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Processo nº 222/2011 Data: 19.05.2011
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Apoio judiciário.
Insuficiência económica.
Presunção.



SUMÁRIO

1. Os titulares do direito de indemnização por acidente de viação gozam, para efeitos de concessão de apoio judiciário, da presunção de insuficiência económica.

2. Deixa de beneficiar de tal presunção o requerente que tiver rendimentos próprios ou de pessoas a seu cargo que, no seu conjunto, ultrapassem o triplo do montante equivalente ao limite de isenção de pagamento do imposto profissional.


O relator,

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José Maria Dias Azedo













Processo nº 222/2011
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. A(XXX), com os sinais dos autos, veio recorrer do despacho proferido pelo Mmo Juiz do T.J.B. que lhe negou a concessão de apoio judiciário.

Em sede da sua motivação de recurso, conclui nos termos seguintes:

“Nos termos do art.° 6°, n.°1, al. f) do D.L n.° 41/94/M, o ofendido de acidente de trânsito (requerente) é pessoa quem automaticamente goza de presunção a obter o apoio judiciário nos termos da lei, a fim de melhor exigir, junto da parte culposa, uma indemnização devida pelo acidente por si causada: mesmo que exista a disposição prevista no art.° 6, n.2 do mesmo Decreto-Lei, muito menos que, segundo os autos, o requerente, de nenhuma maneira, não reúne o triplo do montante do limite de isenção de pagamento do imposto profissional.
A decisão do juiz a quo que indeferiu o pedido de apoio judiciário, violou o disposto no art.° 6°, n.° 1, al. f) e n.° 2 do D.L. n.° 41/94/M”; (cfr., fls. 3 e 4 e 97 a 100).

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Respondendo, afirma o Exmo. Magistrado do Ministério Público que:

“A. Nos termos do art.° 6°, n.°l, al. f) do D.L n.041/94/M, o titular do direito à indemnização por acidente de trânsito goza da presunção de insuficiência económica.
B. Ainda não é capaz de refutar a presunção de insuficiência económica prevista no art.° 6°, n.°1 , al. f) do referido Decreto-Lei, com base apenas no salário mensal de MOP15.290 do recorrente.
C. Na realidade, ao ponderar quanto à concessão ou não de apoio judiciário, não se deve tomar em consideração simplesmente com base em quantos bens ou rendimentos que detém ou aufere o requerente, mas sim quantos bens ou rendimentos que efectivamente estão à sua disposição.
D. Pode surgir a situação seguinte, embora o recorrente aufira um salário mensal de MOP15.290, simultaneamente tem que suportar uma carga da família pesada.
E. Contudo, nos autos parece carecer dos dados sobre a situação económica do recorrente acima referida.
F. Além disso, mesmo que se considere que o recorrente deixa de gozar da presunção de insuficiência económica, deve dar-lhe uma oportunidade para provar a insuficiência da sua capacidade económica.
G. Pelo que, entende o Ministério Público que antes de se apurar a capacidade económica do recorrente, deve-se manter a presunção de insuficiência económica prevista no art.° 6°, n.° l, al. f) do referido Decreto-Lei.
H. Assim sendo, é procedente essa parte da motivação do recorrente. Contudo, quanto ao seu pedido que a concessão de apoio judiciário seja feita directamente pelo Tribunal “ad quem”, o Ministério Público não está de acordo com isso, uma vez que, ao ponderar quanto à concessão ou não de apoio judiciário, é necessário ainda tomar certas diligências para apurar a situação económica do recorrente. Pelo que, não está reunida a regra da substituição à decisão do Tribunal recorrido prevista no art.° 630°, n.°2 do Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente”; (cfr., fls. 6 a 8 e 101 a 106).

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Admitido o recurso, vieram os autos a este T.S.I.

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Em sede de vista juntou o Exmo. Representante do Ministério Público o seguinte douto Parecer:

“As alíneas e) e f) do art° 6° do Dec Lei 41/94/M reportam-se a duas diferentes e autónomas situações de presunção de insuficiência económica, tais sejam dispor o requerente de rendimentos anuais provenientes do trabalho iguais ou inferiores ao direito de isenção do pagamento de imposto profissional e ser o mesmo titular do direito de indemnização por acidente de viação.
Serve tal autonomia por dizer que, pelo mero facto de um titular do direito a indemnização não preencher cumulativamente o pressuposto da alínea anterior, tal não será passível de, por si só, arredar ou condicionar a presunção estabelecida por aquela qualidade, sob pena de não fazer sentido a previsão legal distinta das duas diferentes situações.
Ou seja, dito de outro modo, o mero facto de os rendimentos anuais provenientes do trabalho do requerente ultrapassarem o limite da isenção de pagamento do imposto profissional não é susceptível de arredar, por si só, a presunção de insuficiência económica derivada daquela condição de titularidade do direito de indemnização' por acidente de viação, havendo, como bem acentua o Exmo. Colega junto do tribunal “a quo”, que ter em conta o montante específico daqueles rendimentos do trabalho, bem como os restantes circunstancialismos atinentes às condições de vida do peticionante.
Ora, no caso, o montante do rendimento mensal do requerente -MOP 15.290,00 - não é, em nosso critério, por si mesmo, suficiente para justificar a ilisão daquela presunção.
Donde, não se alcançando na fundamentação do despacho em crise
qualquer outra justificação em que possa validamente assentar o decidido, sermos a entender merecer provimento o presente recurso”; (cfr., fls. 108 a 109).

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Nada obstando, cumpre decidir.

Fundamentação

2. Vem interposto recurso do despacho do Mmo Juiz do T.J.B. que negou a concessão de apoio judiciário na modalidade de dispensa do pagamento de preparos e custas ao ora recorrente.

Entendeu o Mm Juiz que dado que auferia o ora recorrente o salário mensal de MOP$15.290.00, justificada não seria a concessão do dito apoio judiciário.

Vejamos se é de manter o decidido.

Nos termos do art. 1°, n.° 1 do D.L. n.° 41/94/M de 01.08:

“1. O apoio judiciário compreende a dispensa, total ou parcial, do pagamento de preparos ou do pagamento de preparos e custas, ou o seu diferimento, e bem assim o patrocínio oficioso”.

Por sua vez, nos termos do art. 4°, n.° 1 do mesmo diploma legal:

“1. Têm direito ao apoio judiciário todos aqueles que residam no território de Macau, ainda que temporariamente, e que demonstrem não dispor de meios económicos bastantes para custear, no todo ou em parte, os encargos normais de uma causa judicial”.

Quanto à “prova da insuficiência económica” preceitua o art. 5° que:

“1. A insuficiência económica do requerente do apoio judiciário pode ser provada por qualquer meio idóneo, designadamente:
a) Atestado de situação económica emitido pelo Instituto de Acção Social de Macau;

b) Certidão comprovativa de que o requerente se encontra a cargo da assistência pública.

2. Os documentos a que se refere o número anterior devem mencionar expressamente que se destinam a instruir um pedido de apoio judiciário”.

E, (quanto à “presunção de insuficiência económica”), dispõe o art. 6° que:

“1. Goza da presunção de insuficiência económica:
a) Quem estiver a receber alimentos por necessidade económica;

b) Quem reunir as condições exigidas para a atribuição de quaisquer subsídios em razão da sua carência de rendimentos;

c) O filho menor, para efeitos de investigar ou impugnar a sua maternidade ou paternidade ou para acção de outra natureza contra progenitor;

d) O requerente de alimentos;

e) Quem tiver rendimentos anuais, provenientes do trabalho, iguais ou inferiores ao limite de isenção de pagamento do imposto profissional;

f) Os titulares de direito de indemnização por acidente de viação.

2. Deixa de constituir presunção de insuficiência económica o facto de o requerente fruir, além dos referidos na alínea e) do número anterior, outros rendimentos próprios ou de pessoas a seu cargo que, no conjunto, ultrapassem o triplo do montante equivalente ao limite de isenção de pagamento do imposto profissional”.

Atento o assim consignado, “quid iuris”?

Como se deixou relatado, o ora recorrente é o autor de um pedido de indemnização civil enxertado em processo penal instaurado na sequência de um acidente de viação no qual é ofendido.

E, assim, sendo o mesmo residente desta R.A.E.M., será que deve beneficiar do pretendido apoio judiciário atento o seu vencimento mensal?

Cremos que de sentido afirmativo deve ser a resposta.

De facto, tendo em conta o estatuído na alínea f), n.° 1 do art. 6° do D.L. n.° 41/94/M, há que afirmar que goza o ora recorrente da “presunção de insuficiência económica”, pois que é, (ou pelo menos, alega ser), “titular de direito de indemnização por acidente de viação”.

E, mostrando os autos que tem o recorrente um salário mensal de MOP$15.290,00, e, por sua vez, provado não estando que aufere (ou possui outros) rendimentos que no seu conjunto ultrapassam o “triplo do montante equivalente ao limite de isenção de pagamento do imposto profissional”, (MOP$ 285.000,00 = MOP$95.000,00 × 3; cfr., art. 7° do “Regulamento do Imposto Profissional”), motivos não existem para se considerar ilidida a atrás mencionada “presunção de insuficiência económica”, demonstrado ficando assim que razões também não haviam para a decisão de indeferimento proferida e objecto do presente recurso, que, por isso, não se pode manter.

Decisão

3. Nos termos que se deixam expostos, e em conferência, acordam conceder provimento ao recurso.

Sem custas.

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$800.00

Macau, aos 19 de Maio de 2011
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa

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