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 Recurso Contencioso n.º 690/2010
(Reclamação para a conferência)
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 31 de Março de 2011
Descritores:
- Notificação insuficiente ou incompleta do acto
- Prazo de recurso
- Audiência de interessados
SUMÁRIO:
I- De acordo com o art. 27º, n.2, do CPAC, o prazo de recurso começa a correr imediatamente com a notificação insuficiente ou incompleta e só se suspende (nem sequer se interrompe) com a apresentação de requerimento em que seja pedida a notificação dos elementos em falta ou a passagem de certidão ou fotocópia que os contenha. Em tal hipótese, a suspensão dura até que estes dados sejam fornecidos ao requerente.
II- Esta norma, no entanto, para formar um todo normativo coerente e harmonizável, tem que ser lida e interpretada em conjugação com o precedente art. 26º. Assim é que, se a notificação não levar ao destinatário do acto o sentido, o autor e a data da decisão, o prazo não começa logo a correr, por serem elementos essenciais ou de importância primordial. Mas se a imperfeição se verificar ao nível da indicação sobre se o acto é recorrível ou sobre o prazo para a sua impugnação, por exemplo, então estaremos perante elementos de menor importância, que o legislador considerou não terem relevância suspensiva. Nestes casos, só perante requerimento feito nos moldes do art. 27º, n.2 é que o prazo em curso se suspenderá.
III- Não tendo o procedimento administrativo carácter disciplinar ou sancionatório - caso em que a audiência de interessados assume dimensão qualificada e garantia fundamental e em que, portanto, o acto praticado sem a sua observância é passível de nulidade – a omissão dessa formalidade, geralmente, apenas gera anulabilidade.
















Autos de Recurso Contencioso n.º 690/2010
(Reclamação para a conferência)

I- Relatório
A (A), recorrente do processo à margem acima referenciado, tendo recebido o despacho proferido pelo relator em 30/11/2010, através do qual rejeitou o recurso contencioso interposto pelo recorrente com fundamento em extemporaneidade, dele vem apresentar reclamação para a conferência nos termos do artigo 15.º n.º 2 do Código de Processo Administrativo Contencioso.
Na respectiva peça, aduz os seguintes argumentos:
“Quanto ao facto de tempestividade do recurso
Os factos referidos no despacho ora reclamado são os seguintes:
“Como se teve oportunidade de expor no nosso despacho de fls. 90-v, e mostra-se útil aqui recordar, o acto recorrido foi praticado em 09.12.2009, do mesmo foi o recorrente notificado em 18.12.2009, e (apenas) em 09.07.2010 requereu o mesmo a observância do estatuído no artigo 70.º do C.P.A., certo sendo também que o presente recurso deu entrada neste T.S.I. em 25.10.2010.”
Fundamentos do despacho ora reclamado
Os fundamentos do despacho ora reclamado são os seguintes: “In casu, os vícios pelo recorrente invocados (1. Falta de fundamentação; 2. Erro nos pressupostos de facto; 3. Violação do princípio de boa fé) geram apenas a anulação do acto recorrido, pelo que, sendo assim o prazo para o recurso do mesmo o de 30 dias, e como se deixou dito, decorrido está também tal prazo.”
Na parte da fundamentação, o despacho ora reclamado citou principalmente o artigo 27.º n.º 2 do Código de Processo Administrativo Contencioso e o acórdão do TSI proferido no Processo n.º 610/2009 para fundamentar a rejeição do recurso, acórdão esse, no essencial, fez uma interpretação declarativa do disposto no artigo 27.º n.º 2 do Código de Processo Administrativa Contencioso, entendendo que decorrido está o prazo de recurso se dentro de dez dias contados da recepção da notificação deficiente o interessado não tiver pedido à entidade o fornecimento dos elementos então em falta na notificação.
  Porém, o despacho ora reclamado também citou outra posição oposta do acórdão do TSI proferido no Processo n.º 16/2005: “Só uma notificação em que falte um destes elementos torna a respectiva decisão (inoponível ao seu destinatário e) irrelevante para desencadear o início do decurso do prazo para a interposição de recurso contencioso”.
Salvo mau entendimento do recorrente, o conteúdo do aludido acórdão deve implicar que uma notificação em que falte um destes elementos torna a respectiva decisão irrelevante para desencadear o início do decurso do prazo para a interposição de recurso contencioso e a respectiva decisão também não é oponível ao seu destinatário.
  Fundamentos para a invocada tempestividade do recurso
O recorrente entende que para além de uma interpretação declarativa do artigo 27.º n.º 2 do Código de Processo Administrativo Contencioso, deve-se também fazer uma interpretação sistemática desta norma nos termos do artigo 8.º n.º 1 do Código Civil, isto é, deve-se considerar a unidade do sistema jurídico.
Vejamos a obra escrita por Fong Man Chong in Manual de Direito Processual Administrativo de Macau I, página 99:
“As normas de procedimento administrativo, tais como as de outros direitos processuais, apresentam, na sua generalidade, um sistema de princípios, que na sua prática tem duplo sentido, e das soluções já definidas também podem resultar estes princípios.
Da racionabilidade de toda a ordem jurídica e das suas normas também podem resultar alguns princípios que nos permitem fazer interpretação lógica e adequada das normas que regulamentam os diferentes elementos da mesma relação processual”.
Esta obra também tem o seguinte entendimento do “direito à tutela jurisdicional efectiva” previsto no artigo 2.º do Código de Processo Administrativo Contencioso de Macau: “(…) o acesso ao tribunal pressupõe que o interessado conhece os seus próprios direitos e deveres, pelo que, o direito à informação e o direito de exame do processo no ramo de Direito Administrativo constituem os elementos chaves, sendo requisitos necessários para o interessado exercer correctamente todas os seus direitos.
O artigo 2.º do Código de Processo Administrativo Contencioso prevê que: A todo o direito subjectivo público ou interesse legalmente protegido corresponde um ou mais meios processuais destinados à sua tutela jurisdicional efectiva, bem como os procedimentos preventivos e conservatórios necessários para acautelar o efeito útil de tais meios.
O artigo 70.º alínea d) do Código do Procedimento Administrativo exige que da notificação deve constar a indicação de o acto ser ou não susceptível de recurso contencioso, cujo objectivo é evitar o particular perder a oportunidade de interpor recurso por não conhecer o prazo da interposição do recurso e assegurar que o particular pode utilizar o mecanismo de reclamação e de recurso contencioso estabelecido pelo legislador, de forma a garantir que o particular possa defender, por meios processuais, os seus interessados legalmente protegidos.
Do espírito legislativo acima mencionado, podemos saber que o legislador presume que o particular não conhece as disposições no Código do Procedimento Administrativo, por isso, exige que a Administração lhe adverte da ulterior tramitação administrativa.
Caso o artigo 27.º n.º 2 do Código de Processo Administrativo Contencioso seja directamente interpretado como: “se dentro de dez dias contados da recepção da notificação deficiente, o interessado não tiver pedido à entidade o fornecimento dos elementos então em falta na notificação, decorrido está o prazo de recurso”, esta interpretação contrariará ao direito à tutela jurisdicional efectiva previsto no artigo 2.º do Código de Processo Administrativo Contencioso de Macau e ao artigo 70.º alínea d) do Código do Procedimento Administrativo, uma vez que caso o legislador presuma que o particular não conhece as disposições do Código do Procedimento Administrativo, deve também presumir que o mesmo não conhece o artigo 27.º n.º 2 do Código de Processo Administrativo.
O magistrado do Ministério Público junto do Tribunal de Última Instância emitiu o seguinte parecer no Processo n.º 26/2004:
“(…) Em relação à notificação do despacho sancionatório, é verdade que se verifica a falta de indicação de um dos elementos referidos no artigo 70.º do CPA, cuja alínea d) exige que da notificação deve constar a indicação de o acto administrativo ser ou não susceptível de recurso contencioso.
No entanto, a falta de comunicação deste elemento não afecta a validade do acto. “Se era válido, assim continuará a ser. O que acontece é que ele não produzirá efeitos enquanto o interessado não os conhecer na integra. Faltar-lhe-á eficácia externa. E por ser assim, também não se iniciam com aquela notificação insuficiente quaisquer prazos para a impugnação … contenciosa” (Código do Procedimento Administrativa de Macau, Anotado e Comentado, de Lino Ribeiro e José Cândido de Pinho, página 422).
Só quando entender que a falta de indicação prevista no artigo 70.º alínea d) do Código do Procedimento Administrativo leva a que não se inicie a contagem do prazo de recurso contencioso e entender, ao mesmo tempo, que só se tornar aplicável o disposto no artigo 27.º do Código de Processo Administrativo Contencioso quando o interessado tiver tomado o conhecimento desta norma, esta será a interpretação que não cria dilema, isto é, por um lado, exige que a Administração notifica ao interessado se o acto é susceptível ou não de recurso, e por outro lado, presume que o interessado conhece o disposto no artigo 27.º do Código de Processo Administrativo Contencioso.
Pelos acima expostos, o recorrente entende que o recurso por si interposto não é extemporâneo.
  Quanto ao vício da “falta da sua audiência prévia”
O despacho ora reclamado citou dois acórdãos do TSI respectivamente no Processo n.º 224/2001 e no Processo n.º 78/2001, segundo os quais, nos processos de natureza disciplinar ou sancionatória, a falta de audiência constitui nulidade, e em outras situações, como nos casos expressamente consagrados nos artigo 96.º e 97.º do Código do Procedimento Administrativo, a falta de audiência só constitui anulabilidade, uma vez que: “Aliás, existem, por outra banda, situações em que o princípio da audiência dos interessados assume dimensão qualificada, já que está em causa o direito de defesa, sendo o que acontece nos processos de natureza disciplinar ou sancionatória, que têm como consequência a restrição ou eliminação dos direitos dos administrados ou a aplicação de sanções.”
Na sua contestação, o Secretário para a Segurança, ora o recorrido, referiu que o despacho recorrido é um despacho favorável ao recorrente e nos termos do artigo 97.º alínea b) do Código do Procedimento Administrativo, pode-se dispensar a audiência do interessado.
O despacho ora reclamado não esclareceu se o despacho recorrido é ou não um despacho favorável ao recorrente, nem o qualificou como um despacho favorável ao recorrente ou um despacho que restringe os direitos do recorrente.
O conteúdo essencial do despacho recorrido é o seguinte: Em 9 de Dezembro de 2009, o Secretário para a Segurança, conforme proposto pelo CPSP, confirmou a decisão de desligação compulsiva do serviço para efeitos de aposentação do recorrente e também provou que a desligação compulsiva do serviço para efeitos de aposentação do recorrente não foi provocada pelo acidente em serviço ocorrido em 5 de Agosto de 2005.
Vamos agora analisar se o aludido despacho é uma decisão favorável ao recorrente.
Caso a desligação compulsiva do serviço para efeitos de aposentação do recorrente não seja provocada pelo acidente em serviço ocorrido em 5 de Agosto de 2005, tal como provado pelo despacho recorrido, o recorrente terá o direito de receber mensalmente um salário correspondente ao índice 260 da tabela indiciária durante o período de aposentação (vide os artigos 262.º n.º 1 alínea b), 264.º n.º 1 e 265.º n.º 2 do Decreto-Lei n.º 87/89/M).
Caso se prove que a desligação compulsiva do serviço para efeitos de aposentação do recorrente seja provocada pelo acidente em serviço ocorrido em 5 de Agosto de 2005, o recorrente terá o direito de receber mensalmente um salário correspondente ao índice 370 da tabela indiciária durante o período de aposentação (vide os artigos 262.º n.º 1 alínea c), 264.º n.º 2 do Decreto-Lei n.º 87/89/M e o artigo 5.º n.º 2 da Lei n.º 2/2008).
Pelos acima expostos, o recorrente entende que a decisão que confirmou que a desligação compulsiva do serviço para efeitos de aposentação do recorrente foi provocada pelo acidente em serviço é uma decisão favorável ao recorrente enquanto a decisão que confirmou que a desligação compulsiva do serviço para efeitos de aposentação não foi provocada pelo acidente em serviço é uma decisão desfavorável ao recorrente, pelo que, a falta da audiência do recorrente constitui o vício de nulidade e nos termos do artigo 25.º n.º 1 do Código de Processo Administrativo Contencioso, o recurso interposto pelo recorrente com fundamento em nulidade não é extemporâneo, pelo que, deve ser admitido o recurso interposto pelo recorrente.
Pelos acima expendidos e nos termos das disposições legais, deve admitir a presente reclamação ao abrigo do artigo 15.º n.º 2 do Código de Processo Administrativo Contencioso e do artigo 620.º do Código de Processo Civil aplicável por remissão do artigo n.º 1 do Código de Processo Administrativo Contencioso, julgar procedentes os fundamentos invocados na presente reclamação e ordenar o prosseguimento do processo”.
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A entidade recorrida foi notificada da reclamação (fls. 137), mas limitou-se a oferecer o merecimento dos autos (fls. 140).
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O digno Magistrado do M.P emitiu o seguinte parecer:
  “Tanto quanta nos é dado apreender do teor da reclamação apresentada pelo recorrente, funda o mesmo a sua alegação em 2 vectores essenciais:
  - por um lado, dado o facto de a notificação do acto que lhe foi efectuada não conter a indicação a que se reporta a al d) do artº 70º, CPA, tal geraria a inoponibilidade dos efeitos respectivos, razão por que, não se iniciando os prazos para a impugnação contenciosa, o seu pedido, nos termos do nº 2 do artº 27º, CPAC, se encontraria em tempo;
  - por outro e de to do o modo, tal recurso contencioso seria tempestivo dada a forma de invalidade - nulidade - que vê afectar a decisão controvertida, por ocorrência de vício de falta de audiência prévia.
  Ora, tal argumentação encontra “antídoto” bastante e eficaz no teor da douta decisão reclamada, onde, clara e explicitamente se expõe que só uma notificação a que falte a indicação do sentido da decisão, seu autor e data, tom a aquela inoponível ao seu destinatário e irrelevante para o desencadeamento do início da contagem do prazo para interposição do recurso contencioso, razão por que, no caso, atinente à mera não indicação do meio de reacção perante o acto, não pode o recorrente validamente esgrimir com tal inoponibilidade e consequente não desencadeamento do prazo a que alude o nº 2 do artº 27º, CPAC que deixou esgotar, sendo que, por outra banda, a decisão questionada se apresenta também clara e convincente no sentido de atestar que, com os contornos específicos do caso em apreço, a eventual falta de audiência prévia, a registar-se, nunca seria susceptível de conduzir à ocorrência da mais extrema forma de invalidade pretendida pelo recorrente, pelo que o prazo para o recurso seria efectivamente de 30 dias, mostrando-se o mesmo claramente ultrapassado.
  Razões por que, sem necessidade de maiores considerações ou alongamentos, somos a entender não merecer provimento a presente reclamação”.
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Colhidos os vistos, cumpre decidir.
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II- Os Factos
1- O Ex.mo Secretário para a Segurança proferiu em 9/12/2009 despacho que determinava a desligação obrigatória do serviço para efeitos de aposentação a partir de 6/10/2009 do recorrente A na sequência de faltas dadas ao serviço e em resultado de inspecção médica realizada pela Junta de Saúde (doc. fls. 56).
2- Este despacho foi notificado ao interessado pelo ofício de notificação n. 265/DRH/DGR/2009 emitido em 17/12/2009 (doc. # 3: fls. 55).
3- Nessa notificação não foi feita qualquer referência à susceptibilidade de ser interposto recurso contencioso do despacho referido em 1, nem o prazo de que o recorrente poderia dispor para o efeito (loc. cit.).
4- No dia 9 de Julho de 2010 o recorrente pediu ao Departamento de Recursos Humanos do Departamento de Gestão de Recursos que lhe fosse feita a notificação de acordo com o art. 70º, do CPA (doc. # 4, fls.59).
5- No dia 29 de Julho o recorrente recebeu a notificação de que não iria proceder-se a nova notificação (fls. 61).
6- O recurso contencioso deu entrada neste TSI em 25/08/2010, e ao acto ali impugnado eram imputados os vícios de forma por falta de fundamentação e por falta de audiência prévia, erro nos pressupostos de facto e de violação do princípio da boa fé.
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III- O Direito
O despacho de que vem interposta a presente reclamação para a conferência decidiu rejeitar o recurso contencioso por considerar que:
- A falta da comunicação da recorribilidade do acto transmitido e o prazo para o efeito na notificação 265/DRH/DGR/2009 só seria causa de suspensão do prazo de recurso se o interessado tivesse requerido o fornecimento de tais elementos no prazo de dez dias, ao abrigo do art. 27º, n. 2, do CPAC. E tal não aconteceu.
- Não sendo o acto acometido de vícios sancionáveis com a nulidade, o prazo de 30 dias que o interessado dispunha para dele recorrer (art. 25º, al. a), do CPAC) já havia sido ultrapassado.
O reclamante considera que a solução do despacho em causa, ao seguir uma interpretação literal, a que chama “declarativa”, do art. 27º, n.2, do CPAC, ofende o direito à tutela jurisdicional efectiva plasmado no art. 2º do mesmo diploma e viola o art. 70º do CPA.
Vejamos.
O art. 70º do CPA diz, efectivamente, que a notificação deve conter, além do texto integral do acto administrativo (al. a)), a identificação do procedimento, a indicação do seu autor e a data daquele (al. b)), o órgão competente para a impugnação administrativa e o prazo para o efeito (al. c)) e a indicação de o acto ser ou não susceptível de recurso contencioso (al. d)).
Trata-se de uma norma de cariz garantístico que visa proporcionar ao destinatário da decisão administrativa o leque dos elementos mais importantes à aceitação ou à reacção impugnativa de tipo administrativo ou contencioso que ao caso couber.
Mais: ao impor à entidade administrativa o dever de transmitir ao interessado a possibilidade que este tem de fazer uso do instrumento de reacção adequada, e do prazo de que para tal dispõe, está o legislador a afirmar a dupla ideia de que o procedimento é transparente e que nada pode ficar por dizer ou esclarecer. Facilita-se assim a vida ao interessado, as mais das vezes não familiarizado com as coisas do direito e com os modos de impugnação ao seu dispor.
Pergunta-se agora: E se a notificação não contiver todos esses elementos?
Quando vigente, o art. 31º da LPTA respondia à questão: Podia o interessado requerer a notificação dos elementos em falta ou a passagem de certidão que as contivesse; nesse caso, o prazo para o recurso começaria a contar-se a partir da comunicação dos elementos pedidos. Esta disposição permitia concluir que se o interessado não tomasse essa iniciativa, o acto era-lhe ineficaz e inoponível, a ponto de não se iniciarem quaisquer prazos de impugnação administrativa ou contenciosa.
Porém, com o CPAC operou-se uma profunda mudança no alcance da regra.
Dispõe o art. 27º, n.2 do CPAC:
   “2. Quando a notificação omita as indicações previstas no artigo 70.º do Código do Procedimento Administrativo ou a publicação não contenha os elementos enunciados no artigo 113.º e no n.º 4 do artigo 120.º do mesmo Código, pode o interessado requerer no prazo de dez dias à entidade que praticou o acto a notificação das indicações ou dos elementos em falta ou a passagem de certidão ou fotocópia autenticada que os contenha, ficando nesta hipótese suspenso, a partir da data da apresentação do requerimento e até à daquela notificação ou passagem, o prazo para interposição do recurso cuja contagem se tenha iniciado” (bold nosso).
Bastava a leitura da norma acabada de transcrever, para logo se colher sem dificuldade que o prazo de recurso começa a correr imediatamente com a notificação insuficiente ou incompleta e que ele só se suspende (nem sequer interrompe, repare-se) com a apresentação de requerimento em que seja pedida a notificação dos elementos em falta ou a passagem de certidão ou fotocópia que os contenha. Em tal hipótese, a suspensão dura até que estes dados sejam fornecidos ao requerente.
Contudo, esta disposição legal tem que relacionar-se, para formar um todo normativo coerente e harmonizável, com o precedente art. 26º. Isto é, ela não pode ser lida e interpretada isoladamente.
Com efeito, o legislador neste preceito (art. 26º) acabava de dar o mote à compreensão da questão da notificação insuficiente, imperfeita ou defeituosa. No n. 1 do art. 26º é prescrito que:
“A contagem do prazo para interposição do recurso não se inicia enquanto o acto não comece a produzir efeitos e sempre que a publicação ou a notificação, quando obrigatórias, não dêem a conhecer o sentido, o autor e a data da decisão”.
E assim sendo, tudo se percebe melhor agora: se a notificação não levar ao destinatário do acto o sentido, o autor e a data da decisão, o prazo não começa a correr, por serem elementos essenciais ou de importância primordial. Mas se a imperfeição se verificar ao nível da indicação sobre se o acto é recorrível ou sobre o prazo para a sua impugnação, por exemplo, então estaremos perante elementos de menor importância, que o legislador considerou não terem relevância suspensiva. Daí que nestes casos só perante requerimento feito nos moldes do art. 27º, n.2 é que o prazo em curso se suspenderá.
É esta, de resto, a posição deste TSI, no acórdão de 17/02/2005, Proc. n. 16/2005 ou de 28/01/2010, Proc. n. 610/2010.
O actual modelo normativo – que deixa para trás interpretações doutrinais assentes em normas diferentes e já revogadas - não contende com os direitos dos cidadãos à tutela jurisdicional efectiva, nem coarcta as possibilidades de defesa, ao contrário do que sustenta o reclamante, uma vez que o legislador continuou a conferir ao destinatário do acto direitos reactivos e de informação coerciva, justamente para amparo da sua posição. O que sucede é que a alteração verificada tornou mais exigente e responsável a actuação do particular, na medida em que lhe impôs um ónus temporal a respeito do exercício do seu direito à informação, de forma a evitar a eternização da dúvida no seu espírito, com a consequente paralisação das relações jurídicas.
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É claro que o que acaba de afirmar-se tem que ser entendido num quadro de fundamentos que se inscrevam no âmbito de uma sanção anulatória e não, já, quando apontem para a nulidade do acto, pois neste caso, como se sabe, o recurso pode ser interposto sem dependência de prazo, conforme no-lo confirmam o n.1, do art. 25º do CPAC e o n.2, do art.123º, do CPA.
Ora, acontece que nenhuma das causas de invalidade que o reclamante arroja sobre o acto serve para declarar nulo o acto.
Com efeito, nem a falta de fundamentação, nem o erro sobre os pressupostos de facto, nem a violação do princípio da boa fé são de molde a fulminar o acto com a apontada nulidade, como se sabe e não precisa de ser redito.
Nem sequer a falta de audiência prévia, no caso em apreço. Admitamos que o acto sob censura é desfavorável ao ora reclamante (na sua tese é diferente a aposentação, consoante ela radique em acidente em serviço, como ele defende, ou não). Ainda assim, a falta daquela formalidade levaria à nulidade?
Não cremos.
Há quem sustente que a referida formalidade em certos procedimentos (v.g., disciplinares, sancionatórios, ablativos) assume uma dimensão qualificada, uma garantia fundamental, sem a qual nulo seria o acto praticado (v.g. Esteves de Oliveira, P. Gonçalves e P. Amorim, CPA, 2ª ed., pag. 450).
Todavia, até mesmo os autores citados consideram que no processo administrativo comum, como é o caso dos presentes autos, a falta da audiência apenas geraria anulabilidade. E nisso estamos inteiramente de acordo (sobre o assunto e precisamente na senda do que acabamos de dizer, ver Acs. do TSI de 27/02/2003, Proc. n. 78/2001; de 15/02/2007, Proc. 344/2006 e de 21/10/2004, Proc. n. 196/2003-II, entre outros).
Sem mais delongas, somos a concluir que a ausência daquela formalidade geraria anulabilidade e não nulidade.
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Posto isto, resta dizer que o prazo para o recurso seria de 30 dias, nos termos do art. 25º, al. a), do CPAC, contado da sua notificação ao interessado. E uma vez que, tal como vimos, não houve motivo suspensivo do decurso desse prazo, parece óbvia a conclusão acerca da manifesta extemporaneidade da sua interposição, com a consequente rejeição, conforme o relator singularmente bem decidiu na decisão reclamada.
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IV- Decidindo
Face ao exposto, acordam em conferência indeferir a reclamação.
Custas pela reclamante com taxa de justiça em 7 U.C. (art. 89º, n1, “in fine” do R.C.T.

TSI, 31 de Março de 2011.

(Relator) Presente
José Cândido de Pinho Vítor Manuel Carvalho Coelho
(Primeiro Juiz-Adjunto)
Lai Kin Hong

(Segundo Juiz-Adjunto)
Choi Mou Pan