ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:
I – Relatório
O Tribunal Colectivo do Tribunal Judicial de Base, por Acórdão de 21 de Setembro de 2011, condenou, além de outro, os arguidos A (2.º arguido) e B (3.º arguido), pela prática, em autoria material e na forma consumada de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelo artigo 8.º, n.º 1 da Lei n.º 17/2009, nas penas de 7 (sete) anos e 4 (quatro) meses de prisão e 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de prisão, respectivamente.
O arguido A foi ainda condenado, em concurso real, como autor da prática de um crime de detenção de estupefaciente para consumo, previsto e punível pelo artigo 14.º da Lei n.º 17/2009, na pena de 45 (quarenta e cinco) dias de prisão e, como autor da prática de um crime de detenção de utensílio para consumo de estupefaciente, previsto e punível pelo artigo 15.º da Lei n.º 17/2009, na pena de 45 (quarenta e cinco) dias de prisão e, em cúmulo jurídico, na pena única de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão.
O arguido B foi ainda condenado, em concurso real, como autor da prática de um crime de detenção de estupefaciente para consumo, previsto e punível pelo artigo 14.º da Lei n.º 17/2009 na pena de 45 (quarenta e cinco) dias de prisão e, em cúmulo jurídico, na pena única de 6 (seis) anos e 9 (nove) meses de prisão.
O Tribunal de Segunda Instância (TSI), por Acórdão de 1 de Dezembro de 2011, negou provimento aos recursos interpostos pelos arguidos.
Ainda inconformados, recorrem os arguidos para este Tribunal de Última Instância (TUI)
O arguido A termina com as seguintes conclusões úteis:
- Julguem que os tribunais colectivos dos tribunais de primeira e segunda instâncias recorridos incorreram em erro notório na comprovação dos factos;
- Julguem que as condutas praticadas pelo recorrente no presente processo devem ser punidas pelo artigo 14.º da Lei n.º 17/2009 e não pelo artigo 8.º da mesma Lei;
- Julguem que as condutas do recorrente podem diminuir a sua culpa, reunindo, em consequência, as circunstâncias de atenuação especial previstas no artigo 18.º da Lei n.º 17/2009.
- O recorrente entende que se deve considerar preferencialmente a substituição da pena de prisão imposta no presente processo pela pena de multa, ou que se deve conceder a suspensão da execução da pena de prisão; ou
- Solicita que alterem o acórdão recorrido e determinem uma pena mais leve nos termos da lei.
O arguido B termina com as seguintes conclusões úteis:
- A pena de 6 anos e 8 meses de prisão efectiva aplicada pelo cometimento de um crime de tráfico de estupefaciente é severa em demasia.
- Considerando o tipo de droga em causa, que é a “ketamina”, o peso da droga, a sua primodelinquência, a confissão, a juventude e o seu grau académico, deveria o recorrente ter sido condenado na pena de 4 anos de prisão efectiva.
- Agindo diversamente, a decisão recorrida ora validada pela segunda Instância, nessa parte, violou a lei, as normas constante do artigo 65.°, n.º 1, e n.º 2, alíneas a) e d), do Código Penal de Macau.
Na resposta à motivação do recurso o Ex.mo Procurador-Adjunto defendeu que deve ser negado provimento aos recursos.
No seu parecer, a Ex.ma Procuradora-Adjunta manteve a posição já assumida na resposta à motivação.
II – Os factos
As instâncias consideraram provados e não provados os seguintes factos:
Factos provados:
Em 30 de Novembro de 2010, às 23h40, no Posto Alfandegário das Portas do Cerco, o pessoal alfandegário interceptou a arguida C e levou-a para a sala do controlo para a realização de exame corporal.
Na sala de controlo, o pessoal alfandegário encontrou, no penso higiénico dentro da cueca da arguida C, um saco de plástico transparente que continha substância cristal de cor branca (vd. o auto de apreensão a fls. 8 dos autos).
Submetida a exame, a substância cristal acima referida continha um produto que se chama KETAMINA indicada na tabela II-C da Lei n.º 17/2009, com peso líquido de 25,814g (82,25 por cento de KETAMINA, com peso líquido de 21,232g).
A droga acima referida foi adquirida pelos arguidos C e B, que se deslocaram ao centro comercial subterraneo de Gongbei em 30 de Novembro de 2010, pelas 21h00, a pedido do arguido A, para comprá-la a um homem do interior da China conhecido por “D”.
Adquirida a droga, o arguido B requereu que a arguida C, acompanhado dele, as contrabandeasse para Macau.
Os dois arguidos deslocaram-se ao interior da China para adquirir a droga supra referida, com o fim de entregá-la ao arguido A.
O arguido A determinou os arguidos C e B a dirigir-se ao interior da China à compra de droga, visando oferecer ou vender a maior parte da qual a outrem, e ao consumo pessoal duma pequena parte da mesma.
Em 1 de Dezembro de 2010, cerca das 13h15, segundo a informação prestada pela arguida C, o pessoal da PJ deslocou-se à fracção sita no [Endereço (1)] onde residem os arguidos A, B e E para realizar uma busca, e interceptaram o arguido B à porta da fracção.
Os agentes da PJ encontraram, no bolso esquerdo do casaco do arguido B, uma pílula de cor de laranja ligeira; e no bolso esquerdo da calça dele dois sacos de plástico transparente que continha pó branco (vd. o auto de apreensão a fls. 53 dos autos).
Submetida a exame, a pílula de cor de laranja ligeira referida continha um produto que se chama Nimetazepam indicada na tabela IV da Lei n.º 17/2009, com peso líquido de 0,183g; os dois sacos de pó branco continha um produto que se chama KETAMINA indicada na tabela II-C da Lei n.º 17/2009, com peso líquido de 2,713g (69,86 por cento de KETAMINA, com peso líquido de 1,895g).
A pílula de cor de laranja ligeira referida foi adquirida pelo arguido B em 30 de Novembro de 2010, à meia noite, no Disco, a um homem conhecido por “F”, e os dois sacos de pó branco que continham KETAMINA foram dados ao arguido B pelo arguido A na manhã de 1 de Dezembro de 2010.
O arguido B adquiriu e deteve as drogas acima referidas para seu consumo pessoal.
Em 1 de Dezembro de 2010, pelas 13h30, os agentes da PJ levaram o arguido B para entrar na fracção acima referida para realizar uma busca, altura em que os arguidos A e E se encontravam num dos quartos da fracção.
Os agentes da PJ encontraram no bolso esquerdo da calça do arguido A 5 pílulas de cor de laranja ligeira (vd. o auto de apreensão a fls. 61 dos autos).
Submetida a exame, as 5 pílulas de cor de laranja ligeira auferidas continham um produto que se chama Nimetazepam indicada na tabela IV da Lei n.º 17/2009, com peso líquido de 0,936g.
A seguir, os agentes da PJ encontraram, na gaveta do armário para televisão no quarto onde foram encontrados os arguidos A e E, 10 sacos de plástico transparente que continham pó branco; no sofá do quarto 3 pacotes de pó branco (um embrulhado com uma nota de 20 patacas, um embrulhado com um papel branco e o outro contido num saco de plástico transparente); na mesa de chá do quarto dois pacotes de pó branco (um embrulhado com uma nota de HKD$20 e o outro contido num saco de plástico transparente); na caixa de cor de rosa em cima do leitor de CD um saco com planta, um tubo de vidro e um rolo de mortalhas para cigarros de cor azul; no terraço do quarto, um saco de plástico transparente com substância cristal de cor branca, uma palhinha de cor verde, uma garrafa de vidro que continha líquido de cor castanha, com duas palhinhas azuis (uma duas quais inserida num pequeno recipiente de vidro); no terraço do quarto, várias palhinhas, uma tesoura e dois isqueiros (vd. o auto de apreensão a fls. 63 a 64 dos autos).
Submetida a exame, os 10 sacos de plástico transparente com pó branco continham um produto que se chama KETAMINA indicada na tabela II-C da Lei n.º 17/2009, com peso líquido de 11,993g (71,8 por cento de KETAMINA, com peso líquido de 8,612g); o pacote de pó branco embrulhado com uma nota de HKD$20 continha um produto que se chama KETAMINA indicada na tabela II-C da Lei n.º 17/2009, com peso líquido de 0,095g (66,96 por cento de KETAMINA, com peso líquido de 0,064g); o pacote de pó branco embrulhado num papel branco continha um produto que se chama KETAMINA indicada na tabela II-C da Lei n.º 17/2009, com peso líquido de 0,251g (66,04 por cento de KETAMINA, com peso líquido de 0,166g); o pacote de pó branco embrulhado num saco de plástico transparente continha um produto que se chama KETAMINA indicada na tabela II-C da Lei n.º 17/2009, com peso líquido de 0,401g (65,92 por cento de KETAMINA, com peso líquido de 0,264g); o pacote do pó branco embrulhado numa nota de HKD$20 continha um produto que se chama KETAMINA indicada na tabela II-C da Lei n.º 17/2009, com peso líquido de 0,004g; o pacote de pó branco embrulhado num saco de plástico transparente continha um produto que se chama KETAMINA indicada na tabela II-C da Lei n.º 17/2009, com peso líquido de 1,018g (66,56 por cento de KETAMINA, com peso líquido de 0,678g); o pacote da planta acima referido continha marijuana indicada na tabela I-C da Lei n.º 17/2009, com peso líquido de 0,205g; o pacote de substância cristal de cor branca continha um produto que se chama Metanfetamina indicada na tabela II-B da Lei n.º 17/2009, com peso líquido de 0,397g (80,30 por cento de Metanfetamina, com peso líquido de 0,319g); a palhinha de cor verde acima referida continha vestígio de Metanfetamina indicada na tabela II-B da Lei n.º 17/2009; a garrafa de vidro que continha líquido de cor castanha, com duas palhinhas azuis (uma duas quais inserida num pequeno recipiente de vidro) continha vestígios de Metanfetamina indicada na tabela II-B da Lei n.º 17/2009, com volume total de 160ml.
Todas as drogas encontradas pelos agentes da PJ na posse do arguido A e no quarto foram adquiridas por este à meia-noite do dia 1 de Dezembro de 2010 a um homem conhecido por “G”, visando oferecer ou vender a maior parte da qual a outrem, e ao consumo pessoal duma pequena parte da mesma.
As palhinhas, garrafa e recipiente de vidro acima referidos são os utensílios possuídos pelo 2º arguido A para o consumo de drogas.
Os arguidos C, A e B agiram de forma livre, voluntaria e consciente ao praticarem as condutas supra referidas.
Os mesmos bem sabiam a natureza das drogas.
A conduta dos mesmos não foi autorizada por nenhuma lei.
Os mesmos bem sabiam que tal conduta é proibia e punida por lei.
*
Também se provou:
Segundo o registo criminal, a 1ª arguida C e o 3º arguido B não têm antecedentes criminais.
O 2º arguido A tem os seguintes antecedentes criminais:
* No processo sumário n.º PSM-109-02-4, foi condenado em 23 de Outubro de 2002, pela prática em 23 de Outubro de 2002, dum crime de consumo de drogas, na pena de multa de MOP$1.500,00, multa essa convertível em 20 dias de prisão e já paga pelo arguido; e
* No processo comum singular n.º CR4-06-0152-PCS (número original CR2-06-0442PCS), foi condenado em 18 de Setembro de 2007, pela prática em 17 de Janeiro de 2006, dum crime de empréstimos ilícitos, na pena de 9 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos, e na pena de inibição de entrada nos casinos de Macau pelo período de 2 anos. Em 26 de Janeiro de 2010 o despacho do tribunal declarou extintas as penas.
A 4ª arguida E tem registo criminal:
* No processo comum singular n.º CR2-11-0032-PCS, foi acusada da prática dum crime de ofensas simples à integridade física, tendo o procedimento criminal sido extinto por o(a) ofendido(a) ter desistido da queixa.
* No processo n.º CR3-11-0143-PSM, a sentença do tribunal proferida em 27 de Julho de 2011 e transitada em julgado em 6 de Setembro de 2011 condenou-a, pela prática em 26 de Julho de 2011 dum crime de consumo ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas, na pena de 45 dias de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano, pena essa acompanhada de prova de regime e da sujeição da mesma a tratamento de reabilitação de toxicodependência.
Segundo a 1ª arguida, ela entregue-se à indústria cosmética, recebe mensalmente um rendimento de MOP$20.000,00, não tem encargos familiares, e tem como habilitações literárias o 2º ano do ensino secundário-geral.
Segundo o 2º arguido, ele é bate-fichas, recebe mensalmente um rendimento de MOP$13.400,00, não tem encargos familiares, e tem como habilitações literárias o 5º ano do ensino secundário.
Segundo o 3º arguido, ele é bate-fichas, recebe mensalmente rendimento de MOP$10.000,00, tem a seu cargo o pai, e tem como habilitações literárias o 1º ano do ensino secundário-geral.
Segundo a 4ª arguida, ela é desempregada, não tem nenhum encargo, e tem como habilitações literárias o 2º ano do ensino secundário-geral.
*
Factos não provados:
Não se provaram os factos constantes da acusação que não estão em conformidade com os factos provados acima referidos, designadamente:
- As palhinhas, garrafa e recipiente de vidro acima referidos são os utensílios possuídos pela 4ª arguida E para o consumo de drogas.
- A 4ª arguida E agiu de forma livre, voluntária e consciente ao praticar a conduta supra referida.
- A mesma conhecia a natureza das drogas.
- A conduta da mesma não foi autorizada por nenhuma lei.
- A mesma bem sabia que tal conduta é proibida e punida por lei.
*
Convicção dos factos (constante da sentença de 1.ª Instância):
A 1ª arguida C prestou declaração na audiência de julgamento, confessando a prática dos factos importantes que lhe eram imputados.
O 2º arguido A prestou declaração na audiência de julgamento, confessando parte dos factos que lhe são imputados. Segundo o mesmo, as drogas encontradas na posse da 1ª arguida C foram adquiridas por esta juntamente com o 3º arguido B, cada um possuindo metade; as respectivas drogas e as encontradas no quarto foram destinadas a consumo pessoal. O mesmo negou oferecer as drogas a outrem. Nos termos do art.º 338.º, n.º 1, al. b) do Código de Processo Penal, o Tribunal Colectivo procedeu na audiência de julgamento à leitura da declaração prestada pelo 2º arguido no seu primeiro interrogatório judicial.
O 3º arguido B prestou declaração na audiência de julgamento, confessando parte dos factos que lhe são imputados. Segundo o mesmo, as drogas encontradas na posse da 1ª arguida C foram adquiridas por esta juntamente com o 2º arguido A, cada um possuindo metade; todas as drogas foram destinadas ao consumo pessoal.
A 4ª arguida E prestou declaração na audiência de julgamento, negando a prática dos factos que lhe eram imputados.
Os agentes alfandegários prestaram declarações na audiência de julgamento, narrando de forma clara e objectiva o meio usado para interceptar a 1ª arguida C e encontrar droga na sua posse.
Os investigadores da PJ prestaram declarações na audiência de julgamento, narrando de forma clara e objectiva o meio usado de interceptar o 2º arguido A e o 3º arguido B e encontrar drogas nas suas posses e no quarto daquele.
O relatório de exame constante dos autos comprovou o tipo das drogas contidas nas substâncias apreendidas e os respectivos pesos.
Os relatórios sociais dos 1ª, 2º e 3º arguidos descrevem as suas personalidades, o ambiente de crescimento, as suas relações pessoais, familiares e sociais e as condições económicas.
O Tribunal Colectivo reconheceu os factos supra referidos após atender às declarações prestadas pelos 4 arguidos, aos depoimentos das testemunhas, às provas documentais apreciadas na audiência de julgamento, às provas apreendidas e outras provas.
III - O Direito
1. As questões a resolver.
As questões suscitadas pelo 2.º arguido, e que há que conhecer, são as de saber se houve erro notório na apreciação da prova, se a sua conduta não se enquadra na previsão do artigo 8.º, n.º 1, da Lei n.º 17/2009 (crime de tráfico de estupefacientes), se deveria ter beneficiado de atenuação especial da pena e se o Acórdão recorrido aplicou ao recorrente uma pena demasiado pesada pela prática do crime de tráfico de estupefacientes.
Quanto às questões suscitadas pelo 3.º arguido, limita-se à da medida da pena, por pretender uma pena de prisão mais reduzida.
Não se conhece das questões relativas à prática do crime de consumo de estupefaciente, suscitadas pelo 3.º arguido B, visto que ao crime cabe a pena máxima de 3 meses de prisão (artigo 14.º da Lei n.º 17/2009), sendo que este TUI não conhece de questões atinentes a crimes a que sejam aplicáveis penas não superiores a 8 anos de prisão, em recurso de acórdãos condenatórios, como é o caso [artigo 390.º, n.º 1, alíneas f) e g) do Código de Processo Penal].
2. Erro notório na apreciação da prova
Pretende o 2.º arguido que não se provou que tivesse determinado outros à aquisição de estupefaciente, com vista à venda, na sua maior parte. Para tal, invoca declarações prestadas em audiência.
Não se vislumbra que se configure qualquer erro notório na apreciação da prova pelo Tribunal de 1.ª instância, no sentido de erro ostensivo, evidente para qualquer pessoa que examine os factos dados como provados e os meios de prova utilizados.
Improcede a questão suscitada.
3. Crime de tráfico de estupefacientes
Pratica o crime de tráfico de estupefacientes “quem, sem se encontrar autorizado, oferecer, puser à venda, distribuir, ceder, comprar ou por qualquer título receber, transportar, importar, exportar, fizer transitar ou ilicitamente detiver, fora dos casos previstos no artigo 14.º, plantas, substâncias ou preparados compreendidos nas tabelas I a III é punido com pena de prisão de 3 a 15 anos” (artigo 8.º, n.º 1, da Lei n.º 17/2009).
Ora, provou-se que:
“Em 30 de Novembro de 2010, às 23h40, no Posto Alfandegário das Portas do Cerco, o pessoal alfandegário interceptou a arguida C e levou-a para a sala do controlo para a realização de exame corporal.
Na sala de controlo, o pessoal alfandegário encontrou, no penso higiénico dentro da cueca da arguida C, um saco de plástico transparente que continha substância cristal de cor branca.
Submetida a exame, a substância cristal acima referida continha um produto que se chama KETAMINA, com peso líquido de 25,814g (82,25 por cento de KETAMINA, com peso líquido de 21,232g).
A droga acima referida foi adquirida pelos arguidos C e B, que se deslocaram ao centro comercial subterrâneo de Gongbei em 30 de Novembro de 2010, pelas 21h00, a pedido do arguido A, para comprá-la a um homem do interior da China conhecido por “D”.
Adquirida a droga, o arguido B requereu que a arguida C, acompanhado dele, as contrabandeasse para Macau.
Os dois arguidos deslocaram-se ao interior da China para adquirir a droga supra referida, com o fim de entregá-la ao arguido A.
O arguido A determinou os arguidos C e B a dirigir-se ao interior da China à compra de droga, visando oferecer ou vender a maior parte da qual a outrem, e ao consumo pessoal duma pequena parte da mesma”.
Ora, estes factos integram a previsão da norma acima transcrita, pelo que o arguido praticou sem qualquer dúvida o crime pelo qual foi condenado.
4. Atenuação especial da pena
O arguido pretende a atenuação especial da pena. Mas os factos provados não apontam para o circunstancialismo exigido para tal atenuação, que é o de “ ... existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena” (artigo 66.º, n.º 1, do Código Penal).
Por outro lado, actuou em comparticipação, o que agrava a ilicitude do facto e a culpa do agente.
Não se vislumbra, também, ter havido actos demonstrativos de arrependimento sincero, nem matéria de facto susceptível de ser subsumida ao condicionalismo previsto no artigo 18.º da Lei n.º 17/2009..
Não se justifica, pois, a atenuação especial da pena.
5. Medida da pena
Quanto à questão suscitada a propósito da medida da pena este Tribunal tem entendido que “Ao Tribunal de Última de Instância, como Tribunal especialmente vocacionado para controlar a boa aplicação do Direito, não cabe imiscuir-se na fixação da medida concreta da pena, desde que não tenham sido violadas vinculações legais – como por exemplo, a dos limites da penalidade – ou regras da experiência, nem a medida da pena encontrada se revele completamente desproporcionada” (Acórdãos de 23 de Janeiro e 19 de Setembro de 2008 e 29 de Abril de 2009, respectivamente, nos Processos n. os 29/2008, 57/2007 e 11/2009).
Isto é, quando está em causa a medida concreta da pena, não cabe a este Tribunal averiguar se a pena criminal aplicada pelo TSI teria sido aquela que o TUI aplicaria se julgasse em primeira ou em segunda instâncias.
No caso dos autos, em que o TUI intervém em terceiro grau de jurisdição, ponderando a sua posição no sistema judiciário e à competência visando sobretudo a correcção da aplicação do Direito, não lhe cabe apreciar a dosimetria concreta da pena, a menos que ela se mostre completamente desajustada, ou seja, quando a mesma seja de todo desproporcionada face aos factos.
É que a aplicação da pena contém alguma discricionariedade judicial, entendida esta como a actividade do tribunal que não se esgota com a mera subsunção silogístico-formal, que não se compadece com o controlo que os sistemas judiciários e processuais semelhantes, neste aspecto, ao de Macau, atribuem aos tribunais supremos.1
Outrossim, cabe ao TUI sindicar a violação de regras de direito ou de experiência na aplicação da pena.
No caso dos autos não foi alegada qualquer violação de vinculação legal ou de regras da experiência.
Por outro lado, as penas aplicadas não se mostram desproporcionadas, tendo em atenção os factos provados.
São, pois, os recursos manifestamente improcedente.
Impõe-se, portanto, a rejeição dos recursos (artigo 410.º, n.º 1 do Código de Processo Penal).
IV – Decisão
Face ao expendido, rejeitam os recursos.
Custas pelos recorrentes, fixando a taxa de justiça em 2 UC, suportando, cada um, ainda, a quantia de MOP$2.000,00 (duas mil patacas), nos termos do n.º 4 do artigo 410.º do Código de Processo Penal.
Fixam os honorários do defensor do 2.º arguido em mil patacas.
Macau, 29 de Fevereiro de 2012.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei – Sam Hou Fai
1 J. FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra Editora, 2.ª reimpressão, 2009, p. 194 e 197, citando MAURACH/ZIPF, quanto à segunda asserção.
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Processo n.º 2/2012