Processo n.º 750/2010
(Confirmação de Decisão do Exterior)
Data: 26/Maio/2011
Assuntos :
- Revisão de divórcio celebrado no Exterior, celebrado perante autoridade administrativa
SUMÁRIO :
É passível de revisão a decisão administrativa que enquadra um divórcio por mútuo consentimento, registado na China, em Zhongshan, junto da autoridade competente, ainda que não consubstanciado numa decisão judicial.
O Relator,
João A. G. Gil de Oliveira
Processo n.º 750/2010
(Revisão e Confirmação de Decisão do Exterior)
Data: 26/Maio/2011
Requerente: A
Requerido: B
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I – RELATÓRIO
A (A), melhor identificada nos autos, vem intentar
contra
B (B), também melhor identificado nos autos,
a acção de revisão de decisões proferidas por tribunais ou árbitros do exterior de Macau, ao abrigo dos artigos 1199.º e s.s. do Código de Processo Civil, o que faz com os factos e fundamentos seguintes:
1.- 聲請人A (A) ,其分別持有中華人民共和國廣東省中山市公安局發出之中國居氏身份證編號442000197XXXXXXXXX,及中華人民共和國護照編號G23XXXXXX,及澳門身份證明局於2008年08月14日發出之非永久性居民身份證編號1XXXXXX(4). (參閱附件一至附件三)
2.- 被聲請人B (B),其分別持有中華人氏共和國廣東省中山市公安局發出之居民身份證編號442000197XXXXXXXXX,及中華人民共和國護照編號G24XXXXXX,及澳門身份證明局於2008年09月04日發出之非永久性居民身份證編號1XXXXXX(8). (參閱附件四至附件六)
3.- 2010年5月17日,中國廣東省中山市菊城公證處發出“公證書 (2010)菊證字第XXXX號",內容為:“茲證明A (女, 一九XX年X月X日出生)與B(男,一九XX年X月X日出生) 於二00九年六月十九日在廣東省中山市登記離婚。". (參閱附件七,為著產生適當之法律效力,在此視為完全被轉錄,底線及黑體為我們所加)
4.- 2010年5月17日,中國廣東省中山市菊城公證處發出“公證書 (2010)菊證字第XXXX號",內容為:“茲證明前面的影印件與A持有的離婚證字號為粵中欖離字020XXXXXX «中華人民共和國離婚證»的原件相符。原件上“中山市小欖鎮人民政府婚姻登記專用章"的印鑒及鋼印均屬實。"(參閱附件八,為著產生適當之法律效力,在此視為完全被轉錄)
5.- 2010年5月27日,中國廣東省中山市菊城公證處發出“公證書 (2010)菊證字第XXXX號",內容為:“茲證明前面的《離婚協議書〉影印件上“中山市小欖鎮人民政府婚姻登記專用章"的印鑒屬實。"(參閱附件九,為著產生適當之法律效力,在此視為完全被轉錄)
6.- 在上述“公證書(2010)菊證字第XXXX號"之首頁中,可見聲請人與被聲請人之“離婚協議書";(請再參閱附件九,以下簡稱“上述離婚協議書")
7.- 在“上述離婚協議書"中,因著聲請人與被聲請人並無子女,故雙方對子女的安排為“無";(請再參閱附件九,為著產生適當之法律效力,該“離婚協議書"在此視為完全被轉錄)
8.- 在“上述離婚協議書"中,聲請人與被聲請人均無需處理“對共同財產及債權的處理"、“補償情況"、“對共同債務的負擔安排"“其他協議". (請再參閱附件九,為著產生適當之法律效力,該“離婚協議書"在此視為完全被轉錄)
9.- 在“上述離婚協議書"中,聲請人與被聲請人均有簽署,日期為 2009年6月19日。(請再參閱附件九,為著產生過當之法律效力,該 “離婚協議書"在此視為完全被轉錄)
10.- 上述文件所記載之協議離婚事宜,屬請晰及明確地表達了雙方以協議方式離婚之意思表示,及根據中華人民共和國現行〈婚姻法〉作出;
11.- 上述之協議離婚事宜已轉為確定;
12.- 聲請人及被聲請人之協議離婚事宜,中華人民共和國廣東省中 山市人民政府其行政上之管轄權限;
13.- 聲請人及被聲請人之協議離婚事宜,沒有在澳門法院中存在繫屬或已有確定裁判之狀況;
14.- 及不存在被聲請人沒有被傳喚或違反辯論原則及當事人平等原則之事宜;
15.- 聲請人及被聲請人之協議離婚理據,並未有違反澳門公共秩序.
16.- 好了;
17.- 根據《民事訴訟法典〉第1199條、第1200條及續後條文之規定,規範了有關審查本澳以外法院或仲裁員裁判的事宜。
18.- 為此,根據尊敬的中級法院第19512001號案裁判書、第40/2001號案裁判書、第21412002號案裁判書、第156/2000號案裁判書、 第203/2002號素裁判書、第262/2003號案裁判書、第17712004號素裁判書、第97/2005號案裁判書、第27712005號案裁判書、和第13012006號案裁判書、及第44412010號案裁判書等類似聲請個案的司法見解,
19.- 倘法院並未發現有任何不符合《民事訴訟法典》第1200條規定法定要件的地方,且具體訴訟情況因不過用第1202條第2款的規定而祇涉及對上述民事判決作形式上(而非對其判案依據作實質)的審查,
20.- 則法院得應聲請人的要求, 批准確認該有關批准聲請人和被聲請人離婚的民事判決.
21.- 此外;
22.- 就著聲請人與被聲請人之協議離婚屬行政上處理而非經由法院方式處理方面;
23.- 我們一貫地保持尊重所有不同之法律見解的態度,
24.- 然而,我們對中級法院於2003年11月20日就卷宗編號99/2003號所作出之最終合議庭裁判採取認同的態度;
25.- 我們認同, «民事訴訟法典»第1199條及續後條文之規定,不單單地僅限於法院之判決方可由澳門中級法院作出確認,
26.- 就立法精神而言,更應將之擴大至非由法院作出之判決,但屬有權限機關作出之決定亦可通用澳門〈民事訴訟法典〉第1199條及續後條文之規定。
27.- 即如本聲請中,因著中華人民共和國廣東省中山市人民政府對聲請人及被聲請人之協議離婚亦具行政上之管轄權限,
28.- 為此,澳門中級法院亦可根據〈民事訴訟法典〉第1199條及續後條文之規定,對上述決定進行確認,
29.- 俾使上述決定能於澳門特別行政區中產生過當之法律效力。
30.- 本訴訟中,聲請人其有當事人能力、訴訟能力、及正當性、及 其律師代表,有訴之利益;
31.- 澳門中級法院其管轄權限。1
Pelos exposto, pede se:
“- Admita o presente pedido e todos os seus anexos;
- Defira o pedido da requerente, confirmando todo o conteúdo da decisão proferida pelo Governo Popular da Cidade de Zhongshan da Província de Guangdong da República Popular da China em 19 de Junho de 2009 que autorizou o divórcio por mútuo consentimento entre a requerente e o requerido.
Caso assim não se entenda,
- Declare deferido o pedido da requerente, confirmando a decisão proferida pelo Governo Popular da Cidade de Zhongshan da Província de Guangdong da República Popular da China em 19 de Junho de 2009 que autorizou o divórcio por acordo entre a requerente e o requerido.
e
- Quanto à aludida decisão, cite o requerido.”
Foi oportunamente citada o requerido que não deduziu qualquer oposição.
O Digno Magistrado do Ministério Público pronuncia-se no sentido de não vislumbrar obstáculo à revisão em causa.
Foram colhidos os vistos legais.
II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
O Tribunal é o competente internacionalmente, em razão da matéria e da hierarquia.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciária, dispondo de legitimidade ad causam.
Inexistem quaisquer outras excepções ou questões prévias de que cumpra conhecer.
III - FACTOS
Relativamente ao processo de divórcio que correu seus termos no departamento respectivo da cidade de Zhongshan da província de Guangdong da República Popular da China, certifica-se o seguinte:
公证书
(2010) 菊证字第XXXX号
兹证明A (女, 一九XX年X月X日出生) 与B (男, 一九XX年X月X日出生) 于二零零九年六月十九日在广东省中山市登记离婚.
中华人民共和国广东省中山市菊城公证处
公证员
二零一零年五月十七日2
REPÚBLICA POPULAR DA CHINA
(Com emblema nacional da República Popular da China, vide o original)
CERTIDÃO DE DIVÓRCIO
(Carimbo aposto: Ministério dos Assuntos Civis da República Popular da China, vide o original)
Emitido pelo Ministério dos Assuntos Civis da República Popular da China
O requerimento de divórcio enquadra-se às disposições da Lei de Matrimónio da República Popular da China, sendo registado. Emite-se esta certidão.
Serviços dos Registos
Conservador do registo:
(Ass.: vide o original)
(Com carimbo aposto, vide o original)
Titular: A (A)
Data de registo: 19/06/2009
N.º da série da certidão de divórcio: n.º 020XXXXXX da série de Yue Zhong Lan Li Zi
Obs.:
(Com fotografia da titular, vide o original)
Nome: A (A) Sexo: feminino
Nacionalidade: Chinesa Data de nascimento: X/X/19XX
N.º do BI: 442000197XXXXXXXXX
Nome: B (B)Sexo: masculino
Nacionalidade: Chinesa Data de nascimento: X/X/19XX
N.º do BI: 442000197XXXXXXXXX
Nos termos da Lei de Matrimónio da República Popular da China, é decretado o divórcio por mútuo consentimento das duas partes. Conforme apurado pelos Serviços dos Registos de Casamento, o divórcio das partes foi de livre vontade e a questão de filhos e de bens já foi resolvida adequadamente, emite-se a certidão de divórcio.
N.º 0015XXXXXX
公证书
(2010) 菊证字第XXXX号
兹证明前面的影印件与A持有的离婚证字号为粤中榄离字020XXXXXX «中华人民共和国离婚证» 的原件相符. 原件上 “中山市小榄镇人民政府婚姻登记专用章”的印鉴及钢印均属实.
中华人民共和国广东省中山市菊城公证处
公证员
二零一零年五月十七日3
ACORDO DE DIVÓRCIO
É favor preencher legivelmente a tinta
Nome do requerente
B
(B)
Data de nascimento
X/X/19XX
Nome da requerente
A
(A)
Data de nascimento
X/X/19XX
Acordo sobre filhos
Nome de filhos
Sexo
Data de nascimento
Com quem vive
Alimentos e modo de pagamento
Direito de visitas de outra parte
Nada
Acordo sobre a partilha de bens e créditos comuns
Nada
Compensação
Nada
Acordo sobre a partilha de encargos da dívida comum
Nada
Outros acordos
Nada
Divórcio por mútuo consentimento confirmado pelas assinaturas das partes
Requerente (o) (ass.: vide o original) Requerente (a) (ass.: vide o original)
Data: 19/06/2009 Data: 01/06/2009
(Obs: é favor preencher o espaço em branco com “nada”)
公证书
(2010) 菊证字第XXXX号
兹证明前面的 «离婚协议书» 影印件上 “中山市小榄镇人民政府婚姻登记专用章”的印鉴属实.
中华人民共和国广东省中山市菊城公证处
公证员
二零一零年五月二十七日4
IV - FUNDAMENTOS
O objecto da presente acção - revisão da decisão do divórcio que ocorreu no Cartório Notarial Ju Cheng da Cidade de Zhongshan da Província de Guangdong, da República popular da China, de forma a produzir aqui eficácia, passa pela análise das seguintes questões:
1. Requisitos formais necessários para a confirmação;
2. Colisão ou não com matéria da exclusiva competência dos Tribunais de Macau;
3. Compatibilidade com a ordem pública;
*
1. Prevê o artigo 1200º do C. Processo Civil:
“1. Para que a decisão proferida por tribunal do exterior de Macau seja confirmada, é necessária a verificação dos seguintes requisitos:
a) Que não haja dúvidas sobre a autenticidade do documento de que conste a decisão nem sobre a inteligibilidade da decisão;
b) Que tenha transitado em julgado segundo a lei do local em que foi proferida;
c) Que provenha de tribunal cuja competência não tenha sido provocada em fraude à lei e não verse sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais de Macau;
d) Que não possa invocar-se a excepção de litispendência ou de caso julgado com fundamento em causa afecta a tribunal de Macau, excepto se foi o tribunal do exterior de Macau que preveniu a jurisdição;
e) Que o réu tenha sido regularmente citado para a acção, nos termos da lei do local do tribunal de origem, e que no processo tenham sido observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes;
f) Que não contenha decisão cuja confirmação conduza a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública.
2. O disposto no número anterior é aplicável à decisão arbitral, na parte em que o puder ser.”
Com o Código de Processo Civil (CPC) de 1999, o designado privilégio da nacionalidade ou da residência - aplicação das disposições de direito privado local, quando este tivesse competência segundo o sistema das regras de conflitos do ordenamento interno - constante da anterior al. g) do artigo 1096º do CPC, deixou de ser considerado um requisito necessário, passando a ser configurado como mero obstáculo ao reconhecimento, sendo a sua invocação reservada à iniciativa da parte interessada, se residente em Macau, nos termos do artigo 1202º, nº2 do CPC.
A diferença, neste particular, reside, pois, no facto de que agora é a parte interessada que deve suscitar a questão do tratamento desigual no foro exterior à R.A.E.M., facilitando-se assim a revisão e a confirmação das decisões proferidas pelas autoridades estrangeiras, respeitando a soberania das outras jurisdições, salvaguardando apenas um núcleo formado pelas matérias da competência exclusiva dos tribunais de Macau e de conformidade com a ordem pública.
Não se conhecendo do fundo ou do mérito da causa, na revisão formal, o Tribunal limita-se a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade5, pelo que não há que proceder a novo julgamento tanto da questão de facto como de direito.
Vejamos então os requisitos previstos no artigo 1200º do CPC.
Autenticidade e inteligibilidade da decisão.
Parece não haver dúvidas de que se trata de um documento autêntico devidamente selado e traduzido, certificando-se uma decisão relativa a uma autorização de um registo de um divórcio por mútuo consentimento proferida pelo departamento respectivo da República Popular da China, cujo conteúdo facilmente se alcança, em particular no que respeita aos efeitos jurídicos da dissolução do casamento, sendo certo que são estes que devem relevar.6
É certo que não se trata de uma sentença proferida por um Tribunal do Exterior, mas não deixamos de estar perante uma decisão proferida por uma autoridade administrativa que não deixa de produzir os mesmos efeitos, adoptando-se o critério que já tem seguido pelos Tribunais de Macau7 para confirmação de divórcios ocorridos perante autoridades administrativas ou até em termos de Jurisprudência Comparada.8
Sob pena até de os interessados se verem na impossibilidade de reconhecimento na ordem interna relativamente ao seu próprio estado civil.
Quanto aos requisitos relativos ao trânsito em julgado, competência do tribunal ou autoridade do exterior, ausência de litispendência ou de caso julgado, citação e garantia do contraditório, dispõe o artigo 1204º do CPC:
“O tribunal verifica oficiosamente se concorrem as condições indicadas nas alíneas a) e f) do artigo 1200º, negando também oficiosamente a confirmação quando, pelo exame do processo ou por conhecimento derivado do exercício das suas funções, apure que falta algum dos requisitos exigidos nas alíneas b), c), d) e e) do mesmo preceito”.
Tal entendimento já existia no domínio do Código anterior9, entendendo-se que, quanto àqueles requisitos, geralmente, bastaria ao requerente a sua invocação, ficando dispensado de fazer a sua prova positiva e directa, já que os mesmos se presumiam10.
É este, igualmente, o entendimento que tem sido seguido pela Jurisprudência de Macau.11
Ora, nada resulta dos autos ou do conhecimento oficioso do Tribunal, no sentido da não verificação desses requisitos que assim se têm por presumidos.
2. Já a matéria da competência exclusiva dos Tribunais de Macau está sujeita a indagação, implicando uma análise em função do teor da decisão revidenda, à luz, nomeadamente, do que dispõe o artigo 20º do CC:
“A competência dos tribunais de Macau é exclusiva para apreciar:
a) As acções relativas a direitos reais sobre imóveis situados em Macau
b) As acções destinadas a declarar a falência ou a insolvência de pessoas colectivas cuja sede se encontre em Macau.”
Ora, facilmente se observa que nenhuma das situações contempladas neste preceito colide com o caso sub judice, tratando-se aqui da revisão de um divórcio acordado por ambos os cônjuges.
3. Da ordem pública.
Não se deixa de ter presente a referência à ordem pública, a que alude o art. 273º, nº2 do C. Civil, no direito interno, como aquele conjunto de “normas e princípios jurídicos absolutamente imperativos que formam os quadros fundamentais do sistema, pelo que são, como tais, inderrogáveis pela vontade dos indivíduos.”12E se a ordem pública interna restringe a liberdade individual, a ordem pública internacional ou externa limita a aplicabilidade das leis exteriores a Macau, sendo esta última que relevará para a análise da questão.
No caso em apreço, em que se pretende confirmar a decisão em que se autorizou o registo do divórcio, reconhecendo tais efeitos como extintivos da relação matrimonial em causa, não se vislumbra que haja qualquer violação ou incompatibilidade com a ordem pública. Aliás, sempre se realça que o nosso direito substantivo prevê a dissolução do casamento, igualmente por mútuo consentimento, por mera manifestação de vontade de ambos os cônjuges nesse sentido, preenchidos os respectivos requisitos.
À luz das leis da RPC mostra-se comprovada a dissolução do casamento, o que não fere os princípio do nosso ordenamento.
O pedido de confirmação do divórcio ocorrido na RPC não deixará, pois, de ser procedente, confirmação essa que não se estende ao acordo de partilha, situação que se aparta daqueles casos em que a partilha é homologada judicialmente.
V – DECISÃO
Pelas apontadas razões, acordam conceder a revisão e confirmar o divórcio entre A (A) e B (B), registado pelo Departamento da Cidade de Zhongshan da Província de Guangdong da República Popular da China, em 19 de Junho de 2009, no sentido de poder produzir eficácia na RAEM, nos seus precisos termos.
Custas pela requerente.
Macau, 26 de Maio de 2011,
(Relator) João A. G. Gil de Oliveira
(Primeiro Juiz-Adjunto) Ho Wai Neng
(Segundo Juiz-Adjunto) José Cândido de Pinho
1 1. A requerente A (A), portadora do Bilhete de Identidade de Residente da RPC n.º 442000197XXXXXXXXX, emitido pelo Departamento de Segurança Pública da Cidade de Zhongshan da Província de Guangdong da RPC, do Passaporte da RPC n.º G23XXXXXX e do Bilhete de Identidade de Residente Não Permanente de Macau n.º 1XXXXXX(4) emitido pela Direcção dos Serviços de Identificação de Macau em 14 de Agosto de 2008 (vide os Documentos 1 a 3).
2. O requerido B (B), portador do Bilhete de Identidade de Residente da RPC n.º 442000197XXXXXXXXX, emitido pelo Departamento de Segurança Pública da Cidade de Zhongshan da Província de Guangdong da RPC, do Passaporte da RPC n.º G24XXXXXX e do Bilhete de Identidade de Residente Não Permanente de Macau n.º 1XXXXXX(8), emitido pela Direcção dos Serviços de Identificação de Macau em 4 de Setembro de 2008 (vide os Documentos 4 a 6).
3. Em 17 de Maio de 2010, o Cartório Notarial Ju Cheng da Cidade de Zhongshan da Província de Guangdong da China emitiu a escritura pública n.º XXXX da série (2010) Ju Zheng Zi, cujo conteúdo é: “Certifica-se que A (A) (de sexo feminino, nascida em X de X de 19XX) e B (B) (de sexo masculino, nascido em X de X de 19XX) efectuaram o registo de divórcio em 19 de Junho de 2009 na Cidade de Zhongshan da Província de Guangdong”. (vide o Documento 7, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos jurídicos. Sublinhado e negrito nosso).
4. Em 17 de Maio de 2010, o Cartório Notarial Ju Chen da Cidade de Zhongshan da Província de Guangdong da China emitiu a Escritura Pública n.º XXXX da série (2010) Ju Zheng Zi, cujo conteúdo é: “Certifica-se a conformidade da fotocópia que antecede com o original da Certidão de Divórcio n.º 020XXXXXX da série Yue Zhong Lan Li Zi da RPC possuída por A (A). O “carimbo exclusivamente usado pelo Governo Popular da Vila Xiao Lan da Cidade de Zhongshan para registo de casamento e o selo branco, ambos apostos no referido original são verdadeiros” (vide o Documento 8, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos jurídicos).
5. Em 27 de Maio de 2010, o Cartório Notarial Ju Cheng da Cidade de Zhongshan da Província de Guangdong da China emitiu a Escritura Pública n.º XXXX da série (2010) Ju Zheng Zi, cujo conteúdo é: “Certifica-se que o “carimbo exclusivamente usado pelo Governo Popular da Vila Xiao Lan da Cidade de Zhongshan para registo de casamento aposto na fotocópia do “Acordo de Divórcio” que antecede é verdadeiro” (vide o Documento 9, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos jurídicos).
6. Na primeira página da “Escritura Pública n.º XXXX da série (2010) Ju Zheng Zi”, pode-se ler o “acordo de divórcio” entre a requerente e o requerido (vide o Documento 9, doravante designado simplesmente por “referido acordo de divórcio”).
7. A requerente e o requerido não têm nenhum filho, pelo que, no “referido acordo de divórcio”, “não há” quaisquer disposições relativas ao alimento do filho (Vide o Documento 9. Para os devidos efeitos jurídicos, o teor do referido acordo de divórcio dá-se aqui por integralmente reproduzido)
8. No “referido acordo de divórcio”, a requerente e o requerido não precisam de tratar os assuntos relativos aos “bens e créditos comuns”, “compensação”, “encargos das dívidas comuns” e “outros acordos” (vide o Documento 9. Para os devidos efeitos jurídicos, o teor do referido acordo de divórcio dá-se aqui por integralmente reproduzido).
9. O “referido acordo de divórcio” foi assinado por ambos a requerente e o requerido em 19 de Junho de 2009 (vide o Documento 9. Para os devidos efeitos jurídicos, o teor do referido acordo de divórcio dá-se aqui por integralmente reproduzido)
10. A matéria do divórcio por mútuo consentimento constante do documento acima referido manifestou de forma clara e expressa a declaração de vontade do divórcio por mútuo consentimento das ambas as partes, observando as disposições legais previstas na vigente Lei de Casamento da República Popular da China;
11. A decisão do referido divórcio por mútuo consentimento já transitou em julgado;
12. O Governo Popular da Cidade de Zhongshan da Província de Guangdong da República Popular da China tem competência administrativa sobre a matéria de divórcio por mútuo consentimento entre a requerente e o requerido;
13. Inexiste litispedência ou caso julgado do divórcio por mútuo consentimento entre a requerente e o requerido nos tribunais da RAEM;
14. Nem há falta de citação do requerido ou violação do princípio do contraditório ou princípio de igualdade das partes;
15. Os fundamentos do divórcio por mútuo consentimento entre a requerente e o requerido não violam a ordem pública de Macau;
16. Ora bem;
17. Os artigos 1199.º, 1200.º e s.s. do Código de Processo Civil prevêem a revisão de decisões proferidas por tribunais ou árbitros do exterior de Macau.
18. Para isso, conforme a jurisprudência já veiculada pelo Venerando Tribunal de Segunda Instância a propósito de pedidos congéneres ao ora em apreço, designadamente nos processos n.ºs 195/2001, 40/2001, 214/2002, 156/2000, 203/2002, 262/2003, 177/2004, 97/2005, 277/2005, 130/2006 e 444/2010,
19. Caso no exame dos autos não se detecte nenhuma desconformidade com os diversos requisitos legais previstos no art.º 1200.º do Código de Processo Civil de Macau, não sendo aplicável in casu o disposto no n.º 2 do art.º 1202.º do mesmo Código e estando em causa a revisão apenas formal (e não substancial dos seus fundamentos) da decisão de matéria civil supra identificada,
20. O tribunal deve deferir, a pedido da pessoa requerente, a revisão formal da decisão de matéria cível do divórcio entre a requerente e o requerido.
21. Aliás,
22. Quanto à questão de que se trata de uma decisão do divórcio por mútuo consentimento entre a requerente e o requerido proferida por órgão administrativo e não por tribunal;
23. Salvo sempre o muito respeito por toda a jurisprudência diversa;
24. Estamos de acordo com a decisão final proferida pelo Tribunal de Segunda Instância no acórdão n.º 99/2003 em 20 de Novembro de 2003;
25. Concordamos que os artigos 1199.º e s.s. do Código de Processo Civil não prevêem apenas que só as decisões proferidas por tribunal podem ser confirmadas pelo Tribunal de Segunda Instância de Macau;
26. A nível do espírito legislativo, deve ainda permitir uma extensão para que os artigos 1199.º e s.s. do Código de Processo Civil de Macau também sejam aplicáveis às decisões ainda não provindas de tribunal, desde que as mesmas sejam proferidas pela entidade administrativa competente.
27. Como no presente pedido, dado que o Governo Popular da Cidade de Zhongshan da Província de Guangdong da República Popular da China tem competência administrativa na matéria de divórcio por mútuo consentimento entre a requerente e o requerido,
28. O Tribunal de Segunda Instância também pode confirmar a aludida decisão nos termos dos artigos 1199.º e s. s. do Código de Processo Civil,
29. De forma que a aludida decisão possa produzir devidos efeitos jurídicos na Região Administrativa Especial de Macau.
30. Na presente acção, a requerente tem personalidade jurídica, capacidade jurídica e legitimidade, bem como é representada pelo advogado e tem interesse em agir;
31. O Tribunal de Segunda Instância é competente.
2 “CERTIFICADO NOTARIAL
N.º XXXX da série de Ju Zheng Zi (2010)
Certifica-se, por este meio, que A (A) (de sexo feminino, nascida a X de X de 19XX) e B(B) (de sexo masculino, nascido a X de X de 19XX) efectuaram o registo de casamento na Cidade de Zhongshan da Província de Guangdong em 19 de Junho de 2009.
Cartório Notarial “Jucheng” da
Cidade de Zhongshan da Província de Guangdong da
República Popular da China
Notário:
(Ass.: vide o original)
Aos 17 de Maio de 2010
(Carimbo aposto: Cartório Notarial “Jucheng” da Cidade de Zhongshan,
vide o original)
3
CERTIFICADO NOTARIAL
N.º XXXX da série de Ju Zheng Zi (2010)
Certifica-se, por este meio, que a cópia anterior e o original da certidão de divórcio da República Popular da China, n.º 020XXXXXX da série de Yue Zhong Lan Li Zi, titular por A (A), são idênticos, sendo autênticos no original o carimbo e o selo branco, com “uso exclusivo para o registo de casamento do Governo Popular da Vila de Xiaolan da Cidade de Zhongshan”.
Cartório Notarial “Jucheng” da
Cidade de Zhongshan da Província de Guangdong da
República Popular da China
Notário:
(Ass.: vide o original)
Aos 17 de Maio de 2010
(Carimbo: Cartório Notarial “Jucheng” da Cidade de Zhongshan,
vide o original)
4
CERTIFICADO NOTARIAL
N.º XXXX da série de Ju Zheng Zi (2010)
Certifica-se, por este meio, que é autêntico o carimbo, com “uso exclusivo para o registo de casamento do Governo Popular da Vila de Xiaolan da Cidade de Zhongshan”, na cópia do “acordo de divórcio” anterior.
Cartório Notarial “Jucheng” da
Cidade de Zhongshan da Província de Guangdong da
República Popular da China
Notário:
(Ass.: vide o original)
Aos 27 de Maio de 2010
(Carimbo: Cartório Notarial “Jucheng” da Cidade de Zhongshan,
vide o original)”
5 - Alberto dos Reis, Processos Especiais, 2º, 141; Proc. nº 104/2002 do TSI, de 7/Nov/2002
6 - Ac. STJ de 21/12/65, BMJ 152, 155
7 - AC. TSJ de Macau, de 29/1/97, proc. 536 e 19/11/97, proc. 632; TSI, de 11/7/02, proc. 76/2002, CJTSI, 2002, II, 1285; Acs. do TSI, proc. 121/09, de 4/6/09; proc.79/09, de 14/5/09
8 - Acs da RL, de 15/1/82, proc. 14857, BMJ 322, 369; RP, de 12/7/83, CJ 83, 4º, 221
9 - cfr. artigo 1101º do CPC pré-vigente
10 - Alberto dos Reis, ob. cit., 163 e Acs do STJ de 11/2/66, BMJ, 154-278 e de 24/10/69, BMJ, 190-275
11 - cfr. Ac. TSJ de 25/2/98, CJ, 1998, I, 118 e jurisprudência aí citada, Ac. TSI de 27/7/2000, CJ 2000, II, 82, 15/2/2000, CJ 2001, I, 170, de 24/5/2001, CJ 2001, I, 263 de 11/4/2002, proc. 134/2002 de 24/4/2002, entre outros
12 -João Baptista Machado, Lições de DIP, 1992, 254
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750/2010 1/22