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Processo n. 352/2008
Recurso Jurisdicional
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 17 de Março de 2011
Descritores: Recurso sobre a matéria de facto
Princípio da utilidade do recurso


SUMÁRIO:
I- O recurso jurisdicional é um instrumento ao serviço dos interesses da parte considerada prejudicada pela sentença impugnada, que contra ela reage por a achar errada ou injusta. Nesse sentido, fora os casos em que o recurso é indevidamente utilizado por litigante de má fé com intuito meramente dilatório, ele é dominado pelo princípio da utilidade.

II- Não é necessária, porque inútil aos interesses do recorrente, a reapreciação da matéria de facto ao abrigo do art. 599º do CPC, se o tribunal superior considerar que, mesmo na hipótese de vir a proceder a essa tarefa, nunca o resultado obtido serviria para modificar a decisão do ponto de vista do direito aplicado na instância.














Processo n. 352/2008
(recurso jurisdicional civil/laboral)
Recorrente: A
Recorrido: B

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.
I- Relatório
B, com os demais sinais dos autos, moveu uma acção com processo ordinário contra A, com o qual disse ter celebrado seis contratos-promessa relativos a determinadas fracções autónomas, e a quem imputa a culpa no respectivo incumprimento.
Pedia que o Réu fosse declarado culpado pelo incumprimento e, em consequência, condenado a pagar-lhe a quantia de HK$900.000,00, correspondente ao dobro do sinal, acrescida de juros de mora à taxa legal.
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Foi na oportunidade proferida sentença, que julgou provada a acção e procedente o pedido.
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É dessa sentença que vem interposto o presente recurso jurisdicional, em cujas alegações A apresentou as seguintes conclusões:
1ª - Provado está que as partes acordaram que o remanescente do preço seria pago pelo Autor ao Réu aquando da emissão da licença de utilização (alínea D da Especificação);
2ª - Provado está que a licença de utilização nunca foi emitida, dado o imóvel se manter em situação de ilegalidade (resposta aos quesitos 5º, 6º e 7º da base instrutória);
3ª - Provado está, igualmente, não ter sido acordado, entre A. e R., qualquer prazo para a realização das escrituras públicas relativas às fracções autónomas que foram objecto de prometida compra e venda (alínea D) da especificação);
4ª - Não está provado que o autor tenha contactado o réu para celebrar as escrituras públicas de compra e venda (resposta dada ao quesito 1º da base instrutória);
5ª - Não está provado que, na sequência desse contacto feito pelo autor, o réu tenha Informado àquele que já não pretendia celebrar as referidas escrituras (resposta dada ao quesito 2º da base instrutória);
6ª - Deverá considerar-se como provada a matéria constante do quesito 10º da base instrutória e, consequentemente, que no dia imediato ao da assinatura dos contratos-promessa (31/3/1998), o autor assinou uma declaração em que se assume fiador do empreiteiro C e na qual declara ter o D entregue àquele C um cheque no valor de MOP250.000,00, valor que se destinava às obras a realizar no imóvel (cfr. documento junto à contestação do R. sob o nº 3, depoimento de parte do A. e depoimento da testemunha E, ambos produzidos em audiência de discussão e julgamento);
7ª - Deverá considerar-se como provada a matéria constante ao quesito 11º da base instrutória e, consequentemente, que nessa declaração o autor se responsabilizava pelo eventual incumprimento do contrato por parte daquele C, assumindo o compromisso de devolver ao D as Mop$250.000,00 que este entregara ao empreiteiro (cfr. documento junto à contestação do R. sob o nº 3, depoimento de parte do A. e depoimento da testemunha E, ambos produzidos em audiência de discussão e julgamento);
8ª - Deverá considerar-se como provada a matéria constante do quesito 16º da base instrutória e, consequentemente, que o réu, ora recorrente, exerceu pressão junto do seu irmão, D, para este regularizar a construção clandestina do imóvel, face ao depoimento prestado na audiência de discussão e julgamento pela testemunha E e pelo pagamento feito por este D ao empreiteiro (cfr. documentos sob os nºs 3 e 4, juntos à contestação do réu);
9ª - Deverá considerar-se como provada a matéria constante do quesito 21° da base instrutória e, consequentemente, que o autor reconheceu, através de declaração escrita, não ser da responsabilidade do réu o atraso na construção e na obtenção da licença de habitação (cfr. documento com o nº 8 junto à contestação, depoimento de parte do A. e depoimento da testemunha E, ambos produzidos em audiência de discussão e julgamento);
10ª - Deverá considerar-se, ainda, como provada a matéria constante dos quesitos 22º e 23 da base instrutória e, consequentemente, que o réu, através de carta enviada ao autor em 8 de Agosto de 1998, aceitou a declaração de responsabilidade por este assumida, tendo solicitado ao autor o pagamento do remanescente do preço, sob pena de se considerarem resolvidos os contratos-promessa anteriormente assinados, ao que o autor nada respondeu (cfr. documento junto à contestação com o nº 9, depoimento de parte do A. e depoimento da testemunha E, ambos produzidos em audiência de discussão e julgamento); posto que, atento tudo o que antecede,
11ª - Não poderá o réu, ora recorrente, ter incumprido, definitiva e dolosamente, os contratos-promessa que Vincularam Autor e Réu, como se sustenta no douto aresto sub judice.
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Colhidos os vistos, cumpre decidir.
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II- Os Factos
A sentença deu por assente a seguinte factualidade:
- Em 30 de Março de 1998, o Autor celebrou com o Réu seis contratos-promessa, nos termos dos quais aquele prometeu comprar, e este prometeu vender, livre de quaisquer ónus ou encargos de devolutas, as fracções autónomas designadas por cave, r/c, 1º andar, 2º andar, 3º andar e 4º andar, para comércio e habitação, do prédio com os nº 7 da Pátio da XXX, Edf. “XX” descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº XXXX a fls. 191 do livro B22, cujo teor consta dos documentos de fls. 6 a 17 e aqui se dá por integralmente reproduzido (alínea A da Especificação).
- Nesses acordos o Autor e o Réu, as partes acordaram expressamente que o preço dos imóveis seria de HKD$1,500,000.00, equivalente a MOP$1,545,000.00 (alínea B da Especificação).
- O Autor a 30 de Março de 1998 pagou ao Réu, a título de sinal, a quantia de HKD$450,000.00 (alínea C da Especificação).
- As partes acordaram que o remanescente do preço, no montante de HKD$1,050,000.00, seria pago pelo Autor ao Réu aquando da emissão da licença de utilização, não tendo sido acordado prazo para a realização das escrituras públicas relativas às mencionadas fracção (alínea D da Especificação).
- Em 16/12/1999, o Réu vendeu o prédio referido em A) a F pelo preço de MOP$400,000.00 (quatrocentas mil patacas) (alínea E da Especificação).
- Em 26 de Junho de 1996, o Réu celebrou um contrato com o seu irmão D entregando-lhe a construção dum imóvel, para habitação e comércio, constituído por cave, rés-do-chão e 4 andares (Resposta ao quesito 3º).
- O qual deveria estar concluído no prazo de 180 (cento e oitenta) dias (Resposta ao quesito 4º).
- Na sequência de vistoria realizada pelas Obras Públicas, verificou-se que a construção não foi efectuada de acordo com o projecto inicialmente aprovado pelas O.P., tendo havido alteração (Resposta ao quesito 5º e 6º).
- Actualmente o imóvel mantém-se nessa situação (Resposta ao quesito 7º).
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III- O Direito
1- Vindo o presente recurso limitado à matéria de facto, incumbia ao recorrente indicar especificadamente, além dos pontos concretos da matéria de facto que considera terem sido incorrectamente julgados - o que fez - quais os meios probatórios concretos que, sobre aquela matéria, impunham decisão diferente da recorrida (art. 599º, n.1, al. b), do CPC) – o que não fez.
Acresce que, ainda de acordo com o número 2 do artigo citado, tendo a prova sido gravada, querendo dela servir-se, impor-se-ia ao recorrente indicar as passagens da gravação em que se funda para defender decisão diferente da tomada. Não as indicou. E só isso daria motivo para rejeição (cit. art.).
Por outro lado, quando o recorrente, baseado nos documentos juntos aos autos, pretendeu no presente recurso extrair efeitos contrários aos extraídos pelo julgador da 1ª instância, não podemos deixar de dizer que o fez segundo a sua própria leitura pessoal. Ora, sobre este ponto, a interpretação dos documentos não pode ser feita isoladamente nem desligada da restante prova, incluindo a obtida em audiência. E essa tarefa foi feita pelo julgador de forma holística, isto é, integrando-a no quadro mais vasto do conjunto da prova. E não havendo claro e manifesto erro na apreciação de tais documentos e de toda a prova, não se nos afigura que aqui devamos fazer a sua reapreciação de novo. Mas, se outras razões não houvesse, sempre valeriam as que se seguem.

2. Como se sabe, o recurso jurisdicional é um instrumento ao serviço dos interesses da parte considerada prejudicada pela sentença impugnada, que contra ela reage por a achar errada ou injusta. Nesse sentido, fora os casos em que o recurso é indevidamente utilizado por litigante de má fé com um intuito meramente dilatório, ele é dominado pelo princípio da utilidade.

E não é necessária, porque inútil aos interesses do recorrente, a reapreciação da matéria de facto ao abrigo do art. 599º do CPC, se o tribunal superior considerar, que mesmo na hipótese de proceder a essa tarefa, nunca o resultado serviria para modificar a decisão do ponto de vista do direito aplicado na instância.

Vejamos, pois, se estamos perante um caso de necessidade e utilidade no presente recurso.

Conforme se pode ler nas alegações de recurso e respectivas conclusões, o ora recorrente, então réu, defende que a matéria constante dos artigos 10º, 11º, 16º, 21º, 22º, 23º, da base instrutória foi incorrectamente apreciada. E isso o diz por considerar que os documentos e o depoimento das testemunhas inquiridas deveriam levar a 1ª instância a diferente julgamento fáctico. É por tal motivo que o presente recurso jurisdicional, é limitado à matéria de facto, cuja reapreciação vem solicitada.
Apreciando.
O que temos nós por assente nos autos e que não suscite qualquer dúvida às partes? Temos que B e A, autor e réu na acção, celebraram em 30/03/1998 um contrato-promessa relativo à compra e venda de determinadas fracções de um imóvel. O prédio, apesar de pronto, não tinha ainda licença de utilização porque a sua construção não tinha sido efectuada de acordo com o projecto aprovado pelas Obras Públicas. Apesar disso, o recorrido prometeu comprá-lo, e o recorrente prometeu vendê-lo, sem que tivesse sido acordado qualquer prazo para a realização das escrituras definitivas. Provado está, finalmente, que o ora recorrente vendeu o prédio em causa a F em 16/12/1999.
Este, o núcleo factual indiscutível, e em torno do qual o então réu (aqui recorrente) foi ao processo construir uma tese justificativa da sua acção posterior ao contrato-promessa, pretensamente obstativa a qualquer responsabilidade da sua parte no incumprimento daquele. E qual foi essa tese?
Em nossa opinião, trata-se de uma tese em dois actos, se assim podemos dizer, com todo o respeito.
No primeiro deles, envolve o seu irmão, D, a quem tinha sido entregue a construção do imóvel dois anos antes (concretamente, em 26 de Junho de 1996). De acordo com o recorrente, esse irmão havia sido o culpado na desconformidade entre o projectado e o edificado e, portanto, o causador da recusa na emissão da licença de utilização pelas Obras Públicas após vistoria realizada. Durante o impasse criado por essa recusa, o irmão do recorrente terá apontado o nome de um subempreiteiro de nome C que, alegadamente teria “boas ligações” nas Obras Públicas e que, por isso, haveria de resolver o problema, fazendo ele as obras necessárias no prédio. No final desse acto aparece o recorrido B interessado na aquisição do imóvel e é então celebrado o referido contrato-promessa.
Apreciando, desde já, esta parte dos factos invocados, somos levados a dizer que a maior parte deles é completamente irrelevante para a sorte da acção. Na verdade, o que se passou entre o réu (ora recorrente) e o seu irmão (aparentemente empreiteiro, mas nem isso está bem esclarecido) em nada interfere com a validade e a eficácia do negócio. Pode ter tido influência no desejo de se encontrar uma solução para o problema e, portanto, na vontade de contratar por parte do recorrente, se os problemas resultantes da edificação, contrariando a licença de construção, e a consequente demora na obtenção da licença de utilização lhe tiverem provocado alguma inquietação e aborrecimento, o que sem esforço até admitimos. Mas convém reconhecer que as relações estabelecidas entre empreiteiro e dono da obra são completamente estranhas ao aqui recorrido, que apenas toma contacto com a situação quando se lhe apresenta a possibilidade de entrar no negócio de compra do imóvel no estado em que este se encontrava.
Ora, acontece que parte destes factos até mereceu resposta negativa. Com efeito, se houve matéria que foi levada à base instrutória e que acabou por ser dada como provada (nomeadamente os factos 3º, 4º e parte dos 5º e 6º) também é certo que a matéria dos arts. 8º e 9º da base instrutória1 obteve resposta negativa. Quer dizer, não se provou qual a influência que o empreiteiro C pudesse ter na resolução do problema, nem se provou que a razão para a celebração do contrato-promessa residisse na falta de aprovação da obra e na falta de emissão da licença de utilização do prédio. E portanto, qualquer que tivesse sido a razão para a celebração da promessa de venda (na realidade, por não ter peso jurídico, era irrelevante conhecer a causa) a verdade adquirida é que o contrato foi celebrado e tanto basta.
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Celebrado o contrato-promessa, desenha o então réu (aqui recorrente) o segundo acto da factualidade.
E logo na sua abertura, o recorrente começa por dar grande valor ao facto constante dos artigos 10º e 11º da base instrutória. Tratava-se de saber se o autor tinha assinado uma declaração em que se assumia fiador do tal C (empreiteiro) e em que reconhecia que o irmão do recorrente tinha entregado àquele a quantia de Mop$ 250.000,00 destinada às obras que deveria realizar. Declaração que constaria do documento número 3 junto com a contestação (fls. 59 dos autos, traduzida a fls.26 do apenso).
Ora bem. Quanto a esta matéria, duas coisas se nos afiguram estranhas à partida. Uma é a circunstância de esta declaração ter sido alegadamente prestada um dia após a assinatura do contrato-promessa. Outra reside no facto de o declarante - promitente-comprador – ter alegadamente assumido uma garantia pelo incumprimento da obra por parte do empreiteiro. Dizemos “alegadamente”, porque a matéria não passou da mera invocação, uma vez que não foi dada como provada, apesar de haver um documento (fls. 59 cit.) que podia apontar em sentido contrário. Mas, a verdade é que o alegado autor do documento foi ouvido em depoimento de parte e o tribunal não terá dado relevância nem ao teor do documento, nem ao depoimento do seu autor, pois a deu por matéria por provada.
Valerá a pena ouvir a testemunha E, tal como o defende o recorrente? Não, porque a testemunha em apreço não prestou depoimento sobre essa matéria, mas somente aos quesitos 3º e 23º da base instrutória (ver acta de fls. 112 verso). E quanto ao depoimento de parte do autor? Valerá a pena escutá-lo? Também não, por uma simples razão. É que, mesmo que o autor tivesse confirmado em audiência o conteúdo do quesitos 10º e 11º, nem por isso a solução se alterava. Na verdade, da prova eventual daquela factualidade não resultaria mais do que aquilo que estritamente naqueles artigos está perguntado. Nunca se poderia ver numa eventual resposta afirmativa nenhum acordo especial do qual dependesse a manutenção ou a eficácia, muito menos a validade, do contrato-promessa.
Coloquemos a questão noutros termos para mais facilmente nos fazermos entender: Imaginemos que era verdade que o autor assinou aquela declaração e que assumiu ser fiador do subempreiteiro. Em que é que isso alteraria a posição jurídica substantiva tanto dele, como do promitente vendedor? Sinceramente, em nada. Uma tal matéria até pode ter subjacente (pode, mas não é seguro que assim seja) que o contrato-promessa foi celebrado no pressuposto não escrito de que o resto das obras iria ser concluído e que, portanto, o contrato definitivo seria celebrado com tudo regularizado (obras realizadas e licença obtida), nem que para tanto ele se vinculasse a garanti-las através da fiança. Nesse caso, uma tal declaração tinha em vista a defesa dos interesses do declarante promitente-comprador e não a defesa dos interesses do promitente vendedor, seguramente.
Mas até admitimos que o seu envolvimento em tal declaração também fosse pensada em benefício do promitente-vendedor. Porquê? Porque o promitente-comprador teria que efectuar o pagamento do remanescente do preço quando a licença de utilização estivesse concedida (alínea D) da especificação). Isto quer dizer que quanto mais depressa as obras de regularização estivessem prontas, mais depressa seria emitida a licença de utilização e, dessa maneira, mais rapidamente o promitente vendedor receberia o resto do preço acordado na transacção.
Como se vê, a intervenção do recorrido explicar-se-ia por ambos os prismas. Mas uma coisa é certa: da prova daqueles factos nunca resultaria que a eficácia do contrato-promessa estivesse dependente da conclusão das obras ou que ele ficasse sem efeito no caso de estas não se realizarem. Na verdade, para se chegar a tal conclusão seria necessário que a respectiva matéria tivesse sido expressamente alegada de forma clara, que essa matéria representasse um acordo concreto que tornasse a promessa ficar condicionada a uma atitude do promitente-comprador, de maneira a conferir-lhe eficácia sujeita a condição suspensiva2. Só que nada disso foi alegado, nem demonstrado. E portanto, sempre ficaria em singelo aquilo que do documento n. 3, de fls.59, tão-somente podia resultar. E como o seu conteúdo nunca acudiria à tese do recorrente, a reapreciação da prova, a este respeito, mostrar-se-ia totalmente inoperativa e inútil.
Também a matéria do art. 16º da base instrutória se mostra absolutamente indiferente à força vinculativa que resulta do contrato-promessa. Saber se é verdade – e o tribunal não concluiu que sim – se o agora recorrente insistiu junto do seu irmão no sentido de que ele regularizasse a situação que alegadamente ele criara é questão anódina ao problema central do processo. Mesmo que se provasse tal facto nem por isso ficava salvaguardada a actuação do recorrente, na medida em que ele traduz uma relação entre irmãos contratantes, e à qual o recorrido é estranho, pelo que acima já se disse.
O mesmo se diga dos artigos 21º, 22º e 23º da base instrutória. Em que é que eles, mesmo que provados fossem, alteram ou prejudicam o negócio efectuado entre recorrente e recorrido? Em nada. Mesmo que a matéria de facto - agora pretendida dar como provada pelo recorrente – viesse realmente a ter-se por assente, isso apenas permitiria pensar que o promitente-comprador tentou participar na conclusão das obras - necessárias à aprovação pela entidade administrativa competente e à emissão posterior da licença de utilização - em seu benefício, por um lado, e que dessa actuação também o promitente vendedor sairia favorecido, porque receberia mais cedo o remanescente do preço em virtude da mais rápida edificação.
Por isso é que a circunstância de haver, ou não, uma carta em que o recorrido declara não ter o recorrente responsabilidade pela não conclusão das obras, nem pela não emissão da licença, não afecta o negócio celebrado entre ambos.
Assim sendo, a prova obtida permite dar por celebrado um contrato-promessa que teria que ser cumprido nos termos expressamente nele estipulados. A circunstância de o prédio não ter sofrido qualquer desenvolvimento, isto é, não ter sido objecto de qualquer obra de regularização que permitisse a emissão da licença de utilização, não podia ser utilizada contra o promitente-comprador. Logo, a venda definitiva feita pelo promitente-vendedor a terceiro representa um incumprimento, sancionável pelo modo como foi dito na sentença recorrida.
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Por todo o exposto, somos a concluir que a reapreciação da matéria de facto se mostra de todo inútil e em nada iria alterar a sentença objecto do recurso do ponto de vista da solução jurídica encontrada. A pretensão do recorrente é, assim, improcedente.
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IV- Decidindo
Nos sobreditos termos, acordam em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.
Custas pelo recorrente.
TSI, 17 de Março de 2011.
José Cândido de Pinho
Lai Kin Hong
Choi Mou Pan






1 No 8º perguntava-se: “Por apresentação do seu irmão, o réu conheceu o empreiteiro C o qual lhe disse que iria resolver o problema da aprovação da obra”. E no 9º indagava-se se “Desejoso de resolver o problema de falta de aprovação da obra e da falta de emissão da licença, o réu celebrou os contratos a que se alude em A”.
2 O contrato-promessa só passaria a ter efeitos se e quando acontecesse determinado facto a cargo do promitente-comprador, facto que seria neste caso a regularização da situação através das obras e da emissão da licença de utilização.
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