Processo n. 84/2009 (Recurso Laboral)
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 07/04/2011
Descritores: - Prescrição de créditos laborais
- Trabalho doméstico
- Contrato de trabalho
- Salário
- Gorjetas
- Descanso semanal, anual, feriados obrigatórios
SUMÁRIO:
I- Entre o prazo de 15 anos para a verificação da prescrição, fixado no Cod. Civil de 1999, e o de 20, estabelecido no Cod. Civil de 1966, aplicar-se-á o segundo, se o seu termo ocorrer primeiro, face ao disposto no art. 290º, nº1.
II- Para esse efeito, não se aplica ao contrato entre um trabalhador do casino e a STDM as normas dos arts. 318, al. e) do Cod. Civil de 1966 e 311º, al. c) do Cod. Civil vigente porque a relação laboral assim firmada entre as partes é de trabalho e não equivalente à do contrato doméstico.
III- A composição do salário, através de uma parte fixa e outra variável, admitida pelo DL n. 101/84/M, de 25/08 (arts. 27º, n.2 e 29º) e pelo DL n. 24/89/M, de 3/04 (arts. 25º, n.2 e 27º, n.1) permite a integração das gorjetas na segunda.
IV- Considera-se, ao abrigo do art. 17º, do DL 101/84/M, que se o trabalhador não gozou o dia de descanso semanal, nem o novo dia de descanso (substitutivo) que a lei estabeleceu para o compensar, mesmo que tenha recebido a remuneração pelo serviço prestado nesses dias, terá que ser compensado com mais um dia de salário pela compensação não gozada (salário x1).
Ao abrigo do DL 24/89/M (art. 17º, n.1,4 e 6, al. a), tem o trabalhador direito a gozar um dia de descanso semanal, sem perda da correspondente remuneração (“sem prejuízo da correspondente remuneração”); mas se nele prestar serviço terá direito ao dobro da retribuição (salário x2).
V- De acordo com o DL 101/84/M, os feriados obrigatórios do 1 de Janeiro, 1 de Maio e 1 de Outubro, são gozados sem perda de remuneração. Mas se o empregado trabalhar nesses dias, terá direito a remuneração complementar (+50%) se o serviço for indispensável para fazer face a acréscimo de trabalho não previsível (art. 21º, n. 2) e, nesse caso, a fórmula a utilizar será salário x1,5. Nos outros casos, deverá receber um dia de salário, porque a tanto o obriga o art. 28º (salário x1).
VI- Se o trabalhador prestar serviço em feriados obrigatórios remunerados na vigência do DL 24/89/M, além do valor do salário recebido efectivamente pela prestação, terá direito a uma indemnização equivalente a mais dois de salário (salário médio diário x3).
VII- O trabalhador que preste serviço em dias de descanso anual ao abrigo do DL 101/84/M, mesmo tendo auferido o salário correspondente, terá direito ainda a uma compensação equivalente a mais um dia de salário médio diário, ao abrigo dos arts. 23º, n.1 e 24º, n.2 (salário médio diário x1).
Na vigência do DL 24/89/M, terá o trabalhador a auferir, durante esses dias, o triplo da retribuição, mas apenas se tiver sido impedido de os gozar pela entidade patronal. À falta de prova do impedimento desse gozo de descanso, tal como sucedeu com o DL n. 101/84/M, que continha disposição igual (art. 24º, n2), também aqui, ao abrigo do art.21º, n.2 e 22º, n.2, deverá receber também um dia de salário (salário médio diário x1).
Processo n. 84/2009
Recorrentes: STDM e A
Recorridos: os mesmos.
no Tribunal de Segunda Instância da RAEM
I- Relatório
A, com os demais sinais dos autos, moveu contra a STDM acção de processo comum de trabalho pedindo a condenação desta no pagamento de Mop$664.751,62 como compensação pelos descansos semanais, feriados obrigatórios (remunerados e não remunerados) e descansos anuais não gozados desde 25 de Agosto de 1986, data em que para a ré começou a trabalhar, até Novembro de 1999, altura em que cessou a relação laboral entre ambos.
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Tendo a ré STDM suscitado, na oportunidade, a excepção de prescrição na sua contestação, dela o Ex.mo juiz da 1ª instância conheceu no despacho saneador (fls. 96 e sgs.), julgando parcialmente prescritos os créditos peticionados, concretamente os referentes a descanso anual, ao descanso semanal do período anterior a 8 de Maio de 1987 e aos feriados obrigatórios em data anterior a 8 de Maio de 1987.
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Recorreu então a autora, representada pelo M.P., em cujas alegações apresentou as seguintes conclusões:
“1 - Não é verdade que os créditos reclamados pela Autora (créditos resultantes de não gozo dos descansos semanais e anuais e dos feriados obrigatórios) possuem a natureza de prestação renovável, tanto na vigência do Código Civil de 1966 como no actual Código Civil de Macau.
2 - Pelo que violou a sentença, que julgue procedente a excepção da prescrição do pedido relativo ao descanso anual, os artigo 310.º, al. g) do Código Civil de 1966 e artigo 303.º, al. f) do actual Código Civil.
3 - No caso concreto, é todo o regime contido no Código Civil de 1966 que tem aplicabilidade e não o novo regime de Código Civil de Macau por falta de regulamentação específica no domínio do direito de trabalho.
4 - A prescrição é um efeito jurídico da inércia prolongada do titular do direito no seu exercício.
5 - O legislador prevê situações, ligadas a relações de especial proximidade e confiança e até de conflito de interesses, em que não é justo que a inércia prolongada do titular do direito no seu exercício seja desvalorada e daí a previsão legal das chamadas causas bilaterais de suspensão do prazo de prescrição.
6 - Uma das causas bilaterais de suspensão do prazo de suspensão é a pendência da relação de trabalho doméstica.
7 - No nosso entender, a particular relação de trabalho propriamente dita tem toda a semelhança, na sua essência, com a relação de trabalho doméstica, e todos os elementos necessários (subordinação jurídica, retribuição) estão plenamente verificados em ambos os tipos de contrato de trabalho. Ao fim e ao cabo, pode afirmar-se que o contrato de trabalho doméstico é uma sub-espécie do contrato de trabalho.
8 - Existe uma zona de intersecção teleológica entre esses dois tipos de contrato de trabalho que justificaria tratamento legal semelhante.
9 - Se assim é, significaria que o legislador teria alargado o âmbito da causa bilateral de suspensão prevista na alínea e) do artigo 318.º do Código Civil de 1966 a todas as relações laborais e não apenas às relações laborais de trabalho doméstico.
10 - Na verdade, o ponto comum ou zona de intersecção reside-se no facto de que a inibição no exercício do direito por parte do trabalhador doméstico, decorrente da situação de subordinação jurídica em que se encontra e do receio de suscitar conflito com a entidade patronal que pode, inclusivamente, colocar em risco o seu emprego, verifica-se da mesma maneira na relação de trabalho propriamente dito, não se descortina, alguma diferença de carácter substantivo.
11 - Assim, e perante a lacuna legislativa verificada na ordem jurídica de Macau (no âmbito de Código Civil de 1966), o intérprete do direito deve procurar colmatar a mesma lacuna, recorrendo à analogia.
12 - Se assim é, não é difícil de concluir que, por aplicação analógica do artigo 318.º, al. e) do Código Civil de 1966, o prazo de prescrição dos créditos emergentes da relação laboral só começa a correr a partir da cessação do contrato de trabalho.
13 - Pelo que o artigo 318.º, al. e} do Código Civil de 1966 foi também violada.”
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Prosseguiram os autos para julgamento, tendo sido proferida sentença que condenou a STDM no pagamento da indemnização de Mop$ 529.029,50.
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Inconformada, a STDM recorreu da sentença, concluindo as suas alegações como segue:
“I. A Sentença de que ora se recorre é nula por erro na subsunção da matéria de facto dada como provada relativamente ao impedimento, por parte da Ré, do gozo de dias de descanso, por parte da A., e bem assim, relativamente ao tipo de salário auferido pela A., ao condenar a Ré ao pagamento de uma indemnização com base no regime do salário mensal;
II. Recorde-se aqui que estamos em sede de responsabilidade civil, pelo que a Recorrida apenas terá direito de ser indemnizada caso prove que a Recorrente praticou um acto ilícito.
III. E, de acordo com os arts. 20º, 17º, 4, b) e 24º do RJRT, apenas haverá comportamento ilícito por parte do empregador - e consequentemente direito a indemnização - quando o trabalhador seja obrigado a trabalhar em dia de descanso semanal, anual e ou em dia de feriado obrigatório e o empregador não o remunere nos termos da lei.
IV. Ora nada se provou que fosse susceptível de indicar qualquer acção ou omissão (muito menos ilícita) por parte da Recorrente que haja obstado ao gozo de descansos pela A, não podendo, por isso, afirmar-se o seu direito ao pagamento da indemnização que pede, a esse título - relembre-se que ficou provado que a A precisava da autorização da R. para ser dispensada dos serviços;
V. Porque assim é, carece de fundamento legal a condenação da ora Recorrente por falta de prova de um dos elementos essenciais à prova do direito de indemnização da A, ora Recorrida, i.e., a ilicitude do comportamento da R., ora Recorrente. Caso assim não se entenda sempre deve aplicar-se, para o cálculo de qualquer compensação pelo trabalho alegadamente prestado em dias de descanso, o regime previsto para o salário diário;
Assim não se entendendo, e ainda concluindo:
VI. A A, ora Recorrida, não estava dispensada do ónus da prova quanto ao não gozo de dias de descanso e devia, em audiência, por meio de testemunhas ou por meio de prova documental, ter provado que dias alegadamente não gozou.
VII. Assim sendo, salvo o devido respeito, o Tribunal a quo errou na aplicação do direito, pelo que o douto Tribunal de Segunda Instância deverá anular a decisão e absolver a Recorrente dos pedidos deduzidos pela A., ora Recorrida.
VIII. Nos termos do nº1 do art. 335º do Código Civil (adiante CC) “Àquele que invoca um direito cabe fazer prova dos factos constitutivos do direito alegado.”.
IX. Por isso, e ainda em conexão com os quesitos 11º a 15º da base instrutória, cabia à A., ora Recorrida, provar que a Recorrente obstou ou negou o gozo de dias de descanso.
X. Ora nada se provou que fosse susceptível de indicar qualquer acção ou omissão (muito menos ilícita) por parte da Recorrente que haja obstado ao gozo de descansos pela A., não podendo, por isso, afirmar-se o seu direito ao pagamento da indemnização que pede, a esse título.
Assim não se entendendo, e ainda concluindo:
XI. O nº 1 do art. 5º do RJRT dispõe que o diploma não será aplicável perante condições de trabalho mais favoráveis que sejam observadas e praticadas entre empregador e trabalhador, esclarecendo o art. 6º deste diploma legal que os regimes convencionais prevalecerão sempre sobre o regime legal, se daqui resultarem condições de trabalho mais favoráveis aos trabalhadores.
XII. O facto de a A. ter beneficiado de um generoso esquema de distribuição de gorjetas que lhe permitiu, ao longo de vários anos, auferir rendimentos que numa situação normal nunca auferiria, justifica, de per si, a possibilidade de derrogação do dispositivo que impõe ao empregador o dever de pagar um salário justo, pois caso a Recorrida auferisse apenas um salário justo - da total responsabilidade da Recorrente e pago na íntegra por esta - certamente que esse salário seria inferior ao rendimento total que a Recorrida, a final, auferia durante os vários anos em que foi empregado da Recorrente.
XIII. Não concluindo - e nem sequer se debruçando sobre esta questão - pelo tratamento mais favorável à trabalhadora resultante do acordado entre as partes consubstanciado, sobretudo, nos altos rendimentos que a A. auferia - incorreu o Tribunal a quo em erro de direito, o que constitui causa de anulabilidade da sentença ora em crise.
Assim não se entendendo e ainda concluindo:
XIV. A aceitação do trabalhador de que aos dias de descanso semanal, anual e em feriados obrigatórios não corresponde qualquer remuneração teria, forçosamente, de ser considerada como válida.
XV. Os artigos 24º e seguintes da Lei Básica consagram um conjunto de direitos fundamentais, assim como os artigos 67º e seguintes do Código Civil consagram um conjunto de direitos de personalidade e, do seu elenco não constam os alegados direitos violados (dias de descanso anual e feriados obrigatórios).
XVI. Não tendo o legislador consagrado a irrenunciabilidade dos direitos em questão, devem os mesmos ser considerados livremente renunciáveis e, bem assim, considerada eficaz qualquer limitação voluntária dos mesmos, seja essa limitação voluntária efectuada ab initio, superveniente ou ocasionalmente.
XVII. Donde, deveria o Tribunal ter considerado eficaz a renúncia ao gozo efectivo de tais direitos, absolvendo a aqui Recorrente do pedido.
Assim não se entendendo, e ainda concluindo:
XVIII. Ao trabalhar voluntariamente - e, realce-se, não ficou em nenhuma sede provado que esse trabalho não foi prestado de forma voluntária, muito pelo contrário - em dias de descanso (sejam eles anual, semanal ou resultantes de feriados), a Recorrida optou por ganhar mais.
XIX. E, não tendo a Recorrida, sido impedida de gozar quaisquer dias de descanso anual, de descanso semanal ou quaisquer feriados obrigatórios, é forçoso é concluir pela inexistência do dever de indemnização da STDM ora Recorrente.
Ainda sem conceder, e ainda concluindo:
XX. Por outro lado, jamais pode a ora Recorrente concordar com a fundamentação da Mma. Juiz a quo quando considera que a A., ora Recorrida, era remunerada com base num salário mensal, sendo que toda a factualidade dada como assente indica o sentido inverso, ou seja, do salário diário.
XXI. m primeiro lugar, porque a proposta contratual oferecida pela ora Recorrente à generalidade dos trabalhadores dos casinos, como a aqui Recorrida era a mesma há cerca de 13 anos: auferiam um salário diário fixo de MOP$4.10/dia, HKD$10.00/dia ou HKD$15.00, ou seja, um salário de acordo com o período de trabalho efectivamente prestado.
XXII. Acresce que o “esquema” do salário diário nunca foi contestado pelos trabalhadores na pendência da relação contratual e, ademais, nunca os trabalhadores impugnaram expressamente a alegação desse facto nas instâncias judiciais nos processos pendentes.
XXIII. Trata-se de uma disposição contratual válida e eficaz de acordo com o RJRT, que prevê, expressamente, a possibilidade das partes acordarem no regime salarial mensal ou diário, no âmbito da liberdade contratual prevista no art. 1º do RJRT.
XXIV. Ora, na ausência de um critério legal ou requisitos definidos para aferir a existência de remuneração em função do trabalho efectivamente prestado, ao estabelecer que a A., ora Recorrida, era remunerada com um salário mensal, a sentença recorrida desconsidera toda a factualidade dada como assente e, de igual forma, as condições contratuais acordadas entre as partes.
XXV. Salvo o devido respeito por entendimento diverso, a Recorrente entende que, nessa parte, a decisão em crise não está devidamente fundamentada ao tentar estabelecer como imperativo (i.e., o regime de salário mensal em contratos de trabalho típicos) o que a lei define como dispositivo (i.e., as partes poderem livremente optar pelo regime de salário mensal ou diário em contratos de trabalho típicos).
XXVI. E, é importante salientar, esse entendimento por parte da Mma. Juiz a quo, teve uma enorme influência na decisão final da presente lide e, em última instância, no cálculo do quantum indemnizatório, pelo que deve ser reapreciada por V. Exas. no sentido de fixar o salário auferido pela A, ora Recorrida, como salário diário, o que expressamente se requer.
Por outro lado,
XXVII. O trabalho prestado pela Recorrida em dias de descanso foi sempre remunerado em singelo.
XXVIII. A remuneração já paga pela ora Recorrente à ora Recorrida por esses dias deve ser subtraída nas compensações devidas pelos dias de descanso a que a A. tinha direito, nos termos do RJRT.
XXIX. Maxime, o trabalho prestado em dia de descanso semanal, para os trabalhadores que auferem salário diário, deve ser remunerado como um dia normal de trabalho (cfr. al. a) e b) do n.º 6 do art.? 17º do RJRT, tendo o Tribunal a quo descurado essa questão.
XXX. Ora, nos termos do art. 26º, n.º 4 do RJRT, salário diário inclui a remuneração devida pelo gozo de dias de descanso e, nos termos do art. 17º, n.º 6, al. b), os trabalhadores que auferem salário diário verão o trabalho prestado em dia de descanso semanal remunerado nos termos do que for acordado com o empregador.
XXXI. No presente caso, não havendo acordo expresso, deverá considerar-se que a remuneração acordada é a correspondente a um dia de trabalho.
XXXII. Veja-se os recentes Acórdãos do Tribunal de Última Instância da RAEM de 21 de Setembro de 2007, de 22 de Novembro de 2007 e de 27 de Fevereiro de 2008 proferidos, respectivamente, nos Processos n.º 28/2007, n.º 29/2007 e n.º 58/2007, nos quais foi consagrado o entendimento de que a compensação pelo não gozo de dias de descanso semanal deve ser paga em singelo, e não em dobro, uma vez que o Autora já foi paga em singelo (...).
XXXIII. Parece claro que, mesmo que a Recorrente tivesse de pagar a compensação do alegado não gozo de dias de descanso semanal, o trabalho prestado em dia de descanso semanal deve ser pago x2, e uma parte já foi paga, então a R. apenas está em falta com o salário diário xl.
XXXIV. A decisão recorrida enferma assim de ilegalidade, por errada aplicação da alínea b) do nº 6 do art. 17º e do artigo 26º do RJRT, o que importa a revogação da parte da sentença que condenou a Recorrente ao pagamento relativo às compensações pelo não gozo dos dias de descanso, o que, expressamente, se requer.
Ainda concluindo:
XXXV. As gorjetas dos trabalhadores de casinos não são parte integrante do salário, e bem assim as gorjetas auferidas pelos trabalhadores da STDM.
XXXVI. Neste sentido a corrente Jurisprudencial dominante, onde se destacam os acórdãos do Tribunal de Última Instância proferidos no âmbito dos Processos n.º 28/2007, 29/2007 e 58/2007, datados de 21 de Setembro de 2007, 22 de Novembro de 2007 e 27 de Fevereiro de 2008, respectivamente.
XXXVII. Também neste sentido se tem pronunciado a doutrina de forma unânime.
XXXVIII. O ponto essencial para a qualificação das prestações pecuniárias enquanto prestações retributivas é quem realiza a prestação. A prestação será retribuição quando se trate de uma obrigação a cargo do empregador.
XXXIX. Nas gratificações há um animus donandi, ao passo que a retribuição consubstancia uma obrigatoriedade.
XL. Qualifica Monteiro Fernandes expressamente as gorjetas dos trabalhadores da STDM como “rendimentos do trabalho”, esclarecendo que os mesmos são devidos por causa e por ocasião da prestação de trabalho, mas não em função ou como correspectividade dessa mesma prestação de trabalho.
XLI. Na verdade, a reunião e contabilização são realizadas nas instalações dos casinos da STDM, mas com a colaboração e intervenção dos empregados de casino, funcionários da tesouraria e de funcionários do governo que são chamados para supervisionar a contabilização das gorjetas.
XLII. Salvo o devido respeito pela Mma. Juiz a quo, a posição de sustentar a integração das gorjetas no conceito jurídico de salário, com base no conceito abstracto e subjectivo de “salário justo”, não tem qualquer fundamento legal, nem pode ter aplicação no caso concreto.
XLIII. Em primeiro lugar, porque o que determina se certo montante integra ou não o conceito de salário, são critérios objectivos, que, analisados detalhadamente, indicam o contrário, se não vejamos: as gorjetas são montantes, (i) entregues por terceiros; (ii) variáveis; (iii) não garantidos pela STDM aquando da contratação; (iv) reunidas e contabilizadas pelos respectivos empregados do casino, juntamente com funcionários da tesouraria e do governo de Macau.
XLIV. E, fortalece a nossa tese, a posição do governo de Macau que nunca considerou necessário a definição de um montante mínimo salarial que pudesse servir de bitola para a apreciação - menos discricionária - do que é um salário justo.
XLV. Dessa forma, o cálculo de uma eventual indemnização, que não se concede, só poderia levar em linha de conta o salário diário, excluindo-se as gorjetas.
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Não houve contra-alegações.
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Cumpre decidir.
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II- Os Factos
A sentença deu por provada a seguinte factualidade:
- A R. foi, desde o início da passada década de sessenta até 31 de Março de 2002, a concessionária, em regime de exclusividade, de uma licença de exploração de jogos de fortuna e azar em casino (alínea A) dos factos assentes).
- Entre a A. e a R. foi estabelecida um relação em 25 de Agosto de 1986 (alínea B) dos factos assentes).
- Dessa relação a A. recebia uma quantia fixa, no valor de MOP4,10 por dia, desde o início até 30 de Junho de 1989, e de HKD10,00 por dia, desde de 1 de Julho de 1989 até a 30 de Abril de 1995, e de HKD15,00 por dia, desde 1 de Maio de 1995 (alínea C) dos factos assentes).
- A distribuição das gorjetas dadas pelos clientes dos casinos era feita a todos os trabalhadores da R., de acordo com a categoria profissional a que pertenciam (alínea D) dos factos assentes).
- Ao gozo de dias de descanso pelos trabalhadores da R., não corresponderia qualquer remuneração (alínea E) dos factos assentes).
- Os trabalhadores da R. eram livres de pedir o gozo de dias' de descanso (alínea F) dos factos assentes).
- Desde que tal gozo de dias não pusesse em causa o funcionamento da empresa da R. o pedido era deferido (alínea G) dos factos assentes).
- Pode-se conceber a elaboração de um esquema rotativo de gozo de descansos semanais, anuais e feriados pelos trabalhadores da R. (alínea H) dos factos assentes).
- Em 19 de Setembro de 1988, a A. deu à luz uma filha, B (alínea I) dos factos assentes).
- Em 2 de Novembro de 1991, a A. deu à luz um filho, C (alínea J) dos factos assentes).
- A. relação referida em B) dos factos assentes, cessou em Novembro de 1999 (resposta ao quesito da 1º da base instrutória).
- Dessa relação a A. recebia ainda uma quantia variável proveniente da gorjetas dadas pelos clientes (resposta ao quesito da 2º da base instrutória).
- As quais são distribuídas' segundo um critério fixado pela R. (resposta ao quesito da 3º da base instrutória).
- O rendimento recebido pela A. entre os anos de 1986 a 1999 foi de (resposta ao quesito da 6º da base instrutória):
• MOP$15.970,00 em 1986
• MOP$38.730,00 em 1987
• MOP$21.967,00 em 1988
• MOP$99.933,00 em 1989
• MOP$116.186,00 em 1990
• MOP$81.912,00 em 1991
• MOP$134.663,00 em 1992
• MOP$150.881,00 em 1993
• MOP$172.874,00 em 1994
• MOP$188.561,00 em 1995
• MOP$209.695,00 em 1996
• MOP$198.248,00 em 1997
• MOP$193.206,00 em 1998
• MOP$110.739,00 em 1999
- A R. foi sempre regular na entrega das gorjetas à A. (resposta ao quesito da 7º da base instrutória).
- A A. era expressamente proibido de guardar as gorjetas dadas pelos clientes dos casinos (resposta ao quesito da 9º da base instrutória),
- O horário de trabalho da A. era fixado pela R. por turnos (resposta ao quesito da 10º da base instrutória).
- Desde o início da relação até à data da cessação da relação, nunca a A. descansou um período consecutivo de 24 horas em cada período de 7 dias sem perda do respectivo rendimento (resposta ao quesito da 11 º da base instrutória).
- Nunca a A. descansou 6 dias por ano sem perda do respectivo rendimento (resposta ao quesito da 12º da base instrutória).
- Até 30 de Março de 1989, nunca a A. descansou nos dias 1 de Janeiro, 1 de Maio, 1 de Outubro, 10 de Junho, nos dias de Chong Chao, Chong Yeong e durante três dias no Ano Novo Chinês tendo a A. trabalhado nesses dias (resposta ao quesito da 13º da base instrutória),
- De 30 de Março de 1989 a Novembro de 1999, nunca a A. descansou nos dias 1 de Maio, durante três dias no Ano Novo Chinês, e no dia 10 de Junho; de 30 de Março de 1989 a 1992 e 1994 a Novembro de 1999, a A não gozou descanso no dia 1 de Janeiro; de 30 de Março de 1989 a 1997 e em 1999, a A não gozou descanso nos dias de Cheng Meng e no dia 1 de Outubro; de 30 de Março de 1989 a 1998, a A. não gozou descanso nos dias de Chong Chao e Chong Yeong tendo a A. trabalhado nesses dias (resposta ao quesito da 14º da base instrutória),
- Sem que a R. tivesse proporcionado qualquer acréscimo no rendimento da A. (resposta ao quesito da 15º da base instrutória).
- Nem compensado a A. com outro dia de descanso (resposta ao quesito da 16º da base instrutória).
- A A gozou, em 1992, 3 dias de descanso; em 1993, 38 dias de descanso, entre ele o dia 1 de Janeiro; em 1994, 32 dias de descanso; em 1995, 48 dias de descanso; em 1996, 24 dias de descanso; em 1997, 40 dias de descanso; em 1998, 30 dias de descanso, entre eles os dias de Cheng Meng em 5 de Abril e 1 de Outubro; em 1999, 66 dias de descanso, entre eles os dias Chong Chao em 24 de Setembro e Chong Yeong em 17 de Outubro (resposta ao quesito da 17º da base instrutória),
- B nasceu do primeiro parto da A. (resposta ao quesito da 18º da base instrutória).
- Por força da gravidez e parto referido em I) dos factos assentes, a A. gozou descanso (resposta ao quesito da 19º da base instrutória).
- Durante esse período a A. não recebeu qualquer rendimento (resposta ao quesito da 20º da base instrutória).
- C nasceu do segundo parto da A. (resposta ao quesito da 21 º da base instrutória).
- Por força da gravidez e parto referido em J) dos factos assentes, a A. gozou descanso por mais 35 dias após o parto (resposta ao quesito da 22º da base instrutória).
- Durante esse período a A. não recebeu qualquer rendimento (resposta ao quesito da 23º da base instrutória).
- As gorjetas dadas pelos clientes eram reunidas, contabilizadas e depois distribuídas, por uma comissão paritária com a seguinte composição: um membro do departamento de tesouraria da R., um “floor manager” (gerente do andar) e um ou mais trabalhadores da R. (resposta ao quesito da 24º da base instrutória).
- As gorjetas eram diariamente reunidas e contabilizadas e, de dez em dez dias, distribuídas (resposta ao quesito da 25º da base instrutória).
- Nunca em anos em que o rendimento proveniente das gorjetas sofreu flutuações várias, a A tivesse solicitado à R. uma correcção dessas flutuações (resposta ao quesito da 26º da base instrutória).
- A actividade da R. é rigorosamente contínua não se interrompendo em qualquer dia ou momento, seja em fins de semana, estações de veraneio ou feriados obrigatórios (resposta ao quesito da 27º da base instrutória).
- O esquema referido em H) dos factos assentes é complexo (resposta ao quesito da 30º da base instrutória).
- A A. não gozou dias de descanso porque quis auferir o respectivo rendimento (resposta ao quesito da 31º da base instrutória).
- A R. permitia aos seus trabalhadores o gozo de um número ilimitado de dias de descanso não remunerado (resposta ao quesito da 32º da base instrutória).
- Os trabalhadores da R. podiam requerer até 40 dias de descanso não remunerado, desde que para tanto preenchessem um formulário e apresentassem o requerimento com antecedência (resposta ao quesito da 33º da base instrutória).
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III- O Direito
A) Do saneador (a prescrição)
O despacho saneador absolveu a ré do pedido relativamente aos créditos resultantes do descanso anual e, bem assim, do descanso semanal e feriados obrigatórios no período anterior a 8/5/1987. O raciocínio laborioso é este: os direitos aos descansos semanais, anuaias e feriados têm natureza renovável. A mesma natureza não teria já, por exemplo, o direito resultante do não gozo; este não seria renovável (o que aconteceria com o referente ao descanso semanal e feriado. O mesmo não concluiu, porém, quanto ao não gozo do descanso anual, com o argumento de que o trabalhador sempre os pode reclamar passados dois ou três anos, o que significaria que a regularidade e previsibilidade do direito não se perderia com o seu não gozo, aplicando-se-lhe assim o art. 303º, al. f), do CC (isto é, seriam direitos renováveis). Por isso, considerando que o prazo seria de cinco anos estariam prescritos os créditos respectivos, tendo em atenção o disposto aquela disposição legal e em conta que a Ré fora notificada em 7 de Maio de 2007 para a tentativa de conciliação e que a relação laboral cessou em 19 de Novembro de 1999. Quanto aos outros direitos resultantes do não gozo do descanso semanal e feriados obrigatórios, o despacho saneador considerou estarem prescritos todos os ocorridos até 7 de Maio de 1987 (20 anos antes da data da notificação para a tentativa de conciliação, segundo o art. 309º do CC de 1966). No que concerne aos descansos semanais e feriados obrigatórios posteriores a 1 de Novembro de 1999 e até à cessação da relação laboral, aplicou o prazo de 15 anos (art. 302º do CC de 1999), pelo que não estariam prescritos.
Conhecendo.
Acompanhamos o acórdão deste TSI de 11/06/2009, no Proc. 78/2009, por corresponder à jurisprudência que vem sendo seguida de modo constante. “(…) Importa não esquecer que os créditos não são os salários, mas sim as compensações por direitos não gozados. E esses direitos não são prestações renováveis, pela razão simples, desde logo, que não se chegaram a verificar. E mesmo em relação aos salários dos trabalhadores, a prestação de trabalho não se coaduna com a natureza de uma qualquer prestação renovável, antes se traduzindo na contrapartida de um serviço prestado durante um certo período, sob direcção e instruções da entidade empregadora, correspondendo cada salário a um trabalho próprio, não se podendo dizer que o salário seguinte é a renovação do anterior. Ainda, a não consideração de um prazo curto de prescrição insere-se num entendimento que leva a considerar que a relação de proximidade existente pode condicionar o exercício do direito pela parte do trabalhador, pelo que deve ele mostrar-se protegido, como acontecia anteriormente para o serviço doméstico e agora para as relações de trabalho em geral.
(…) Estabelece o art. 306º do Código Civil de 1966 que “o prazo de prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido; se, porém, o beneficiário da prescrição só estiver obrigado a cumprir decorrido certo tempo sobre a interpelação, só findo esse prazo se inicia o prazo da prescrição”. Não está prevista, de modo expresso, entre as causas bilaterais de suspensão reguladas no art. 318º do Código Civil de 1966, a situação que agora nos ocupa e relativa a créditos emergentes de relação de trabalho não-doméstico. Com efeito, o Código Civil de 1966, prevendo embora a figura do contrato de trabalho, relegou para legislação especial a sua regulamentação – cfr. art. 1152º e 1153º do Código Civil de 1966. O art. 318º do Código Civil de 1966, regulando sobre as causas bilaterais da prescrição, determina, entre o mais que agora não releva, que a prescrição não começa nem corre “entre quem presta o trabalho doméstico e o respectivo patrão, enquanto o contrato durar” (al. e) do art. 318º do Código Civil). (…) Por aplicação da regra geral, dir-se-á que o prazo de prescrição em relação a cada um dos créditos aqui reclamados iniciou o seu curso com o respectivo vencimento, uma vez que, a partir daí a parte Autora passou a estar em condições de exercer os seus direitos. Assim, em relação aos créditos vencidos relativos ao período situado entre o início e o dia correspondente a vinte anos antes da tentativa de conciliação ou da respectiva notificação ter-se-á verificado a prescrição. (…) Não há lacuna na presente situação. A lacuna, como diz o Prof. Oliveira Ascensão, é uma fatalidade, uma 2 incompleição do sistema normativo que contraria o plano deste2. Fatalidade que vai ao ponto de se negar a sua própria existência, porquanto no ordenamento jurídico não pode haver verdadeiras lacunas, enquanto ausência de solução jurídica para o caso omisso.3 Só perscrutando, interpretando e valorando o ordenamento podemos dizer se há ou não uma lacuna. Ora, na obediência daquelas tarefas, logo se divisa uma norma genérica que abarca a situação em apreço, norma essa que decorre do disposto no artigo 306º, n.º 1 do CC66 - aplicável ao tempo da relação laboral invocada -, complementada pelo art. 307º que estipula para os casos de rendas perpétuas ou vitalícias ou para os casos de prestações análogas, em que a prescrição do direito do credor corre desde a exigibilidade da primeira prestação que não for paga. (…). Há uma regra relativa ao início da prescrição e as situações em que o legislador quis que o prazo se suspendesse, tendo a preocupação de elencar, entre milhentas situações possíveis, apenas umas tantas e, no que respeita às causas bilaterais da suspensão, somente uma meia dúzia de casos. Pretendeu o legislador que essa previsão fosse meramente exemplificativa? Seguramente que não. A letra e o espírito da norma, afastam essa possibilidade. As situações causas de suspensão da prescrição, são demasiado concretas, específicas e particulares para comportarem essa natureza. No que ao trabalho doméstico respeita é particularíssima essa previsão, não podendo o legislador ignorar que a par desse tipo de relação de trabalho existiam todas as restantes relações laborais, não fazendo sentido que teleologicamente pretendesse abranger todas as relações laborais a partir daquela particularização. Se o legislador excepcionou para o serviço doméstico uma causa de suspensão de prescrição, a interpretação analógica está vedada em relação às normas excepcionais - art. 11º do CC66 e 10º do CC99. (…) E em termos de interpretação, ainda que o princípio não seja absoluto, estamos em crer que vale aqui o brocardo ubi lex voluit dixit, ubi noluit tacuit. Nem por razões teleológicas se aceita uma interpretação extensiva como se pretende. São por demasiado evidentes todas as razões que podiam justificar uma protecção do trabalhador por via desse instituto, dadas as particulares relações, teias, dependências, receios, anseios, instabilidades que se criam nas relações laborais, que nem vale a pena desenvolver por demais o tema, aliás, bem focalizado na decisão recorrida. Mas são igualmente diferentes e visíveis as diferenças entre a relação laboral comum e o serviço doméstico. Este, a merecer um tratamento autónomo em Macau e no direito Comparado e apartar-se daquele. Ora são essas razões de diferença que fazem perceber a opção do legislador e tanto basta para afastar uma razão teleológica de aplicação da causa de suspensão da prescrição estabelecida para o serviço doméstico em relação a todas as relações laborais. Afigura-se não se estar perante uma situação não prevista nem regulada, não sendo legítimo ao aplicador da lei substituir-se ao legislador no aperfeiçoamento e melhoria do sistema laboral e protecção do trabalhador. Admite-se que possa haver alguma limitação na liberdade e na vontade do trabalhador, mas importa não esquecer que todas as situações que o legislador contemplou contêm sempre alguma razão que pode justificar a sua inércia e passividade. E dessa constatação será legítimo extrapolar para se considerar suspensa a prescrição quando se suspeite dessa inibição? Afigura-se que essa há-de ser uma opção do legislador. Nesta conformidade, sem necessidade de outros desenvolvimentos somos a julgar parcialmente procedente o recurso interposto e a considerar, um prazo normal de prescrição de 20 anos, a iniciar-se com o vencimento de cada uma das prestações em dívida...”.
Cremos que a transcrição daquele segmento do acórdão serve para iluminar, sem mais acrescentos, a solução a dar ao caso (vide ainda o Ac. do TSI de 19/03/2009, Proc. n. 690/2007). E sobre a o dies a quo da contagem do prazo diz-se no Ac. do TSI de 31 de Março de 2011, Proc. 780/2007:
“Deverá ter-se em conta o disposto no art. 318º, al. e), do C.C. de 1966, segundo o qual a prescrição não começa, nem corre “entre quem presta o trabalho doméstico e o respectivo patrão, enquanto o contrato durar” (negrito nosso), tal como o defende o recorrente?
Recordemos que a legislação laboral da RAEM nada diz sobre o assunto. E, por tal motivo, entende o recorrente que se deve aplicar a referida norma como forma de integração da lacuna. Isto é, o prazo só deve começar a correr após a cessação da sua relação laboral, tal como acontecia com as relações de trabalho doméstico. E em apoio dessa opinião, chama à colação o art. 311º, al. c), do C.C. vigente, segundo o qual “a prescrição não se completa entre quem presta o trabalho doméstico e o respectivo empregador por todos os créditos, bem como entre as partes de quaisquer outros tipos de relações laborais, relativamente aos créditos destas emergentes, antes de 2 anos decorridos sobre o termo do contrato de trabalho”.
Ora, em primeiro lugar, desta última disposição não decorre que o prazo apenas se inicia com o termo da relação laboral. Ao dizer no seu proémio que “a prescrição não se completa” está a partir de um pressuposto, que é o de haver um prazo já iniciado, o qual não terminará senão ao fim de um período de dois anos após o termo do contrato de trabalho. Trata-se, em suma, de uma disposição que estabelece uma suspensão do prazo prescricional e não um diferimento do “dies a quo”.
Em segundo lugar, na medida em que ela traz à luz do dia uma estatuição até então inexistente, a ideia de uma novação parece sair reforçada. Quis o legislador tomar posição expressa pela primeira vez sobre o assunto, não sendo legítimo inferir que essa sempre fora a sua intenção implícita contida na legislação anterior.
Mas regressemos ao art. 318º do C.C. de 1966. Poderemos ver nela a possibilidade de aproveitamento do seu regime aos casos por ela não abrangidos? Não, em nossa opinião.
Trata-se de uma norma muito particular que o legislador quis aplicável somente ao trabalho doméstico, por o considerar distinto e com especificidades relativamente ao universo geral da contratação laboral. Havendo uma relação de grande proximidade, até mesmo de confiança pessoal entre empregador e trabalhador doméstico, com maior incidência quando o trabalhador é “interno”, qualquer incursão judicial para reclamar créditos deste contra aquele iria abalar definitivamente a relação. Porque foi isso o que o legislador anteviu, logo tratou de trazer para a norma um mecanismo de defesa dos interesses do trabalhador, protegendo-o desse risco. Mas não tendo o legislador avistado idêntico perigo nas demais relações laborais, nenhuma necessidade viu de consagrar a mesma solução para elas. Assim sendo, uma vez que nesta matéria o silêncio da lei sobre os demais casos de serviço não doméstico não representa nenhum vazio legal, não podemos falar de lacuna que mereça ser preenchida (este é o sentido unânime da jurisprudência produzida sobre o assunto, de que a título de exemplo citamos o Ac. do TSI de 19/03/2009, Proc. n. 690/2007).
Quer isto dizer que por aplicação do prazo de prescrição de vinte anos (Código Civil de 1966), se mostram todos prescritos os créditos anteriores a 7 de Maio de 1987, data da notificação para a tentativa de conciliação. E não apenas os referentes aos descansos semanais e feriados obrigatórios, senão também os alusivos ao descanso anual. Portanto, em relação aos descansos anuais, procede o recurso, na medida em que a decisão recorrida os considerou totalmente prescritos, enquanto na presente decisão também eles só se devem considerar prescritos se anteriores àquela data. Deverão contar-se, pois, os vencidos a partir dessa data.
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B) Da sentença
1- Defende a recorrente STDM que a sentença errou quanto aos factos dados como apurados, por não se ter demonstrado que o trabalhador esteve impedido de gozar os dias de descanso semanal, anual, feriados obrigatórios ou sequer que nunca os tenha gozado.
A nosso ver, vê mal o problema a recorrente. Em primeiro lugar, a formulação dos quesitos teve por base a factualidade alegada e não sofreu por parte da STDM reclamação quanto à matéria ora em apreço. Em segundo lugar, o que importava apurar era somente se o trabalhador gozou ou não os dias de descanso e os feriados. Saber se a eles o trabalhador renunciou é já questão impeditiva que à STDM cumpria alegar e demonstrar (art. 335º, n.2, do C.C.).
Somos levados a dizer, portanto, que não existe falta de prova, nem sequer erro na apreciação da prova. Pensa a recorrente que sim, quanto ao primeiro ponto, por achar que o impedimento por parte do trabalhador em gozar aqueles dias de descanso seria necessário à aquisição do direito a compensação. Mas não. A lei não faz depender a compensação de qualquer obstáculo criado pelo empregador ao descanso do trabalhador. Pura e simplesmente abstrai dele. Por isso, não seria necessário que se provasse que o trabalhador foi obrigado a trabalhar contra a sua vontade naqueles dias (sobre este ponto, apenas seremos levados a concordar com a recorrente quanto ao descanso anual, mas a seu tempo trataremos dele).
Diferente se nos afigura já a questão do erro na apreciação da prova, sobre os dias em que o trabalhador não gozou o seu direito ao descanso. Para a recorrente andou mal o tribunal em dar por provada a respectiva matéria de facto, por alegadamente nenhuma das testemunhas ter afirmado que o trabalhador não gozou dias de descanso.
A resposta antevê-se, porém, fácil.
Em 1º lugar, cumpriria à recorrente indicar as passagens da gravação em que se funda para infirmar a decisão sobre a matéria de facto (art. 599º , n.2, do CPC). E não o fez.
Em 2º lugar, a decisão em causa repousa numa convicção do julgador que, sem outros dados adicionais que possamos conferir, é impossível de controlar.
Portanto, à falta de melhores elementos, não se pode dar razão à recorrente sobre este ponto.
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2- Recorrente ainda invoca considerações sobre a liberdade contratual. Pergunta-se: é possível que as partes da relação laboral afastem o conteúdo das normas que conferem o direito ao descanso semanal, anual e feriados obrigatórios?
Toda a gente tem estado de acordo que as normas laborais sedimentam a opinião do favorecimento da parte mais fraca económica ou socialmente, que é o trabalhador. E é por isso que, quando o legislador positiva direitos em favor do trabalhador fá-lo de forma impostergável. Isto é, não se tem entendido ser permitido que, contra a vontade do legislador vertida na norma, o trabalhador acorde com o empregador um regime de trabalho que lhe retire direitos. Estamos, pois, a falar de direitos irrenunciáveis, que de alguma maneira, o art. 30º, da Lei Básica traduz ou acolhe à luz do princípio da inviolabilidade da dignidade humana. Pode o trabalhador acordar com o empregador o valor do salário, dentro de certos limites. O que não pode é prescindir de certos direitos nascidos apenas em seu exclusivo benefício. É o caso, por exemplo, do direito ao descanso.
Disso, aliás, nos dá conta o art. 5º, do DL n.101/84/M e 5º, do DL n.24/89/M ao estabelecer o princípio do tratamento mais favorável.
E não se diga que o acordo firmado entre recorrente e recorrido neste caso concreto é mais favorável ao trabalhador, que durante décadas, recebeu valores remuneratórios mais elevados. Tanto no caso da natureza do contrato, no da composição do salário, como no do gozo de dias de descanso e feriados, nada do que se provou encaixa bem no princípio, antes pelo contrário.
Assim, mesmo que se tivesse provado a renúncia a tais direitos – e não se provou - ela seria inoperativa, porque prejudicial aos interesses do trabalhador.
Isto não quer dizer, bem entendido, que trabalhar nesses dias de descanso signifique uma renúncia totalmente abdicativa do correspondente direito. Pode acontecer que o trabalhador preste voluntariamente serviço nesses dias (ver art. 17º, n.5, do DL n. 101/84/M), mas para isso mesmo é que a própria lei prevê formas substitutivas compensatórias (v. art. 566º, do Cod. Civil). Ou seja, tanto é um direito forte (embora não intangível) que só pode ser quebrado num contexto favorável ao trabalhador. E isto é o que a própria lei prevê, de nada valendo a invocação dos usos e costumes, porque estes, pelo modo como a recorrente os desenha, não afastam minimamente as normas imperativas a que nos vimos referindo. O trabalho praticamente contínuo dos “croupiers”, devido à escassez de mão-de-obra especializada para o serviço nas bancas dos casinos de Macau, teria que ser compensado como manda a lei e nunca como o terá querido o empregador ou como, em tese geral, o admitisse o próprio trabalhador. Os usos e costumes nunca poderiam sobrelevar-se ao domínio normativo.
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3- A seguir insurge-se contra a composição do salário, tal como definida na sentença. Era mensal o salário? Qual a sua composição?
É para nós questão ultrapassada a de que o salário integra uma parte fixa e outra variável. Problema é como calculá-lo: se ao dia, se ao mês e qual o seu valor.
Verdade que o trabalhador recebeu uma quantia fixa diária de MOP$ 4,10 durante um período e de HKD$10,00 a partir de certa altura (facto 4). Verdade também que nos dias em que não trabalhava não recebia remuneração (facto 23). Todavia, a ausência de remuneração nesses dias não advém de qualquer acordo prévio, face à latitude do facto levado à base instrutória (perguntava-se se no momento da celebração do acordo entre A. e R. esta informou aquele de que o gozo de dias de descanso não era remunerado) e à forma restritiva da resposta obtida. A prova desse facto poderia levar, sim, a conclusão diferente sobre o período a que corresponderia a remuneração, se conjugada com o valor da quantia fixa acertada para cada período diário. Mas o encurtamento da resposta ao alcance da pergunta, já não permite pensar que o salário era determinado em função de período de trabalho efectivamente prestado (art. 28º, n.1, do DL n. 101/84/M, de 25/8).
Aliás, a questão está consolidada neste TSI em termos tais que deles não somos capazes de divergir. Veja-se, por exemplo, o que foi dito no Ac. de 14/09, no Rec. N. 407/2006:
“…a “quota-parte” de “gorjetas” a ser distribuída ao Autor, em montante definido unilateralmente pela Ré, integra precisamente o salário mensal do Autor, pois caso contrário e vistas as coisas à luz de um homem médio colocado na situação concreta do ora Autor, ninguém estaria disposto a trabalhar por conta da Ré em tantos anos seguidos nos seus casinos em horários de trabalho por esta fixados…ou seja, em horários de turnos necessariamente árduos para qualquer pessoa humana, se tivessem de ser cumpridos continuadamente em anos seguidos, sabendo entretanto, de antemão, que a prestação fixa do seu salário era de valor muito reduzido”.
E também o Ac. de 15/07/2010, Proc. n. 928/2010:
“…o qual o trabalhador estava obrigado a trabalhar por turnos de seguinte forma:
1º e 6º turnos: das 07h00 às 11h00, e das 03h00 às 07h00;
3º e 5º turnos: das 15h00 às 19h00, e das 23h00 às 003h00 do dia seguinte;
2º e 4º turnos: das 11h00 às 15h00, e das 19h00 às 23h00
Como se sabe, é por imposição legal e pelos termos do contrato de concessão para exploração dos jogos de fortuna e azar que os casinos têm de funcionar ininterruptamente durante 24 horas. Ora, se é compreensível e justificável a fixação dos turnos, nos termos que vimos supra, pela entidade patronal para fazer face à necessidade de assegurar o funcionamento contínuo legalmente imposto dos seus casinos, já custa perceber como é quê é possível os seus trabalhadores afectados aos casinos, em vez de auferirem um salário mensal, que é única forma de pagamento conciliável com a organização dos turnos durante 24 horas para assegurar a continuidade do funcionamento dos casinos, auferirem antes um salário diário determinado em função do número de dias de trabalho em que quis trabalhar e efectivamente prestou serviço. Na verdade, basta dar uma vista de olhos aos turnos fixados e à forma como os turnos estão organizados e distribuídos durante as 24 horas, em especial o 5º turno que se inicia às 23h00 num dia e termina às 03h00 de madrugada no dia seguinte, já se apercebe da impossibilidade prática de determinar o período de trabalho diário para efeitos de cálculo do alegado salário diário”.
Assim sendo, tal como este TSI tem admitido em casos similares, é de considerar que o salário era mensal, para cujo apuramento médio diário entrará o valor conjunto da parte fixa e da variável, tal como apurado nas respectivas respostas.
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4- Como calcular a compensação?
Como o contrato atravessou a vigência dos DL n.s 101/84/M e 24/89/M, o apuramento dos valores compensatórios tem que obedecer a ambos os diplomas, consoante o período a que respeite o trabalho nos dias de descanso, sem esquecer, porém, que alguns deles estão prescritos, como atrás foi julgado.
Vamos por partes. Assim:
a) Descanso semanal
Na vigência do DL n. 101/84/M
A sentença utilizou a fórmula AxBx1 (em que A são os dias de descanso vencidos e não gozados; B é o salário médio diário e 1, o factor correspondente à compensação).
Pois bem. Em cada sete dias de trabalho, o trabalhador tinha direito a gozar um período de descanso de 24 horas consecutivas (art. 17º, n.1, cit. dip.). E se, em vez de o gozar, o trabalhador prestasse trabalho, tinha ele direito a gozar um outro dia de descanso compensatório dentro dos 30 dias seguintes (art. 17º, n. 4). Como proceder, então, nos casos em que o trabalhador prestasse também serviço no dia que deveria ser destinado ao descanso compensatório? Substituindo esse dia de compensação não gozado por um ou por dois dias de salário?
O recorrente trabalhador defende que deverá ser por dois; a recorrente empregadora, STDM, por nenhum. Aquele, pelo facto de considerar ter trabalhado nos dias que eram dedicados ao descanso, tanto no descanso originário, digamos assim, como no substitutivo. Esta, por defender que o trabalhador só teria direito a compensação se não tivesse sido pago pelo trabalho prestado nesse dia. Mas nenhum tem razão.
Com efeito, quando o trabalhador não exerce o seu direito ao descanso no dia devido, a forma que a lei estabelece para o compensar é através da concessão de um novo dia de descanso, que será gozado dentro dos 30 dias posteriores (art. 17º, n.4).
Ora, note-se que no caso dos autos só o primitivo dia de descanso não foi compensado; mas o serviço nele prestado foi pago. Por isso, teria o trabalhador direito a transferir o descanso para outro dia. Mas, se até mesmo esse dia substitutivo tiver sido dia de trabalho, como aconteceu, quando devia ser de descanso? Como proceder?
Dois caminhos se nos afiguram possíveis e qualquer deles conduzirá ao mesmo resultado.
Não esqueçamos que o trabalhador recebeu sempre uma unidade salarial nos dias de trabalho fornecido ao empregador. Pergunta-se, então:
- O trabalhador foi pago pelo valor pecuniário que lhe era devido legalmente? Quer dizer, recebeu aquilo que sempre teria que receber mesmo sem trabalhar?
– Ou apenas foi pago pelo serviço efectivamente prestado?
Analisemos cada uma destas perspectivas (de ora em diante, por comodidade e facilidade, falaremos somente em devido, para nos referirmos ao direito pecuniário correspondente aos dias de descanso semanal anual e feriados; e falaremos em prestado, para aludirmos ao valor pecuniário correspondente ao trabalho efectivamente prestado nesses dias).
1ª Comecemos pela primeira (pagamento do devido).
Em cada dia de descanso que devia ter gozado – mas que não gozou – a STDM pagou ao trabalhador o valor salarial a que ele teria direito. E então diz-se: o patrão pagou ao empregado o dia de descanso. Nada a esse título lhe deve mais. Mas, nessa hipótese, a questão que imediatamente se põe é se, a par do valor que recebeu pelo dia de descanso, o facto de ele ter trabalhado nesse dia também deve ser remunerado.
A resposta a esta pergunta envolve um breve estudo do regime instituído pelo DL 101/84.
O legislador quis que o trabalhador que prestasse serviço nesses dias de descanso haveria de ser compensado com outro dia de descanso a gozar dentro dos 30 dias seguintes ao da prestação do trabalho. É o que diz o art. 17º, n.4 do diploma. Esta circunstância, aliada à letra do n. 5 imediato 1 tolerará a interpretação que este dia de trabalho efectivo não deve ser pago?
Não nos parece. Efectivamente, se todo o dia de descanso tem um valor pecuniário (tanto é assim que para o diploma “…o salário mensal… inclui o valor do salário dos períodos de descanso semanal…, não podendo sofrer qualquer dedução pelo facto de não prestação de trabalho nesses períodos “(art. 28º, n.1), por maioria de razão valor pecuniário deverá ter o dia de descanso em que o trabalhador gerou riqueza ao seu empregador. Não pensar desta maneira equivaleria a admitir que o empregador, com o beneplácito do legislador, pudesse sem causa (diríamos mesmo, ilegitimamente) enriquecer à custa do trabalhador. Trabalhar de graça em tal circunstância é contra o espírito do texto legal, todo ele geneticamente criado em defesa do trabalhador . Basta ler os artigos iniciais do decreto-lei para se concluir que assim é, em particular para os artigos 5º, n.2 e 6º , onde expressamente se preceitua o modo mais favorável de interpretar o diploma.
Perguntamos, por fim, agora: Terá o artigo 17º, n.5 força suficiente para destruir toda esta construção? Não. Admiti-lo seria ir outra vez contra o sentido da lei, toda ela impregnada de regras e princípios favoráveis ao trabalhador. Admiti-lo seria ver na expressão “prestar serviço voluntário” o mesmo que “prestar serviço gratuito”. Ora, para nós, trabalhar voluntariamente não quer senão dizer trabalhar livremente, não forçadamente. Não se pode ver na lei um efeito negativo tão grande à esfera do livre prestador, ao ponto de se lhe retirar o direito ao recebimento do valor pecuniário pelo serviço prestado. Isso contradiz as regras de boa hermenêutica. Aliás, para nós, a expressão em causa ainda tem outro sentido. Ao exprimir-se desse modo, o que o legislador terá querido estabelecer foi que esse direito ao descanso não é irrenunciável. O trabalhador pode trabalhar nesses dias, mas sem a isso ser obrigado (o que até está de acordo com a redacção da parte final do n. 5). Nada mais. Não podemos, portanto, ver na norma aquilo que ela, claramente, na sua letra não diz (art. 8º, n.s 2 e 3, do Cod. Civil).
Repare-se na injustiça que seria admitir que um trabalhador pudesse trabalhar sem contrapartida pecuniária: O trabalhador D não vai trabalhar no dia de descanso. Como o empregador não pode descontar-lhe esse dia (ver artigo 28º, n.1), D leva para casa no final do mês o salário completo. O colega de serviço E vai trabalhar nesse dia e ao fim do mês leva para casa o mesmo salário. Ora, o legislador não pode ter querido alguma vez admitir uma tão monstruosa desigualdade na própria criação do direito.
Não ignoramos que possa haver, a coberto do art. 23º, n.1, quem infira coisa diferente da que nós inferimos. De acordo com a sua leitura, aquele normativo só permitiria o pagamento (“sem perda de salário”) dos dias de descanso anual. A expressão “para além dos períodos de descanso semanal e dos feriados obrigatórios” não teria outro efeito senão fazer a devida demarcação em relação a estes dias de não trabalho, os quais, sendo direitos dos trabalhadores expressamente consignados, não teriam o mesmo tratamento ao nível remuneratório. Todavia, esta é uma interpretação ablativa que, em nossa opinião, vai precisamente contra o artigo 28º. Aliás, esse foi o lugar próprio do diploma onde, de maneira abrangente, o legislador quis cobrir toda a situação referente ao cálculo do salário, e onde expressamente se diz que os dias de descanso semanal, anual e feriados têm um valor (“valor dos salários dos períodos de descanso semanal, anual e feriados obrigatórios…”) que não pode sofrer qualquer dedução.
Esta questão foi, aliás, objecto de discussão no Conselho Permanente de Concertação Social aquando da alteração deste diploma, com vista à obtenção de consensos sobre aquele que viria a ser o DL 24/89/M. E se quisermos tirar conclusões seguras sobre o assunto, temos que admitir que:
a) Os empregadores não vinham pagando os dias de descanso semanal, pois faziam da lei uma “aplicação de modo elástico” (sic). Era uma prática habitual, ao que parece, mas contrária à lei.
b) O governo de então entendia expressamente que nenhuma alteração se justificava sobre essa matéria porque o dever do pagamento do descanso semanal “…resulta da lei”. Assim, ou a redacção transitava como estava nesse diploma para o novo ou, a eliminar-se do n.2 do art. 28º a expressão “descanso semanal”, haveria que fazer incluir no art. 17º a expressão “sem perda de salário”. Quer dizer, para o representante do legislador, não podia haver qualquer dúvida de que estes dias tinham que ser pagos, tal como estava definido no DL 101/84/M, e tal como haveria de ficar previsto no diploma que a este sucedesse. Porque, “o governo não tem intenção de alterar estas normas, a menos que tal resulte das reuniões”. E a verdade é que não alterou mesmo!
c) Algumas dúvidas mais sérias havia sobre o pagamento dos dias de descanso semanal em relação aos trabalhadores que auferiam “à peça”ou “ao dia”, mas não já em relação aos trabalhadores que auferiam “salário mensal”.
Portanto, a interpretação autêntica, feita a partir da fonte normativa, não deixa margem para dúvidas.
Assim, somos a entender que nesta perspectiva o empregador teria que pagar, além do devido já pago, o trabalho prestado.
Quer isto dizer, em suma, que, na perspectiva equacionada, se o trabalhador foi pago pelo devido, ainda tem a haver o prestado: 1 (um) dia de salário por cada dia de serviço prestado nesses dias. Um dia de salário, porque a lei não prevê expressamente diferente forma de remunerar o trabalhador nesses dias, senão através do art. 28º, n.1, o modo de remunerar: sendo o salário mensal, o cálculo do valor do salário de cada um dos períodos de descanso e dos feriados corresponderá à fracção percentual de todo o período. Logo, um trigésimo. A fórmula é, pois, salário x 1.
2ª Avancemos para a segunda perspectiva (pagamento do prestado).
Nesta hipótese, o empregador pagou ao trabalhador o serviço realizado em cada um desses dias de descanso. Ou seja, remunerou o trabalho prestado. Quid iuris quanto ao devido?
Nesta perspectiva, ainda mais consensual do que a primeira, o empregador não tem como fugir da responsabilidade do pagamento. Neste caso, o referido artigo 28º não permite outra leitura que não seja a de que o empregador tem que pagar o que descontou, isto é, o que não pagou.
Logo, também nesta acepção, a forma de compensar o trabalhador será através do pagamento de 1 (um) dia de salário correspondente a cada dia de descanso não gozado e não pago.
Por tal motivo, em qualquer das perspectivas, a fórmula correcta é: salário médio diário x1.
E, portanto, a sentença não merece censura nesta parte, porque respeitou a lei ao multiplicar os dias de descanso não gozados (A) pelo valor do salário médio (B), vezes o factor 1 (ver fls. 17 da sentença). Apurou o valor de Mop$ 10.191,10.
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Na vigência do DL n. 24/89/M
Vale aqui o disposto no art. 17º, n.1, 4 e 6, al. a).
Assim:
N.1: Tem o trabalhador direito a gozar um dia de descanso semanal, sem perda da correspondente remuneração (“sem prejuízo da correspondente remuneração”).
N.4: Mas, se trabalhar nesse dia, fica com direito a gozar outro dia de descanso compensatório e, ainda,
N.6: Receberá em dobro da retribuição normal o serviço que prestar em dia de descanso semanal.
Ora, como o trabalhador trabalhou o dia de descanso semanal terá direito ao dobro do que receberia, mesmo sem trabalhar (n.6, al. a)).
Na 1ª perspectiva acima avançada, se o empregador pagou o devido (pagou o dia de descanso), falta pagar o prestado. E como o prestado é pago em dobro, tem o empregador que pagar duas vezes a “retribuição normal” (o diploma não diz o que seja retribuição normal, mas entende-se que se refira ao valor remuneratório correspondente a cada dia de descanso, que por sua vez corresponde a um trinta avos do salário mensal).
Na 2ª perspectiva, se se entender que o empregador pagou um dia de salário pelo serviço prestado, continuam em falta:
- Um dia de salário (por conta do dobro fixado na lei), e ainda,
- O devido (o valor de cada dia de descanso, que não podia ser descontado, face ao art. 26º, n.1);
Portanto, a fórmula será sempre: AxBx2.
Assim, nesta parte a sentença não pode ser confirmada por ter operado com o factor 3, atribuindo-lhe a indemnização no valor de Mop$ 331.611,30. O valor devido será de Mop$ 221.074,20.
A esta importância acrescerá o valor dos dias de descanso que gozou (ver resposta ao art. 17º da Base Instrutória), que, por não terem sido pagos, o deverão ser agora em função apenas da remuneração devida em cada um deles (x1), o que perfaz, tal como decidido, o valor de Mop$122.603,70.
Tudo somado, o valor indemnizatório ascende a Mop$ 353.869,00.
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b) Feriados obrigatórios
b).1 - Na vigência do DL n. 101/84/M
- Feriados remunerados
Nos feriados obrigatórios os trabalhadores permanentes devem ser dispensados da prestação do trabalho (n. 2 do art. 20º) e têm direito à retribuição correspondente aos feriados de 1 de Janeiro, 1 de Maio e 1 de Outubro (n.3, do cit. artigo). Estes são os feriados pagos (ou pagáveis).
Portanto, gozando-os, isto é, mesmo sem prestação de trabalho, os trabalhadores deverão ser remunerados de acordo com a retribuição normal (são dispensados da prestação de trabalho sem perda de remuneração).
Supôs o legislador que não haveria problemas quanto aos feriados e que, ao menos nesses dias, haveria efectivo descanso. E tanto assim é que abriu as excepções do art. 21º, ao estabelecer que o trabalho só poderia ser prestado nesses dias de feriado obrigatório nos três casos previstos nas três alíneas do n.1.
Mas, e se for realmente prestado trabalho nesses dias de feriado obrigatório remunerado?
Responde o n. 2 do art. 21º : os trabalhadores só receberão acréscimo de salário, em valor não inferior a 50% da remuneração normal, se o serviço for indispensável ao empregador de forma a fazer face a acréscimo de trabalho não previsível.
A estatuição do art. 21º é razoavelmente harmonizável com o disposto no n. 3 do artigo precedente. Quer dizer, nos feriados não gozados nos dias 1 de Janeiro, 1 de Maio e 1 de Outubro (que sempre seriam pagos), o trabalhador receberá acréscimo de salário em função do acréscimo de trabalho mas só na situação prevista na al. b), do n.1.
Nas restantes situações (als. a) e c)), - por exemplo, no caso em que a prestação de trabalho é necessária para garantir a continuidade do funcionamento da empresa, de acordo com os usos e costumes, como é a situação dos “croupiers” dos casinos, que laboram em regime de continuidade -, pergunta-se: esse trabalho deverá ser remunerado?
Duas propostas de solução:
1ª Proposta: Não. Esse trabalho não será extraordinariamente compensado, porque o legislador não previu tal. Nesta hipótese de trabalho, haveria que reconhecer: Pode não se concordar grandemente com a solução, mas foi a que o legislador quis consagrar. A fórmula seria, pois: salário diário x 0.
2ª Proposta: Sim. Se o legislador foi imperativo ao prescrever que o empregador não pode efectuar descontos nos dias de feriado obrigatório (art. 28º, n.1), está aí a ideia de que o número 2 do art. 21º só tem sentido para os casos de acréscimo de salário. Portanto, se o trabalhador, mesmo sem prestar serviço, sempre teria direito a receber a “retribuição correspondente”, então é forçoso pensar que, no caso de ele ir realmente prestar o serviço, a contrapartida do empregador terá que ser remuneratória.
Solução adoptada: A melhor saída para a dúvida (dúvida legítima, perante um diploma confuso, pouco coerente, algo pantanoso) reside no acolhimento da segunda proposta de solução.
Não se pensar assim, equivaleria a ver frustrado o escopo do número do artigo 28º e, tal como acima concluíramos para o serviço prestado em dia de descanso semanal, corresponderia a um enriquecimento (injustificado) do empregador, que de modo nenhum o legislador alguma vez terá querido consagrar à custa do trabalhador. Nesta acepção, portanto, o trabalhador teria sempre que receber o valor da “retribuição correspondente”(art. 20º, n.3), ou seja, o devido, e ainda o valor do trabalho realizado nesse dia - que deveria ter sido de descanso - ou seja, o valor do correspondente trabalho prestado.
Se assim for, fácil se torna concluir o modo de compensar o trabalhador: se ele recebeu o devido, falta-lhe receber o prestado; e se recebeu o valor do trabalho prestado, falta-lhe receber o valor do devido.
Em qualquer dos casos, a fórmula é a mesma: salário diário x 1. Entende a sentença, porém, que não há lugar a indemnização referente aos feriados não gozados neste período (entre 8/05/1987 e 2/04/21989). Consequentemente, nesta parte, tem que ser revogada.
Assim, por serem 11 os feriados não gozados nesse período, e atendendo ao valor diário remuneratório (ver sentença a fls. 190), a indemnização a arbitrar seria de Mop $ 2.290,90. Contudo, porque o trabalhador não recorreu, vedado está a este TSI atribuir qualquer indemnização, porque limitado à pretensão do recurso.
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-Feriados não remunerados
O mesmo se diga quanto a estes feriados. Porque a sentença não os considerou, não os poderá o TSI considerar também por não estarem ser objecto do presente recurso.
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b). 2- Na vigência do DL n. 24/89/M
- Feriados remunerados
Esta lei trouxe inovações: introduziu uma indemnização especial, chamemos-lhe assim, que a lei anterior não previa e alargou o leque dos dias feriados remunerados, pois aos previstos na lei anterior, somaram-se agora os três dias do Ano Novo Chinês (cfr. art. 19º, n.3). Portanto, o gozo desses dias é feito, não apenas sem perda de remuneração (já era assim na lei anterior), como ainda deve ser extraordinariamente compensado.
Se o trabalhador prestar serviço nesses dias, diz o diploma, além da remuneração normal, receberá ainda um acréscimo salarial não inferior ao dobro da retribuição normal (art. 20º, n. 1). O que quer dizer não inferior? Quer dizer que pode ser igual, mas não descer desse limite. E até pode ser superior, mas nesse caso só o empregador poderá fixar o valor, singularmente ou por acordo com o empregado. O que não pode é o tribunal, arbitrariamente subir acima dessa barreira.
Aqui chegados, de novo pensemos nas duas perspectivas acima avançadas: a de o trabalhador ter sido pago pelo valor do devido e a de ter sido remunerado pelo valor do serviço prestado. É bom que se equacionem estas duas acepções para se ver até que ponto a solução pode diferir.
1ª Perspectiva (pagamento do devido)
O empregador pagou ao trabalhador o valor remuneratório que, pela lei, sempre lhe seria devido (ou seja, pagou a “remuneração correspondente aos feriados…”: art. 19º, n.3, até porque não lhos podia descontar: art.26º, n.1).
Sendo assim, falta pagar ao trabalhador o seguinte: a remuneração do trabalho efectivamente prestado (um dia de salário), mais um acréscimo em dobro, nos termos do art. 20º, n. 1(mais dois dias). Tudo perfaz 3 (três) dias de valor pecuniário.
2ª Perspectiva (pagamento do prestado)
Nesta óptica, o empregador o que fez foi pagar ao trabalhador em singelo o valor do serviço prestado.
Todavia, falta pagar o acréscimo em dobro (2 x salário) e ainda o valor do devido (um dia). Tudo perfaz 3 (três) dias de valor pecuniário.
Como se vê, qualquer que seja o prisma por que se encare a situação, o resultado é o mesmo. A fórmula é, em ambas, salário diário x 3, e não 2, conforme decidiu a sentença. Todavia, não pode este TSI ultrapassar o valor fixado na 1ª instância por a interessada trabalhadora não ter recorrida da respectiva sentença.
Assim, aceitar-se-á o valor além fixado, o que monta a Mop$ 51.676,90.
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- Feriados não remunerados
Nada a este respeito a sentença fixou. Porém, esta matéria não vem posta em causa no recurso.
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c) Descanso anual
A sentença nada atribuiu neste capítulo ao trabalhador por no saneador ter considerado totalmente prescritos os créditos respectivos. Porém, dada a decisão tomada supra sobre o assunto, haverá que determinar qual o montante indemnizatório a que o trabalhador tem direito. Vejamos.
c)1- Na vigência do DL n. 101/84/M
O art. 23º, n.1 reza assim:
“O trabalhador permanente tem direito a seis dias de descanso anual, sem perda de salário, para além dos períodos de descanso semanal e dos feriados obrigatórios”.
O art. 24º, por seu turno, dispõe do seguinte modo:
”1- O período ou períodos de descanso anual a gozar por cada trabalhador será fixado pelo empregador, de acordo com as exigências de funcionamento da empresa.
2- No momento da cessação da relação de trabalho, se o trabalhador não tiver ainda gozado o respectivo período de descanso anual, ser-lhe-á pago o salário correspondente a esse período”.
A sentença entendeu que esta disposição só é válida para as relações que terminem dentro do período de vigência do diploma em apreço. E porque a relação deste trabalhador terminou sob o império do DL 24/89/M, o trabalhador não teria direito a qualquer compensação.
Não concordamos. Efectivamente, esta interpretação, de tão restritiva, equivaleria, se bem a entendemos, a concluir que o valor daqueles seis dias de salário só seriam pagos no momento da cessação da relação de trabalho e se o trabalhador ainda não tivesse gozado o respectivo período de descanso anual. Mas não é assim. Julgamos que a norma tem em vista estabelecer o modo como há-de o trabalhador ser retribuído do “respectivo período de descanso anual”, que não chegou a gozar até ao momento em que terminou a relação laboral. A lei diz por outras palavras o seguinte: o trabalhador recebe em dinheiro (no montante salarial) o valor de todos esses dias.
Mas não diz que o trabalhador perca o direito à compensação pelo trabalho prestado nesses dias em anos anteriores ao período a que se refere o número 2.
Portanto, a solução coerente e harmónica com todo o espírito que perpassa no diploma, já vista nos restantes casos, não pode deixar de ser a que impõe ao empregador o dever de pagar mais uma unidade salarial. Expliquemo-nos mais uma vez, tanto por uma, como por outras das perspectivas que temos vindo a desenhar.
1ª Perspectiva (pagamento do devido):
Suponhamos que o empregador pagou ao trabalhador a importância que ele sempre teria que receber pelo gozo dos dias de descanso anual – sem perda de salário, diz o art. 23º, n.1; sem possibilidade de desconto no salário mensal, diz o art. 28º.
Como ele trabalhou nesse dia, falta pagar-lhe o salário correspondente ao serviço prestado. Ou seja, tem a receber 1 (um) crédito salarial correspondente a um dia de salário.
2ª Perspectiva (pagamento do prestado):
Se o empregador já pagou ao trabalhador o serviço prestado em cada um desses dias, falta pagar-lhe o valor correspondente aos dias de descanso não gozados e que sempre lhe seria devido. Portanto, 1 (um) dia de crédito salarial.
A fórmula é, em qualquer caso, salário médio x 1.
Sendo assim, considerando o valor remuneratório diário em 1987 e 1988 (123,80 e 60,20, respectivamente), temos que no ano de 1878 (recordemos que tendo o trabalhador iniciado a relação laboral em Agosto de 1986, em 7/05/1987, data a considerar para efeito de prescrição, ainda não se tinha vencido qualquer crédito resultante de dias de descanso anual, o que só se verificaria em Agosto desse ano) tem direito a Mop$ 742,80 e em 1988 a Mop$ 361,12, o que tudo perfaz o valor de Mop$ 1.103,92.
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c) 2- Na vigência do DL n. 24/89/M
São os mesmos seis dias a que o trabalhador tem direito em cada ano civil e, tal como na legislação anterior, sem perda de salário (art.21º, n.1). Se a duração da relação for inferior a um ano, o período de descanso será proporcional segundo a regra do n.2 (neste caso, porém, não obstante a sentença não ter fixado valor compensatório relativamente ao ano de 1992, sendo certo que a relação terminou em Junho deste ano, a verdade é que o recorrente não a censurou no recurso, pelo que esta instância está impedida de se pronunciar sobre o assunto: art. 589º, n3 do CPC).
No que respeita à violação do direito ao descanso anual, dispõe o art. 24º que “O empregador que impedir o trabalhador de gozar o período de descanso anual pagará ao trabalhador, a título de indemnização, o triplo da retribuição correspondente ao tempo de descanso que deixou de gozar “ (bold nosso).
O triplo, diz a norma. Contudo, o pressuposto nela estabelecido é o de que o trabalhador tenha sido impedido de exercer o seu direito! Ora, este impedimento deveria ter sido provado e o facto que mais se aproximava desse desiderato era o do art. 20º da base instrutória, que mereceu resposta negativa.
Como compensar o trabalhador que prestou serviço nos dias de descanso anual sob o império deste diploma?
A nosso ver, o legislador nenhuma alteração introduziu em relação ao que havia plasmado no corpo de normas do diploma de 1984. Na verdade, em tudo são iguais os textos legais quanto a este aspecto. Por isso, se concluímos que o trabalhador tem direito a mais um dia de valor remuneratório ao abrigo do DL n. 101/84/M, não se vê motivo para, com base em preceitos precisamente iguais no DL n. 24/89/M (arts. 21º, n.1 e 22º, n. 2), se entender que neste último o legislador não ponderou a hipótese, que não previu o caso e que não lhe deu estatuição.
Claro que o art. 24º deste último preceitua uma fórmula de cálculo de compensação para as situações em que o empregador impedir o seu empregado de gozar o dia de descanso anual. É verdade. Mas será legítimo pensar que, ao estatuir dessa maneira para esse caso, omitiu o legislador a solução para os casos ali não incluídos? Não, a nosso ver. A forma como o preceito está redigido reforça ainda mais a ideia de que, fora esta situação excepcional (que o legislador quis expressamente introduzir, numa clara opção pela defesa da parte contratual mais desfavorecida), em todos os restantes casos a solução é aquela que já vinha do articulado de 1984 e ao qual nenhuma alteração quis introduzir. E temos que pensar, não esqueçamos, que o legislador se exprimiu da maneira mais correcta e adequada ao seu pensamento (art. 8º, n.3, do Cod. Civil).
Portanto, em nossa opinião não existe qualquer lacuna que deva ser suprida pela técnica analógica.
Assim, valem aqui mutatis mutandis, as considerações tecidas atrás, quando nos referimos ao modo de compensar o trabalhador que prestou trabalho nos dias de descanso anual ao abrigo do diploma de 1984. Sendo elas também prestáveis à interpretação do DL 24/89/M, somos a concluir como além: Ou o empregador pagou o devido ou o prestado. No primeiro caso, falta pagar o prestado; no segundo, falta pagar o devido. A fórmula não pode deixar de ser sempre esta: salário médio diário x 1, o que, aplicada, corresponde ao valor indemnizatório de:
1989: 6x273,80= 1.642,80; 1990: 6x318,30= 1.909,80; 1991: 6x224,30= 1.345,80; 1992: 6x368,90= 2.213,40; 1993: 6x413,40= 2.480,40; 1994: 6x473,60= 2.841,60; 1995: 6x516,60= 3.099,60; 1996: 6x574,50= 3.447,00;1997: 6x543,10= 3.258,60;1998: 6x529,30= 3.175,80; 1999: 6x331,60= 1989,60.
O valor global é, pois de Mop$. 27.404,40, a que se haverá de somar o de 1.103,92 acima fixado, tudo perfazendo o resultado de Mop$ 28.508,32.
A importância ascende, pois, a Mop$ 434.054,22, a que acrescerá a importância de Mop$ 12.946,50, em virtude licença de maternidade (mas que no recurso não foi posta em crise), tudo somando o valor global de Mop$ 447.000,72.
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IV- Decidindo
Face ao que vem de ser dito, acordam em:
1- Conceder parcial provimento ao recurso interposto do despacho saneador;
2- Conceder parcial provimento ao recurso interposto da sentença pela STDM e, em consequência, confirmar e revogar a sentença nos termos acima expostos e, por via disso, condenar a STDM a pagar a A a quantia de Mop$ 447.000,72., acrescida de juros legais calculados pela forma decidida pelo TUI no seu acórdão de 2/03/2011, no processo n. 69/2010.
Custas pelos recorrentes em ambos os recursos na proporção do decaimento.
Macau, 07 de Abril de 2011.
José Cândido de Pinho
Choi Mou Pan
Lai Kin Hong
(com declaração de voto)
※ Rectificado por Acórdão proferido em 14-April-2011.
Processo nº 84/2009
Declaração de voto
Subscrevo o Acórdão antecedente à excepção da parte que diz respeito à existência dos direitos do trabalhador à compensação e aos factores de multiplicação para efeitos de cálculos de indemnização pelo trabalho prestado nos descansos semanais e anuais e nos feriados obrigatórios, em tudo quanto difere do afirmado, concluído e decidido, nomeadamente, nos Acórdãos por mim relatados e tirados em 27MAIO2010, 03JUN2010 e 27MAIO2010, nos processos nºs 429/2009, 466/2009 e 410/2009, respectivamente.
RAEM, 07ABR2011
O juiz adjunto
Lai Kin Hong
1 Segundo o qual “A observância do direito consagrado no n. 1 não prejudica a faculdade do trabalhador prestar serviço voluntário em dia de descanso semanal, não podendo, no entanto, a isso ser obrigado”.
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