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Processo n.º 783/2009 Data do acórdão: 2011-7-14
(Autos de recurso penal)
  Assuntos:
  – rejeição do recurso
  – art.o 410.o, n.o 3, do Código de Processo Penal
  – passado criminal
  – suspensão de execução da inibição de condução
  – condutor de profissão
  – art.o 109.o, n.o 1, da Lei do Trânsito Rodoviário
S U M Á R I O
1. O art.o 410.o, n.o 3, do Código de Processo Penal de Macau permite que “Em caso de rejeição do recurso, o acórdão limita-se a... especificar sumariamente os fundamentos da decisão”.
2. Devido sobretudo ao passado criminal do arguido, mesmo que trabalhe, segundo alega, como condutor de profissão, não se pode satisfazer o seu desejo de suspensão da execução da pena de inibição de condução sob a égide do art.o 109.o, n.o 1, da Lei do Trânsito Rodoviário.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 783/2009
(Autos de recurso penal)
Recorrente: A




ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I - RELATÓRIO
Inconformado com a sentença proferida a fls. 21 a 23 dos autos de Processo Sumário n.° CR1-09-0258-PSM do 1.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, que o condenou como autor material de um crime consumado doloso de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.o 90.o, n.o 1, da vigente Lei do Trânsito Rodoviário (Lei n.o 3/2007, de 7 de Maio) (doravante abreviada como LTR), em quatro meses de prisão efectiva, e na inibição de condução automóvel por um ano e três meses, veio o arguido A, aí já melhor identificado, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para:
– imputar à decisão recorrida a errada interpretação da norma incriminadora do art.o 90.o da LTR, com alegada indevida consideração pela Mm.a Juíza a quo, aquando da medida concreta da pena de prisão, do grau de “dolo” dele na prática do crime, aí previsto, de condução em estado em embriaguez (por entender ele que não sendo este delito um crime doloso, mas sim necessariamente negligente por força do disposto no art.o 93.o, n.o 3, alínea 1), da mesma LTR, deveria ter sido achada uma pena mais leve do que aquela por que vinha condenado);
– assacar ao Tribunal recorrido a violação do disposto no art.o 44.o, n.o 1, do Código Penal de Macau (CP) (por ter decidido em não substituir a prisão pela multa), ou, subsidiariamente, a violação do art.o 48.o, n.o 1, do CP (por ter decidido em impor prisão efectiva);
– para além de pretender, fosse como fosse, a atenuação especial da pena, nos termos do art.o 66.o, n.o 2, alínea c), do CP, atenta a sua já confissão integral e sem reservas dos factos prestada à luz do art.o 325.o do CPP na audiência de julgamento em primeira instância;
– e, por fim, acusar ao mesmo Tribunal a violação do art.o 109.o da LTR (por não ter decidido em suspender a execução da pena de inibição de condução, enquanto ele era sobretudo um condutor de profissão);
– termos em que pediu ao presente Tribunal ad quem a redução da pena e a substituição da pena de prisão pela multa, e, subsidiariamente, a suspensão de execução da pena de prisão aplicada na sentença, e, fosse como fosse, a suspensão da pena de inibição de condução (cfr. o teor da motivação do recurso, apresentada a fls. 32 a 51 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu o Ministério Público no sentido de manutenção do julgado (cfr. a resposta de fls. 55 a 57v).
Subidos os autos, emitiu o Digno Procurador-Adjunto parecer (a fls. 82 a 84), pugnando até pela rejeição do recurso devido à manifesta improcedência do mesmo.
Feito subsequentemente o exame preliminar pelo então M.mo Juiz Relator (em sede do qual se entendeu dever o recurso ser rejeitado em conferência por manifestamente improcedente) e corridos os novos vistos legais por causa da recente especialização do TSI, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
O art.o 410.o, n.o 3, do Código de Processo Penal de Macau (CPP) permite que “Em caso de rejeição do recurso, o acórdão limita-se a... especificar sumariamente os fundamentos da decisão”.
E é isto que se faz agora, sendo, aliás, de notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver apenas as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
E como ponto de partida, é de atender a toda a matéria de facto já descrita como provada no texto da sentença recorrida (cfr. o art.o 631.o, n.o 6, do Código de Processo Civil de Macau, ex vi do art.o 4.o do CPP).
Desde já, mostra-se equívoca a tese jurídica preconizada pelo recorrente a respeito da alegada “natureza exclusivamente negligente” do crime de condução em estado de embriaguez tipificado no art.o 90.o da LTR.
É que esta norma incriminadora não pode ser mais clara: no seu n.o 1, está tipificado o crime como um delito naturalmente doloso, e no seu n.o 3, está consagrada expressamente a também punibilidade da conduta descrita no n.o 1, quando praticada em negligência.
E a previsão expressa desse n.o 3 resulta da exigência do princípio plasmado no art.o 12.o do CP, segundo o qual “Só é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos especialmente previstos na lei, com negligência”.
Contra esta constatação, obviamente não pode o recorrente invocar o estatuído no art.o 93.o, n.o 3, alínea 1), da LTR, pois esta alínea só visa concretizar uma das circunstâncias (qual seja, “a condução em estado de embriaguez ou sob influência de álcool”) em que a moldura penal de um determinado crime cometido por negligência no exercício da condução se encontre legalmente agravada no limite mínimo da pena com a metade da sua duração máxima, se sanção mais grave não for aplicável por força de outra disposição legal.
Por exemplo, o crime negligente de ofensa grave à integridade física é (em alternativa da pena de multa) punível com pena de prisão de um mês a três anos, mas se for cometido no exercício da condução em estado de embriaguez, então já passa a ser punível com pena de prisão de um ano e sete meses a três anos.
Aliás, se valesse a tese do recorrente, então o crime de condução em estado de embriaguez, quando for cometido em negligência, passaria a ser forçosamente sempre punível com a pena de dois anos e seis meses a três anos de prisão, o que seria mais penosa para o próprio recorrente. Por aí se vê o absurdo da tese do recorrente.
Em suma, e em face da matéria de facto já dada por provada na sentença recorrida, o recorrente praticou indubitavelmente o crime de condução em estado de embriaguez na sua forma dolosa, pelo que a pena de quatro meses de prisão achada pela Mm.a Juíza a quo, tendo em conta todas as circunstâncias já apuradas em primeira instância (das quais se sobressaem a taxa, relativamente não baixa, de álcool detectada nesta vez no sangue do recorrente (1,93 gramas por litro), e as duas antecedentes criminais do recorrente como autor do crime de usura para jogo e do crime de violação de proibições impostas por sentença, ambos punidos com pena de prisão suspensa na sua execução), para além das elevadas necessidades de prevenção, pelo menos, geral deste delito em Macau, já não admite mais margem para redução.
Igualmente, devido às naturais exigências de prevenção do cometimento, pelo recorrente, de crime congénere no futuro, não se pode accionar o mecanismo de substituição, previsto no art.o 44.o, n.o 1, do CP, dessa pena de quatro meses de prisão pela pena de multa.
Por outra banda, também se vislumbra inviável qualquer hipótese de atenuação especial da pena, visto que atentas as ditas antecedentes criminais do recorrente, há necessidade de aplicação da pena na sua dose “normal” (cfr. o critério material plasmado na parte final do n.o 1 do art.o 66.o do CP), sendo certo que a verificada confissão integral e sem reservas dos factos não tem a pretendida virtude de fazer atenuar especialmente a pena correspondente ao crime de condução em estado em embriaguez, porquanto o cometimento deste crime pelo recorrente foi detectado em flagrante delito, mediante teste da taxa de álcool no sangue.
Assim sendo, ficam intactas as penas de quatro meses de prisão e de um ano e três meses de inibição de condução, impostas ao recorrente na sentença recorrida.
Outrossim, também há-de cair por terra a pretensão de suspensão da execução da pena de prisão e da pena de inibição de condução, uma vez que atento o passado criminal do recorrente, não se pode acreditar que nesta vez, a simples censura dos factos e a ameaça da prisão já consigam prevenir que ele venha a praticar mais crime no futuro, por um lado, e por outro, também sobretudo devido ao seu passado criminal, mesmo que trabalhe, segundo alega, como condutor de profissão, não se pode satisfazer o seu desejo de suspensão da execução da pena de inibição de condução sob a égide do art.o 109.o, n.o 1, da LTR.
Em síntese, é de rejeitar o recurso, por a decisão recorrida não padecer de nenhuma das ilegalidades esgrimidas pelo recorrente.
III – DECISÃO
Dest’arte, acordam em rejeitar o recurso, manifestamente improcedente, do arguido A.
Custas pelo arguido, com seis UC de taxa de justiça e cinco UC de sanção pecuniária (referida no art.o 410.o, n.o 4, do CPP).
Passe mandados de detenção contra o arguido para efeitos de execução da pena de prisão.
Macau, 14 de Julho de 2011.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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José Maria Dias Azedo
(Segundo Juiz-Adjunto)



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