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Processo n.º 259/2011 Data do acórdão: 2011-7-14
(Autos de recurso penal)
  Assuntos:
  – acidente de viação
– insuficiência para a decisão da matéria de facto provada
– ampliação do pedido cível de indemnização
– reenvio parcial do processo
S U M Á R I O
1. Como do teor concreto da fundamentação fáctica do acórdão recorrido, não se retira que o Tribunal a quo tenha investigado todo o objecto probando do pedido cível enxertado na acção penal dos autos, emergente de acidente de viação, por a mesma fundamentação fáctica não ter respondido concretamente a toda a matéria fáctica alegada na petição de ampliação do pedido cível, é patente o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada a que alude o art.o 400.o, n.o 2, alínea a), do Código de Processo Penal de Macau (CPP).
2. Com o que há que reenviar o processo para novo julgamento em primeira instância, nos termos conjugados dos art.os 400.o, n.o 2, alínea a), 418.o, n.os 1 e 3, do CPP, relativamente à parte do objecto do processo afectada por esse vício.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 259/2011
(Autos de recurso penal)
  Recorrente: A (A)
  Recorridas: Companhia de Seguros ......(Macau), S.A.
B (B)




ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Por acórdão proferido a fls. 378 a 384 dos autos de processo comum colectivo n.o CR1-08-0011-PCC do 1.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, com pedido de indemnização cível enxertado pela lesada A (A) contra a arguida B (B) e a Companhia de Seguros ...... (Macau), S.A. (actualmente denominada Companhia de Seguros ...... (Macau), S.A.), ficou a arguida condenada, como autora material de um crime negligente consumado de ofensa grave à integridade física, na pena de um ano e nove meses de prisão (suspensa na sua execução por dois anos), e na multa de novecentas patacas, por cometimento de uma infracção concretamente punida, por ser mais favorável à própria arguida, pelo art.o 34.o, n.os 1 e 3, da Lei do Trânsito Rodoviário (Lei n.o 3/2007, de 7 de Maio), conjugado com o art.o 4.o, no 2, alínea f1), do respectivo Regulamento, com suspensão, determinada nos termos do art.o 73.o, n.o 1, alínea a), do anterior Código da Estrada então vigente à data dos factos, da validade da licença de condução por nove meses, e ficou a demandada seguradora condenada a pagar à demandante um total de MOP$634.308,80 (seiscentas e trinta e quatro mil, trezentas e oito patacas e oitenta avos), para indemnização dos danos patrimoniais e morais desta, com juros legais contados desde o trânsito em julgado da decisão até integral pagamento.
Inconformada com o acórdão na parte decisória civil, veio a demandante civil (que tinha também a qualidade de assistente) recorrer para este Tribunal de Segunda Instância, para, nos termos postos na sua motivação do recurso de fls. 389 a 400 dos presentes autos correspondentes, assacar a essa decisão:
– a título principal, o vício, previsto no art.o 400.o, n.o 2, alínea a), do Código de Processo Penal de Macau (CPP), de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (por alegada falta de pronúncia sobre a matéria então vertida na petição de ampliação do pedido cível datada de 16 de Setembro de 2008, a respeito da sua incapacidade permanente parcial e do agravamento do grau de abalo psicológico sofrido a nível de danos morais, depois de conhecida essa incapacidade permanente parcial);
– e subsidiariamente, o vício, aludido no art.o 400.o, n.o 2, alínea c), do CPP, de erro notório na apreciação da prova (no tangente à matéria fáctica alusiva à sua alegada incapacidade permanente parcial);
– e também a causa geradora de nulidade da decisão prevista no art.o 571.o, n.o 1, alínea d), do Código de Processo Civil de Macau (CPC) (por omissão de pronúncia sobre a dita matéria da petição de 16 de Setembro de 2008) (cfr. o teor da motivação do recurso, apresentada a fls. 389 a 400 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso, respondeu apenas a arguida e também civilmente demandada B (a fls. 404 a 411), no sentido de improcedência da argumentação da recorrente.
Subidos os autos, entendeu a Digna Procuradora-Adjunta, em sede de vista dada a fl. 423, que não havia lugar à emissão de parecer, por estar em causa um recurso circunscrito à parte civil.
Feito o exame preliminar (em sede do qual se decidiu conceder à demandante o pretendido apoio judiciário na modalidade de dispensa total de pagamento de custas – cfr. o teor de fls. 423v a 424), e corridos os vistos legais, realizou-se a audiência em julgamento.
Cumpre agora decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame dos autos, fluem os seguintes elementos, com pertinência à solução do recurso:
Em 12 de Junho de 2007, o Ministério Público deduziu acusação contra a arguida B, pelos factos descritos no libelo constante de fls. 98 a 99, factos esses iguais aos descritos no despacho de pronúncia emitido em 14 de Novembro de 2007 a fls. 225 a 226v, na fase final da instrução processada a pedido da arguida.
Entrementes, já em 27 de Junho de 2007, a lesada A no acidente de viação dos autos ocorrido em 25 de Setembro de 2005, apresentou o pedido cível (a fls. 117 a 131) contra a arguida e a Companhia de Seguros ...... (Macau), S.A. (presentemente chamada Companhia de Seguros ...... (Macau), S.A. – cfr. o conhecimento por este TSI obtido no julgamento de recursos congéneres anteriores), a enxertar na acção penal em questão, para imputar à arguida exclusiva culpa pela produção do acidente, requerer a realização de perícia médico-legal, e reclamar a indemnização:
– de percas salariais como guarda do Corpo de Polícia de Segurança Pública de Macau (CPSP), no valor de MOP$1.575,00;
– de despesas médicas e medicamentosas no Hospital Kiang Wu no período de 25 de Setembro a 12 de Outubro de 2005, no valor de MOP$28.316,00;
– de despesas com subsequentes consultas externas de ortotraumatologia no Hospital Kiang Wu, no valor de MOP$2.822,00;
– de despesas com a segunda intervenção cirúrgica de osteossíntese do seu fémur direito fracturado, realizada num hospital da cidade de Foshan do Interior ...... em que esteve internada no período de 21 de Outubro a 13 de Novembro de 2005, no valor de MOP$31.391,00;
– despesas previsíveis com a nova intervenção cirúrgica a ter lugar em finais de 2007 para efeitos de remoção de placas e parafusos metálicos insertos no seu corpo, no valor estimado de MOP$6.000,00;
– despesas com várias consultas a mestre de medicina tradicional chinesa em Macau para efeitos de tratamento e massagem muscular no período de 23 de Janeiro a 11 de Fevereiro de 2006, no valor total de MOP$3.420,00;
– despesa com uma consulta médica em Hong Kong, em 5 de Agosto de 2006, no valor de HKD$980,00, equivalente a MOP$1.010,00;
– despesas com consumo de alguns medicamentos chineses, no valor total de MOP$9.280,00;
– despesas de transporte por táxi para deslocações de ida e regresso diárias ao local de trabalho, no valor total de MOP$868,00;
– despesas de transporte público para deslocações ao hospital em Foshan, no valor total de RMB$120,00, correspondente a MOP$138,00;
– despesas de reparação do ciclomotor policial então conduzido por ela no acidente de viação, no valor de MOP$1.906,00;
– taxa de justiça paga para a sua constituição em assistente, no valor de MOP$550,00;
– despesas de contratação de advogado, no valor de MOP$25.000,00;
– em soma de todas as quantias acima referidas, são MOP$110.693,00 reclamadas para indemnização dos danos patromoniais;
– e danos morais sofridos (por causa de terríveis dores angustiantes sofridas nas lesões corporais e respectivas intervenções cirúrgicas, de terrível desgosto, ansiedade, mágoa e vergonha em face das cicatrizes e marcas permanentes e visíveis deixadas no seu corpo), a serem compensados, pelo menos, por MOP$300.000,00.
Em 28 de Junho de 2007, a demandante requereu a ampliação do seu pedido cível, através do petitório de fls. 179 a 180, no sentido de que:
– as lesões e as várias cicatrizes no seu corpo constituem um dano corporal, para o qual reclama a quantia de MOP$150.000,00, com o que o valor total da indemnização dos danos patrimoniais passa a ser de MOP$260.693,00;
– a quantia indemnizatória dos danos morais passa a ser de MOP$500.000,00;
– e sem prejuízo de vir pedir posteriormente mais elevada indemnização, em função do resultado da perícia médico-legal peticionada.
A pedido da demandante na parte final da petição cível inicial, com similar pretensão manifestada pela seguradora (a fl. 247), foi finalmente realizada, por determinação ínsita no despacho judicial de fl. 253, a perícia médico-legal de 9 de Maio de 2008 à demandante, tendo o Senhor Perito Médico-Legal concluído, no relatório de fl. 262, que esta, por causa do acidente de viação, passou a ter incapacidade permanente parcial em 15% (devido mormente à situação permamente de coxeadura de grau ligeiro, causada por deformação do joelho direito na sequência das intervenções cirúrgicas na perna direita).
Em 16 de Setembro de 2008, a demandante voltou a requerer, a fl. 274 a 277, a ampliação do seu pedido cível (sem contestação depois, quer por parte da arguida quer da seguradora), para reclamar a indemnização:
– de despesas com consultas externas supervenientes, no valor de MOP$3.582,80;
– de danos patrimoniais a serem sofridos no valor estimado, pelo menos, em MOP$200.000,00, por o grau de incapacidade permanente parcial já atestado pela perícia médico-legal ir comprometer negativamente o resultado de testes de aptidão da sua robustez física, e, como tal, ir afectar negativamente também a sua oportunidade de promoção na carreira policial, com impacto negativo, em última instância, no futuro cálculo do montante das pensões de aposentação;
– para além de pedir que os seus danos morais passassem a ser indemnizados por valor total de MOP$700.000,00 (já que depois de ciente do resultado daquela perícia médico-legal, passou a sofrer mais psicologicamente, por sobretudo recear que a situação da sua incapacidade permanente parcial pudesse afectar directamente a sua oportunidade de se casar e de criar descendentes).
Em 2 de Março de 2011, o Tribunal Colectivo a quo proferiu acórdão, dando por provados todos os factos pronunciados (segundo os quais, e na parte que ora interessa à decisão do recurso: a arguida B não cumpriu o sinal de cedência de prioridade, e provocou assim a ocorrência do acidente de viação dos autos no dia 25 de Setembro de 2005, o que causou directa e necessariamente à lesada fractura da parte média e inferior do fémur direito, que precisou de 120 dias para convalescença, e de mais 10 dias para efeitos de realização de operação destinada a retirar objectos nele insertos, para além de se considerar integralmente reproduzido no texto desse acórdão o teor dos relatórios médicos de fls. 37, 39, 51, 53 e 55 dos autos), e também, de modo expresso, os seguintes factos:
– “o acidente de viação em causa fez com que a assistente A tenha ficado ferida, com prejuízos económicos: despesas de tratamento médico no valor total de MOP$70.541,80, desconto de um sexto no vencimento em MOP$1.575,00, despesas de transporte em MOP$1.006,00, medicamentos chineses em MOP$9.280,00, e despesas de reparação do ciclomotor no valor total de MOP$1.906,00, por isso, na soma total de MOP$84.308,80” (cfr. o correspondente teor, redigido originalmente em chinês, do antepenúltimo parágrafo da página 6 do acórdão, a fl. 380v);
– os factos alegados nos art.os 52, 53, 54, 55, 57, 59 e 62 da petição cível de fls. 117 a 131 (segundo os quais os ferimentos, as lesões e a fractura do fémur e as duas intervenções cirúrgicas de osteossíntese deixaram no corpo da demandante evidentes marcas e cicatrizes permanentes e visíveis, cicatrizes que acompanharão a demandante para o resto da sua vida, o que lhe causa terrível desgosto, ansiedade, mágoa e vergonha, e tendo a demandante, à data da apresentação dessa petição cível, apenas 22 anos de idade, ela, naturalmente preocupada com a beleza e perfeição do seu corpo, se sente envergonhada em saber que o seu corpo está cicatrizado, o que, compreensivelmente, lhe causa terrível desgosto e descontentamento, e a terrível experiência traumatológica vivida lhe deixou marcas inesquecíveis e inapagáveis no seu espírito, para além das inúmeras noites de insónia que tem tido, pois a memória avivada do acidente sofrido ainda a abala emocionalmente).
Por outra banda, o Tribunal recorrido afirmou, no mesmo aresto, que deu como não provados “os restantes factos importantes constantes do pedido cível e das contestações que se encontrem desconformes com os factos provados, e também os seguintes: (....)” (cfr. o correspondente teor, redigido originalmente em chinês, do último parágrafo da já acima referida página 6 do acórdão) os seguintes factos:
– os factos alegados nos art.os 14.o, 15.o, 17.o e 19.o da contestação de fls. 240 a 247 (através dos quais a contestante seguradora alegou ter a demandante provocado o acidente de viação).
Na fundamentação probatória da sua convicção sobre os factos, afirmou o Tribunal recorrido que chegou a examinar o relatório médico-legal de fl. 262, sem ter tecido ao mesmo tempo qualquer razão de discordância do teor desse relatório (cfr. o teor da parte final do terceiro parágrafo da página 7 do seu acórdão, a fl. 381).
Na fundamentação jurídica do seu aresto, o Tribunal a quo considerou expressamente que a taxa de justiça pela constituição da lesada em assistente e os honorários de advogado não podem entrar no cálculo da indemnização, por falhar o nexo de causalidade entre essas despesas e o acidente de viação.
Por fim, decidiu o Tribunal recorrido fixar em MOP$550.000,00 a quantia indemnizatória dos danos morais da demandante, e como tal condenou apenas a seguradora a pagar a esta um total de MOP$634.308,80 (para indemnização desses danos morais e dos danos patrimoniais já provados no valor total de MOP$84.308,80), por concluída culpa exclusiva por parte da arguida na produção do acidente de viação.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cumpre notar que este Tribunal de Segunda Instância (TSI), como tribunal ad quem, só tem obrigação de decidir das questões material e concretamente postas pela parte recorrente na motivação do recurso e devidamente delimitadas nas respectivas conclusões, e já não decidir, da justeza, ou não, de todos os argumentos invocados pela parte recorrente para sustentar a procedência da sua pretensão (neste sentido, cfr., nomeadamente, os arestos deste TSI nos seguintes processos: de 4/3/2004 no processo n.° 44/2004, de 12/2/2004 no processo n.º 300/2003, de 20/11/2003 no processo n.º 225/2003, de 6/11/2003 no processo n.° 215/2003, de 30/10/2003 no processo n.° 226/2003, de 23/10/2003 no processo n.° 201/2003, de 25/9/2003 no processo n.º 186/2003, de 18/7/2002 no processo n.º 125/2002, de 20/6/2002 no processo n.º 242/2001, de 30/5/2002 no processo n.º 84/2002, de 17/5/2001 no processo n.º 63/2001, e de 7/12/2000 no processo n.º 130/2000).
Na sua motivação do recurso, a ofendida demandante começa por imputar à decisão civil tomada no acórdão da Primeira Instância, o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, por defender ela que o Tribunal a quo deixou de investigar a matéria de facto então alegada no requerimento, datado de 16 de Setembro de 2008 (a fls. 274 a 277), de ampliação do pedido cível na parte referente à incapacidade permanente parcial.
Pois bem, dos termos literais da fundamentação do acórdão da Primeira Instância:
– resulta que o Tribunal a quo, ao dizer que o acidente de viação em causa causou à assistente um total de MOP$70.541,80 de despesas de tratamento médico, acabou por materialmente dar por não provado, entre todas as quantias de despesas de tratamento médico reclamadas na petição cível inicial e nos subsequentes dois requerimentos de ampliação do pedido cível, só o montante de MOP$6.000,00 reclamado na petição cível (inicial) como referente às “despesas previsíveis” com a nova intervenção cirúrgica destinada à remoção de placas e parafusos metálicos insertos no corpo da demandante. Na verdade, o referido total de MOP$70.541,80 tem de resultar da soma matemática das seguintes parcelas indemnizatórias reclamadas a nível de despesas de tratamento médico: MOP$28.316,00, MOP$2.822,00, MOP$31.391,00, MOP$3.420,00, MOP$1.010,00 e MOP$3.582,80;
– mas já não resulta que o Tribunal recorrido deu, ou não deu, por provada a incapacidade permanente parcial da demandante correspondente à situação de coxeadura de grau ligeiro então alegada no segundo requerimento de ampliação do pedido cível, e ulteriormente já atestada no relatório de perícia médico-legal de fl. 262, com interesse à decisão do pedido, só formulado nesse segundo requerimento, de indemnização de danos patrimoniais alegadamente no valor estimado de MOP$200.000,00, por causa do impacto negativo que essa incapacidade permanente parcial alegadamente tem na promoção da carreira policial e no futuro cálculo do montante das pensões de aposentação da demandante. (Na verdade, sendo a alegada existência da incapacidade permanente parcial também logicamente compatível com as lesões descritas nos factos pronunciados n.os 6 e 7, já dados por provados expressamente no acórdão, não se pode considerar que essa alegada incapacidade já se encontre abrangida pela já acima referenciada fórmula de enumeração genérica dos factos não provados empregue pelo Tribunal recorrido).
Nesta perspectiva, assiste razão à recorrente ao invocar a existência de lacuna no apuramento do objecto probando do pedido cível na parte referente à sua alegada incapacidade permanente parcial, lacuna essa geradora efectivamente do vício previsto na alínea a) do n.o 2 do art.o 400.o do CPP, e naturalmente comprometadora também da justeza da decisão feita no acórdão impugnado no tocante à fixação da quantia indemnizatória dos danos morais.
Com o que há que reenviar o processo para novo julgamento em primeira instância, por um novo Tribunal Colectivo, nos termos conjugados dos art.os 400.o, n.o 2, alínea a), 418.o, n.os 1 e 3, do Código de Processo Penal de Macau (CPP), relativamente à matéria fáctica vertida nos pontos 6 a 25, 27 a 28, 32 a 34 e 36 do segundo requerimento de ampliação do pedido cível, apresentado em 16 de Setembro de 2008 a fls. 274 a 277, solução de recurso essa que já tutela também a preocupação da demandante ao invocar, na parte final da sua motivação do recurso, a causa de nulidade do acórdão por omissão de pronúncia.
Caberá, pois, ao Tribunal Judicial de Base investigar, em concreto, da veracidade da matéria fáctica vertida nesses pontos concretos (que foram então alegados pela demandante propriamente na sequência do conhecimento do resultado da perícia médico-legal de fl. 262), e depois decidir de novo, em função do resultado da respectiva investigação, conjugado com toda a matéria de facto já dada por provada no acórdão recorrido, sobre o pedido de indemnização de danos patrimoniais formulado no ponto 25 do mesmo requerimento e o pedido de indemnização de danos morais totais formulado finalmente no ponto 38 desse requerimento para o valor de MOP$700.000,00.
Com o acima analisado e concluído, já não é mister conhecer do remanescente assacado vício de erro notório na apreciação da prova, porque o novo julgamento a fazer já implicará a nova apreciação da prova no concernente à questão de incapacidade permanente parcial.
Como a decisão de reenvio (parcial) não afecta minimamente a decisão civil já tomada pelo Colectivo recorrido, condenatória da seguradora em pagar à demandante a quantia de MOP$84.308,80 para indemnização dos danos patrimoniais emergentes entretanto já provados, assim, na falta de recurso interposto pela seguradora, fica intacta essa quantia indemnizatória, pelo que esta decisão civil condenatória já transitou em julgado a partir do 11.o dia contado da data da leitura pública, em 2 de Março de 2011, do acórdão ora sob impugnação.
Sendo certo que os juros legais do referido montante de MOP$84.308,80 se vencem desde o mesmo 11.o dia contado de 2 de Março de 2011, porquanto o termo inicial para contagem de juros dessa quantia indemnizatória, fixado nesse aresto como sendo na data do trânsito em julgado da decisão, não foi impugnado pela demandante na motivação do presente recurso, pelo que devido ao princípio do dispositivo, e, por isso, não obstante a posição jurídica obrigatória firmada no recente douto Acórdão uniformizador de jurisprudência do Venerando Tribunal de Última Instância, de 2 de Março de 2011, do Processo n.o 69/2010, não se pode alterar agora oficiosamente esse termo inicial de contagem de juros legais da quantia de MOP$84.308,80.
IV – DECISÃO
Em sintonia com o exposto, acordam em conceder provimento ao recurso da demandante civil, reenviando, por conseguinte, para novo julgamento, o objecto do pedido cível de indemnização na parte concretamente delimitada nos pontos 6 a 25, 27 a 28, 32 a 34 e 36 do segundo requerimento, datado de 16 de Setembro de 2008, de ampliação do pedido cível, com o que fica mantida a condenação civil já decidida no acórdão recorrido, da demandada seguradora no pagamento à demandante de MOP$84.308,80 (oitenta e quatro mil, trezentas e oito patacas e oitenta avos), com juros legais desde o 11.o dia contado da leitura pública, em 2 de Março de 2011, do acórdão recorrido.
Custas do presente recurso pela arguida demandada, por esta ter pugnado pelo malogro do recurso, com mil e trezentas patacas de honorários a favor do seu Exm.o Defensor Oficioso, honorários esses a adiantar pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância.
Comunique o presente acórdão (com cópia do acórdão recorrido) ao Senhor Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública, com referência ao ofício de fl. 322
Macau, 14 de Julho de 2011.
______________________
Chan Kuong Seng
(Relator)
______________________
Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
______________________ (Segue declaração)
José Maria Dias Azedo
(Segundo Juiz-Adjunto)

Processo nº 259/2011
(Autos de recurso penal)



Declaração de voto


Não acompanho a decisão de reenvio dos autos para novo julgamento em virtude do detectado vício de insuficiência da matéria de facto provada para a decisão, pois que, se o Colectivo a quo não incluiu nos “factos provados” a alegada “incapacidade permanente parcial” da recorrente, e afirmou que “não se provaram os restantes factos do pedido civil e contestações desconformes com os factos provados”, razoável me parece de concluir que aquela não se provou.

Por sua vez, importa atentar que a mencionada “incapacidade” vem referida no relatório médico de “fls. 262”, e, em sede de fundamentação sobre a decisão da matéria de facto consta expressa menção a tal documento.

Macau, aos 14 de Julho de 2011

José Maria Dias Azedo



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