Processo nº 696/2010(/) Data:03.03.2011
(Autos de recurso penal)
Assuntos : Crime de “ofensa à integridade física por negligência.
Pena.
SUMÁRIO
1. Se ao crime cometido couber, em alternativa, pena de prisão ou multa, “o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.”
2. Assim, sendo o arguido primário, e tendo confessado os factos de forma voluntária e sem reservas, considerando que o crime foi cometido com negligência (simples) e que leves foram as lesões com o mesmo causadas, motivos não há para não se optar por uma pena não privativa de liberdade.
O relator,
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Processo nº 696/2010(()
(Autos de recurso penal)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. Por acórdão do Colectivo do T.J.B. decidiu-se condenar o arguido A como autor de 1 crime de “ofensa à integridade física por negligência” p. e p. pelo art. 142°, n°1 do C.P.M. conjugado com o art. 93° da Lei n° 3/2007 (Lei do Trânsito Rodoviário), na pena de 10 meses de prisão, suspensa na sua execução por 1 ano e na inibição da condução por 3 meses; (cfr., fls. 115-v a 116 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
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Inconformado, o arguido recorreu.
Na sua motivação, e em síntese, pede a revogação da dita decisão e que, em sua substituição, se profira acórdão condenando-o numa pena de multa de 180 dias, à taxa diária de MOP$100,00, convertível em 120 dias de prisão subsidiária, ou, assim não se entendendo, que se reduza a pena de prisão aplicada; (cfr., fls. 125 a 128).
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Em resposta, pugna o Exm° Magistrado do Ministério Público no sentido da improcedência do recurso; (cfr., fls. 134 a 136).
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Neste T.S.I., e em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador-Adjunto o seguinte Parecer:
“Impugna o recorrente a pena que lhe foi imposta no douto acórdão.
Vejamos.
Sendo o crime por que o mesmo foi condenado punível com prisão ou multa, impõe-se chamar à colação, liminarmente, o art. 64° do C. Penal.
É este comando, conforme se sabe, que estabelece o critério geral orientador da escolha da pena.
E a opção pela sanção não privativa da liberdade pressupõe que, no caso concreto, a mesma se mostre suficiente para se alcançarem os fins visados com as reacções criminais.
Ora, isso acontece, em nosso juízo, na hipótese vertente.
Está em causa o tipo p.p. nas disposições conjugadas dos arts. 142°, n°, 1, do citado C. Penal e 93°, n°, 1, da L. T. Rodoviário.
E há, naturalmente, uma multiplicidade de condutas subsumíveis à previsão dessas normas.
Não pode dizer-se, entretanto, que a situação em apreço integre uma violação grave do interesse protegido nas mesmas.
Basta atentar, além do mais, nas consequências que resultaram para o ofendido.
E, sendo assim, as razões de prevenção geral não constituem um obstáculo para a opção em questão.
Os fins de prevenção especial, por seu turno, não contrariam, do mesmo modo, a aplicação da pena pecuniária.
O arguido; na verdade, para além de ser delinquente primário, fez uma confissão integral e sem reservas.
Na perspectiva apontada, não repugna aceitar a medida concreta propugnada na motivação do recurso.
O recorrente pretende, subsidiariamente, a redução da pena de prisão para um “quantum” inferior a 4 meses.
Mas essa pretensão não tem cabimento, sendo certo que o limite mínimo dessa pena, como se frisa na resposta do M°P°, corresponde a 9 meses.
E, a manter-se a opção pela pena privativa da liberdade, cremos que a medida concreta fixada não é passível de crítica.
Este o nosso parecer.”; (cfr., fls. 164 a 166).
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Passa-se a decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Estão provados os factos seguintes:
“Em 17 de Novembro de 2007, por volta das 22h45, o arguido estava a conduzir o automóvel ligeiro de matrícula MK -XX-XX ao longo da Avenida XX de Macau, na via de trânsito direita, na direcção à XX ao XX.
Perto do poste de iluminação n.° XXX situado na Avenida XX, a parte dianteira do automóvel ligeiro de matrícula MK-XX-XX embateu na traseira do ciclomotor de matrícula CM-XXXXX, deixando o ciclomotor perder o controlo, fazendo com que a motorista e o passageiro caíssem no chão e ficassem feridos.
Naquela altura, B conduzia o ciclomotor de matrícula CM-XXXXX, transportando C (vítima), que estava em frente e na mesma direcção do arguido.
Do embate acima referido resultaram, directa e inevitavelmente, contusões de tecido mole em várias partes do lado esquerdo do corpo de B; e, resultaram lacerações e escoriações de tecido mole em várias partes do lado esquerdo do corpo de C. São constantes de fls. 31, 33, 41 e 42 dos autos os estados de ferimento das duas vítimas, constituindo como parte integrante da presente acusação.
Segundo o parecer do médico legal, B e C ficam, respectivamente, com 2 e 7 dias de convalescença.
Na ocorrência do acidente, o tempo era bom, com iluminação suficiente, pavimento seco e densidade de trânsito forte.
O aludido acidente acontece porque o arguido não cumpriu os termos previstos no n.° 1 do art° 21.° da Lei do Trânsito Rodoviário, isto é, não manteve entre o seu veículo e o que o precede a distância suficiente.
O arguido infringiu, livre, voluntária e conscientemente, as disposições da Lei do Trânsito Rodoviário acima referidas, razão pela qual o acidente ocorreu, por negligência, e causou ferimento às duas vítimas.
O arguido sabia perfeitamente que tais condutas eram proibidas e punidas por lei.
Segundo o registo criminal, o arguido é delinquente primário.”; (cfr., fls. 114-v a 115 e 157 a 158).
Do direito
3. Traz o arguido o presente recurso insurgindo-se contra decisão que o condenou como autor de 1 crime de “ofensa à integridade física por negligência” p. e p. pelo art. 142°, n°1 do C.P.M. conjugado com o art. 93° da Lei n° 3/2007 (Lei do Trânsito Rodoviário), na pena de 10 meses de prisão, suspensa na sua execução por 1 ano (e na inibição da condução por 3 meses).
Pede, como se viu, que lhe seja aplicada uma pena de multa de 180 dias, à taxa diária de MOP$100,00, convertível em 120 dias de prisão subsidiária, ou que se reduza a dita pena de prisão.
Cremos que o recurso merece provimento.
Vejamos.
Ao crime “de ofensa à integridade física por negligência” p. e p. pelo art. 142° do C.P.M. e pelo ora recorrente cometido, cabe, em alternativa, a pena de prisão até 3 anos ou pena de multa, (que no caso, atento o art. 45°, n° 1, do mesmo código, tem como limite mínimo 10 dias, e como limite máximo, 360 dias).
Assim sendo, importa atentar no preceituado no art. 64° do referido código onde se estatui que:
“Se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.”
No caso dos autos, ponderando na factualidade provada, (e afigurando-se-nos que o Colectivo a quo se terá olvidado de tal comando legal), cremos que adequada é uma pena de multa.
Na verdade, consta do Acórdão ora recorrido que o arguido é primário e confessou os factos de forma voluntária e sem reservas.
Por sua vez, o crime em questão foi cometido com “negligência”, sendo também de considerar “leves” as lesões com o mesmo causadas.
E, como acertadamente salienta o Ilustre Procurador-Adjunto, a situação em apreço não integra “uma violação grave do interesse protegido”, ao ponto de, em termos dos fins das penas (art. 40° do C.P.M.), se mostrar necessária uma pena privativa da liberdade, afigurando-se-nos pois que, a pena de multa, realiza, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição.
Nesta conformidade, atentos os critérios do art. 65° e os limites do art. 45°, n° 1, do aludido código, crê-se que justa e adequada é a pena de 180 dias de multa, à taxa de MOP$100.00 por dia, perfazendo a multa global de MOP$18,000.00, ou 120 dias de prisão subsidiária, tal como pelo recorrente vem peticionada.
Dest’arte, prejudicada ficando a questão da “redução da pena de prisão”, (e certo sendo que, um dos ofendidos desistiu da queixa), resta decidir.
Decisão
4. Nos termos que se deixam expostos, concede-se provimento ao recurso.
Sem custas.
Honorários ao Exm° Defensor no montante de MOP$ 1,000,00.
Macau, aos 3 de Março de 2011
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José Maria Dias Azedo
(Relator)
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Chan Kuong Seng
(Primeiro Juiz-Adjunto)
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Tam Hio Wa
(Segundo Juiz-Adjunto)
) Processo redistribuído ao ora relator em 10.01.2011.
. Processo redistribuído ao ora relator em 10.01.2011.
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