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Recurso nº 795/2010
Data: 17 de Fevereiro de 2011

Assuntos: - Incerteza jurídica
- Nome romanizado
- Rectificação
- Nova prova


Sumário
1. Quando o Tribunal estiver perante uma situação em que o arresto do imóvel que se encontra inscrito a favor de quem tinha o nome romanizado em chinês diverso do requerido, pondo-se em causa à certeza e a estabilidade jurídicas do direito sobre a coisa, deve-se tomar a decisão aplausível no sentido de resolver essa incerteza jurídica.
2. No decurso do recurso, correu também o recurso da decisão do arresto neste Tribunal e foi definitivamente decidido no sentido de manter o arresto, em que também reconheceu que são mesmas pessoas o requerido e o titular do imóvel arrestado, podendo este Tribunal tomar decisão da referida rectificação do nome, em conformidade com a nova prova.
O Relator,
Choi Mou Pan

Recurso nº 795/2010
Recorrente: A





A cordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.:
Por apenso aos autos da execução ordinário nº CV3-07-0065-CEO, movida pelo A, com sede em Beijing e sucursal em Macau contra o executado B, foi pedido pelo mesmo exequente o arresto da Fracção “AR/C” do rés-do-chão “A” para comércio, e foi este pedido deferido.
Porém, o arresto ficou registado provisoriamente por dúvidas, já que na inscrição do registo consta que o proprietário é B, solteiro, maior, natural da China, de nacionalidade chinesa e com residência na Rua de XX, nº X, rés-do-chão, Macau (a mesma morada que consta na petição inicial da execução, no âmbito dos autos principais, que constituem o processo nº CV3-07-0065-CEO). Para o Exmo. Conservador, a dúvida existente reside no facto de não saber se C e B são a mesma pessoa. Face a este facto, veio o A pedir a rectificação do nome do executado C também usa como romanização em chinês B e com o fim de converter o registo do arresto de provisório em definitivo, que se digne ordenar a emissão de uma certidão que contenha o despacho proferido e que certifique que C também usa como romanização em chinês B.
Notificado o requerido C, este se limitou a confirmar que tinha usado também o nome romanizado B.
Procedidas as diligências necessárias, a Mmª Juiz titular do processo, foi indeferir a rectificação nos termos do seguinte despacho:
“Fls. 322: o requerente vem pedir a rectificação do termo do arresto. Compulsados os autos, B (titular do bilhete de identidade nº 19XXXX, fls. 84 e fls. 106a) e C (titular do documento de identificação de Hong Kong a fls. 92) possuem documentos de identificação diferentes, as datas do nascimento de B e C não são iguais (fls. 91 e 92 e fls. 106a), entendo que para já não existem elementos nos autos para afirmar que se trate da mesma pessoa. Pelo exposto, indefiro o requerimento de rectificação.“
Com este despacho não concordou, recorreu o requerente da providência cautelar ora exequente A, alegando que:
A. Nos autos principais de execução, anteriormente à decisão de anulação do processado, já o Juiz que era titular do processo havia proferido despacho considerando que C e B são a mesma pessoa, para efeitos de rectificação do termo de penhora e conversão em definitivo do respectivo registo.
B. O arresto da fracção designada por “AR/C” foi requerido contra C e foi decretado, apesar de o imóvel estar registado em nome de B. Se dúvidas houvesse quanto à titularidade do imóvel o arresto teria de ser necessariamente inferido.
C. A decisão referida em B) fez caso julgado formal, pelo que o despacho de que agora se recorre viola o art. 575º do Código de Processo Civil.
D. Estão juntos aos autos dois documentos de identificação, o Bilhete de Cidadão Nacional (em que o nome aparece romanizado como B) e o de Residente de Hong Kong (em que o nome aparece romanizado como C) e dos dois consta uma fotografia que revela claramente que se trata da mesma pessoa.
E. Sendo natural da República Popular da China, o facto de nos dois documentos referidos em D) a data de nascimento ser diferente é irrelevante, pois que se trata de um fenómeno usual na década de 90 do século passado, já que nessa altura a data de nascimento era assente com base em mera declaração.
F. O próprio C veio aos autos reconhecer que também usa o nome B e que se trata da mesma pessoa, por duas vezes.
G. Assim, ao indeferir a pretensão do ora Recorrente, o Tribunal a quo violou as normas da experiência comum e da lógica do homem médio, incorrendo em erro na apreciação da prova.
H. Havia no processo suficientes elementos probatórios (a mesma fotografia nos dois documentos de identificação, a mesma assinatura nas livranças e na escritura e a confissão expressa do facto pelo Requerido) que impunham sobre a matéria de facto decisão diversa da recorrida.
Termos em que deve ser revogada a decisão recorrida e proferido novo despacho a ordenar a rectificação do termo de arresto, dele passando a constar que C também usa como romanização B, de modo a poder converter-se em definitivo o registo que se encontra provisório por dúvidas.
Notificado o recorrido este não respondeu ao recurso.

Conhecendo:
O ponto essencial que se discute nos presentes autos é que o recorrente viu a impossibilidade de converter em definitivo o registo do arresto do imóvel inscrito a favor do B, enquanto o requerido tinha o nome romanizado em chinês como C e não conseguiu obter a rectificação judicial nos autos.
Compulsados os autos, foi a própria Juiz que ordenou o arresto do imóvel que se encontra inscrito a favor de quem tinha o nome romanizado em chinês diverso do requerido e depois indeferiu o pedido da rectificação.
Perante esta situação, põe em causa à certeza e a estabilidade jurídicas do direito sobre a coisa, pois, podemos ver, no passo a priori, caso se entendesse serem pessoas diversas, deveria indeferir logo o arresto a decretar, para evitar o arresto dos bens alheios. E no passo posterior, se se entendesse por diversas as pessoas do requerido e do titular do imóvel arrestado, deveria ordenar o levantamento do arresto como uma consequência necessária da decisão ora em mira.
E, o processo não podia parar por aqui, de modo a ficar incerteza a situação jurídica tanto do requerido como do requerente, devendo o Tribunal a quo optar, de uma das duas soluções correctas, rectificar ou levantar o arresto.
Mesmo na última hipótese de admitir a falta dos elementos na primeira instância para a requerida rectificação, nesta instância, já os temos para os efeitos pretendidos.
Vejamos.
No decurso do presente recurso, correu também o recurso da decisão do arresto neste Tribunal e foi definitivamente decidido no sentido de manter o arresto.
Do acórdão e da sentença recorrida que tinha sido tomada em consequência da oposição ao arresto, podemos ver claramente, foi expressamente reconhecido que o requerido C também se identificava como B. Pelo menos, ao ver confirmado o arresto, não podemos deixar de entender que foi definitivamente decidido que a pessoa a favor de quem está inscrito o imóvel arrestado era mesma da pessoa identificado como requerido.
Se bem que o Tribunal a quo não tenha tido elemento suficiente para tomar a requerida confirmação, com o trânsito em julgado o recurso do arresto registo neste TSI sob nº 653/2010, já temos elemento mais que suficiente para afirmar que são de mesma pessoa o requerido C e o propiciatório do imóvel arrestado B, independentemente do seu próprio reconhecimento desse referida identificação.
Logo, é de julgar procedente o presente recurso, revogando o despacho recorrido e na sua substituição, deve deferir a requerida rectificação.
Pelo exposto, acordam neste Tribunal de Segunda Instância em conceder provimento ao recurso do A nos exactos termos acima consignados.
Sem custas em ambas instâncias.
RAEM, aos 17 de Fevereiro de 2011
Choi Mou Pan (Relator)
Joao A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng



TSI-795-2010 Página 1