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Processo nº 209/2007
(Autos de Recurso Contencioso)

Data: 31 de Março de 2011


ASSUNTO
- Interdição de entrada na RAEM
- Princípio da proporcionalidade


SUMÁRIO
- O poder de recusar a entrada na RAEM de não residentes e de fixar o período em que é interditada a sua entrada consiste na discricionaridade da Administração, que tem um campo de actuação bastante largo, só fica sujeito ao controlo judicial em casos de erro manifesto ou total desrazoabilidade (cfr. artº 21º, nº 1, al. d) do CPAC).
- O jogo de fortuna e azar é o sector fundamental da economia da RAEM, qualquer actividade ilícita que põe em causa o funcionamento e desenvolvimento normal do mesmo prejudica gravemente a economia local.
- Os crimes relacionados com a droga, especialmente o crime de tráfico, mesmo que seja em quantidade diminuta, são crimes altamente perigosos, que causam graves problemas sociais e originam a prática de novos crimes face à necessidade da procura do dinheiro para o consumo, ofendendo assim a segurança e ordem públicas da RAEM.
   - Tendo em conta o sacrifício suportado pelo recorrente em consequência da sua interdição de entrar na RAEM e os interesses públicos em jogo (manter o funcionamento e desenvolvimento normal do sector de jogos de fortuna e azar, assegurar a tranquilidade da sociedade e a segurança e a ordem públicas em geral), não nos afigura que o período de interdição de 5 anos seja desproporcional.

O Relator,

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Ho Wai Neng
















Processo nº 209/2007
(Autos de Recurso Contencioso)

Data: 31 de Março de 2011
Recorrente: A (A)
Recorrido: Secretário para a Segurança (保安司司長)

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
A (A), melhor identificado nos autos, vem interpor o presente Recurso Contencioso contra o despacho do Secretário para a Segurança, de 19/03/2007, que indeferiu o seu recurso hierárquico necessário, mantendo a decisão do Comandante Substituto do CPSP de interdição da sua entrada na RAEM por 5 anos, assacando-lhe vícios de erro nos pressupostos de facto e violação do princípio da proporcionalidade, pedindo assim que seja anulado o acto recorrido.
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Regularmente citada, a entidade recorrida contestou nos termos constantes a fls. 46 a 50 dos autos, cujo teor aqui se dá integralmente reproduzido, pugnando pelo não provimento do recurso.
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Só o recorrente é que apresentou alegações facultativas, mantendo, no essencial, a posição já tomada na petição inicial.
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O Ministério Público é de parecer da improcedência do recurso.
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Foram colhidos os vistos legais dos Mmºs Juizes-Adjuntos.

II – Factos
É assente a seguinte factualidade:
1. Por acórdão do Tribunal Judicial de Base, de 07/05/2004, foi o recorrente condenado pela prática de:
- um crime de colocação de apostas ilícitas, p.p.p. artº 4º, nº 1 da Lei nº 9/96/M, na pena de 40 dias de multa, à taxa diária de MOP$50,00, o que perfaz no total de MOP$20.000,00, com prisão alternativa de 26 dias;
- um crime de tráfico de estupefacientes em quantidade diminuta, p.p.p. artº 9º, nº 1 do DL nº 5/91/M, na pena de 1 ano e 6 meses;
- um crime de detenção de produtos estupefacientes para consumo próprio, p.p.p. artº 23º, al. a) do DL nº 5/91/M, na pena de 45 dias de prisão;
- um crime de falsificação de documento de valor especial, p.p.p. artºs 244º, nº 1, al. c) e 245º do CPM, na pena de 1 ano e 3 meses de prisão.
Em cúmulo, na pena única de 2 anos de prisão e multa de MOP$20.000,00, com prisão alternativa de 26 dias.
2. Por despacho do Comandante Substituto do CPSP, de 10/01/2007, foi determinada, ao abrigo do disposto da al. 2) do nº 2 do artº 4º da Lei nº 4/2003, bem como do artº 12º, nºs 2 a 4, da Lei nº 6/2004, a interdição da entrada do recorrente por 5 anos, com fundamento de que face aos seus antecedentes criminais, “a sua presença na RAEM, traz riscos para o ordem e segurança públicas da região, bens jurídicos onde se insere a protecção da comunidade residente”.
3. Inconformada com a decisão, interpôs, em 12/02/2007, o recurso hierárquico necessário para o Secretário para a Segurança.
4. Em 19/03/2007, o Secretário para a Segurança indeferiu o recurso hierárquico necessário interposto, mantendo a decisão da interdição da entrada.

III – Fundamentos
No entendimento do recorrente, não obstante ter sido condenado criminalmente, já cumpriu a pena em causa, encontrando-se reabilitado e integrado socialmente, daí que não poderão considerar a sua presença na RAEM constituir qualquer perigo ou ameaça para a paz, segurança interna e estabilidade públicas, errando assim a decisão de interdição nos pressupostos de facto.
Por outro lado, interdição por um período de 5 anos é excessiva, violando o princípio da proporcionalidade, previsto no nº 2 do artº 5º do CPA, nos termos do qual as decisões da Administração que colidam com direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos dos particulares só podem afectar essas posições em termos adequados e proporcionais aos objectivos a realizar.
Quid iuris?
Nos termos da al. 2) do nº 2 do artº 4º da Lei nº 4/2003, pode recusar-se a entrada dos não-residentes na RAEM em virtude de que terem sido condenados em pena privativa de liberdade, na RAEM ou no exterior.
Por sua vez, o artº 12º, nºs 3 a 4, da Lei nº 6/2004, dispõe que a interdição de entrada pelo motivo supra indicado deve fundar-se na existência de perigo efectivo para a segurança ou ordem públicas da RAEM e o período de interdição deve ser proporcional à gravidade, perigosidade ou censurabilidade dos actos que a determinam.
Trata-se aqui de um poder discricionário da Administração, que tem um campo de actuação bastante largo, só fica sujeito ao controlo judicial em casos de erro manifesto ou total desrazoabilidade (cfr. artº 21º, nº 1, al. d) do CPAC).
No caso em apreço, o recorrente foi condenado pela prática dos seguintes crimes:
- um crime de colocação de apostas ilícitas, p.p.p. artº 4º, nº 1 da Lei nº 9/96/M, na pena de 40 dias de multa, à taxa diária de MOP$50,00, o que perfaz no total de MOP$20.000,00, com prisão alternativa de 26 dias;
- um crime de tráfico de estupefacientes em quantidade diminuta, p.p.p. artº 9º, nº 1 do DL nº 5/91/M, na pena de 1 ano e 6 meses;
- um crime de detenção de produtos estupefacientes para consumo próprio, p.p.p. artº 23º, al. a) do DL nº 5/91/M, na pena de 45 dias de prisão;
- um crime de falsificação de documento de valor especial, p.p.p. artºs 244º, nº 1, al. c) e 245º do CPM, na pena de 1 ano e 3 meses de prisão.
Em cúmulo, na pena única de 2 anos de prisão e multa de de MOP$20.000,00, com prisão alternativa de 26 dias.
   Tendo em conta o tipo e natureza dos crimes praticados pelo recorrente, bem como o impacto provocado na sociedade, não resta qualquer margem de dúvida de que existe perigo efectivo para a segurança ou ordem públicas da RAEM.
   Pois, sendo o jogo de fortuna e azar o sector fundamental da economia da RAEM, qualquer actividade ilícita que põe em causa o funcionamento e desenvolvimento normal do mesmo prejudica gravemente a economia local.
   Por outro lado, os crimes relacionados com a droga, especialmente o crime de tráfico, mesmo que seja em quantidade diminuta, são crimes altamente perigosos, que causam graves problemas sociais e originam a prática de novos crimes face à necessidade da procura do dinheiro para o consumo, ofendendo assim a segurança e ordem públicas da RAEM.
   É certo que o recorrente já cumpriu a pena condenada, contudo, como bem observou o douto acórdão do TUI, proferido no Proc. nº 34/2007, que “as penas são as reacções públicas sobre os crimes em si” e “a interdição de entrada não constitui consequência directa da prática dos crimes pelos quais vem condenado, mas sim medida policial de prevenção tomada em consequência da análise de personalidade e situação pessoal de um não-residente da RAEM”.
   Pelo exposto, se conclui que o acto recorrido não errou nos pressupostos de facto e de direito.
   Quanto à violação do princípio da proporcionalidade, cumpre dizer que tendo em conta o sacrifício suportado pelo recorrente em consequência da sua interdição de entrar na RAEM e os interesses públicos em jogo (manter o funcionamento e desenvolvimento normal do sector de jogos de fortuna e azar, assegurar a tranquilidade da sociedade e a segurança e a ordem públicas em geral), não nos afigura que o período de interdição de 5 anos seja desproporcional.
Improcede, portanto, também este argumento.

IV – Decisão
Nos termos e fundamentos aciam expostos, acordam os Juízes que compõem o Colectivo deste Tribunal, em conferência, em negar provimento ao recurso interposto, confirmando o acto recorrido.

Custas pelo recorrente, com 6UC de taxa de justiça.
Notifique e registe.

RAEM, aos 31 de Março de 2011.

O Relator, Presente,

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Ho Wai Neng Vítor Manuel Carvalho Coelho

Os Juízes Adjuntos,

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Cândido de Pinho

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Lai Kin Hong

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209/2007 p.1/8