância, a 21 de Setembro de 2009, no processo n.º 21/2009, fixa-se tal valor à acção/recurso.
Custas do incidente pelas autoras, aqui recorridas.
B - I – RELATÓRIO
Vem o presente recurso do despacho saneador proferido, em 14 de Abril de 2010, ao abrigo do disposto na alínea b) do art.º 429.º do Código de Processo Civil, que, conhecendo do mérito da causa, julgou o recurso judicial interposto pelas sociedades comerciais (i)“B”; (ii) “C”; (iii) “D” e (iv) “E” procedente e, em consequência, alterou o despacho da Exm.ª Chefe do Departamento da Propriedade Intelectual dos Serviços de Economia de 22 de Novembro de 2005, através do qual foi concedido o registo da marca n.º N/15326, para assinalar serviços da classe 37.ª, requerido pela ora recorrente, a Sociedade comercial “A”.
Com tal decisão não se conforma pelas razões levadas às conclusões nas suas alegações deste recurso:
Decorre da situação jurídica das várias marcas que integram os sinais marcários ZHI DI/CHITEI e LANDMARK que, para se concluir se a marca registanda deve ou não ser concedida à agora Recorrente tem que ser aferida, apenas, pelas marcas N/1186l, para a classe 36ª, e N/12024, para a classe 42ª.
Os sinais marcários 置地 e LANDMARK que, efectivamente, imprimem eficácia distintiva às marcas em confronto têm origens diferentes, certo sendo que são associados não porque tenham o mesmo significado (em chinês e em inglês, portanto não têm correspondência um com o outro) mas porque se trata de duas marcas que pertencem à THE HONGKONG LAND COMPANY LIMITED, ora Recorrente
A expressão chinesa置地 (que romaniza ZHI DI - mandarim - ou CHI TEI - cantonense) traduz-se para inglês LAND e integra a denominação social da, agora, Recorrente; a expressão inglesa LANDMARK traduz-se para chinês 地標 ou 陸標, caracteres que romanizam, respectivamente, TEI PIU e LOK PIU.
O douto Tribunal a quo entende que os sinais置地e LANDMARK têm o mesmo significado, pelo que é incontornável concluir que a expressão LANDMARK foi registada em Macau, em primeiro lugar, pois não se pode perder de vista que o douto Acórdão do TSI - no que se refere à marca N/11862 - , deu razão à Contestante, ora Recorrente, na questão ligada à prioridade no registo da marca LANDMARK (para a classe 42ª).
Se os factos dados por provados no referido Acórdão servem como argumentos, então, sempre se poderá dizer que, no caso e indo na esteira do que foi decidido nessa Alta Instância, falha o primeiro requisito para se considerar a marca imitada ou reproduzida, ou seja, falha o requisito previsto na alínea a) do n.º 1 do art. 215º do RJPI - "a marca registada tiver prioridade".
No caso, falha um outro requisito: "sejam ambas as marcas destinadas a assinalar serviços ou produtos idênticos ou afins" (alínea b) do n.º 1 do art. 215º); conforme se pode verificar dos pedidos de registo das marcas referidas pelas Autoras/Recorrentes e, agora, Recorridas, as respectivas interessadas lograram obter o registo das marcas N/11861, para assinalar serviços integrados na classe 36ª e N/12024, que se destina a assinalar serviços da classe 42ª, sendo que, com a marca aqui em apreciação, se pretende assinalar serviços da classe 37ª.
Fica, pois, arredada a hipótese de se considerar verificado o fundamento de recusa previsto na alínea b) do n.º 2 do art. 214.° do RJPI, não sendo necessário, no caso, referir os outros requisitos (indução em erro ou confusão do consumidor e o risco de associação com a marca registada).
O douto Tribunal a quo, para resolver a questão, entendeu, no seu alto critério, considerar que as marcas N/1186l, para a classe 36ª e a marca N/12024, para a classe 42ª, são marcas de prestígio e, assim, poder dar por verificado o fundamento de recusa previsto no art. 214°, n.º 1, alínea c).
Não existem nos autos elementos de prova que possam conduzir à conclusão de que as marcas N/11861 e N/12024 gozam de prestígio, sem se perder de vista que, sempre, se terá que reportar à data da concessão administrativa, ou seja, a 2003, quando se fala em provar o prestígio.
O douto Tribunal a quo julgou, também, verificado o fundamento de recusa previsto na alínea e) do n.º 2 do art. 214º do RJPI, pelo facto de as denominações sociais das Autores/Recorrentes e ora Recorridas integrarem a expressão "LAND MARK" e/ou ültí8, não tendo elas autorizado a Contestante, agora Recorrente, a utilizá-las para compor as suas marcas, acolhendo, assim, a tese defendida pelas Autoras/ora Recorridas.
Tal fundamento só funciona se a coincidência de elementos da marca e do nome ou denominação social for susceptível de induzir o consumidor em erro ou confusão.
A firma (denominação social, nome social) é também um elemento da propriedade industrial, porquanto integra os chamados sinais distintivos do comércio; porém, regulada no Código Comercial, a firma tem uma finalidade diferente da da marca e da do nome do estabelecimento, regulados no Regime Jurídico da Propriedade Industrial.
Essa finalidade permite-nos afirmar que só em casos muito especiais (em que os produtos ou serviços são comercializados com o nome da firma) a coincidência de elementos pode induzir o consumidor em erro ou confusão, pois, o facto da firma servir para distinguir a actividade económica e não os produtos ou serviços, arreda a possibilidade do consumidor ter um contacto directo com as empresas, isto é, enquanto que a marca é um sinal distintivo de objectos, a firma é um sinal distintivo de sujeitos.
É unânime o entendimento doutrinário e jurisprudencial de que este fundamento de recusa só opera quando estiverem em causa actividades concorrentes.
As Autoras/Recorrentes e, agora, Recorridas, limitam-se a dizer que a sua denominação social integra elementos que compõem a marca registanda, mas não se preocupam em fazer um contraponto entre a actividade que exerce e em que medida há o perigo de engano (risco de provocar confusão junto do consumidor) quanto à proveniência dos serviços - os que oferece e os que a Requerente da marca, aqui Parte Contrária e, agora, Recorrente, pretende oferecer assinalando-os com a marca registanda.
Pese o facto de o douto Tribunal a quo não se ter debruçado sobre o fundamento, também, invocado pelas Autoras/ora Recorridas, dado que os recursos judiciais de marca são de plena jurisdição, não pode a Contestante, agora, Recorrente, deixar de contra- argumentar a tese defendida pelas mesmas, na sua petição inicial, no sentido de que o pedido do registo da marca nominativa aqui em questão deve ser recusado, por se verificar o fundamento de recusa previsto na alínea c) do n.º 1 do art. 9º do sempre citado RJPI.
Em nenhuma das situações defendidas pela Doutrina e pela Jurisprudência se enquadra a razão pela qual as Autoras/Recorrentes e, agora, Recorridas, consideram que, ao apresentar o pedido de registo da marca n.º N/15326, a sua Requerente - Contestante nos autos e, agora, Recorrente - se comportou de modo desleal.
A douta decisão recorrida violou as normas do art. 214°, n.º 1, alínea c) e n.º 2, alínea e), do RJPI, porque as aplicou, por erro de julgamento.
NESTES TERMOS requer seja considerado procedente o presente recurso e, consequentemente, porque não existem quaisquer outras razões legais que o impeçam, ser mantido o despacho da DSE de 22 de Novembro de 2005 que concedeu o pedido de registo da marca nominativa que consiste em香港置地com o n.º N/15326 e se destina a assinalar serviços da classe 37ª.
B, C, D e E, Partes Contrárias, notificadas das alegações de recurso apresentadas pela Recorrente, vêm, ao abrigo da segunda parte do n.º 2 do artigo 613º do Código de Processo Civil (CPC), apresentar a sua resposta, o que fazem nos seguintes termo conclusivos:
A marca em discussão nestes autos não difere, em nada essencial, da marca apreciada pelo douto Tribunal de Última Instância, no processo n.º 21/2009, onde o TUI julgou verificado o fundamento de recusa de marca previsto na alínea e) do n.º 2 do artigo 214º do RJPI, recusando a final a marca pretendida registar pela A - solução de direito que deve acompanhar-se nos presentes autos, recusando-se a marca N/15326, porquanto os caracteres 香港 não são suficientes para o consumidor médio distinguir claramente a marca pretendida registar das firmas das Partes Contrárias, das suas marcas registadas N/11861 e N/12024, e do seu Nome de Estabelecimento n.º E/40.
Prevendo a hipótese de procedência de alguma das questões suscitadas pela Recorrente, e caso se entenda que a factualidade considerada assente na douta decisão recorrida é insuficiente para nestes autos se fazer o mesmo enquadramento que fez o douto Tribunal de Última Instância no âmbito daquele processo N.º 21/2009, impugnam as Partes Contrárias, subsidiariamente, ao abrigo e nos termos do n.º 2 do artigo 590º, do Código de Processo Civil, a matéria de facto seleccionada na decisão recorrida, que deve ser ampliada, por forma a incluir os factos alegados pelas Partes Contrárias no requerimento de recurso que apresentaram no Tribunal Judicial de Base a 10 de Fevereiro de 2006, incluindo os vertidos nos artigos 3º, 4º, 7°, 37°, 38°, e 46º a 56º daquele requerimento, provados por profusa documentação então junta, a que nesses mesmos artigos se faz referência expressa.
Prevendo também a hipótese de procedência de alguma das questões suscitadas pela Recorrente, não se seguindo nestes autos o entendimento propugnado pelo douto Tribunal de Última Instância no supra citado processo n.º 21/2009, requerem também as Partes Contrárias, subsidiariamente, ao abrigo e nos termos do n.º 1 do artigo 590°, do Código de Processo Civil, a ampliação do âmbito do recurso, por forma a que sejam analisados por V. Exas. os fundamentos de recusa previstos na alínea d) do n.º 1 do artigo 9.º do RJPI (concorrência desleal), e na alínea b) do n.º 1 do artigo 215º do RJPI (conjugado com alínea c) do n.º 1 do artigo 214.°), não considerados na douta sentença recorrida, dando-se por reproduzida a argumentação expendida nos artigos 43.° a 45.°, e 46.° e segs., do requerimento de recurso apresentado a 10 de Fevereiro de 2006, pelas Partes Contrárias, no Tribunal Judicial de Base.
Tendo a Recorrente requerido que as Partes Contrárias viessem indicar o valor da acção, indica-se o valor de MOP1.000.001 (um milhão e uma pataca), por se tratar de uma acção sobre interesses imateriais, a que portanto se aplica a norma do artigo 254.° do Código de Processo Civil, conforme decidido pelo douto Tribunal de Última Instância, a 21 de Setembro de 2009, no já citado processo n.º 21/2009, citando F, G, H, I e J.
Termos em que se deve recusar o pedido de registo da marca N/15326, julgando portanto improcedente o recurso da Recorrente.
A Direcção dos Serviços de Economia da Região Administrativa Especial de Macau veio apresentar as suas alegações, sustentando:
É facto indiscutível que as marcas as marcas N/11861 e N/12024 foram concedidas às então Recorrentes, assim como o E/40 e as marcas N/11862, N/12023 e N/12786 foram recusadas.
Na douta sentença recorrida lê-se: "O elemento distintivo da marca registando é o mesmo das marcas concedidas às recorrentes e do estabelecimento hoteleiro da primeira recorrente.
Trata - se de uma marca forte que goza de prestígio em Macau. Sendo comum o elemento distintivo < < Landmark> > e < <置地> > é possível à Recorrida tirar partido do prestígio e do carácter distintivo das marcas e nome de estabelecimento das recorrente, pelo que, ocorre o fundamento de recusa do registo previsto na alínea c) do n.º 1 do art. 214 do RJPI.
O facto do elemento distintivo ser comum em todas aquelas é igualmente susceptível de induzir o consumidor médio em erro ou confusão quanto à proveniência dos serviços ou produtos, pelo que, ocorre também o fundamento de recusa previsto da al. e) do n.º 2 do art. 214. do RJPI. ( ... )".
Quanto ao primeiro fundamento, secundamos a douta sentença proferida nos autos de Rec. n.º CV3-08-0038 CRJ (N/15323) segundo a qual:
"(...) E, por outro lado, porque, mesmo que concluíssemos que sim, estaria por demonstrar aquela dimensão qualitativa do prestígio associado às marcas das Recorrentes que vimos ser elemento de demonstração indispensável para se concluir pela existência de marca de prestígio.
De resto isto prende-se com uma outra questão, que é aprova da proeminente notoriedade.
Se é certo que em determinadas situações essa notoriedade pode ser considerada um "facto notório", no sentido processualmente relevante previsto no art. 434º, n.º 1 do CPCM, na concreta situação agora em litígio tal não sucede. (...) Como é bom de ver, pelo simples compulsar dos autos, tal prova não foi feita pela Recorrentes que era quem tinha o respectivo ónus ..
(...) e como tal não ocorre o terceiro fundamento para a recusa do registo da marca (...) invocado pelas Recorrentes.
É facto notório e, portanto, a não carecer de prova, que as marcas como Coca-Cola, Macdonalds, Mercedes, Toyota, Sony, Apple, são marcas de prestígio.
Nos termos da citada disposição legal deve considerar -se "facto notório", o facto que é do conhecimento geral. Ora, (...) Não existe comparação possível entre as marcas referidas no número anterior e outras que seguramente existem nos mais diversos sectores económicos e a marca da Recorrente, no que ao respectivo prestígio concerne ....
Assim, fácil é de concluir que não se demonstra que a marca da recorrente seja uma marca de prestígio na RAEM e, como tal, não ocorre o fundamento para a recusa do registo.
A finalizar esclareça-se que, este nosso entendimento não colide nem contraria aquele que assumimos na sentença proferida no processo que agora tem o CV3-04-000S-CRJ. Com efeito, na referida sentença não abordamos a questão do prestígio das marcas das Recorrentes mas tão só a da notoriedade das marcas da aqui Recorrida e Recorrente naquele recurso e, a título incidental, a notoriedade da marca de uma das Recorrentes. Ora, o que aqui releva e está em causa é justamente, saber se as marcas das Recorrentes que podem ser notórias são, igualmente, marcas de prestígio. E vimos que não são. (...)".
Quanto ao segundo fundamento, da al. e) do n.º 2 do art. 214°, procedendo à decomposição analítica da norma legal referida, podemos inferir que, para que ocorra recusa do registo da marca, toma-se necessária a verificação de três requisitos.
Importa apreciar o último dos requisitos que a lei refere: a susceptibilidade de indução do consumidor em erro ou confusão.
Destinando-se a marca a serviços diferentes daqueles que a Recorrente disponibiliza no seu estabelecimento, afigura-nos que, aos olhos de um consumidor médio, é de considerar que este não poderá estabelecer qualquer ligação entre os serviços marca aqui em causa e o estabelecimento da Recorrente de modo a pensar que é esta que oferece aqueles serviços.
No entender da entidade Recorrida, o uso de caracteres "香港" na marca em crise "置地香港", é suficiente para afastar a aplicação porque no contexto geográfico que é o nosso, marcado pela proximidade entre a RAEM e a RAEHK e da qual decorrem diversas interacções regionais de variada natureza e que transforma a proximidade geográfica em verdadeira proximidade existencial, o consumidor médio sabe bem que existe aquilo que poderíamos designar, de modo genérico, por "Landmark de Macau" e de "Landmark de Hong Kong " e que, um e outro, são realidades económicas, comerciais e empresariais diversas.
Conclusão
Deverá pois, ser negado provimento ao recurso e manter-se a decisão do Tribunal a quo.
Foram colhidos os vistos legais.
II - FACTOS
Vem provada a factualidade seguinte:
Em 16.11.2004 a Recorrente requereu o registo da marca N/15326 para os serviços da classe nº 37 a qual consiste no seguinte:
- cf. fls. 1 do proc. adm. apenso -;
O pedido de registo foi publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau (BORAEM), II Série, de 05.11.2005 – cf. fls. 13 do proc. adm. apenso -;
Por despacho de 22.11.2005 proferido a folhas 1198 do processo administrativo apenso foi concedido o pedido de registo da marca N/15326 com base nos fundamentos constantes da informação de folhas 1198/1208 do mesmo processo cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
O Despacho referido na alínea c) foi publicado no Boletim Oficial da RAEM, II Série, de 11.01.2006 – cfr. fls. 1209 do proc. adm. apenso -;
As marcas N/11862, N/12023 e N/12786 não foram concedidas – cfr. fls. 218/301 -.
A marca N/11861 constituída por
para a classe 35ª foi concedida a “E” tendo sido requerida em 29.07.2003 – cf. fls. 386 -.
A marca N/12024, para a classe 42ª foi concedida a C – cf. fls. 371/385 .
III - FUNDAMENTOS
1. O objecto do presente recurso passa pela análise das questões que, na óptica da ora recorrente, A e podem fazer inverter o decidido na 1ª Instância, ao ter-se determinado a recusa da marca N/1536, oportunamente por ela requerida, pedido que fora aceite pela DSE (Direcção dos Serviços de Economia).
2. Para melhor acompanhamento das posições em confronto transcreve-se a base legal mais directamente pertinente, extraída do Dec- Lei n.º 97/99/M, de 13 de Dez. (diploma que aprovou RJPI – Regime Jurídico da Propriedade Industrial)).
Prevê o artigo 214º do RJPI:
(Fundamentos de recusa do registo de marca)
1. O registo de marca é recusado quando:
a) Se verifique qualquer dos fundamentos gerais de recusa da concessão de direitos de propriedade industrial previstos no n.º 1 do artigo 9.º;
b) A marca constitua, no todo em parte essencial, reprodução, imitação ou tradução de outra notoriamente conhecida em Macau, se for aplicada a produtos ou serviços idênticos ou afins e com ela possa confundir-se, ou que esses produtos possam estabelecer ligação com o proprietário da marca notória;
c) A marca, ainda que destinada a produtos ou serviços sem afinidade, constitua reprodução, imitação ou tradução de uma marca anterior que goze de prestígio em Macau, e sempre que a utilização da marca posterior procure tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da marca ou possa prejudicá-los.
2. O pedido de registo também é recusado sempre que a marca ou algum dos seus elementos contenha:
a) Sinais que sejam susceptíveis de induzir em erro o público, nomeadamente sobre a natureza, qualidades, utilidade ou proveniência geográfica do produto ou serviço a que a marca se destina;
b) Reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem, para produtos ou serviços idênticos ou afins, que possa induzir em erro ou confusão o consumidor, ou que compreenda o risco de associação com a marca registada;
c) Medalhas de fantasia ou desenhos susceptíveis de confusão com as condecorações oficiais ou com as medalhas e recompensas concedidas em concursos e exposições oficiais;
d) Brasões ou insígnias heráldicas, medalhas, condecorações, apelidos, títulos e distinções honoríficas a que o requerente não tenha direito, ou, quando o tenha, se daí resultar o desrespeito e o desprestígio de semelhante sinal;
e) A firma, nome ou insígnia de estabelecimento, ou apenas parte característica dos mesmos, que não pertençam ao requerente ou que o mesmo não esteja autorizado a utilizar, se for susceptível de induzir o consumidor em erro ou confusão;
f) Sinais que constituam infracção de direitos de autor ou de propriedade industrial.
3. O facto de a marca ser constituída exclusivamente por sinais ou indicações referidos nas alíneas b) e c) do n.° 1 do artigo 199.º não constitui fundamento de recusa se aquela tiver adquirido carácter distintivo.
4. O interessado na recusa do registo da marca a que se refere a alínea b) do n.º 1 só pode intervir no respectivo processo quando prove já ter requerido em Macau o respectivo registo ou o faça simultaneamente com o pedido de recusa.
5. O interessado na recusa do registo da marca a que se refere a alínea c) do n.º 1 só pode intervir no respectivo processo quando prove já ter requerido em Macau o respectivo registo para os produtos ou serviços que lhe deram grande prestígio, ou o faça simultaneamente com a reclamação.
E o artigo 215ª:
(Reprodução ou imitação de marca)
1. A marca registada considera-se reproduzida ou imitada, no todo ou em parte, por outra, quando, cumulativamente:
a) A marca registada tiver prioridade;
b) Sejam ambas destinadas a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins;
c) Tenham tal semelhança gráfica, nominativa, figurativa ou fonética com outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto.
2. Considera-se reprodução ou imitação parcial de marca, a utilização de certa denominação de fantasia que faça parte de marca alheia anteriormente registada, ou somente do aspecto exterior do pacote ou invólucro com as respectivas cores e disposição de dizeres, medalhas e recompensas, de modo que pessoas analfabetas os não possam distinguir de outras adoptadas por possuidor de marcas legitimamente utilizadas.
3. Vejamos, sinteticamente, os diversos argumentos apresentados.
Na decisão da DSE, depois de visualisadas as marcas em confronto,
a marca registada 11861
e a marca registanda N/15326
,
a marca N/15326 foi admitida porque se entendeu que “não existindo reprodução ou imitação de marca, também não ocorrem actos de concorrência desleal, porque as marcas não se confundem, uma é mista e outra é nominativa e em ambas o elemento geográfico está presente, diferenciando as empresas em causa e portanto a origem dos serviços que ambas tencionam prestar na RAEM.” (cls. do parecer que a decisão proferida integrou, vertida a fls 1208 do processo instrutor).
O Mmo Juiz do TJB julgou procedente o recurso, revogando aquela decisão, com os seguintes fundamentos:
Nas marcas referidas supra o elemento distintivo é a expressão LANDMARK em inglês ou a correspondente em caracteres chineses 置地.
O registo da marca objecto destes autos foi pedido em 16.11.2004; a marca N/11861 foi pedida em 29.07.2003.
Foi ultrapassado o prazo que lhe concedia o beneficio da prioridade com base no pedido de registo noutro país da União, tendo concluído que as marcas N/11861 e N/12024 das aqui recorridas E, e outras e oponentes ao registo da marca registanda N/15326, ora recorridas, gozam de prioridade de registo.
As marcas destinam-se a classes diferentes.
Afasta-se assim a reprodução ou imitação de marca prevista no artº 215º do RJPI
Analisando os requisitos do art.º 214º, a marca registanda destina-se a serviços sem afinidade com as marcas concedidas como se apreciou supra.
O elemento distintivo da marca registanda é o mesmo das marcas concedidas às recorrentes e do estabelecimento hoteleiro da primeira recorrente.
Trata-se uma marca forte que goza de prestigio em Macau pelo que, ocorre o fundamento de recusa do registo previsto na alínea c) do nº 1 do art.º 214º do RJPI..
O facto do elemento distintivo ser comum em todas aquelas é igualmente susceptível de induzir o consumidor médio em erro ou confusão quanto à proveniência dos serviços ou produtos, pelo que, ocorre também o fundamento de recusa previsto na alínea e) do nº 2 do art.º 214º do RJPI1.
Destarte, verificando-se no caso em apreço os fundamentos de recusa previsto na alínea c) do nº 1 e alínea e) do nº2 do art.º 214º do RJPI, sem necessidade de outras considerações, impõe-se concluir pela necessária procedência do recurso e revogação do despacho que concedeu a marca objecto destes autos.
Estes argumentos são enfatizados pela E e outras, ora recorridas.
A DSE inverte a posição assumida e vem agora defender, porventura por lapso, a bondade da decisão judicial ora recorrida, ainda que a sua argumentação inculque em sentido diverso daquele por que conclui, sustentando a não confundibilidade das marcas.
4. Apreciemos então os argumentos da recorrente.
Começa esta por impugnar a matéria de facto.
A este propósito só nos pronunciaremos se e na medida em que a matéria fáctica que serviu de base à fundamentação jurídica se mostrar pertinente.
Não interessará divagar sobre os alegados lapsos de escrita; não interessará relevar os registos de pretensas marcas que afinal não estão registadas se não foi nelas em que se estribou o critério da prioridade; não interessará aqui desenvolver a questão do prestígio das marcas por se entender que essa qualificação há-de derivar do enquadramento factual produzido, não deixando de ser matéria conclusiva e de direito, a extrair de determinados pressupostos e de outra matéria probanda.
É verdade que uma marca não é de prestígio por se dizer apenas que é, mesmo ressalvando as situações de uma notoriedade evidente.
Mas ainda aqui nos pronunciaremos quando for pertinente.
5. Depois, avança a recorrente A para a questão relativa à prioridade do registo para dizer que “para se concluir se a marca registanda deve ou não ser concedida à agora recorrente, terá que ser aferida, apenas, pelas marcas N/11861, para a classe 36º, e N/1204, para a classe 42ª”
E foi isso que foi feito na sentença recorrida, onde foram consideradas apenas essas marcas em confronto com a registanda N/15326.
Avancemos, então.
6. Diz a seguir que quem tem prioridade é a ora recorrente A.
Sustenta que
os sinais置地. e LANDMARK são associados, não porque tenham o mesmo significado (em chinês e em inglês, portanto não têm correspondência um com o outro) mas porque se trata de duas marcas que pertencem à A, aqui Recorrente;
a expressão chinesa置地. (que romaniza ZHI DI - mandarim - ou CHI TEI - cantonense) traduz-se para inglês LAND e integra a denominação social da,ora recorrente;
a expressão inglesa LANDMARK traduz-se para chinês地標;陸標, caracteres que romanizam, respectivamente, TEI PIU e LOKPIU.
Porém, se o Tribunal a quo entende que os sinais e LANDMARK têm o mesmo significado, é incontornável a conclusão de que a expressão LANDMARK foi registada em Macau, em primeiro lugar, pela Contestante, ora Recorrente, pois não se pode perder de vista que o Acórdão do TSI - no que se refere à marca N/ 11862 - , deu razão à Contestante, ora recorrente, na questão ligada à prioridade no registo da marca LANDMARK (para a classe 42.a).
Se os factos dados por provados no referido acórdão servem como argumentos, então, sempre se poderá dizer que, no caso e indo na esteira do que foi decidido nesta Instância, falha o primeiro requisito para se considerar a marca imitada ou reproduzida, ou seja, falha o requisito previsto na alínea a) do n.º1 do art. 215º do RJPI.
Embora não seja de todo despicienda a questão suscitada quanto à diferença e autonomia dos caracteres que reproduzem a expressão correspondente a Landmark, não vamos agora enveredar por essa análise, considerando que se tem vindo a entender como relevante em termos de elemento distintivo o conjunto dos caracteres chineses置地 enquanto tradutores dessa aproximação.2
A este propósito não deixamos aqui de actualizar e acompanhar no que concerne a esta questão e apenas para estes efeitos o que sobre o assunto referiu o TUI3, enquanto disse discordar da tese que vingou nas instâncias, segundo a qual, os caracteres香港, que significam Hong Kong, juntos aos caracteres置地 [Chi Tei] (que são a expressão utilizada em chinês para significar Landmark), ou seja, Hong Kong Landmark, permitam ao consumidor médio distinguir claramente a marca da recorrida particular香港置地 [Hong Kong Chi Tei], ou seja Hong Kong Landmark, do nome de estabelecimento - 澳門置地廣場 [Ou Mun Chi Tei Kuong Cheong], ou seja, Macau Landmark Plaza.
7. Com a Convenção de Paris, vigente em Macau, em consequência do Aviso de depósito em 30 de Novembro de 1999 pelo Ministério dos Negócios Estrangeiro da República Popular da China no depositário, do Senhor Director Geral da Organização Mundial de Propriedade Industrial sediada em Genebra, para vigorar na Região a partir de 20 de Dezembro de 1999, a Convenção de Paris para a Protecção da Propriedade Industrial de 20 de Março de 1883, estabeleceu-se o regime de propriedade de marca a partir da sua consagração nos termos do artigo 4º:
"Artigo 4º
A) - 1) Aquele que tiver apresentado, em termos, pedido de ... registo de marca de fábrica ou de comércio num dos países da União, ou o seu sucessor gozará, para apresentar o pedido nos outros países, do direito de prioridade durante os prazos adiante fixados.
C) – 1) Os prazos de prioridade atrás mencionados serão de .... seis meses para ... as marcas de fábrica ou de comércio.
2) Estes prazos correm a partir da data da apresentação do primeiro pedido; o dia da apresentação não é contado.
3) (...)
4) Deve ser considerado como primeiro pedido cuja data de apresentação marcará o início do prazo de prioridade, um pedido ulterior que tenha o mesmo objecto que um primeiro pedido anterior; de harmonia com a alínea 2), apresentação do pedido ulterior; o pedido anterior tenha sido retirado, abandonado ou recusado, sem ter sido submetido a exame público e sem deixar subsistir direitos e que não tenha ainda servido de base para reivindicação do direito de prioridade.
O pedido anterior não poderá nunca mais servir de base para reivindicação do direito de prioridade.
Quem quiser prevalecer-se da prioridade de um pedido anterior deverá formular declaração em que indique a data e o país desse pedido. Cada país fixará o momento até ao qual esta declaração deverá ser efectuada.
2) Estas indicações serão mencionadas nas publicações emanadas da Administração competente (...)."
Assim se tem por verificado o 1º requisito do artigo 215º, n.º1, al. a) do RJPI.
8. Mas para que se verifique reprodução ou imitação de marca é necessário que sejam cumulativos os requisitos do artigo 215º do CPC.
Quanto ao da alínea b) “sejam ambas as marcas destinadas a assinalar serviços ou produtos idênticos ou afins” , não nos dá a lei um conceito de serviços idênticos ou afins. A afinidade entre dois produtos ou serviços pode encontrar-se na sua aparência ou conteúdo mas pode, também, basear-se na aplicação a que se destinam, na sua possibilidade de satisfazer a mesma ou idêntica função.
Conforme se pode verificar dos pedidos de registo das marcas referidas pelas ora recorridas as respectivas interessadas lograram obter o registo das marcas:
(1) N/11861, para assinalar serviços integrados na classe 36.ª, quais sejam, arrendamento e gestão predial; avaliação predial; financiamento predial; investimento predial; corretagem predial; serviços de corretagem predial; serviços de agência predial; gestão predial relacionada com terrenos, estradas, pontes, «power stations», edifícios de escritórios, prédios e construções e infra-estruturas; serviços de agência de habitação; agentes de habitação; serviços de actuário; recebimento de rendas; aluguer de acomodação; agência de aluguer e de «leasing»; serviços de gestão de acomodação; aluguer de apartamentos; aluguer de andares; aluguer de escritórios; «leasing» predial; avaliação predial e evolução financeira predial; provisão de informação financeira via «internet»; serviços de segurança, depósito e emissão de «travel vouchers»;
(2) N/12024, que se destinam a assinalar a prestação de serviços da classe 42ª. : hotéis, restaurantes, restaurante com sala de dança, serviços de bares, salão de beleza, ginásios, massagens, serviços de “catering”, fornecimento de facilidades para apoio de recepções sociais, convenções, banquetes e outros eventos similares;
Sendo que, com a marca aqui em apreciação,
(3) N/15326, pretende-se assinalar serviços da classe 37.ª: obras de construções e supervisões de estruturas; restauração de construções; manutenção e reparação de construções, obras de construções e objectos contidos nas construções; manutenção de plantas, decorações de flores e plantas e horticultura; gestão de assuntos de construções e outras obras de construções; serviços de gestão de obras de construções; embelezamentos de obras interiores; instalação e manutenção de construções, obras de construções e equipamentos e acessórios de construções; isolamentos térmicos e isolamentos acústicos de construções; construções de locais comerciais e lojas; limpeza de construções (externas); limpeza de construções (internas); lavagem de janelas; obras de construções; demolição de construções; pinturas de interior e exterior de casas; aplicação de gesso, aplicação de estuque; manutenção e reparação de cofres; aluguer de equipamentos de construção; informações de construção; informações de reparação; instalação, manutenção e reparação de aparelhos e equipamentos para escritórios; exploração de pedras; instalação, manutenção e reparação de equipamentos de aquecimento; instalação, manutenção e reparação de equipamentos eléctricos; instalação, manutenção e reparação de equipamentos de ar condicionado; instalação, manutenção e reparação de aparelhos de alarme de incêndio; instalação, manutenção e reparação do sistemas de anti-roubo.
Ora, daqui resulta não haver afinidade entre os serviços que as titulares das marcas acima referidas pretendem oferecer e os serviços que a ora recorrente, pretendente à marca n.º N/15326 pretende oferecer.
9. Quanto ao requisito da alínea c) do art. 215º remetemo-nos para a posição do TUI já acima aludida, dando até esse requisito como verificado.
Mas na inverificação de todos eles não temos por certa a imitação da marca.
10. Isto, não obstante o Tribunal a quo ter considerado que as marcas N/11861, para a classe 36.ª e a marca N/12024, para a classe 42.ª, são marcas de prestígio e, assim, ter dado por verificado o fundamento de recusa previsto no art.º 214.º, n.º 1, alínea c).
Não se acompanha esse entendimento, não havendo elementos constantes do processo que permitam concluir que as marcas N/11861 e N/12024 são marcas de prestígio.
O prestígio mede-se pelo reconhecimento da qualidade de dada marca, o seu conhecimento generalizado, a ligação do consumidor à marca, seja em termos de se lhe ligar, usar os produtos ou serviços respectivos, seja em termos efectivos ou de apetência, tudo enquadrado por uma acção do titular da marca de prestígio no sentido de criar uma ligação entre a marca e o público em geral, não descurando a promoção e divulgação da mesma.
Ora se acções houve nesse sentido, como refere a ora recorrente, resultaram elas da iniciativa da sua iniciativa, face aos elementos constantes dos autos, sendo certo que não basta a promoção de um dado edifício denominado “LANDMARK” como se tal facto fosse determinante para o alcance de prestígio e de notoriedade das marcas “LANDMARK” e “CHI TEI”, na RAEM.
Importando ainda referir que notoriedade não significa prestígio.
A marca de prestígio deve obedecer a dois requisitos: gozar de excepcional notoriedade e gozar de excepcional atracção e/ou satisfação junto dos consumidores.
Assim se conclui no sentido de que não se verifica o conceito de imitação de marca, não se podendo ter por preenchido o requisito do n.º 1, al. c) do art. 214º do RJPI, ou seja de que não deixou de haver imitação da marca, ainda que para serviço não afim, por as recorridas serem detentoras de uma marca de prestígio.
11. Importará agora apreciar o fundamento de recusa previsto na alínea e) do n.º 2 do art.º 214.º do RJPI, pelo facto de uma das ora recorridas, integrar na sua denominação social a expressão “LANDMARK”, não tendo ela autorizado a ora recorrente A, a utilizá-la para compor as suas marcas, acolhendo, assim, a tese defendida pelas ora recorridas.
Pretende a impetrante que tal fundamento só funciona se a coincidência de elementos da marca e do nome ou denominação social for susceptível de induzir o consumidor em erro ou confusão, enquanto reconhece que a firma (denominação social, nome social) é também um elemento da propriedade industrial, porquanto integra os chamados sinais distintivos do comércio; porém, regulada no Código Comercial e diz que a firma tem uma finalidade diferente da marca e da do nome do estabelecimento, regulados no Regime Jurídico da Propriedade Industrial.
E essa finalidade permite-lhe afirmar que só em casos muito especiais (em que os produtos ou serviços são comercializados com o nome da firma) a coincidência de elementos pode induzir o consumidor em erro ou confusão, pois, o facto da firma servir para distinguir a actividade económica e não os produtos ou serviços, arreda a possibilidade do consumidor ter um contacto directo com as empresas, isto é, enquanto que a marca é um sinal distintivo de objectos, a firma é um sinal distintivo de sujeitos.
Embora seja verdade que a denominação social da 3.ª Autora/Recorrente e, agora, Recorrida, integre a expressão “LANDMARK”, não há factos alegados que permitam extrair a conclusão de que há possibilidade de induzir em erro ou confusão o público consumidor que estiver em contacto com um serviço assinalado pela marca que se pretende registar (N/15326, para a classe 37.ª) e a dita empresa.
Perante isto não deixamos de ter presente o que o TUI observou no processo 21/2009:
“Pois bem, discorda-se da tese que vingou nas instâncias, segundo a qual, os caracteres香港, que significam Hong Kong, juntos aos caracteres置地 [Chi Tei] (que são a expressão utilizada em chinês para significar Landmark), ou seja, Hong Kong Landmark, permitam ao consumidor médio distinguir claramente a marca da recorrida particular香港置地 [Hong Kong Chi Tei], ou seja Hong Kong Landmark, do nome de estabelecimento - 澳門置地廣場 [Ou Mun Chi Tei Kuong Cheong], ou seja, Macau Landmark Plaza.
Na verdade, não parece que uma designação de proveniência geográfica, como Hong Kong, seja capaz de fornecer eficácia distintiva aos caracteres置地 [Chi Tei].
Manifestamente, na marca香港置地 [Hong Kong Chi Tei], traduzida para Hong Kong Landmark, não é a designação “Hong Kong” que tem eficácia distintiva. É antes置地 [Chi Tei], ou seja, “Landmark”.
O mesmo acontece no nome de estabelecimento - 澳門置地廣場 [Ou Mun Chi Tei Kuong Cheong], ou seja, Macau Landmark Plaza. O que tem capacidade distintiva é置地 [Chi Tei], ou seja, “Landmark”.
Da mesma maneira, recorrendo a um exemplo, nos nomes Holiday Inn Hong Kong e Holiday Inn Plaza, o que tem carácter distintivo é Holiday Inn e não Hong Kong ou Plaza. Um consumidor médio pensará que há ligação entre os dois nomes. Isto sem esquecer que, provavelmente, Holiday Inn é uma marca mais forte que Landmark.
No caso dos autos, um consumidor médio em Macau, que não faça um exame atento ou confronto, pode confundir o nome do estabelecimento com a marca, pode pensar que a marca está ligada ao estabelecimento de hotel Landmark, que aquela marca provém deste estabelecimento.
Afigura-se-nos, portanto, que a mencionada marca, a que foi concedido o registo em Macau, é susceptível de induzir o consumidor em erro ou confusão com o nome do
Processo n.º 21/2009 14 Processo n.º 21/2009 15 estabelecimento.”
Com todo e muito respeito por tudo quanto acima se afirma, até que nem se deixa de acompanhar tudo quanto ali se diz, parece, no entanto, que esta linha argumentativa se é certeira quanto a uma possível confundibilidade das expressões em referência, seja em língua chinesa, seja em língua inglesa, não se pode aproveitar para se concluir no sentido da verificação do requisito previsto na aludida alínea e) do artigo 214º do RJPI.
É que esse obstáculo só deve funcionar quando estivermos perante uma afinidade de produtos ou serviços entre os correspondentes à marca registanda e às actividades desenvolvidas por uma dada empresa.
Seria levar muito longe a proibição de utilização de um elemento, ainda que parcial, existente numa dada firma, numa qualquer marca de um produto ou serviço que nada tivesse a ver com aquela empresa. Imagine-se v.g. a interessada na marca de um pneu ficar impedida de usar uma parte da firma de uma empresa detentora de um hotel.
Estamos em crer que aquela doutrina elaborada a partir da citada norma deve ser aplicada com alguma adequação e assim não se encaixar na situação presente vista a dissemelhança de actividades desenvolvidas.
Parece ser unânime o entendimento doutrinário de que este fundamento de recusa só fará sentido quando estiverem em causa actividades concorrentes.4
Só há confundibilidade quando há concorrência.5
As ora recorridas, limitam-se a dizer que a sua denominação social integra elementos que compõem a marca registanda, mas não se preocupam em fazer um contraponto entre a actividade que exerce e em que medida há o perigo de engano (risco de provocar confusão junto do consumidor) quanto à proveniência dos serviços – os que oferece e os que a Requerente da marca, aqui Parte Contrária e, agora, Recorrente, pretende oferecer assinalando-os com a marca registanda.
Fica, assim, arredada a hipótese de considerar existente o alegado fundamento de recusa previsto no art.º 214.º, n.º 2, alínea e), do RJPI, por falta do requisito “possibilidade de induzir o consumidor em erro ou confusão”.
12. Pese o facto de o Tribunal a quo não se ter debruçado sobre o fundamento, também, invocado pelas ora recorridas, E e outras, não se deixará de analisar a tese defendida pelas mesmas, na sua petição inicial, no sentido de que o pedido do registo da marca nominativa aqui em questão deve ser recusado, por se verificar o fundamento de recusa previsto na alínea c) do n.º 1 do art.º 9.º do sempre citado RJPI.
O Regime Jurídico da Propriedade Industrial da RAEM consagrou como fundamento de recusa o reconhecimento de que deve ser vedado ao requerente do registo de uma marca o exercício de concorrência desleal e que esta é possível independemente da sua intenção - cfr. art.º 9.º, n.º 1, alínea c), do RJPI.
A lei não descreve as situações que podem configurar concorrência desleal - ao contrário do que acontece em termos de Direito Comparado com o art. 317º do CPI de Portugal -, destacando-se na Doutrina, exemplificativamente situações integrantes dessa figura
Assim, são indicadas, a título de exemplo, na Doutrina e na Lei comparadas, as seguintes: situação objectiva de concorrência desleal por confusão de produtos (mas já não confusão de marcas que é uma situação que remete para outro fundamento de recusa com pressupostos próprios); pedido de registo de uma marca de facto usada há mais de seis meses por um outro concorrente (tendo em conta que dentro do prazo de seis meses o titular da marca de facto goza do direito de prioridade para efectuar o registo); pedido de registo de uma marca cujo registo haja sido pedido num dos países da Convenção da União de Paris por um outro concorrente que tenha cumprido o prazo de prioridade de seis meses para o pedido do registo na RAEM previsto no art.º 4º C-1 da Convenção de Paris; pedido de registo de marca que contenha o nome ou insígnia, não registados, de um estabelecimento comercial muito conhecido; pedido de registo de uma marca feito com intenção malévola de evitar o pedido iminente (e não ignorado) do registo da mesma marca por parte de um concorrente; pedido de registo de uma marca que, de modo ardiloso como é apresentada, é susceptível de induzir em erro o consumidor; falsas afirmações ou indicações de qualidade, de crédito ou reputação próprios, com o fim de beneficiar do crédito e reputação alheios.6
Ora, no caso presente, não se vislumbra que a requerente da marca, ora recorrente, detentora de uma marca conhecida e reconhecida em Hong Kong, ao apresentar o pedido de registo da marca n.º N/15326, se tenha comportado de modo desleal.
O facto alegado pelas ora recorridas de poder vir a beneficiar do investimento feito por elas, mas não provado, poderia consubstanciar, efectivamente, um dos requisitos do fundamento previsto na alínea c) do n.º 1 do art.º 214.º, qual seja, o de pretender tirar partido indevido do prestígio da marca, se se pudesse dar por provado que: (i) há reprodução de marca (que, no caso, não se verifica conforme supra se alegou e provou); (ii) se se pudesse dar por provado que as marcas das recorridas ão marcas de prestígio, isto é, de excepcional notoriedade, também não demonstrado.
Acresce que se tem presente, a admitir-se que existe confundibilidade e todos os seus pressupostos, que já este Tribunal por várias vezes, - v.g. processos 86/2005 - III, de 13 de Julho de 2006, 516/2006, de 7 de Junho de 2007, 645/2007, de 8 de Maio, de 2008, 83/2008, de 22 de Janeiro - , reconheceu a validade de uma prioridade de registo à ora recorrente no sentido de validar a sua legitimidade na defesa de uma dada marca primeiramente registada num ordenamento da União de Paris, qual seja o de Hong Kong, o que nada tem a ver com a utilização para efeitos de registo uma única vez a que alude o artigo 17º, n.º 2 do RJPI.
Assim se conclui no sentido de que não se verificam os fundamentos de recusa que levaram o Tribunal a quo a alterar o despacho de concessão da marca , para assinalar serviços integrados na classe 37.ª.
IV - DECISÃO
Pelas apontadas razões, acordam em conceder provimento ao recurso, revogando a decisão recorrida, mantendo-se, consequentemente o despacho nos termos do qual foi concedido o registo da marca n.º N/15326, para assinalar serviços da classe 37.ª, requerido pela ora recorrente.
Custas pela recorrente.
Macau, 31 de Março de 2011,
João A. G. Gil de Oliveira (Relator)
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
1 Veja-se Acórdão do TUI a folhas 322/337.
2 - Cfr. processos 516/2006, 645/2007, 83/2008, 1071/2009
3 - Processo n.º 21/2009, de 21 de Outubro
4 - CPI, Jorge Cruz, 2003, 610, 629
5 - Américo da Silva carvalho, Dto de Marcas,2004, 304 e segs
6 - Art. 317º do CPI de Portugal e Couto Gonçalves, Dto de Marcas, 2000, 167
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707/2010 1/38