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Processo nº 116/2011 Data: 03.03.2011
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Liberdade condicional.


SUMÁRIO

1. A liberdade condicional é de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social.

O relator,

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Processo nº 116/2011
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. A, com os restantes sinais dos autos e ora preso no Estabelecimento Prisional de Coloane (E.P.C.), vem recorrer da decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, motivando para, a final, concluir, imputando à decisão recorrida a violação do disposto no artº 56º do C.P.M., e pugnando assim pela sua revogação; (cfr., fls. 88 a 92 que como as que adiante se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os legais efeitos).

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   Respondeu o Digno Magistrado do Ministério Público, pronunciando-se no sentido de se dever negar provimento ao recurso; (cfr., fls. 94 a 96-v).

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Nesta Instância, e em douto Parecer, considera também o Exmo. Representante do Ministério Público que se deve julgar improcedente o recurso; (cfr. fls. 133 a 134).

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Corridos os vistos legais dos Mmºs Juízes-Adjuntos, e nada obstando, vieram os autos à conferência.

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Passa-se a decidir.


Fundamentação

Dos factos

2. Flui dos autos a factualidade seguinte (com relevo para a decisão a proferir):
– por Acórdão deste T.S.I. de 17.09.2009, foi A, ora recorrente, condenado como autor de 2 crimes de “ofensa qualificada à integridade física” p. e p. pelo art. 137°, n° 1 e 140°, n° 1 e 2 do C.P.M., fixando-se-lhe a pena única de 1 ano e 3 meses de prisão;
– o mesmo recorrente deu entrada no E.P.C. em 11.03.2010, e em 11.01.2011, cumpriu dois terços da referida pena, vindo a expiar totalmente a mesma pena em 11.06.2011;
– durante a sua reclusão, manteve um comportamento isento de censura, tendo desenvolvido actividades escolares e laborais, e, uma vez em liberdade, irá viver em Macau, com a sua família, possuindo perspectiva de emprego como cabeleireiro.

Do direito

3. Insurge-se o ora recorrente contra a decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, afirmando, em síntese, que se devia considerar que reunidos estão todos os pressupostos do artº 56º do C.P.M. para que tal libertação antecipada lhe fosse concedida.

Vejamos.

Preceitua o citado artº 56º do C.P.M. (que regula os “Pressupostos e duração” da liberdade condicional) que:
   “1. O tribunal coloca o condenado a pena de prisão em liberdade condicional quando se encontrarem cumpridos dois terços da pena e no mínimo 6 meses, se:
a) For fundamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; e
b) A libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social.
   
2. A liberdade condicional tem duração igual ao tempo de prisão que falte cumprir, mas nunca superior a 5 anos.

3. A aplicação da liberdade condicional depende do consentimento do condenado”; (sub. nosso).
   
Constituem, assim, “pressupostos objectivos” ou “formais”, a condenação em pena de prisão superior a seis (6) meses e o cumprimento de dois terços da pena, num mínimo de (também) seis (6) meses; (cfr. nº 1).

“In casu”, atenta a pena única que ao recorrente foi fixada, e visto que se encontra ininterruptamente preso desde 11.03.2010, expiados estão já dois terços de tal pena, pelo que preenchidos estão os ditos pressupostos formais.

Todavia, e como é sabido, tal “circunstancialismo” não basta, já que não sendo a liberdade condicional uma medida de concessão automática, impõe-se para a sua concessão, a verificação cumulativa de outros pressupostos de natureza “material”: os previstos nas alíneas a) e b) do nº 1 do referido artº 56º.

Na verdade, e na esteira do decidido nesta Instância, a liberdade condicional “é de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir óbviamente matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social”; (cfr., v.g., os Acs. deste T.S.I. de 31.01.2002, Proc. nº 6/2002, de 18.04.2002, Proc. nº 53/2002, de 25.01.2007, Proc. nº 11/2007, de 08.02.2007, Proc. nº 17/2007, e o de 15.02.2007, Proc. nº 10/2007).

Assim, detenhamo-nos na apreciação de tais pressupostos de natureza material.

Ponderando na factualidade atrás retratada, poder-se-á dizer que é fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, mostrando-se a pretendida liberdade condicional compatível com a defesa da ordem jurídica e paz social?

Vejamos.

— Quanto ao referido “juízo de prognose”, cremos ser o mesmo viável.

De facto, antes da condenação por cuja pena cumpre o ora recorrente, era o mesmo primário, e o seu comportamento prisional, isento de censura, assim como às perspectivas de emprego, levam-nos a considerar que inadequado não é o mencionado “juízo de prognose favorável”, no sentido de se admitir que o recorrente, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes.

— Quanto à “compatibilidade” da pretendida liberdade condicional com a necessária defesa da ordem jurídica e paz social.

Pois bem, os crimes em questão – de “ofensa qualificada à integridade física” – são sem dúvida crimes com gravidade e que não deixam de causar uma certa repulsa social.

Todavia, e “in casu”, há que ponderar também no seguinte:

Os crimes em questão foram cometidos quando o ora recorrente tinha pouco mais de 16 anos de idade.

Por sua vez, importa também atentar que o ora recorrente cumpriu já cerca de 1 ano da pena de 1 ano e 3 meses de prisão em que foi condenado.

Sairá, assim, do E.P.C., e será, de qualquer forma, posto em liberdade, daqui a cerca de 3 meses.

Perante isto, considerando-se que tem o recorrente perspectivas de emprego, e atento os fins da liberdade condicional – essencialmente para preparar o condenado para o seu retorno à sociedade – cremos pois que, no caso, adequado será proporcionar tal adaptação, que não deixará de ser um estímulo a uma vida futura de harmonia com as regras de convivência social.

Por sua vez, afigura-se-nos também que face à pena fixada, e ao período de tempo em reclusão e ao que falta cumprir, salvaguardada estará a ordem jurídica e paz social, se ao recorrente se determinar determinadas regras de conduta.

Assim se decidirá.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam julgar procedente o recurso, concedendo a pretendida liberdade condicional ao recorrente, e ficando o mesmo sujeito às seguintes obrigações:
– comprovar nos autos e no prazo de um mês o exercício de uma profissão; e,
– observar o programa de reabilitação que lhe for apresentado pelo Departamento de Reinserção Social.

Sem custas.

Passem-se mandados.

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1,500.00.

Oportunamente, comunique, com cópias, ao Departamento de Reinserção Social.

Macau, aos 3 de Março de 2011

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José Maria Dias Azedo
(Relator)

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Chan Kuong Seng
(Primeiro Juiz-Adjunto)
(vencido, porque entendo que não se deve conceder liberdade condicional ao recorrente, porque atentas as circunstâncias graves dos dois crimes de ofensa grave à integridade física então praticados por ele em conjunto com outros arguidos, a libertação antecipada ora decretada irá ofender a paz Social, com a agravante de que o recorrente apenas tem comportamento regular no Estabelecimento Prisional).

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Tam Hio Wa
(Segundo Juiz-Adjunto)


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