打印全文
Processo n.º 62/2011 Data do acórdão: 2011-3-10
(Autos de recurso penal)
  Assuntos:
– art.o 91.o do Código de Processo do Trabalho
– infracção directamente verificada de forma não imediata
– indícios suficientes da prática da infracção
– auto de notícia como acusação
– art.o 47.o do Decreto-Lei n.o 24/89/M
– arranjos quotidianos de trabalho
– horário de trabalho
– poder disciplinar
– trabalhador por conta alheia
– sub-empreiteiro
– art.o 1135.o, n.o 1, parte final, do Código Civil
– poder de hierarquia
– denúncia unilateral do contrato
– direito a férias anuais e feriados
– art.o 1079.o, n.o 1, do Código Civil
– conversão do auto de notícia em acusação
– art.o 93.o, n.o 1, do Código de Processo do Trabalho
– art.o 93.o, n.o 3, do Código de Processo do Trabalho
– art.o 94.o, n.o 1, do Código de Processo do Trabalho
– notificação do auto de notícia
– suspensão do prazo de prescrição do procedimento
– art.o 112.o, n.o 1, alínea b), do Código Penal
– designação da data para julgamento





S U M Á R I O
1. O Código de Processo do Trabalho de Macau (CPT) reza, no seu art.o 91.o, que:
– <<1. [...]
2. Quando respeite a infracções presenciadas ou directamente verificadas, ainda que de forma não imediata, por funcionário no exercício das suas funções, o auto faz fé em juízo, desde que devidamente confirmado.
3. Para os efeitos do número anterior, consideram-se directamente verificadas de forma não imediata as infracções cuja ocorrência tenha sido comprovada através da confissão do infractor ou da consulta de documentos por ele emitidos [...] e que sejam suficientemente indiciadores da prática dessas mesmas infracções.
4. O auto que faça fé em juízo vale como acusação [...].>>
2. No caso dos autos, foi levantado e confirmado no seio da Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL), entidade legalmente competente para fiscalização do cumprimento da legislação laboral, um auto de notícia contra uma sociedade comercial, por entender, após investigação então feita, estar verificada uma contravenção, cometida por esta, ao disposto no art.o 47.o do Decreto-Lei n.o 24/89/M, de 3 de Abril, por incumprimento do aviso prévio e não pagamento de indemnização rescisória ao trabalhador queixoso aquando da denúncia unilateral, em 7 de Novembro de 2008, do contrato de trabalho mantido com este sem interrupção desde 2 de Maio de 2008.
3. E do exame crítico e global sobretudo das declarações da sócia gerente da sociedade comercial autuada e do teor dos dois contratos escritos em questão nos autos, afigura-se a este Tribunal ad quem que o juízo acusatório pela infracção em causa emitido no dito auto de notícia pelo pessoal da DSAL resultou realmente de uma verificação feita directamente (ainda que não imediatamente) por essa Entidade Oficial depois de examinados mormente esses mesmos elementos probatórios.
4. De facto, a referida representante da socidade já declarou à DSAL que a sua sociedade contratou o queixoso desde 2 de Maio de 2008, e que mesmo após a assinatura do segundo contrato de 9 de Agosto de 2008, os arranjos dos trabalhos do queixoso (com horário de trabalho, trabalho extraordinário e distribuição de trabalhos a organizar pela própria sociedade) e a remuneração diária desse queixoso em MOP$420 com horas extraordinárias a calcular à parte eram os mesmos, declarações essas que a serem conjugadas com o teor sobretudo do segundo contrato, conforme o qual o queixoso tinha que obedecer aos arranjos de trabalho, ao horário de trabalho e ao poder disciplinar da dita sociedade no caso, por exemplo, de incumprimento do horário de trabalho e das ordens por esta dadas, dão, de facto, para indiciar suficientemente a prática pela sociedade, da infracção tida por verificada pela DSAL no auto de notícia então levantado e confirmado, mesmo que a sociedade tenha designado o queixoso nos dois contratos referidos como seu “sub-empreiteiro”.
5. Na verdade, se o queixoso fosse um verdadeiro sub-empreiteiro da sociedade, esta, sem prejuízo do seu poder de fiscalização da execução da obra objecto da sub-empreitada, não poderia organizar os trabalhos quotidianos do queixoso (cfr. o disposto na parte final do n.o 1 do art.o 1135.o do Código Civil de Macau).
6. Da mesma maneira, o poder disciplinar é sempre correlativo do poder de hierarquia, inexistente também na relação jurídica de sub-empreitada.
7. Aliás, não se pode esquecer de que no próprio clausulado do segundo dos contratos, também se empregou, com frequentes vezes, o termo “trabalhador”, e se previu expressamente os mecanismos de denúncia unilateral do contrato e de concessão do direito a férias anuais e feriados, tipicamente caracterizadores de uma relação de trabalho por conta alheia (cfr. o conceito de contrato de trabalho por conta alheia, plasmado no art.o 1079.o, n.o 1, do mesmo Código Civil, por um lado, e, por outro, o disposto nos art.os 19.o, 21.o e 47.o do então vigente Decreto-Lei n.o 24/89/M), e nunca de uma relação de sub-empreitada.
8. Do exposto decorre que o auto de notícia dos autos faz mesmo fé em juízo, e, por isso, vale como acusação propriamente dita.
9. Daí que é realmente irrelevante processualmente a decisão do Ministério Público de conversão desse auto de notícia dos autos em acusação, visto que o art.o 93.o, n.o 1, do CPT determina que <>.
10. Só é necessário ao Ministério Público emitir o juízo acusatório quando o auto levantado não poder fazer fé em juízo (cfr. o art.o 93.o, n.o 3, do CPT).
11. Valendo efectivamente como acusação, por fazer fé em juízo, o auto então levantado e confirmado no seio da DSAL, e tendo a dita sociedade sido pessoalmente notificada em 9 de Julho de 2010 desse auto acusatório, o prazo de dois anos de prescrição do procedimento contravencional como tal previsto no art.o 94.o, n.o 1, do CPT já se encontrou suspenso desde essa data de notificação do auto, por comando do art.o 112.o, n.o 1, alínea b), do Código Penal de Macau, aplicável por força do art.o 89.o do CPT, pelo que o procedimento contravencional dos autos subjacentes à presente lide recursória ainda não está prescrito, muito menos em 8 de Novembro de 2010.
12. Com o que o Mm.o Juiz a quo terá que emitir nova decisão, no sentido de designar data para julgamento sob a já promoção nesse sentido em 20 de Setembro de 2010 pelo Ministério Público em face do auto de notícia dos autos remetido efectivamente ao Tribunal Judicial de Base em 6 de Setembro de 2010.
13. Procede, pois, o recurso do Ministério Público, dado que o despacho judicial recorrido que decidiu em não receber aquele auto de notícia como acusação violou o disposto no art.o 91.o, n.os 2 e 4, do CPT.
O relator,

Chan Kuong Seng

Processo n.º 62/2011
(Autos de recurso penal)
Recorrente: Ministério Público
Recorrida: A, Limitada (A有限公司)





ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I - RELATÓRIO
Inconformada com o despacho proferido em 29 de Outubro de 2010 pelo Mm.o Juiz titular do processo de contravenção laboral n.o CR2-10-0037-LCT do 2.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, que, na sua essência, decidiu não receber o auto de notícia n.o 475/2010 em questão nesses autos como acusação contra a sociedade comercial denominada A, Limitada, veio a Digna Delegada do Procurador recorrer para este Tribunal de Segunda Instância, para rogar a invalidação dessa decisão (cfr. com mais detalhes, a motivação de recurso de fls. 147 a 150 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu a dita sociedade comercial no sentido de manutenção da decisão recorrida (cfr. com mais pormenores, a resposta de fls. 155 a 158 dos autos).
Subido o recurso, pugnou a Digna Procuradora-Adjunta, em sede de vista, pelo provimento do recurso (cfr. o parecer emitido a fls. 170 a 171v).
Feito o exame preliminar e corridos os vistos legais, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame crítico e global dos autos, fluem os seguintes elementos pertinentes à solução do recurso:
Em 29 de Junho de 2010, foi levantado e confirmado no seio da Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL) o auto de notícia n.o 475/2010 contra a sociedade comercial denominada A, Limitada (A有限公司), em sede do qual foi aplicada a esta a multa de MOP$2.500,00 (duas mil e quinhentas patacas), pelo cometimento de uma infracção ao disposto no art.o 47.o do Decreto-Lei n.o 24/89/M, de 3 de Abril, devido ao entendido verificado incumprimento do aviso prévio e à entendida verificada falta de pagamento de indemnização rescisória ao trabalhador B (XXX), aquando da denúncia unilateral, em 7 de Novembro de 2008, da relação de trabalho então mantida com este sem interrupção desde 2 de Maio de 2008 (cfr. o teor do auto de notícia de fls. 4 a 5v).
Em 9 de Julho de 2010, a dita sociedade comercial foi notificada pessoalmente desse auto de notícia (cfr. a certidão de notificação de fl. 6v), o qual veio a ser remetido efectivamente ao Tribunal Judicial de Base em 6 de Setembro de 2010 (cfr. o carimbo de entrada nesse Tribunal aposto no canto superior direito de fl. 2).
Por decisão de 20 de Setembro de 2010 do Digno Procurador-Adjunto junto do 2.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, foi esse auto de notícia convertido em acusação, com simultânea promoção da designação da data para julgamento (cfr. o despacho de fl. 134).
Subsequentemente, e sem que essa decisão de conversão do auto de notícia em acusação tenha sido objecto de notificação da referida sociedade comercial, o Mm.o Juiz do 2.o Juízo Criminal proferiu, em 29 de Outubro de 2010 e com posse da tradução portuguesa do teor do auto de notícia e do mapa de apuramento da quantia em dívida em anexo ao mesmo, despacho no sentido de:
– não receber o auto de notícia, por entender que este auto não fazia fé em juízo, e, como tal, não podia valer como acusação, já que a DSAL o levantou apenas com base na “mera declaração do queixoso, nada mais instruindo nem lhe solicitando a indicação de testemunhas, desenvolvendo considerações jurídicas a propósito da qualificação jurídica do contrato em causa”, enquanto a arguida se defendeu que “se trata de contrato de sub-empreitada, juntando documento e pagando em coerência as quantias devidas com excepção das que derivam da prévia e necessária qualificação da relação entre as partes como de contrato de trabalho”;
– para além de considerar, subsidiariamente, que o procedimento contravencional em questão iria estar prescrito em 8 de Novembro de 2010, e que caberia ao queixoso, “querendo, e com recurso ao apoio judiciário e consequente nomeação de advogado oficioso, deduzir acção cível que não por apenso nestes autos”.
Entrementes, constam dos autos dois contratos escritos, celebrados em nome de ambas as partes, o primeiro dos quais datou de 2 de Maio de 2008 (cfr. nomeadamente o teor de fl. 109), e o segundo de 9 de Agosto de 2008 (cfr. designadamente o teor de fls. 106 a 108).
De acordo com o primeiro contrato, a sociedade A acima identificada contratou B como sub-empreiteiro para trabalhos diversos das obras de areia.
E no segundo contrato, celebrado para o período de 9 de Agosto de 2008 a 8 de Novembro de 2008, reafirmou-se que B era sub-empreiteiro da mesma sociedade A nas obras de areia, e com seguinte clausulado, nomeadamente:
– o posto de B é trabalhador de areia;
– o prazo do contrato é de 9 de Agosto de 2008 a 8 de Novembro de 2008, com período experimental de três meses, indo caducar o contrato se até antes do seu termo não houver negociações entre as partes sobre a renovação do contrato;
– o horário de trabalho é de oito horas por dia;
– o salário é de MOP$300 por dia, sem qualquer compensação pela prestação de trabalho extraordinário;
– as férias anuais remuneradas são de seis dias por ano;
– confere-se o direito aos feriados obrigatórios, depois de completado o período experimental;
– dentro do período experimental, a entidade empregadora ou o trabalhador pode pôr termo ao contrato sem necessidade de aviso prévio;
– depois de completado o período experimental, se o trabalhador quiser pôr termo ao contrato, terá que avisar por escrito com sete dias de antecedência ou substituir o aviso prévio por sete dias de salário, e se a entidade empregadora quiser pôr termo ao contrato, terá que avisar por escrito com quinze dias de antecedência, ou pagar quinze dias de salário para substituir o aviso prévio;
– o trabalhador terá que pagar imposto profissional, e a entidade empregadora irá reter uma certa quantia dentro do salário a fim de fazer pagar esse imposto;
– a entidade empregadora tem o direito de aplicar sanções disciplinares ao trabalhador, quando: a) este recusar dolosamente a aceitar as ordens legítimas dadas; b) ...; c) chegar atrasado ou sair cedo demais; d) ...; e) ...; f) faltar ao trabalho sem justificação; ... l) pedir a outrem que faça o registo do ponto de trabalho ou fazer o registo do ponto por conta de outrem, e m) ...
Por outra banda, de acordo com as declarações prestadas em 18 de Fevereiro de 2009 à DSAL pela sr.a XXX (XXX), que é um dos dois únicos sócios gerentes da sociedade A com poderes de obrigar sozinha a própria sociedade (cfr. o teor da escritura de constituição da sociedade a que se referem as fls. 89 a 90):
– ela é representante da sociedade A e é responsável pelo tratamento da queixa de B;
– a sua sociedade celebrou um contrato escrito com B em 2 de Maio de 2008, para o contratar como seu sub-empreteiro para trabalhos de limpeza de lixo das obras de areia, com salário diário de MOP$420, e com horas extraordinárias, cumprindo à sua sociedade organizar os trabalhados quotidianos (por exemplo, o horário de trabalho, a distribuição de trabalhos e o trabalho extraordinário) de B, e se este não fosse ao trabalho, teria que avisar directamente o pessoal da sociedade responsável nessa matéria;
– em 9 de Agosto de 2008, foi assinado outro contrato com prazo, à luz do qual eram mesmos os arranjos de trabalhos como antes, tendo a sociedade pago, de facto, a remuneração de MOP$420, com horas extraordinárias calculadas à parte, não obstante o facto de constar nesse segundo contrato que o salário era de MOP$300, e sem qualquer compensação por trabalho extraordinário;
– quanto à questão de indemnização rescisória e por aviso prévio, ela iria acompanhar o assunto com a sua sociedade, enquanto os salários e as horas extraordinárias em dívida já foram pagos ao queixoso (cfr. o auto de declarações a fl. 85).
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
Após analisada a motivação do recurso do Ministério Público, são as seguintes questões a conhecer, eventualmente:
– 1.a ) Faz ou não o auto de notícia dos autos fé em juízo?
– 2.a) Impede a decidida conversão em acusação do auto de notícia o juízo judicial ora recorrido, o qual violou o disposto no art.o 91.o do vigente Código de Processo do Trabalho (CPT)?
– 3.a) O procedimento contravencional já se encontrou prescrito?
– 4.a) Na hipótese de se encontrar já prescrito o procedimento, será o Mm.o Juiz a quo ainda competente para julgar o pedido cível?
Conhecendo concretamente.
Da 1.a questão:
O CPT reza, no seu art.o 91.o, que:
– <<1. [...]
2. Quando respeite a infracções presenciadas ou directamente verificadas, ainda que de forma não imediata, por funcionário no exercício das suas funções, o auto faz fé em juízo, desde que devidamente confirmado.
3. Para os efeitos do número anterior, consideram-se directamente verificadas de forma não imediata as infracções cuja ocorrência tenha sido comprovada através da confissão do infractor ou da consulta de documentos por ele emitidos ou que respeitem à sua actividade e que sejam suficientemente indiciadores da prática dessas mesmas infracções.
4. O auto que faça fé em juízo vale como acusação, presumindo-se verdadeiros, até prova em contrário, os factos dele constantes que tenham sido presenciados ou directamente verificados, ainda que de forma não imediata, pelo funcionário que o levantou.>>
No caso dos autos, foi levantado e confirmado no seio da DSAL, entidade legalmente competente para fiscalização do cumprimento da legislação laboral, o auto de notícia n.o 475/2010 contra a sociedade A, por entender, após investigação então feita, estar verificada uma contravenção, cometida por esta, ao disposto no art.o 47.o do Decreto-Lei n.o 24/89/M, de 3 de Abril, por incumprimento do aviso prévio e não pagamento de indemnização rescisória ao trabalhador queixoso B aquando da denúncia unilateral, em 7 de Novembro de 2008, do contrato de trabalho mantido com este sem interrupção desde 2 de Maio de 2008.
E do exame crítico e global sobretudo das declarações da sócia gerente XXX da sociedade comercial A ora autuada e do teor dos dois contratos escritos em questão (já acima referidos), afigura-se a este Tribunal ad quem que o juízo acusatório pela infracção em causa emitido no dito auto de notícia pelo pessoal da DSAL com competência de fiscalização, resultou realmente de uma verificação feita directamente (ainda que não imediatamente) por essa Entidade Oficial depois de examinados mormente esses mesmos elementos probatórios.
De facto, a referida representante da socidade A já declarou à DSAL que a sua sociedade contratou o queixoso desde 2 de Maio de 2008, e que mesmo após a assinatura do segundo contrato de 9 de Agosto de 2008, os arranjos dos trabalhos do queixoso (com horário de trabalho, trabalho extraordinário e distribuição de trabalhos a organizar pela própria sociedade) e a remuneração diária desse queixoso em MOP$420 com horas extraordinárias a calcular à parte eram os mesmos.
Declarações essas que a serem conjugadas com o teor sobretudo do segundo contrato, conforme o qual o queixoso tinha que obedecer aos arranjos de trabalho, ao horário de trabalho e ao poder disciplinar da sociedade A no caso, por exemplo, de incumprimento do horário de trabalho e das ordens por esta dadas, dão, de facto, para indiciar suficientemente a prática pela sociedade, da infracção tida por verificada pela DSAL no auto de notícia então levantado e confirmado, mesmo que a sociedade tenha designado o queixoso nos dois contratos referidos como seu “sub-empreiteiro”.
Na verdade, se o queixoso fosse um verdadeiro sub-empreiteiro (no sentido próprio do termo) da sociedade A, esta, sem prejuízo do seu poder de fiscalização da execução da obra objecto da sub-empreitada, não poderia organizar os trabalhos quotidianos do queixoso (cfr. mormente o disposto na parte final do n.o 1 do art.o 1135.o do Código Civil de Macau).
Da mesma maneira, o poder disciplinar é sempre correlativo do poder de hierarquia, inexistente também na relação jurídica de sub-empreitada.
Dest’arte, não é pelo mero facto de a sociedade A ter defendido a existência de uma relação de sub-empreitada ou pelo mero facto de o queixoso ter sido denominado nos dois contratos dos autos como “sub-empreiteiro”, que se deve considerar afastados todos os acima indícios materialmente suficientes da prática pela mesma sociedade da infracção ao art.o 47.o do Decreto-Lei n.o 24/89/M, de 3 de Abril, então vigente à data dos factos, traduzida no não pagamento da indemnização rescisória e no incumprimento do aviso prévio aquando da denúncia unilateral da relação de trabalho então mantida sem interrupção com o queixoso (há mais de três meses).
Aliás, não se pode esquecer de que no próprio clausulado do segundo dos contratos, também se empregou, com frequentes vezes, o termo “trabalhador”, e se previu expressamente os mecanismos de denúncia unilateral do contrato e de concessão do direito a férias anuais e feriados, tipicamente caracterizadores de uma relação de trabalho por conta alheia (cfr. o conceito de contrato de trabalho por conta alheia, plasmado no art.o 1079.o, n.o 1, do mesmo Código Civil, por um lado, e, por outro, o disposto nos art.os 19.o, 21.o e 47.o do então vigente Decreto-Lei n.o 24/89/M), e nunca de uma relação de sub-empreitada.
Ademais, se fosse o queixoso um verdadeiro sub-empreteiro, porque é que teria a sociedade A que fazer pagar o imposto profissional dele?
Do acima explanado, decorre que o auto de notícia dos autos faz mesmo fé em juízo, e, por isso, vale como acusação propriamente dita.
Da 2.a questão:
Da solução acabada de ser dada acima se retira que é realmente irrelevante processualmente a decisão do Ministério Público de conversão do auto de notícia dos autos em acusação, visto que o art.o 93.o, n.o 1, do CPT determina que <>.
De facto, só é necessário ao Ministério Público emitir o juízo acusatório quando o auto levantado não poder fazer fé em juízo (cfr. o art.o 93.o, n.o 3, do CPT).
E por aí se vê também, como uma observação à parte, que não assiste razão ao Mm.o Juiz a quo, quando este afirmou no primeiro parágrafo do seu despacho ora recorrido que “Em processo de contravenção laboral só o auto de notícia que faça fé em juízo pode servir de acusação”.
Da 3.a questão:
Valendo efectivamente como acusação, por fazer fé em juízo, o auto então levantado e confirmado no seio da DSAL, e tendo a sociedade A sido pessoalmente notificada em 9 de Julho de 2010 desse auto acusatório, o prazo de dois anos de prescrição do procedimento contravencional como tal previsto no art.o 94.o, n.o 1, do CPT já se encontrou suspenso desde essa data de notificação do auto de notícia, por comando do art.o 112.o, n.o 1, alínea b), do Código Penal de Macau, aplicável por força do art.o 89.o do CPT, pelo que o procedimento contravencional dos autos subjacentes à presente lide recursória ainda não está prescrito, muito menos em 8 de Novembro de 2010.
Com o até agora analisado e concluído, é de ver que o Mm.o Juiz a quo terá que emitir nova decisão, no sentido de designar data para julgamento sob a já promoção nesse sentido em 20 de Setembro de 2010 pelo Ministério Público em face do auto de notícia dos autos remetido efectivamente ao Tribunal Judicial de Base em 6 de Setembro de 2010, com o que já não se torna mister, na presente sede recursória, conhecer da 4.a questão supra referida, respeitante à questão de competência do Tribunal recorrido no julgamento do pedido cível na eventual já prescrição do procedimento contravencional.
Há-de proceder, pois, o recurso do Ministério Público, dado que o despacho recorrido violou o disposto no art.o 91.o, n.os 2 e 4, do CPT.
IV - DECISÃO
Em sintonia com o expendido, acordam em julgar provido o recurso do Ministério Público, revogando, por conseguinte, o despacho judicial recorrido, com o que deverá o Mm.o Juiz a quo proferir novo despacho no sentido de designar data para julgamento.
Sem custas pelo presente processado recursório.
Fixam em mil e trezentas patacas os honorários devidos à Ilustre Defensora Oficiosa da sociedade comercial A, Limitada, ora a suportar pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância.
Macau, 10 de Março de 2011.
__________________________
Chan Kuong Seng
(Relator)
__________________________
Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
__________________________
José Maria Dias Azedo
(Segundo Juiz-Adjunto)
Processo n.° 62/2011 Pág. 19/19