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Processo nº 74/2011/A
(Autos de Suspensão de Eficácia)

Data: 19 de Maio de 2011

ASSUNTO:
- Suspensão de eficácia
- Acto negativo com conteúdo positivo
- Requisitos legais

SUMÁRIOS:
- Só há lugar a suspensão de eficácia quando os actos tenham conteúdo positivo, ou tendo conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva e a suspensão seja circunscrita a esta vertente.
- O acto administrativo que consiste na exclusão das requerentes no concurso público, é um acto negativo.
- Contudo, não é um acto puramente negativo, por ter uma vertente positiva, já que com a exclusão liminar, as requerentes ficam afastadas desde logo do concurso público e a sua proposta nunca jamais é apreciada, introduzindo assim uma alteração na situação jurídica das requerentes: deixam de ter a qualidade de concorrente.
- Para decretar a suspensão, é necessário verificar-se, cumulativamente, os seguintes requisitos:
    “a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
    b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
    c) Do processo não resultam fortes indícios de ilegalidade do recurso.” (nº 1 do artº 121º do CPAC).
O Relator,
Ho Wai Neng
















Processo nº 74/2011/A
(Autos de Suspensão de Eficácia)

Data: 19 de Maio de 2011
Requerentes: A e B
Entidade requerida: O Senhor Chefe do Executivo

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

    O Consórcio entre A e B, melhor identificados nos autos, vêm, por apenso do Recurso Contencioso Administrativo nº 74/2001, requerer a suspensão da eficácia do despacho do Senhor Chefe do Executivo, de 04/11/2010, pelo qual se indeferiu o seu recurso hierárquico, mantendo a deliberação da Comissão de Abertura das Propostas que excluíu, em 30/06/2010, a sua proposta ao Concurso Público Internacional para “Modernização, operação e manutenção da Estação de Tratamento de Águas Residuais da Península de Macau”.
Alega para tanto, no essencial, que a execução deste acto lhe causará prejuízos de difícil reparação; a suspensão da execução não acarreta qualquer prejuízo para o interesse público; e inexistem indícios de ilegalidade na interposição do recurso.
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A entidade requerida e o contra-interessado o Consórcio entre a C e D vêm opôr à pretensão das requerentes, por entenderem o acto em causa ser puramente negativo, bem como o pedido não preencher os requisitos legais previstos no nº 1 do artº 121º do CPAC.
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O Mº Pº é de parecer da improcedência do pedido.
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O Tribunal é o competente.
As partes possuem a personalidade e a capacidade judiciárias.
Mostram-se legítimas e regularmente patrocinadas.
Não há questões prévias, nulidades ou outras excepções que obstam ao conhecimento do mérito da causa.
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Factos provados:
    - Por deliberação da Comissão de Abertura das Propostas, de 30/06/2010, excluiu-se a proposta das requerentes ao Concurso Público Internacional para “Modernização, operação e manutenção da Estação de Tratamento de Águas Residuais da Península de Macau”.
- Inconformada com a decisão de exclusão, interpuseram o recurso hierárquico necessário impróprio para o Senhor Chefe do Executivo, o qual, por despacho de 04/11/2010, negou o mesmo, mantendo a deliberação da exclusão da Comissão de Abertura das Propostas.
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Enquadramento jurídico:
Dispõe o artº 120º do CPAC que só há lugar a suspensão de eficácia quando os actos tenham conteúdo positivo, ou tendo conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva e a suspensão seja circunscrita a esta vertente.
No caso em apreço, o acto administrativo em causa consiste na exclusão das requerentes no concurso público, daí que é um acto negativo.
Contudo, não é um acto puramente negativo, por ter uma vertente positiva, já que com a exclusão liminar, as requerentes ficam afastadas desde logo do concurso público e a sua proposta nunca jamais é apreciada.
Pelo exposto, se conclui que com a exclusão liminar, introduziu uma alteração na situação jurídica das requerentes: deixam de ter a qualidade de concorrente.
No mesmo sentido e a título do direito comparado, cite-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de Portugal nº 0484/03, de 19/03/2003.
Para a procedência do pedido, não basta ser um acto positivo, ou sendo negativo, com conteúdo positivo.
É ainda necessário ainda reunir outros requisitos legais, a saber:
     “a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
    b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
    c) Do processo não resultam fortes indícios de ilegalidade do recurso.” (nº 1 do artº 121º do CPAC).
    Tais requisitos devem verificar-se cumulativamente para que o requerimento seja procedente (Acórdãos do Tribunal de Última Instância, de 25.4.2001, recurso 6/2001, do Tribunal de Segunda Instância, de 22.2.2001, recurso 30-A/2001, e do Supremo Tribunal Administrativo de Portugal, de 1.7.2003, recurso 975/03).
    Basta, assim, que não se verifique um dos requisitos para que o pedido improceda.
    É precisamente o que sucede neste caso, relativamente, de forma que se nos afigura mais clara, ao requisito constante da citada alínea a).
    Vejamos.
    Como fundamento de prejuízo de difícil reparação, as requerentes alegaram o seguinte:
    “A eficácia do acto prejudica gravemente as recorrentes pois retira-lhes a possibilidade de ganharem o concurso e a adjudicação e arrecadação da receita daí resultante.
    Bem como, mesmo que a adjudicação a um dos contra-interessados venha a ser anulada posteriormente por força de decisão judicial em recurso das recorrentes e repetida a ponderação e adjudicação, as recorrentes também assim serão prejudicadas em termos de igualdade e rigor de apreciação, isto é, não disporá do mesmo tempo de maturação e ponderação face à vantagem da maturação e repetida ponderação daquelas duas que se encontram admitidas. Nem da mesma predisposição psicológica da autoridade recorrida para as ponderar favoravelmente.
    Bem como ainda as prejudica, necessária e obviamente, quer com a perda das despesas que realizou como todos as deslocações da origem (Pequim e Bélgica) a Macau e vice versa, constituição da caução do concurso, gastos com técnicos, estudos, documentos, notarizações e taxas utilizados no concurso e recurso pendente, tudo estimado em mais de um milhão de patacas, quer com as despesas que necessariamente de suportar com novos procedimentos, deslocações, preocupações e permanente atenção a qualquer sinal de perigo de definitiva adjudicação sem conhecimento das recorrentes.” (vide os artºs 10º, 11º e 13º da petição inicial).
    Em primeiro lugar, as requerentes não lograram provar que já realizaram despesas mais de um milhão de patacas para o concurso público em causa.
    Admitimos, como natural, que realizaram algumas despesas para a preparação e apresentação da proposta, só que tais despesas não têm de ser necessariamente de repetir, visto que caso vier julgar procedente o recurso contencioso interposto pelas requerentes, seria anulada a decisão de exclusão liminar e readmitida a sua proposta já apresentada, sem necessidade de apresentar qualquer nova proposta.
    Mesmo que tenham de realizar novas despesas, as mesmas, como bem notou o Dignº Magistrado do Mº Pº junto deste Tribunal, “seriam sempre perfeitamente quantificáveis e determináveis, não podendo, como tal, configurar o conceito dos almejados prejuízos de difícil reparação” (v. fls. 190 dos autos) .
    Quanto à permanente preocupação e atenção a qualquer sinal de perigo de definitiva adjudicação sem o seu conhecimento, cumpre dizer que a adjudicação definitiva de um concurso público é sempre de conhecimento público, daí que não se percebe qual a preocupação das requerentes e de que modo se constitui um prejuízo difícil de reparação.
    No que respeita aos demais alegados prejuízos, também não são difíceis de reparação.
Pois, como já referimos anteriormente, caso vier julgar procedente o recurso contencioso interposto pelas requerentes, seria anulada a decisão de exclusão liminar e a sua proposta poderia ser readmitida.
    Em consequência, a Comissão de Abertura tem o dever legal de apreciar e ponderar de novo as propostas apresentadas, com critérios objectivos, assentes na mesma base de igualdade.
    Não se pode afirmar peremptoriamente, nem é previsível, que a autoridade requerida, caso vier reavaliar as propostas em consequência da procedência do recurso contencioso, iria favorecer outras propostas.
    É necessário ter alguns elementos de suporte para o efeito, senão todas as decisões de exclusão liminar do concurso público merecem sempre a suspensão da eficácia.
    Pelo exposto, é de concluir que a pretensão das requerentes não pode proceder, sem necessidade de apreciar se estão ou não verificados os demais requisitos acima enunciados.
    *
    Por tudo o exposto, acordam, em conferência, em indeferir o presente pedido de suspensão da eficácia.
    
    Custas pelas requerentes com 6UC de taxa de justiça.
    
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    Registe e notifique.
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RAEM, aos 19 de Maio de 2011.
Ho Wai Neng Presente
José Cândido de Pinho Vítor Coelho
  Lai Kin Hong
  Vencido nos termos do declaração de voto que se junte.


Processo nº 74/2011A
Declaração de voto de vencido



Vencido por entender que in casu estamos perante uma não admissão in limine de um concorrente que, a meu ver, se trata de um acto puramente negativo sem vertente positiva, portanto insusceptível de suspensão.

RAEM, 19MAIO2011


O juiz adjunto,



Lai Kin Hong