ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:
I – Relatório
A interpôs recurso contencioso de anulação do despacho do Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, de 28 de Janeiro de 2010, que rejeitou por extemporaneidade, o recurso hierárquico do despacho do Director dos Serviços de Educação e Juventude, de 7 de Setembro de 2009, que atribuiu ao aluno B, no ano lectivo de 2008/2009, o Prémio Dr. Nascimento Leitão, no valor de MOP$47.171,30.
Por acórdão de 24 de Novembro de 2011, o Tribunal de Segunda Instância (TSI) negou provimento ao recurso.
Inconformada, interpõe a mesma recorrente recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância (TUI), terminando a respectiva alegação com a formulação das seguintes conclusões úteis:
- Não se provou que tenha sido afixado qualquer edital no local próprio da Escola Portuguesa de Macau, contendo, entre outras, a menção relativa ao referido despacho do Director dos Serviços de Educação e Juventude, tal como não se provou que a Escola tenha informado a Recorrente ou a sua encarregada de educação, através da internet, telefone ou ofício, dos prémios atribuídos nesse ano, apesar de se ter provado ser essa a prática anteriormente seguida pela Escola (cfr. ponto 5 dos factos provados), nem mesmo dos prémios atribuídos à Recorrente;
- Provou-se apenas que relativamente aos prémios escolares referentes ao ano lectivo de 2008/2009, foi afixado, pelo menos, um banner, no átrio da Escola, no dia 10 de Setembro, contendo o nome dos alunos premiados e os respectivos prémios;
- De acordo com o Doc. de fls. 137 dos autos, junto pela entidade recorrida, tal banner contém a referência ao nome da Escola e ao ano lectivo e ainda o nome dos alunos premiados e dos respectivos prémios;
- O D.L. n.º 37/97 /M, de 8 de Setembro, não contém quaisquer normas relativas à notificação da decisão atributiva de prémios por parte do Director dos Serviços de Educação e Juventude e a norma do artigo 13.°/1 desse diploma, contrariamente ao afirmado no acórdão recorrido, não confere àquele o direito de estabelecer o modo de proceder à comunicação dos prémios aos respectivos laureados;
- A disposição do Regulamento dos Prémios e Menções de Excelência da Escola Portuguesa de Macau, que estabelece que «Os nomes dos alunos a quem forem atribuídos os prémios escolares serão publicados em local destinado ao efeito», contrariamente ao afirmado no acórdão recorrido, não constitui uma «previsão especial», cuja aplicação prevaleça sobre as normas do C.P.A., em matéria de notificação de actos administrativos;
- Não estabelecendo o D.L. n.º 37/97/M qualquer procedimento especial de notificação ou de comunicação de actos administrativos que careça de concretização e sendo tal "regulamento" um diploma editado por uma entidade privada, contrariamente ao entendimento explicitado no acórdão recorrido, não pode tal "regulamento" ter a pretensão de executar aquele diploma legal, nem muito menos afastar a aplicação das regras relativas à notificação de actos administrativos constantes do C.P.A.;
- A regra do "regulamento" da Escola Portuguesa de Macau, que determina a publicação em local destinado ao efeito dos nomes dos alunos a quem forem atribuídos os prémios escolares, contrariamente ao afirmado pelo acórdão recorrido, não constitui uma previsão especial que permite que a comunicação de um acto administrativo se basta com a divulgação in loco dos resultados apurados e pelo modo considerado mais conveniente e eficaz a essa divulgação;
- A notificação ou a comunicação de um acto administrativo constitui, no nosso sistema, um dever estrito da Administração, vinculado quanto às formas do seu cumprimento e quanto ao respectivo conteúdo, a que corresponde um direito dos administrados;
- As disposições do C.P.A. relativas à notificação dos actos administrativos aplicam-se ao caso dos presentes autos, dado que este diploma se aplica a todos os órgãos da Administração Pública que, no desempenho da actividade administrativa de gestão pública, estabeleçam relações com os particulares, e é supletivamente aplicável a todos os procedimentos especiais, desde que não envolvam diminuição das garantias dos particulares;
- Não se provou que o banner afixado no átrio da Escola, contendo o nome dos alunos premiados e os respectivos prémios, constituísse um documento oficial da D.S.E.J ou da Escola, para além de que resulta que o referido banner não contém nenhuma menção relativa à existência do acto administrativo aqui em causa, do seu autor e da data em que foi praticado, nem nenhuma referência a decisão ou a deliberação da Escola que tenha ordenado a sua afixação, nem sequer a data em que o banner foi afixado;
- Tendo a Recorrente apenas tomado conhecimento do acto administrativo aqui em causa, no dia 11 de Novembro de 2009, data em que ocorreu a cerimónia oficial da entrega dos prémios e onde ficou a saber, oficialmente, que foi outro o aluno contemplado com prémio Nascimento Leitão e tendo tomado conhecimento efectivo dessa decisão, através da certidão que lhe foi passada, em 1 de Dezembro de 2009, contendo a referida decisão e os seus fundamentos, não pode deixar de se concluir que o recurso hierárquico necessário, interposto no dia 11 de Dezembro de 2009, se deve considerar tempestivo, nos termos dos artigos 155.°/1 e 149.º-c do C.P.A.;
- Ao ter confirmado a decisão recorrida, considerado que o recurso hierárquico foi interposto manifestamente fora do prazo legal - com os argumentos, nomeadamente, de que o artigo 13.°/1 do D.L. n.º 37/97 /M confere à D.S.E.J. o direito de estabelecer o modo de proceder à comunicação dos prémios aos respectivos laureados, de que a comunicação dos prémios se basta com o respeito pela exigência relativamente ao local em que a divulgação deve ser feita, de que o legislador do D.L. n.º 37/97/M dispensou no caso dos autos a observância das regras gerais relativas à notificação de actos administrativos e de que a divulgação feita era a bastante para dar cumprimento e satisfação ao dever legal de comunicação do acto administrativo -, violou o acórdão recorrido, nomeadamente, as normas dos artigos 13.°/1 do D.L. 37/97/M, 2.°/1/6,68.°,70.°,72.°/2, 149.º-c, 155.°/1 e 160.º- do C.P.A.
O Ex.mo Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer em que se pronuncia pela improcedência do recurso.
II - Os Factos
O Acórdão recorrido considerou provados os seguintes factos:
1- O Prémio Nascimento Leitão é atribuído pela Direcção dos Serviços de Educação e Juventude ao aluno que, tendo frequentado, pelo menos os 10.º e 11.º anos de escolaridade em instituições educativas em língua veicular portuguesa, haja concluído o 12.º ano de escolaridade com a mais elevada classificação e concluído também o ensino secundário no mínimo tempo possível que a lei permitir (doc. fls. 84).
2- A recorrente A foi aluna da Escola Portuguesa de Macau no ano lectivo 2008/2009, concluindo o 12.º ano de escolaridade, a quem foram atribuídos os Prémio Fundação Escola Portuguesa de Macau, Prémio Escola Portuguesa de Macau, Prémio Flor de Lótus, Prémio Fundação Henry Fok e Prémio Fundação Choi (doc. fls. 137 dos autos e 13, 25 e 32 do apenso)
3- Nesse mesmo ano lectivo concluiu o 12.º ano o aluno B, a quem foi atribuído o prémio referido em 1 e ainda o Prémio Luís de Camões (doc. fls. 137 dos autos).
4- O prémio aludido em 1 supra foi atribuído pelo Ex.mo Director dos Serviços de Educação e Juventude em 7 de Setembro de 2009 ao aluno B por alegadamente ter concluído o 12º ano de escolaridade nesse ano lectivo com a mais elevada classificação e o ensino secundário no mínimo tempo possível que a lei permite (doc. fls. 11 e 64 do apenso administrativo e fls. 2 e 3 do apenso “traduções”).
5- Geralmente, a informação sobre os vários prémios atribuídos aos alunos era feita através de divulgação na Internet, por comunicação aos alunos ou pais destes e ainda, e sempre, por afixação de um ou dois banners no átrio da escola com os nomes dos alunos premiados e o prémio atribuído (prova testemunhal).
6- Relativamente aos prémios atribuídos aos alunos referentes àquele ano lectivo de 2008/2009, foi pelo menos afixado o banner no local habitual do átrio da escola no dia 10 de Setembro, onde se manteve exposto (prova testemunhal: 1.ª e 2.ª testemumhas da entidade recorrida; também declaração de fls. 153 dos autos).
7- A recorrente partiu de Macau para Portugal no dia 15 de Julho de 2009 (doc. fls. 59, 60, 67 dos autos), para completar os estudos na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (testemunha da recorrente).
8- A mãe da recorrente permaneceu em Macau.
9- Os prémios foram entregues no dia 11 de Novembro de 2009 (doc. fls. 144 v. e 145) e à respectiva cerimónia esteve presente a mãe da recorrente (prova testemunhal e doc. fls. 139 e sgs dos autos ).
10- Em 11/12/2009 a recorrente apresentou recurso hierárquico do despacho de 7/09/2009 do Director de Serviços de Educação e Juventude referido em 4 supra (fls. 20 dos autos).
11- Em 28/01/2010 o Ex.mo Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, sobre a Informação n.º XXX/GSD-SH/XXXX, exarou despacho de rejeição liminar do recurso hierárquico ao abrigo do disposto na alínea d) do artigo 160º do CPA (doc. fls. 28 dos autos e 46 do p.a.).
É este o acto recorrido.
III – O Direito
1. A questão a apreciar
Trata-se apenas de saber o recurso hierárquico, que a recorrente interpôs do acto do Director dos Serviços de Educação e Juventude, de 7 de Setembro de 2009, que atribuiu o Prémio Dr. Nascimento Leitão (a um outro aluno da Escola Portuguesa), para o Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, foi tempestivo, visto que o prazo para este recurso é de 30 dias (artigo 155.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo) e a recorrente apresentou o recurso em 11 de Dezembro de 2009.
2. As sub-questões a resolver
Para decidir a questão posta no presente recurso jurisdicional, importa resolver outras sub-questões.
i) A primeira sub-questão é a de saber se estamos perante um acto administrativo.
ii) A segunda, suposta a resposta afirmativa à anterior, é a de apurar se tal acto tem de ser notificado aos interessados, em especial, se tem de ser notificado a um aluno que, dentro do universo dos possíveis contemplados com o prémio, acabou por não ser o escolhido.
iii) A terceira sub-questão reside em decidir quando começa a correr o prazo para o recurso hierárquico de um acto administrativo, quando o recorrente não foi notificado do acto recorrido.
3. Acto administrativo
Não suscitou quaisquer dúvidas no processo que a decisão do Director dos Serviços de Educação e Juventude, de 7 de Setembro de 2009, que atribuiu o Prémio Dr. Nascimento Leitão a um aluno, é um acto administrativo.
E assim é, visto estarmos perante uma decisão de um órgão da Administração que, ao abrigo de normas de direito público, visou produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta (artigo 110.º do Código do Procedimento Administrativo).
4. Dever de notificação dos actos administrativos
Vejamos, agora, se tal acto tem de ser notificado aos interessados, em especial, se tem de ser notificado a um aluno que, dentro do universo dos possíveis contemplados com o prémio, acabou por não ser o escolhido.
Para tal temos de conhecer as normas que regem a atribuição do prémio.
O Decreto-Lei n.º 37/97/M, de 8 de Setembro, estabelece os critérios de atribuição e formas de expressão dos prémios escolares, a conceder aos alunos de todos os níveis e modalidades de ensino não superior ministrados no Território em instituições educativas oficiais e particulares (artigo 1.º).
Dispõem o seguinte os restantes preceitos do diploma legal (omitindo-se o artigo 8.º, cujo prémio deixou de ser atribuído, por previsão do Regulamento n.º 8/2001):
“Artigo 2.º
(Selecção)
1. Compete ao órgão de direcção das instituições educativas efectuar a selecção dos alunos a premiar, ouvidas as respectivas estruturas pedagógicas.
2. Os critérios a considerar são o aproveitamento e rendimento escolar dos alunos, o comportamento, a assiduidade e a participação activa em realizações no âmbito da vida escolar, dentro e fora da instituição educativa.
Artigo 3.º
(Prémios escolares)
Os prémios escolares a atribuir aos alunos que se hajam distinguido, conforme o disposto no artigo anterior, são os seguintes:
a) Prémio Flor de Lótus;
b) Prémio Luís de Camões;
c) Prémio Li Bai;
d) Prémio Dr. Nascimento Leitão;
e) Prémio Infante D. Henrique;
f) Prémio Luís Gonzaga Gomes;
g) Prémio Monsenhor António André Ngan;
h) Prémio Choi Leng Seong.
Artigo 4.º
(Prémio Flor de Lótus)
1. O prémio Flor de Lótus é atribuído aos dois alunos finalistas com melhor aproveitamento dos ensinos primário, secundário geral e secundário complementar, ou equivalente, de cada uma das instituições educativas do Território.
2. O prémio consta de diploma, placa alusiva e de 1 000,00 (mil patacas) para os alunos do ensino primário, de 2 000,00 (duas mil patacas) para os alunos do ensino secundário geral e de 3 000,00 (três mil patacas) para os alunos do ensino secundário complementar.
Artigo 5.º
(Prémio Luís de Camões)
1. O prémio Luís de Camões é atribuído ao aluno finalista dos ensinos primário, secundário geral e secundário complementar, ou equivalente, de cada uma das instituições educativas do Território, que tenha obtido, no decurso do ano lectivo, melhor aproveitamento na disciplina de Português.
2. O prémio consta de diploma e medalha alusiva.
Artigo 6.º
(Prémio Li Bai)
1. O prémio Li Bai é atribuído ao aluno finalista dos ensinos primário, secundário geral e secundário complementar, ou equivalente, de cada uma das instituições educativas do Território, que tenha obtido, no decurso do ano lectivo, melhor aproveitamento na disciplina de Língua Chinesa.
2. O prémio consta de diploma e medalha alusiva.
Artigo 7.º
(Prémio Dr. Nascimento Leitão)
1. O prémio Dr. Nascimento Leitão, de acordo com a vontade do doador, é atribuído ao aluno que, tendo frequentado, pelo menos, os 10.º e 11.º anos de escolaridade em instituições educativas em língua veicular portuguesa, haja concluído o 12.º ano de escolaridade com a mais elevada classificação e concluído também o ensino secundário no mínimo tempo possível que a lei permitir.
2. O prémio consta da importância relativa ao rendimento anual das acções da «China Light & Power Limited», à ordem da instituição educativa, e não é acumulável com qualquer outro prémio pecuniário, pelo que, em caso de renúncia, o mesmo é atribuído ao aluno que, em segundo lugar, reúna as condições referidas no número anterior.
Artigo 9.º
(Prémio Luís Gonzaga Gomes)
1. O prémio Luís Gonzaga Gomes é atribuído aos quatro alunos do ensino secundário geral ou equivalente, dois do ensino em língua veicular chinesa e dois do ensino em língua veicular portuguesa, que apresentem o melhor texto sobre a intercomunicabilidade das culturas oriental e ocidental.
2. O prémio consta de diploma e placa alusiva.
Artigo 10.º
(Prémio Monsenhor António André Ngan)
1. O prémio Monsenhor António André Ngan é atribuído aos dois alunos com melhor aproveitamento dos cursos de difusão da língua portuguesa, organizados pela Direcção dos Serviços de Educação e Juventude, no âmbito da educação de adultos.
2. O prémio consta de diploma e placa alusiva.
Artigo 11.º
(Prémio Choi Leng Seong)
1. O prémio Choi Leng Seong é atribuído ao aluno finalista de cada um dos cursos de educação técnico-profissional de cada uma das instituições educativas do Território que os ministrem, que melhor aproveitamento tenha obtido no decurso do ano lectivo.
2. O prémio consta de diploma e placa alusiva.
Artigo 12.º
(Encargos)
Os encargos resultantes do presente diploma são satisfeitos por verbas inscritas no Orçamento Geral do Território, com a excepção do disposto no n.º 2 do artigo 7.º, quanto ao prémio Dr. Nascimento Leitão.
Artigo 13.º
(Disposições finais)
1. Compete à Direcção dos Serviços de Educação e Juventude dar execução ao disposto no presente diploma.
2. A alteração dos montantes do Prémio Flor de Lótus é determinada por despacho do Governador.
Artigo 14.º
(Revogação)
É revogado o Decreto-Lei n.º 72/84/M, de 7 de Julho”.
Como resulta das normas citadas, relativamente ao Prémio Dr. Nascimento Leitão, é a direcção da Escola Portuguesa de Macau que escolhe, em cada ano, ouvida a respectiva estrutura pedagógica, o aluno que, tendo frequentado, pelo menos os 10.º e 11.º anos de escolaridade em instituições em língua veicular portuguesa, haja concluído o 12.º ano com a mais elevada classificação e concluído também o ensino secundário no mínimo tempo possível que a lei permite.
O universo dos possíveis escolhidos é o conjunto dos alunos que hajam concluído o 12.º ano e que tenham frequentado, pelo menos, os 10.º e 11.º anos de escolaridade em instituições em língua veicular portuguesa.
Não há, portanto, quaisquer candidaturas ao prémio. Há, apenas uma escolha do aluno que tenha concluído o 12.º ano com a mais elevada classificação e concluído também o ensino secundário no mínimo tempo possível que a lei permite.
De acordo com o artigo 13.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 37/97/M, compete à Direcção dos Serviços de Educação e Juventude dar execução ao disposto no diploma, designadamente, emitindo o Diploma do Prémio, cujo modelo foi aprovado por Despacho do Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura n.º 28/2001, publicado na I série do Boletim Oficial, de 26 de Junho de 2001.
Nada se diz, por conseguinte, quanto à obrigatoriedade de notificação do acto que atribui o prémio, pelo que se aplica, necessariamente, o disposto no artigo 68.º do Código do Procedimento Administrativo, onde se estabelece:
“Artigo 68.º
(Dever de notificar)
Devem ser notificados aos interessados os actos administrativos que:
a) Decidam sobre quaisquer pretensões por eles formuladas;
b) Imponham deveres, sujeições ou sanções, ou causem prejuízos;
c) Criem, extingam, aumentem ou diminuam direitos ou interesses legalmente protegidos, ou afectem as condições do seu exercício”.
Para o aluno contemplado com o Prémio a notificação é obrigatória, por se tratar de um acto que cria a favor dele um direito [alínea c)].
Já quanto a todos os restantes alunos do 12.º ano, não há qualquer obrigação de notificação, pois eles não formularam qualquer pretensão à Administração, o acto não lhes impõe quaisquer deveres, sujeições ou sanções, nem lhes causa prejuízos (ou seja, não empobrecem por causa do acto), nem cria, extingue, aumenta ou diminui direitos ou interesses legalmente protegidos, ou afecta as condições do seu exercício.
Assim, o acto não tinha de ser notificado à recorrente. À mesma conclusão chegou o Acórdão recorrido.
5. Dies a quo do prazo para o recurso hierárquico de um acto administrativo
A última sub-questão consiste em saber quando começa a correr o prazo para o recurso hierárquico de um acto administrativo, quando o recorrente não foi notificado do acto recorrido.
O Código do Procedimento Administrativo contém um Capítulo dedicado à reclamação e recursos administrativos, com uma secção I com três artigos comuns (artigos 145.º a 147.º), a Secção II, relativa à reclamação com cinco artigos (artigos 148.º a 152.º), a Secção III, relativa ao recurso hierárquico com dez artigos (artigos 153.º a 162.º) e a Secção IV, relativa aos recurso hierárquico impróprio e o recurso tutelar com dois artigos (artigos 163.º e 164.º).
A secção I, comum a estas três formas de impugnação, não contém norma sobre o dia do começo do prazo para estas impugnações administrativas.
O mesmo acontece com os recurso hierárquico, recurso hierárquico impróprio e recurso tutelar.
Ela existe para a reclamação (artigo 149.º), e é pacificamente aceite que se trata de uma norma geral, também aplicável aos recurso hierárquico, recurso hierárquico impróprio e recurso tutelar.
Referindo-se a normas idênticas do Código português, advertem MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e JOÃO PACHECO DE AMORIM1
“A presente disposição, no que respeita ao início do prazo de apresentação da reclamação, está deslocada, como já assinalou Rebelo de Sousa (R.D.J. vol. VI, 1992, pág. 48): cabia na Subsecção I, por dever abranger também os recursos, e está na Subsecção II, que apenas abrange, sistematicamente falando, a impugnação reclamatória.
O que significa que quase tudo quanto se comenta a seguir (salvo no que respeita aos prazos aplicáveis) vale também para as outras espécies de impugnação procedimental de acto administrativo”.
E no mesmo sentido opinam DIOGO FREITAS DO AMRAL, JOÃO CAUPERS, JOÃO MARTINS CLARO, JOÃO RAPOSO, MARIA GLÓRIA DIAS GARCIA, PEDRO SIZA VIEIRA e VASCO PEREIRA DA SILVA2
A norma em causa, o artigo 149.º, dispõe o seguinte:
“Artigo 149.º
(Prazo da reclamação)
A reclamação deve ser apresentada no prazo de quinze dias a contar:
a) Da publicação do acto no Boletim Oficial de Macau, quando a mesma seja obrigatória;
b) Da notificação do acto, quando esta se tenha efectuado, se a publicação não for obrigatória;
c) Da data em que o interessado tiver conhecimento do acto, nos restantes casos”.
O prazo, no entanto, é o que consta do n.º 1 do artigo 155.º:
“Sempre que a lei não estabeleça prazo diferente, é de trinta dias o prazo para a interposição do recurso hierárquico necessário”
Pois bem, o acto não foi publicado no Boletim Oficial.
O acto não tinha de ser notificado à recorrente (como dissemos atrás) e não foi efectivamente.
Na verdade, a notificação de um acto administrativo é um acto formal (porque se traduz numa diligência ou formalidade procedimental, que deve ser documentada no próprio processo), oficial (porque é conhecimento dado pelos serviços competentes para o efeito) e pessoal (porque a comunicação é enviada ao próprio interessado)3.
No caso dos autos o conhecimento do acto foi dado pela afixação de uma tarjeta cartonada (o tal banner) com os nomes dos contemplados pelos prémios atribuídos aos alunos da Escola Portuguesa de Macau, afixado no átrio da Escola no dia 10 de Setembro, sendo um material da própria Escola.
Não se tratou de qualquer notificação porque, para além de não conter as menções exigidas pelo artigo 70.º do Código do Procedimento Administrativo (o texto integral do acto administrativo, a identificação do procedimento administrativo, incluindo a indicação do autor do acto e a data deste, o órgão competente para apreciar a impugnação do acto e o prazo para esse efeito e a indicação de o acto ser ou não susceptível de recurso contencioso), não foi feita pelos Serviços Públicos – a Escola Portuguesa não é entidade integrada na Administração - nem foi feita com as formalidades previstas para a notificação edital, que sempre exigiria publicação em jornais, nos termos do artigo 72.º, n.º 2, do mesmo diploma legal.
É que a tese de que as notificações poderiam ser feitas de qualquer maneira, apenas porque o artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 37/97/M, dispõe que compete à Direcção dos Serviços de Educação e Juventude dar execução ao disposto no presente diploma, não tem na letra da lei a mínima correspondência. A competência consiste nos poderes para executar o Decreto-Lei, na atribuição dos prémios, elaboração dos respectivos diplomas comprovativos, entrega dos valores monetários em causa, etc.
A notificação é um acto que tem de ser rodeado de garantias, porque é uma formalidade essencial para a efectivação de direitos por parte dos interessados.
Mas, repete-se, a ora recorrente não tinha de ser notificada e não o foi.
Logo, por aplicação da alínea c) do artigo 149.º, o recurso deveria ser apresentado no prazo de 30 dias, a contar da data em que a interessada teve conhecimento do acto.
Dos factos provados resulta que a tarjeta cartonada (o banner) com os nomes dos contemplados pelos prémios atribuídos aos alunos da Escola Portuguesa de Macau, esteve afixada no átrio da Escola no dia 10 de Setembro.
Não se prova que a recorrente tomou conhecimento por esta via, nem em que momento (a recorrente estava em Portugal desde 15 de Julho de 2009), apesar de a mãe estar em Macau, ao tempo. A recorrente era maior (nascida a 12-01-1991 – fls. 47), pelo que mãe não a representava. De todo o modo, nem se provou que mãe teve conhecimento daquela afixação.
Os Prémios foram entregues no dia 11 de Novembro de 2009, cerimónia a que esteve presente a mãe da recorrente.
E a recorrente alega que teve conhecimento do acto, no mesmo dia 11 de Novembro de 2009, por meio da mãe.
Como é sabido, não é o interessado que tem de provar que o recurso hierárquico é tempestivo.
É manifesto, para o efeito de saber quando teve a recorrente efectivo conhecimento do acto é neutro, isto é, irrelevante, que a recorrente não estivesse em Macau. Se o facto não a pode beneficiar, também não a pode prejudicar. Aliás, poderia estar em Macau e não ter conhecimento do acto.
O recurso hierárquico foi interposto em 11 de Dezembro de 2009, pelo que foi tempestivo.
Decidindo diferentemente, impõe-se a revogação do Acórdão recorrido.
IV – Decisão
Face ao expendido, concedem provimento ao recurso, revogam o Acórdão recorrido e anulam o acto recorrido.
Sem custas, no TSI e no TUI.
Macau, 18 de Abril de 2012.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei –
Sam Hou Fai
O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Vítor Manuel Carvalho Coelho
1 MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e JOÃO PACHECO DE AMORIM, Código do Procedimento Administrativo, Coimbra, Almedina, 2.ª edição, 1997, p. 760.
2 DIOGO FREITAS DO AMRAL, JOÃO CAUPERS, JOÃO MARTINS CLARO, JOÃO RAPOSO, MARIA GLÓRIA DIAS GARCIA, PEDRO SIZA VIEIRA e VASCO PEREIRA DA SILVA, Código do Procedimento Administrativo, Coimbra, Almedina, 6.ª edição, 2007, p. 290.
3 MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e JOÃO PACHECO DE AMORIM, Código..., p. 348.
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Processo n.º 16/2012