Processo nº 130/2011 Data: 14.04.2011
(Autos de recurso penal)
Assuntos : Crime de “tráfico de estupefacientes”.
Atenuação especial.
Medida da pena
SUMÁRIO
1. A atenuação especial da pena só pode ter lugar em casos “extraordinários” ou “excepcionais”, ou seja, quando a conduta em causa “se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo.
2. Na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art. 65° a teoria da margem de liberdade, segundo a qual a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites.
O relator,
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José Maria Dias Azedo
Processo nº 130/2011
(Autos de recurso penal)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. A, (A), com os sinais dos autos, respondeu (como 1° arguido) em audiência colectiva no T.J.B., e, a final, foi condenado como autor de um crime de “tráfico de estupefacientes” p. e p. pelo art. 8°, n.°1 da Lei n.°17/2009, na pena de 4 anos e 3 meses de prisão; (cfr., fls. 230 a 231 e 292-v a 295 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
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Inconformado, o arguido recorreu.
Na sua motivação de recurso, oferece as conclusões seguintes:
“1. O recorrente A (A) foi condenado no referido processo na pena de 4 anos e 3 meses de prisão efectiva pela prática, em autoria material, de 1 crime de tráfico de drogas previsto no n.° 1 do art.° 8.° da Lei n.° 17/2009.
2. Considerando as circunstâncias do cometimento de crime do recorrente, tais como o grau de ilicitude, a intensidade do dolo, a prevenção de crime e a atitude após a prática de crime, entendemos que o mesmo não deve ser punido na pena de 4 anos e 3 meses de prisão.
3. O mais importante é que o recorrente contou à Polícia o local onde escondia a maior parte de drogas, para além disso, ele confessou sem reserva os factos que lhe foram acusados na audiência, comportamentos esses mostram o seu arrependimento, desse modo, a culpabilidade dele também deve ser significativamente diminuída; como as circunstâncias atenuantes previstas na alínea c) do n.° 1 e n.° 2 do art.° 66.° do Código Penal têm que ser tratadas por forma atenuada na determinação de pena.
4. Nesse sentido, deve-se aplicar ao recorrente primeiramente o art.° 67.°do Código Penal, a moldura de pena mais adequada deve ser de 7 meses e 6 dias a 10 anos de prisão.
5. Pelo exposto, o recorrente entende que o Colectivo a quo não atendeu plenamente à situação dele, na determinação de pena, incorreu na aplicação da pena excessiva e em violação dos termos previstos nos artigos 40° e 65° do Código Penal de Macau”; (cfr., fls. 247 a 255 e 298 a 303).
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Em resposta, assim conclui o Exmo. Magistrado do Ministério Público:
“1. A confissão do arguido quanto aos factos criminosos durante a fase de inquérito e na audiência assim como a sua atitude de arrependimento constituem apenas circunstâncias de atenuação geral mas não as circunstâncias de atenuação especial previstas na alínea c) do n.° 2 do art.° 66° do Código Penal.
2. O Ministério Público entende que as tais circunstâncias já foram consideradas na condenação.
3. Nos termos dos artigos 40.° e 65.° do Código Penal, toma-se em consideração fundamental a culpabilidade do agente e a necessidade de prevenção criminal para julgar se a punição concreta é adequada.
4. O recorrente não é delinquente primário e os crimes praticados são cada vez mais graves, a ilicitude e o grau de culpabilidade são extremamente altas.
5. A condenação revela a necessidade de prevenção criminal.
6.Os juízes já tomaram consideração a situação concreta do recorrente na medida de pena, acto esse corresponde com as disposições dos artigos 40° e 65° do Código Penal, é adequada e justa”; (cfr., fls. 257 a 259-v e 304 a 310).
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Remetidos os autos a este T.S.I., e em sede de vista, juntou o Exmo. Magistrado do Ministério Público o seguinte Parecer:
“Mostra-se o recorrente inconformado com a medida concreta da pena que lhe foi aplicada, almejando a redução da mesma, ou mesmo a sua atenuação especial, fundando-se essencialmente na circunstância de, para além da confissão dos factos, ter, espontaneamente, fornecido à polícia informe àcerca da existência e paradeiro da restante droga que detinha na sua residência, o que denotará também o seu arrependimento.
Pois bem:
Se, relativamente aos factos por que o recorrente foi surpreendido na intervenção policial, a confissão dos mesmos se apresenta, efectivamente, de grau diminuto, atento o "flagrante delito" já a informação relativa à droga apreendida na residência do mesmo deve assumir, em nosso critério, relevância destacada
É que, bem vistas as coisas, nos termos expressos no douto acórdão em análise, foi o próprio recorrente quem, após ter sido detido, livre e espontaneamente referiu a existência de mais drogas na sua residência, revelando o local preciso onde as mesmas se encontravam escondidas, vindo, alias, após deslocação ao local, a ser ele mesmo a retirá-las, entregando-as às autoridades, tudo revelando, pois, para além de alto grau de colaboração com estas na reposição da legalidade, sério arrependimento pela sua actuação.
E, convirá não esquecer que a droga, voluntária e espontaneamente "anunciada" e entregue pelo recorrente na sua residência corresponde, quer no que respeita à "ketamina", quer à "cocaína", ao maior volume de estupefacientes apreendidos, determinante do ilícito imputado.
Contestando a atenuação especial pretendida, sustenta a Exma Colega junto do tribunal "a quo", que " ... a polícia poderia encontrar as drogas mesmo que o recorrente não confessasse e não entregasse activamente as drogas ".
É claro que, atento até o seu passado criminal no domínio dos
estupefacientes, se apresenta como verosímil que o recorrente não desconhecesse ser prática policial usual em Macau, em intervenções similares, a busca nas residências dos intervenientes, podendo, quiçá, os estupefacientes ser encontrados mesmo sem a sua colaboração.
Trata-se, contudo, de meras conjecturas, meras especulações (a polícia poderia fazer a busca sem o consentimento do visado ? Mesmo efectuada esta, com consentimento judicial e sem o informe daquele, seria encontrada a droga ?), em que não topamos relevância decisiva : o que, no caso, importa é a matéria que, de facto, foi dado como comprovada.
E, a este nível, é indiscutível a relevância a atribuir à atitude do recorrente, não só colaborante com as autoridades, como essencial para a descoberta dos próprios factos delituosos, além de demonstrativa de sério arrependimento e vontade de reposição da legalidade.
Daí que nos não repugne a eventualidade da pretendida atenuação especial da pena, ou, assim se não entendendo, dado até o passado criminal do visado no domínio dos estupefacientes (a não permitir, porventura, um juízo de acentuada diminuição da sua culpa), uma maior aproximação da pena ao seu limite mínimo abstracto, já que, para além da mera confissão, não vemos devidamente valoradas no douto aresto em escrutínio, como atenuantes de realce, a atitude activamente colaborante do recorrente, essencial, como já se frisou, para a própria descoberta dos factos, bem como a contrição que decorrerá, com normalidade, de tal atitude.”
Este, o nosso entendimento; (cfr., fls 312 a 314).
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Passa-se a decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Vem dados como provados os factos seguintes:
“I- Por volta das 17:00 de 19 de Abril de 2010, os agentes da Polícia Judicial dirigiram-se ao local de trabalho do 2° arguido B - Restaurante Japonês … (…日本料理專門店), situado no r/c do … da Avenida … de Macau) para efeitos de investigação ao 2.° arguido, e encontraram, in loco, no bolso direito do fato do 2.° arguido B 2 sacos de objectos cristalizados brancos, 1 saco de pó branco embrulhado pela nota de MOP$10,00, 1 saco de objectos cristalizados castanhos embrulhado pela nota de MOP$10,00, 4 comprimidos de cor de laranja clara, 4 sacos plásticos transparentes, 3
palhinhas pretas e 1 papel de estanho em forma de barra.
II- Submetidos a exame laboratorial, um dos dois sacos de objectos cristalizados brancos supra referidos continha como composição, Ketamina, abrangida na Tabela II-C da lista anexa à Lei n.° 17/2009, com peso líquido de 1,822 gramas (De acordo com análise de métodos quantitativos, a Ketamina corresponde a 86,61%, no peso de 1 ,578 gramas); e o outro saco continha como composição, Metanfetamina, abrangida na Tabela II-B da lista anexada, com peso líquido de 0,898 gramas (De acordo com análise de métodos quantitativos, a Metanfetamina corresponde a 82,02%, no peso de 0,737 gramas); o pó branco dentro da nota continha como composição, Ketamina, abrangida na Tabela II-C da lista anexada, com peso líquido de 0,067 gramas (De acordo com análise de métodos quantitativos, a Ketamina corresponde a 81,85%, no peso de 0,055 gramas); os objectos cristalizados castanhos dentro da nota continham como composição, Metanfetamina, abrangida na Tabela II-B da lista anexada, com peso líquido de 0,020 gramas (De acordo com análise de métodos quantitativos, a Metanfetamina corresponde a 89,970/0, no peso de 0,0 18 gramas); os 4 comprimidos de cor de laranja clara continham como composição, Nimetazepam, abrangida na Tabela IV da lista anexada, com peso líquido de 0,752 gramas; os 4 sacos plásticos transparentes tinham Metanfetamina abrangida na Tabela II - B da lista anexada e Ketamina abrangida na Tabela II -C; as 3 palhinhas pretas tinham Anfetamina e Metanfetamina abrangidas na Tabela II - B da lista anexada assim como Ketamina abrangida na Tabela II-C; o papel de estanho em forma de barra tinha Metanfetamina abrangida na Tabela II- B da lista anexada assim como Ketamina abrangida na Tabela II-C.
III- Posteriormente, os agentes da PJ fizeram busca ao armário do 2.° arguido B no restaurante, foram encontrados dentro do armário 1 saco plástico transparente e 2 palhinhas pretas.
IV- Submetidos a exame laboratorial, o saco plástico transparente acima referido tinha Anfetamina e Metanfetamina abrangidas na Tabela II-B da lista anexa à Lei n.° 17/2009, assim como Ketamina abrangida na Tabela II-C; as 2 palhinhas pretas tinham Metanfetamina e N,N-dimetanfetamina abrangidas na Tabela II-B da lista anexada, e Ketamina abrangida na Tabela II-C.
V- Para além disso, os agentes da PJ dirigiram-se à residência do 2.° arguido B, situa no ...° andar … do Edf. … de Fai Chi Kei (Bloco …) para efeitos de busca, foram encontrados na gaveta da mesa de computador no quarto do 2.° arguido B 1 saco de pó branco embrulhada por papel branco, 3 sacos plásticos transparentes, 1 garrafa com líquido e com duas palhinhas fixadas na tampa, 1 palhinha branca.
VI- Submetido a exame laboratorial, o pó branco acima referido tinha Metanfetamina abrangida na Tabela II-B da lista anexa à Lei n.° 17/2009, assim como Ketamina abrangida na Tabela II-C, com peso líquido de 0,214 gramas (De acordo com análise de métodos quantitativos, a Metanfetamina corresponde a 1,800/0, no peso de 0,004 gramas, enquanto a Ketamina corresponde a 79,470/0, no peso de 0,170 gramas); os 3 sacos plásticos transparentes tinham Metanfetamina abrangida na Tabela II-B da lista anexada, assim como Ketamina abrangida na Tabela II-C; o líquido dentro da garrafa continha como composições: Codeína abrangida na Tabela A da lista anexada, Metanfetamina abrangida na Tabela II-B da lista anexada e Ketamina abrangida na Tabela II-C, com volume líquido de 86 ml, a palhinha branca tinha Metanfetamina abrangida na Tabela II _ B e Ketamina abrangida na Tabela II -C da lista anexada.
VII- As drogas encontradas pela Polícia na posse e na residência do 2° arguido B foram adquiridas por mesmo junto de indivíduo
desconhecido para o seu consumo pessoal.
VIII- O papel de estanho, palhinhas e garrafa acima mencionados foram utensílios para consumo de drogas detidos pelo 2° arguido B.
IX- O 2° arguido B, depois de ter sido preso, confessou que o 1° arguido A exercia actividades de tráfico de drogas, além disso, sob a disposição da Polícia, telefonou ao 1.° arguido A e alegou que gostaria de comprar 2 sacos de "K Chai (Ketamina)", combinaram então os dois a efectuar a transacção de drogas perto da Padaria … da Rua da Praia do ….
X- Em 20 de Abril, cerca das 00:20 de madrugada, os agentes da PJ prenderam o 1.° arguido A que foi vender drogas ao 2.° arguido B à frente da Padaria … da Rua da Praia do …, além disso, foram encontrados in loco no bolso posterior esquerdo das calças do 1.° arguido 2 sacos de objectos cristalizados brancos e 1 saco de objectos cristalizados leitosos.
XI- Submetidos a exame laboratorial, os 2 sacos de pó branco acima referidos continham como composição, Ketamina, abrangida na Tabela II-C da lista anexa à Lei n.° 17/2009, com peso líquido de 3,896 gramas (De acordo com análise de métodos quantitativos, a Ketamina corresponde a 87,51%, no peso de 3,409 gramas); aquele saco de objectos cristalizados leitosos continha como composição, Cocaína, abrangida na Tabela I-B da lista anexada, com peso líquido de 0,305 gramas (De acordo com análise de métodos quantitativos, a Cocaína corresponde a 90,17%, no peso de 0,275 gramas).
XII- Os dois sacos de Ketamina supramencionados foram as drogas que o 1 ° arguido A pretendeu vender ao 2.° arguido B, e o saco de Cocaína foi aquele que o 1° arguido A pretendeu vender outrem no "XX Karaoke" da Dynasty Plaza.
XIII- Posteriormente, o 1.° arguido A confessou aos agentes da PJ que havia também drogas escondidas em cima da grade da varanda na residência situada no ...° andar … do Edf. … da Calçada do Januário, portanto, os agentes levaram o 1° arguido A à dita residência para efeitos de busca, ali, o 1.° arguido A tirou da grade da varanda 1 saco plástico branco que continha 1 caixinha de óculos azul e entregou-o para os agentes. Naquela caixinha de óculos continha: 15 sacos de objectos cristalizados brancos, 4 sacos de objectos cristalizados leitosos, 1 nota de $20,00 com pó, 1 palhinha branca, 1 grande saco plástico transparente, 1 saco plástico de tamanho médio, contendo 79 sacos plásticos transparentes azuis.
XIV- Submetidos a exame laboratorial, os sacos de objectos cristalizados brancos acima referidos continham como composição, Ketamina, abrangida na Tabela II-C da lista anexa à Lei n." 17/2009, com peso líquido de 30,584 gramas (De acordo com análise de métodos quantitativos, a Ketamina corresponde a 82,74%, no peso de 25,305 gramas).
Os 4 sacos de objectos cristalizados leitosos acima referidos continham como composição, Cocaína, abrangida na Tabela 1- B da lista anexada, com peso líquido de 1,369 gramas (De acordo com análise de métodos quantitativos, a Cocaína corresponde a 86,23%, no peso de 1,180 gramas); o pó na referida nota continha como composição Ketamina abrangida na Tabela II -C da lista anexada; a palhinha branca e o grande saco plástico transparente tinham Ketamina abrangida na Tabela II-C.
XV- Naquele dia, os agentes da PJ apreenderam ainda 1 telemóvel (número de telefone: 62XXXXXX) e MOP$500,00 que foram encontrados na posse do 1.° arguido A.
XVI- As mencionadas drogas encontradas pela Polícia na residência do 1.° arguido A foram adquiridas de indivíduo desconhecido, para posteriormente aproveitaria oportunidade a vender a terceiros.
XVII- O saco transparente acima referido foi o utensílio usado pelo 1° arguido A a embrulhar drogas no momento de praticar as actividades de tráfico.
XVIII- A palhinha supramencionada foi o utensílio para consumo de drogas detido pelo 1.° arguido A.
XIX- O mencionado telemóvel era aparelho de comunicação que o 1.° arguido A usava no tráfico, o dinheiro foi recebido pelo mesmo através de tráfico de drogas.
XX- O 1.° arguido A e o 2.° arguido B praticaram livre, voluntária, consciente e dolosamente os actos supramencionados.
XXI- Os dois arguidos sabiam muito bem a natureza das drogas à margem referenciadas.
XXII- As condutas dos dois arguidos acima referidas são proibidas por lei.
XXIII- Os dois arguidos sabiam perfeitamente que as tais condutas eram proibidas e punidas por lei.
Para além disso, ficaram provados ainda os seguintes factos:
–– O 1.° arguido A e o 2.° arguido B admitiram os factos acusados. .
–– Antes de ser preso, o 2.° arguido B comprou do 1.° arguido A pelo menos um saco de Ketamina por MOP$500,00.
Segundo o registo criminal:
O 1.° arguido A não é delinquente primário, foi condenado na pena de 1 mês e 15 dias no processo n. ° CR2-08-0 11 0- PSM proferido pelo TJB em 5 de Maio de 2008 pela prática de 1 crime de consumo de drogas, com suspensão de 1 ano sob condição de recebimento de tratamento de abstenção do consumo de droga e o acompanhamento de assistente social; em 16 de Dezembro de 2008, o Tribunal decidiu prolongar o período de suspensão por 1 ano, o arguido precisa de receber o tratamento de abstenção do consumo de droga e o acompanhamento de assistente social.
Em 28 de Abril de 2009, o 1.° arguido A foi condenado em 1 ano e 9 meses de prisão e no pagamento de MOP$10.000,00 pela prática de 1 crime de tráfico de drogas de pequena quantidade no processo n.° CR2-08-0230-PCS proferido pelo TJB, em cúmulo jurídico com a condenação do processo n.° CR2-08-0 11 O-PSM, foi condenado na pena de 1 ano e 10 meses de prisão e no pagamento de MOP$1000.00 com a suspensão de 2 anos sob condição de recebimento de tratamento de abstenção do consumo de droga e com o acompanhamento do regime de prova. Em 21 de Junho de 2010, o Tribunal decidiu prolongar o período de suspensão do arguido por 1 ano.
O 2.° arguido B não é delinquente primário, foi condenado em 23 de Maio de 2003 na pena de 1 ano e 6 meses de prisão no processo n." CR3-03-0052-PCC (o antigo processo n.° PCC-002-03-3) proferido pelo TJB, pela prática de 1 crime de furto qualificado, com a suspensão de 2 anos e 6 meses, a referida condenação foi declarada extinta em 16 de Fevereiro de 2006.
O 1° arguido A alegou que exercia função de chefe de empregados de mesa num restaurante antes de ser preso, tinha habilitações literárias o ensino primário, sem encargo familiar.
O 2° arguido B disse que exercia função de empregado de mesa naquela altura, auferindo mensalmente MOP$4.500,00, tinha habilitações literárias o ensino de 5° ano da escola primária, sem encargo familiar”; (cfr., fls. 229-v a 228 e 278-v a 287).
Do direito
3. Vem o (1°) arguido A recorrer do Acórdão que o condenou como autor de um crime de “tráfico de estupefacientes” p. e p. pelo art. 8°, n.°1 da Lei n.°17/2009, na pena de 4 anos e 3 meses de prisão.
Busca a atenuação especial ou redução da pena que lhe foi imposta, alegando que violados foram os art.os 40°, 65° e 66° do C.P.M.
–– Vejamos se assim é, começando-se por ver se devia ser a pena em causa “especialmente atenuada”.
Nos termos do art. 66° do C.P.M.:
“1. O tribunal atenua especialmente a pena, para além dos casos expressamente previstos na lei, quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.
2. Para efeitos do disposto no número anterior são consideradas, entre outras, as circunstâncias seguintes:
a) Ter o agente actuado sob influência de ameaça grave ou sob ascendente de pessoa de quem dependa ou a quem deva obediência;
b) Ter sido a conduta do agente determinada por motivo honroso, por forte solicitação ou tentação da própria vítima ou por provocação injusta ou ofensa imerecida;
c) Ter havido actos demonstrativos de arrependimento sincero do agente, nomeadamente a reparação, até onde lhe era possível, dos danos causados;
d) Ter decorrido muito tempo sobre a prática do crime, mantendo o agente boa conduta;
e) Ter o agente sido especialmente afectado pelas consequências do facto;
f) Ter o agente menos de 18 anos ao tempo do facto.
3. Só pode ser tomada em conta uma única vez a circunstância que, por si mesma ou em conjunto com outras, der lugar simultaneamente a uma atenuação especial da pena expressamente prevista na lei e à atenuação prevista neste artigo”.
E, apreciando análoga a questão teve já este T.S.I. oportunidade de afirmar que:
“A atenuação especial só pode ter lugar em casos “extraordinários” ou “excepcionais”, ou seja, quando a conduta em causa “se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo”, (cfr., v.g., o recente Ac. deste T.S.I. de 11.11.2010, Proc. n° 670/2010)”.
No caso, ao crime pelo ora recorrente cometido cabe a pena de 3 a 15 anos de prisão; (cfr., art. 8°, n.°1 da Lei n.° 17/2009).
E, resulta dos autos que o arguido confessou os factos, tendo também colaborado com as autoridades policiais na identificação dos locais onde em sua casa estava o estupefaciente guardado.
E, perante isto, será que merece a peticionada “atenuação especial”.
Cremos que não.
A “confissão” tem, no caso, pouco valor atenuativo, pois que o ora recorrente foi surpreendido em flagrante delito.
Por sua vez, a colaboração que nos termos descritos na factualidade provada prestou às autoridades policiais, devendo ser tida em conta, (e, certamente, foi), não constitui “circunstância” que transforme a situação em causa de forma a que se deva considerar a mesma “especial” ou “extraordinária” para que se possa accionar o comando do art. 66° do C.P.M..
Basta de facto ver que a sua “colaboração” permitiu a apreensão de 30.584 gramas de Ketamina e 1,369 gramas de Cocaína, não se podendo considerar que viabilizou o afastamento de uma “grande quantidade de estupefacientes” do mercado, o que eventualmente, poderia levar a uma solução diversa.
Assim, e na parte em questão, improcede o recurso.
–– Vejamos agora se merece o recorrente uma redução da pena.
Pois bem, nos termos do art. 40° do C.P.M.:
“1. A aplicação de penas e medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
2. A pena não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa.
3. A medida de segurança só pode ser aplicada se for proporcionada à gravidade do facto e à perigosidade do agente”.
E como já entendeu este T.S.I..
“Na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art. 65° a teoria da margem de liberdade, segundo a qual a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites”; (cfr., v.g., o Acórdão de 03.02.2000, Processo n.°2/2000 e de 24.02.2011, Processo n.° 975/2010).
Atento o assim estatuído e entendido, e não se olvidando a moldura penal em causa (3 a 15 anos de prisão), poder-se-á dizer que excessiva é a pena de 4 anos e 3 meses de prisão?
Cremos que negativa deve ser a resposta, pois que na fixação de tal pena não deixou o Colectivo a quo de ponderar na confissão e colaboração do ora recorrente, sendo, no caso, atento o tipo de crime em questão, fortes as razões de prevenção (nomeadamente) geral, pois que com o crime em questão se pretende salvaguardar (essencialmente) a “saúde pública” e como é público e notório, tem-se infelizmente registado um aumento de tal tipo de criminalidade.
Para além disso, não se pode também olvidar o “passado criminal” do ora recorrente, o que não deixa igualmente de impedir que ao mesmo se fixe uma pena inferior à decretada pelo Colectivo a quo.
Decisão
4. Em face de tudo quanto se tentou deixar esclarecido, acordam negar provimento ao recurso.
Pagará o arguido recorrente a taxa de justiça que se fixa em 5 UCs.
Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$900.00.
! 11
Macau, aos 14 de Abril de 2011
(Relator)
José Maria Dias Azedo
(Segunda Juiz-Adjunta)
Tam Hio Wa
(Primeiro Juiz-Adjunto)
Chan Kuong Seng (subscrevo a decisão, porque acho que a pena aplicada pela 1.ª Instância ao crime de tráfico já é demasiado leve).
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