Processo nº 276/2011 Data: 26.05.2011
(Autos de recurso penal)
Assuntos : Crime de “auxílio à imigração clandestina”, “acolhimento” e “exploração de prostituição”.
Concurso real.
Suspensão de execução da pena.
SUMÁRIO
1. O arguido, cuja conduta provada preenche os elementos típicos dos crimes de “auxílio à imigração clandestina”, “acolhimento” e “exploração de prostituição” comete tais crimes em concurso real, pois que quando comete o de “acolhimento”, consumado está o de “auxílio à imigração clandestina”, sendo também distinto o bem jurídico tutelado pelo crime de “exploração de prostituição”.
2. O artigo 48º do Código Penal de Macau faculta ao juiz julgador a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido quando :
– a pena de prisão aplicada o tenha sido em medida não superior a três (3) anos; e,
– conclua que a simples censura do facto e ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. art.º 40.º), isto, tendo em conta a personalidade do agente, as condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.
E, mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão não deverá ser decretada a suspensão se a ela se opuseram as necessidades de prevenção do crime.
O relator,
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Processo nº 276/2011
(Autos de recurso penal)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. A , arguido com os sinais dos autos, respondeu em audiência colectiva no T.J.B., vindo a ser condenado pela prática, em concurso real, de um crime de “auxílio a imigração clandestina” e outro de “acolhimento”, p. e p. pelos art. 14° n.° 1 e 15 n.° 1 da Lei n.° 6/2009, e um outro crime de “exploração de prostituição”, p. e p. pelo art. 8°, n.° 2 da Lei n.° 6/97/M, fixando-lhe o Colectivo a pena única de 2 anos e 9 meses de prisão; (cfr., fls. 359-v a 360-v e 432 a 434).
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Do assim, decidido, e porque inconformado, o arguido recorreu para, em sede da sua motivação, produzir as conclusões seguintes:
“1.) O recorrente A foi condenado na pena de 2 anos e 3 meses de prisão pela prática, em co-autoria e de forma consumada, de 1 crime de auxílio à imigração ilegal p.p. pelo n.° 1 do art.° 14.° da Lei n.° 6/2004;
2.) foi condenado na pena de 7 meses de prisão pela prática, em autoria e de forma consumada, de 1 crime de acolhimento p.p. pelo n.° 1 do art.° 15.° da Lei n.° 6/2004;
3.) foi condenado na pena de 9 meses de prisão pela prática, em autoria e de forma consumada, de 1 crime de exploração de prostituição p.p. pelo n.° 2 do art.° 8.° da Lei n.° 6/97/M;
4.) em cúmulo jurídico, o recorrente foi condenado numa única pena de 2 anos e 9 meses de prisão efectiva.
5.) O recorrente entende que o tribunal a quo violou materialmente, na medida de pena, o art.° 40.° e o art.° 65.° do Código Penal;
6.) sendo assim, é notoriamente demasiado excessiva a pena de 2 anos e 3 meses de prisão aplicada pela prática, em autoria e de forma consumada, de 1 crime de auxílio à imigração ilegal p.p. pelo n.° 1 do art.° 14.° da Lei n.° 6/2004;
7.) é notoriamente demasiado pesa e excessiva a pena de 7 meses de prisão aplicada pela prática, em autoria e de forma consumada, de 1 crime de acolhimento p.p. pelo n.° 1 do art.° 15.° da Lei n.° 6/2004;
8.) é notoriamente demasiado pesa e excessiva a pena de 9 meses de prisão aplicada pela prática, em autoria e de forma consumada, de 1 crime de exploração de prostituição p.p. pelo n.° 2 do art.° 8.° da Lei n.° 6/97/M.
9.) O crime de auxílio à imigração ilegal e o crime de acolhimento devem ser absorvidos pelo crime de exploração de prostituição.
10.) Pelo que deve ser absolvido do crime de auxílio à imigração ilegal e do crime de acolhimento e fixar de novo uma única pena adequada.
11.) Se não fosse assim, o tribunal a quo violou materialmente o n.° 2 do art.° 72.° do Código Penal ao aplicar o concurso dos 3 crimes.
13.) Neste sentido, o recorrente pede que seja condenado na pena mais leve em cúmulo jurídico;
14.) O recorrente entende que o tribunal a quo, ao proferir ao acórdão recorrido, violou materialmente o art.° 48.° do Código Penal, isto é, determinou erradamente que não concedesse ao recorrente a suspensão da execução da pena condenada.
15.) o recorrente entende que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, pelo que deve suspender a execução da pena aplicada”; (cfr., fls. 376 a 381 e 435 a 441).
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Respondendo, considera o Exmo. Magistrado do Ministério Público que:
“1. Segundo a moldura da pena aplicável aos crimes praticados pelo recorrente, não há quaisquer penas concretas que lhe foram aplicadas são superiores a um terço do limite máximo, pelo que não devem ser consideradas como excessivas. Pelo contrário, é notoriamente demasiado leve a pena aplicada ao crime de exploração de prostituição cujas circunstâncias são mais graves.
2. O tipo do crime de exploração de prostituição é diferente a os do crime de auxílio à imigração ilegal e do crime de acolhimento, pelo que o primeiro não pode absolver os outros dois crimes.
3. A condenação da única pena de 2 anos e 9 meses de prisão após a aplicação do concurso dos 3 crimes compreende no limite definido previsto no n.° 2 do art. o 71.°do Código Penal (2 anos e 3 meses a 3 anos e 7 meses), o facto esse só mostra que a punição é demasiado leve mas nada excessiva.
4. As circunstâncias e a culpabilidade dos crimes praticados pelo recorrente são graves, a simples censura do facto e a ameaça da prisão. não podem realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição; por outro lado, o número dos respectivos crimes sujeita à tendência de aumento em Macau, tomando em conta as necessidades de prevenção geral e prevenção especial, o recorrente não possui requisitos materiais da concessão de suspensão da execução de pena.
5. O acórdão recorrido não violou o art. 40.°, art. 48.°, art. 65.° e art. 71.° do Código Penal”; (cfr., fls. 385 a 388-v e 442 a 449).
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Neste T.S.I., e em sede de vista juntou o Exmo. Representante do Ministério Público o seguinte douto Parecer:
“Para além de pretensa consunção de ilícitos, mostra-se o recorrente - inconformado com a medida concreta da pena que lhe foi aplicada, quer parcialmente, quer em termos de cúmulo, pugnando ainda pela suspensão de execução da mesma.
Mas, sem qualquer razão, conforme bem expressa a Exma colega junto da 1ª instância, a cujas brilhantes considerações aderimos e nos dispensaremos de reproduzir.
Desde logo, mal se compreende como sustentar que o crime de exploração da prostituição consome os de imigração ilegal e acolhimento, quando, manifestamente, nos encontramos perante infracções com substancialmente diferentes elementos típicos, a protegerem diferentes valores e interesses, não sobreponíveis, existindo, como é óbvio, concurso real e não aparente entre as mesmas.
Depois, atentos os circunstancialismos concretamente apurados relativamente a cada um dos referidos ilícitos, cremos ter-se usado de dosimetria penal justa e adequada, quedando-se as penas parcelares aquém de 113 das respectivas molduras penais abstractas, mostrando-se efectuado uso correcto e sensato das regras e punição do concurso de crimes estipuladas no art° 71°, CPM.
Finalmente, atenta a natureza específica dos crimes imputados e o seu aumento exponencial em Macau, seja na vertente da imigração ilegal e acolhimento, seja na da exploração da prostituição, quiçá, devido ao desenvolvimento acelerado da Região, devido, designadamente, ao sector do jogo, ocorrem sérias necessidades de prevenção geral deste tipo de crimes, o que, aliado ao facto de se não perspectivar juízo de prognose favorável relativo ao recorrente, à luz de considerações exclusivas de execução da prisão, indica que a simples censura dos factos e a mera ameaça daquela não realizarão, com alto grau de probabilidade, de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, pelo que bem se agiu ao não determinar a almejada suspensão de execução da pena.
Razões por que se entende não merecer provimento o presente recurso”; (cfr., fls. 451 a 452).
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Passa-se a decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Estão dados como provados os factos seguintes:
“1. Em18 de Setembro de 2009, a arguida B, com o registo civil e o bilhete de identidade da República Popular da China de C, foi ao departamento competente no Interior da China tratar e recebeu com sucesso um passaporte da República Popular da China n.° GXXX, cuja titular é C.
A arguida B sabia muito bem naquela altura que os dados de identificação constantes do referido passaporte não eram os dados de identificação verdadeiros dela.
3. Posteriormente, a arguida B entrou e saiu de Macau por várias vezes mediante o referido passaporte da RPC. N.° GXXX (vd. a fls. 41 dos autos).
4. No início de 2010, a fim de receber protecção na altura de exercício de prostituição em Macau, a arguida B contactou um homem que tinha conhecido pelo Dezembro de 2008, isto é, o arguido A. O arguido A organizou logo que a arguida B morasse num quarto da fracção em XX.° andar X do Edf. XX da Rua de XX.
5.Todos os dias, à noite, quando a arguida B pretendia buscar clientes nas ruas para prestar-lhes serviço sexual, o arguido A ia primeiramente fazer uma observação na rua, só chamou a arguida B sair buscar clientes quando não havia nenhuma polícia ao redor, e por outro lado, o arguido A prestava vigilância escondidamente durante o processo e avisou imediatamente a arguida B quando havia polícia, para que a arguida B tivesse tempo suficiente ir se embora e escapar-se da intercepção da polícia.
6. Mais tarde, o arguido A e a arguida B passaram a ser namorados.
7. Por volta de Abril de 2010, a prima D da colega de escola E da arguida B, telefonou à arguida B e pediu-lhe para ajudá-la a exercer prostituição em Macau.
8. Com o consentimento da arguida B, ela e o arguido A foram buscar D para Zhuhai no Aeroporto Baiyun de Guangzhou e deixaram-na passar uma noite no Hotel XX (XX酒店) que fica em XX de XX de Zhuhai.
9. Naquela altura, a arguida B chegou a acordo com D que a última precisou de pagar ao arguido A $200 adquirido através de prostituição a título das despesas de vida, incluindo a renda e as despesas para comprar preservativos.
10. A fim de facilitar D a entrar e sair dos casinos de Macau e evitar a intercepção da polícia, em 20 de Abril de 2010, de manhã, o arguido A ajudou D tratar dum Salvo-conduto para deslocação a Hong Kong e Macau da República Popular da China mediante um indivíduo não identificado, por preço de RMB$700,00. Para este efeito, o arguido A mandou a arguida B a acompanhar D a tirar fotografia na loja de revelação e fotografia, deu depois uma fotografia de D ao homem supra referido.
11. Ao meio dia do mesmo dia, o arguido A adquiriu um Salvo-conduto para deslocação a Hong Kong e Macau da República
Popular da China n.° WXXX, cuja titular era F (ora apreendido, vd. a fls, 17 dos autos).
12. Naquela altura, o arguido A sabia perfeitamente que, salvo a fotografia, os restantes dados de identificação daquele Salvo-conduto não são os dados de identificação verdadeiros de D.
13. Posteriormente, o arguido A entregou a D o Salvo-conduto acima referido.
14. Pelas 15h00 do mesmo dia, o arguido A telefonou uma mulher que se chama “Ah G (亞G)” para prestar auxílio a D a imigrar clandestinamente em Macau, para esse efeito, gastou-lhe RMB$5.000,00.
15. Pelas 23h00 do mesmo dia, um homem não identificado levou D a uma costa desconhecida em Zhuhai, e depois, D entrou clandestinamente em Macau de barco conduzido por outro homem não identificado. O arguido A e a arguida B entraram antecipadamente em Macau a esperarem com os documentos legais.
16. Por volta das 2h00 de 21 de Abril de 2010, tendo recebido o telefonema de “Ah G”, o arguido A foi buscar D à porta do Hotel XX e organizou-a morar em XX.° andar X do Edf. XX da Rua de XX.
17. Naquela altura, o arguido A sabia muito bem que D não detinha documento de identificação para a permanência legal em Macau.
18. No mesmo dia, de manhã, os arguidos A e B levaram D ao redor do Hotel XX e Hotel XX em Nape para ensiná-la os métodos de procurar clientes a quem prestar serviço sexual e exigiram-na a pedir-lhes HKD$500,00 ou MOP$500,00 após a prestação de serviço.
19. Ao mesmo tempo, a arguida B forneceu alguns preservativos a D, entregou-lhe ainda as cartas nas quais estavam escritos o seu número de telefone: XXXXX e a frase “Boa Sorte” com o intuito de contactar com os clientes. Os telefonemas foram atendidos com o auxílio da arguida B para que D pudesse combinar com os clientes lugar de prestação de serviço sexual.
20. Quando D foi buscar clientes nas ruas, o arguido A prestou escondidamente vigilância, observando a situação da rua para verificar se houvesse polícias.
21. D deu ao arguido A todo o dinheiro adquirido através de prostituição para guardá-lo. Até 28 de Abril de 2010, D entregou ao arguido A a quantia de MOP$10.000,00 adquirida através de prostituição.
22. Mais tarde, D queria voltar imediatamente para o Interior da China, mas A pediu-a para ficar mais uma semana, por isso, os dois meteram-se em discussão.
23. Pelas 3h40 de 30 de Abril de 2010, D telefonou ao Corpo de Polícia de Segurança Pública para recorrer ajuda. O Corpo de Polícia de Segurança Pública entregou posteriormente D à Polícia Judiciária para efeitos de investigação.
24. Pelas 11h30 do mesmo dia, os agentes da PJ procederam à investigação na fracção de XX.0 andar X do Edf. XX da Rua de XX e descobriram no quarto a arguida B. Naquela altura, a arguida B mostrou aos agentes. da PJ o mencionado passaporte da RPC n.° XXX, cuja titular era C, como o seu documento de identificação. Posteriormente, os agentes encontraram na gaveta do toucador algumas cartões escritas o número de telefone da arguida: XXXXX e imprimida a frase “Boa sorte”, foram encontrados ainda 32 preservativos na gaveta da guarda-roupa no quarto (ora apreendidos, vd. as fls. 35 e 36 dos autos), sendo assim, os agentes levaram a arguida B à Polícia para efeitos de investigação.
25. Mediante o sistema automático de impressões digitais - AFIS, a Polícia aprovou que a arguida B e C eram a mesma pessoa (vd. a fls. 26 dos autos).
26. Além disso, os agentes encontraram na posse da arguida B um telemóvel de marca XX, de modelo XXC e um cartão SIM cujo número de telefone era XXXXX, um registo civil da RPC cujo titular era H, um bilhete de identidade da RPC cuja titular era C, o mencionado passaporte da RPC cuja titular era C, 4 cartões onde estavam escrito o número de telefone da arguida B: XXXXX e imprimida a frase “Boa sorte”, et.c (ora apreendidas, vd. as fls. 38 a 44 dos autos).
27. No mesmo dia, o arguido A foi interceptado pelo Corpo de Polícia de Segurança Pública e foi levado para a Polícia Judiciária. Os agentes da PJ encontraram posteriormente na posse do arguido A 6 fotografias que eram iguais a a do salvo-conduto para deslocação a Hong Kong e Macau da República Popular da China n.° WXXX supramencionado, com o nome da titular F (ora apreendidas, vd. as fls, 58 e 59 dos autos).
28. Após a autenticação da Polícia Judiciária, foi provado que o salvo-conduto para deslocação a Hong Kong e Macau da República Popular da China n.° WXXX, com o nome de titular F era falsificado (vd. o relatório pericial constante das fls, 127 a 133 dos autos).
29. A arguida B, de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que os dados de identificação constantes do referido passaporte da RPC n.° GXXX não correspondiam aos dela, ainda usava por várias vezes o documento como se fosse seu titular, com a intenção de enganar a Força de Segurança Pública e imigrar clandestinamente na RAEM.
30. O arguido A, de forma livre, voluntária e consciente, falsificou, mediante outrem, o salvo-conduto para deslocação a Hong Kong e Macau da República Popular da China que não correspondia aos dados pessoais verdadeiros de D, com a intenção de enganar a Força de Segurança Pública para que D pudesse imigrar clandestinamente na RAEM.
31. As condutas dos arguidos B e A prejudicaram a fé pública dos respectivos documentos assim como a segurança e a confiança que possuíam na relação geral, além disso, prejudicaram ainda a confiança da RAEM e terceiro na autenticidade e legalidade nos respectivos documentos, puseram em causa os interesses da RAEM e do terceiro.
32. O arguido A, de forma livre, voluntária e consciente, junto com outrem, auxiliou D entrar na RAEM sem passar pelos postos fronteiriços da China e Macau, com o intuito de fugir da examinação da Força de Segurança de Macau, actos esses violaram as disposições jurídicas contra a imigração clandestina.
33. O arguido A, de forma livre, voluntária e consciente, acolheu D na fracção supra referida apesar de saber perfeitamente que esta imigrou clandestinamente em Macau.
34. O arguido A, de forma livre, voluntária e consciente, auxiliou a arguida B a exercer prostituição em Macau.
35. Os arguido A e B, de forma livre, voluntária e consciente, com intenção de obterem para si benefício ilegítimo, agindo de comum acordo e dividindo tarefas entre si, ajudaram D a exercer prostituição em Macau.
36. Os dois arguidos sabiam muito bem que as tais condutas eram proibidas e punidas pela lei.
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Para além disso, na audiência de julgamento, foram provados ainda:
Segundo os registos criminais, a 1ª arguida, tal como o 2.° arguido, é delinquente primária em Macau.
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(II) Factos não provados:
Por volta de Maio de 2009, a arguida B adquiriu, através de um homem com apelido de I, por preço de RMB$3.000,00, o registo civil e o bilhete de identidade da República Popular da China de C.
(III) Convicção do Tribunal
O 2.° arguido A confessou na audiência que, através de “Ah G”, ajudou a testemunha D a falsificar o Salvo-conduto da República Popular da China em Zhuhai e auxiliou-a a imigrar clandestinamente em Macau, organizou ainda o alimento e o alojamento para ela em Macau. Ao mesmo tempo, o 2.° arguido confessou ainda que, era uma vez, comprou preservativos a favor da D e ajudou-a guardar dinheiro cada dia. No entanto, o 2.° arguido negou que tinha explorado a prostituição da 1ª arguida B e da testemunha D.
Nesse sentido, constituem-se factos provados a declaração de audiência do 2.° arguido A, o auto de declaração para memória futura feita pela testemunha D no Juízo de Instrução Criminal, o depoimento da testemunha e os respectivos documentos constantes dos autos, são suficientes as provas para reconhecer os factos” ;(cfr., fls. 354 a 356-v e 414 a 424).
Do direito
3. Vem o arguido A recorrer do Acórdão do Colectivo do T.J.B. que o condenou pela prática, em concurso real, de um crime de “auxílio a imigração clandestina” e outro de “acolhimento”, p. e p. pelos art. 14° e 15 da Lei n.° 6/2009, e um outro crime de “exploração de prostituição”, p. e p. pelo art. 8°, n.° 2 da Lei n.° 6/97/M, fixando-lhe o Colectivo a pena única de 2 anos e 9 meses de prisão.
Considera que o referido veredicto padece de erro na qualificação jurídica da sua conduta que do julgamento resultou provada e que excessivas são as penas parcelares e única, pedindo, ainda, a suspensão da execução desta última.
Como em sede de exame preliminar se deixou consignado, (cfr., fls. 453), cremos que nenhuma razão tem o recorrente, sendo pois de se considerar o recurso “manifestamente improcedente”, e, por isso, de rejeitar; (cfr., art. 409°, n.° 2, al. a) e art. 410°, n.° 1 do C.P.P.M.).
Passa-se a expor este nosso entendimento.
–– Quanto à “qualificação jurídica”.
Pois bem, é o recorrente de opinião que não devia ser condenado pela prática, em concurso real, de um crime de “auxílio a imigração clandestina” e outro de “acolhimento”, p. e p. pelos art. 14° e 15 da Lei n.° 6/2009, e um outro crime de “exploração de prostituição”, p. e p. pelo art. 8°, n.° 2 da Lei n.° 6/97/M, pois que considera que “o crime de auxílio à imigração ilegal e o crime de acolhimento devem ser absorvidos pelo crime de exploração de prostituição”; (cfr., concl. 9).
Ora, nos termos do art. 14° da Lei n.° 6/2009, comete o crime de “auxílio à imigração clandestina”:
“1. Quem dolosamente transportar ou promover o transporte, fornecer auxílio material ou por outra forma concorrer para a entrada na RAEM de outrem nas situações previstas no artigo 2.º, é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos.
2. Se o agente obtiver, directamente ou por interposta pessoa, vantagem patrimonial ou benefício material, para si ou para terceiro, como recompensa ou pagamento pela prática do crime referido no número anterior, é punido com pena de prisão de 5 a 8 anos”.
Por sua vez, comete o crime de “acolhimento”:
“1. Quem dolosamente acolher, abrigar, alojar ou instalar aquele que se encontre em situação de imigração ilegal, ainda que temporariamente, é punido com pena de prisão até 2 anos.
2. Se o agente obtiver, directamente ou por interposta pessoa, vantagem patrimonial ou benefício material, para si ou para terceiro, como recompensa ou pagamento pela prática do crime referido no número anterior, é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos”.
Como se vê, no crime de “auxílio à imigração clandestina” pune-se a conduta daquele que promove, proporciona ou presta auxílio à “entrada em Macau de imigrante clandestino”, enquanto que no crime de “acolhimento” pune-se a conduta desenvolvida no sentido de “permitir ou facilitar a permanência de imigrante clandestino que já se encontra em Macau”.
Assim, não parece de entender que a conduta do ora recorrente não integre a prática de ambos os ditos crimes, até mesmo porque aquando do cometimento do segundo, (“acolhimento”), consumado já estava o primeiro, (de “auxílio”).
No que toca ao crime de “exploração de prostituição”, é o mesmo previsto e punido pelo art. 8° da Lei n.° 6/97/M, onde se prescreve que:
“1. Quem aliciar, atrair ou desviar outra pessoa, mesmo com o acordo desta, com vista à prostituição, ou que explore a prostituição de outrem, mesmo com o seu consentimento, é punido com pena de prisão de 1 a 3 anos.
2. Quem, com remuneração ou sem ela, angariar clientes para pessoas que se prostituem ou, por qualquer modo, favorecer ou facilitar o exercício da pros-tituição, é punido com pena de prisão até 3 anos.
3. A tentativa é punível”.
E, atento o assim estatuído, não vemos como ou porque motivos, (que nem o recorrente explicita), se poderá entender que este último crime de “exploração de prostituição” absorve (ou consome) os de “auxílio” e “acolhimento”, sendo antes de sufragar na íntegra o entendimento pelos Exmos. Representantes do Ministério Público assumido sobre a questão.
Aliás, também (recentemente) confirmou este T.S.I. uma condenação idêntica à ora em causa, (cfr., o Acórdão de 11.03.2010, Processo n.° 185/2010), pelo que ociosas nos parecem mais alongadas considerações.
–– Quanto “à(s) pena(s)”.
Pelo crime de “auxílio” fixou o Tribunal a quo a pena de 2 anos e 3 meses de prisão, pelo de “acolhimento” a de 7 meses de prisão e pelo de “exploração de prostituição” a de 9 meses de prisão.
E, atentas as molduras penais previstas para estes crimes – “2 a 8 anos”, “até 2 anos” e “ até 3 anos de prisão”, respectivamente – e ponderando na factualidade dada como provada, cabe dizer que excessivas não são tais penas parcelares, pois que se nos apresentam em total harmonia com o estatuído no art. 40° e 65° do C.P.M., e ainda próximas do seu limite mínimo.
Refira-se também que o ora arguido impugna tais penas considerando-as inflaccionadas, mas sem adiantar um único argumento para tal “conclusão”.
Assim, motivos não há para se alterar o decidido.
No que toca à pena única, a mesma apresenta-se-nos também em sintonia com os critérios do art. 71° do C.P.M., reflectindo, adequadamente, “os factos e a personalidade do agente”.
Assim, e certo sendo que no ponto em questão também nada adianta o recorrente, mais não se mostra de dizer.
Por fim, quanto à pretendida “suspensão da execução da pena”.
Ora, sobre a questão tem este T.S.I. entendido que:
“1. O artigo 48º do Código Penal de Macau faculta ao juiz julgador a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido quando :
– a pena de prisão aplicada o tenha sido em medida não superior a três (3) anos; e,
– conclua que a simples censura do facto e ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. art.º 40.º), isto, tendo em conta a personalidade do agente, as condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.
E, mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão não deverá ser decretada a suspensão se a ela se opuseram as necessidades de prevenção do crime”; (cfr., v.g., Ac. recente de 27.01.2011, Proc. n° 781/2009, do ora relator).
No caso, não obstante permitir a pena em questão a pretendida suspensão, atenta a personalidade do recorrente e ponderando nas necessidades de prevenção criminal, inviável se nos mostra de considerar viável a conclusão de que “a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades de punição”.
Posto isto, impõe-se a rejeição do recurso.
Decisão
4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam rejeitar o recurso; (cfr., art. 409°, n.° 2, al. a) e 410, n.° 1 do C.P.P.M.).
Pagará o recorrente 5 UCs de taxa de justiça, e como sanção pela rejeição do seu recurso, o equivalente a 4 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 4 do C.P.P.M.).
Honorários ao Exm° Defensor no montante de MOP$800.00.
Macau, aos 26 de Maio de 2011
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José Maria Dias Azedo
(Relator)
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Chan Kuong Seng
(Primeiro Juiz-Adjunto)
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Tam Hio Wa
(Segundo Juiz-Adjunto)
Proc. 276/2011 Pág. 26
Proc. 276/2011 Pág. 1