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Processo nº 434/2011 Data: 14.07.2011
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Crime de “tráfico de estupefacientes”.
Medida da pena.




SUMÁRIO

1. Atenta a moldura penal para o crime de “tráfico de estupefacientes”, (3 a 15 anos de prisão), censura não merece a pena de 4 anos e 9 meses de prisão imposta a um arguido que, após expulso de Macau, aqui volta, clandestinamente, para, dias depois, dedicar-se à prática de tal crime em co-autoria com um outro arguido, vindo a ser surpreendido com porções de Ketamina para cedência a terceiros.


O relator,

______________________
José Maria Dias Azedo


Processo nº 434/2011
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Em audiência colectiva no T.J.B. respondeu A, (1ª) arguida com os restantes sinais dos autos.

A final, e na total procedência da acusação, foi a arguida condenada, na pena única de cinco (5) anos e dois (2) meses de prisão; (cfr., fls. 583 a 584 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformada, a arguida recorreu, pedindo (apenas) a redução da pena parcelar de 4 anos e 9 meses de prisão que lhe foi imposta pelo crime de “tráfico de estupefacientes” p. e p. pelo art. 8°, n.° 1 da Lei n.° 17/2009; (cfr., fls. 627 a 628-v).

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Respondendo, diz o Exmo. Magistrado do Ministério Público que se deve julgar improcedente o recurso; (cfr., fls. 632 a 634).

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Em sede de vista juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:

“Subscrevemos as criteriosas explanações do nosso Exmo. Colega.
E nada temos, de relevante, a acrescentar-lhes.
No âmbito do n°. 2 do art. 65° do C. Penal, desde logo, nada se apurou em benefício da recorrente.
Em termos agravativos, por seu turno, impõe-se realçar a sua condenação anterior, bem como a variedade de droga detida pela mesma.
Acresce, também, a situação de co-autoria que presidiu à respectiva actuação.
Quanto aos fins das penas, são elevadas, como é sabido, as exigências de prevenção geral.
Tudo ponderado, em suma, a pena impugnada não pode deixar de ter-se como justa e equilibrada.
E o mesmo se deve dizer, igualmente, da pena única.
Deve, pelo exposto, o recurso ser julgado manifestamente improcedente (com a sua consequente rejeição, nos termos dos arts. 407°, n° 3-c, 409°, n° 2-a e 410°, do C. P. Penal)”; (cfr., fls. 664 a 665).

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Cumpre decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados os factos seguintes:

“Em 09 de Janeiro de 2007, quando a arguida A foi interceptada por guardas de PSP, exibiu um passaporte da República Popular da China n°. G1887XXXX e declarou ser A, filha de B e de mãe incógnita, natural de Henan, bem como apôs as impressões digitais e assinou num documento relativo ao arquivo de identidade das instalações de PSP para confirmação.

De facto, o nome verdadeiro da arguida A é A e não XXX, o nome do pai era C e não B, a arguida sabia que o nome da sua mãe era D e o facto de que não sabia do nome da sua mãe foi falso. A arguida nasceu na Província de Hubei e não na de Henan, a referida arguida sabia bem da sua identidade verdadeira.

O nome e o local de nascimento da arguida A constantes no supracitado documento de identificação eram identidade falsa, a citada arguida sabia perfeitamente que tais dados do respectivo documento de identificação eram identidade falsa.
Em 20 de Maio de 2009, a arguida A foi expulsa do território e interdida de entrar em Macau no período de seis anos, desde 21 de Maio de 2009 a 20 de Maio de 2015.
No mesmo dia, a arguida A assinou a notificação da Ordem de Interdição de Reentrada emitida por PSP, a dita arguida sabia muito bem que foi notificada de ser proibida reentrar em Macau no período supracitado, sob pena de ser punida com pena de prisão.
Em 16 de Setembro de 2009, pelas 01h30, a arguida A reentrou clandestinamente em Macau, de barco, de Zhuhai.
Em 23 de Setembro de 2009, o arguido E alugou em nome do seu amigo - a testemunha F, um quarto n°. XXX do Hotel “XXX” sito em Macau, na Rua das XXX, com o objectivo de guardar os estupefacientes destinados principalmente à venda.
No mesmo dia, o arguido E deixou a A residir no supracitado quarto de hotel.
Depois, os arguidos E e A, de comum acordo e em divisão de tarefas, venderam em Macau os estupefacientes a outra pessoa.
Em 25 de Setembro de 2009, pelas 02h05, na intersecção da Avenida de Artur Tamagnini Barbosa e da Rua de Lei Pou Chon, guardas de PSP interceptaram a arguida A que tinha comportamento suspeito.
Os guardas de PSP descobriram em flagrante um saco de plástico transparente na mão direita da arguida A, contendo no interior sete pacotes de pós brancos embrulhados por lenço de papel, bem com apreenderam na posse da arguida A cento e cinquenta patacas e um telemóvel.
Após o exame laboratorial, confirmou-se que os pós brancos supracitado com peso líquido de 7.322g. continham substância de “Ketamina” regulada pela Tabela II-C da Lei n°. 17/2009 (após a análise quantitativa, revelou-se que a percentagem da composição de “Ketamina” era de 63.53 %, com peso de 4.658g.).
Os estupefacientes supracitados foram entregues pelo arguido E à arguida A em 25 de Setembro de 2009, pelas 00h30, em frente do Hotel “XXX” sito na Rua das XXX, para que a última pudesse levá-los para o Restaurante Mc'Donalds situado em XXX e vender a outra pessoa por preço de mil patacas.
O telemóvel supracitado era o instrumento de comunicação para exercer a actividade de tráfico de droga e o dinheiro supracitado foi obtido através de tal actividade.
No mesmo dia, pelas 03h50, guardas da P.S.P. deslocaram-se ao quarto n°, 511 do Hotel “XXX” sito em Macau, na Rua das XXX para proceder à busca e apreenderam na mesinha de cabeceira um saco de plástico transparente, contendo no interior sete pacotes de pós brancos embrulhados por lenço de papel e três pacotes de cristais brancos, duzentos saquinhos de plástico transparentes, cento e cinquenta saquinhos de plástico, quatro isqueiros, uma tesoura com cabo preto, onze palhinhas de várias cores, dois rolos de papel de estanho, dois tubos de ensaio de vidro, um untensílio de vidro em forma de cabaça contendo líquido e com uma palhinha de cor de rosa, um frasco de plástico transparente com líquido e duas palhinhas respectivamente de cor amarelha e cor de laranja e uma mini balança eléctrica.
Após o exame laboratorial, confirmou-se que os sete pacotes de pós brancos supracitados com peso líquido de 7.057g. continham composição de “Ketamina” (após a análise quantitativa, revelou-se que a percentagem da composição de “Ketamina” era de 55.39%, com peso líquido de3.909g.); os três pacotes de cristais brancos supracitados com peso liquido de 0.511g. continham composição de “Metanfetamina” regulada pela Tabela Il-B da Lei n°. 17/2009 (após a análise quantitativa, revelou-se que a percentagem da composição de “Metanfetamina” era de 76.75%, com peso líquido de 0.392g.); os duzentos sacos de plástico transparentes supracitados ficaram manchados de substância de “Ketamina”; os dois tubos de ensaio e a balança eléctrica supracitados também ficaram manchados de substância de “Cocaína” regulada pela Tabela I-B e de “Ketamina” regulada pela Tabela II-B do mesmo diploma; a capacidade do líquido contido no utensílio de vidro em forma de cabaça e com uma palhinha de cor de rosa era de 44 ml., no qual continha a composição de “Cocaína”; e, a capacidade do líquido contido no supracitado frasco de plástico era de 215 ml., no qual continha a composição de “Cocaína” e de “Metanfetamina”.
Os supracitados estupefacientes foram adquiridos a individuo desconhecido pelos arguidos E e A que os guardaram no quarto do citado hotel para consumo pessoal e vender a outra pessoa.
Os supracitados sacos de plástico e balança eléctrica eram os instrumentos e equipamentos para os arguidos E e A exercerem a actividade de tráfico de droga.
E, os supracitados isqueiros, tesoura, palhinhas, papel de estanho, tubos de ensaio, utensílio de vidro, frasco de plástico eram instrumentos para os arguidos F e G consumirem droga.
A arguida G pretendia prejudicar o regime jurídica da lei da imigração elasdestina e esquivar-se da monitorização do departamento policial de Macau, tendo Propositadamente fornecido à autoridade policial os dados de identificação falsos, bem como exibido e utilizado o passaporte que continha os dados de identificação falsos.
A arguida G sabia bem que não podia violar a ordem de interdição de reentrada, ainda entrou em Macau por porto ilegal.
Os arguidos F e G tinham perfeito conhecimento da natureza e características dos estupefacientes supracitados.
Os arguidos F e G sabiam bem que não podiam, de comum acordo e em divisão de tarefas, adquirir e deter os estupefacientes supracitados para consumir por si mesmos, fornecer e vender a outra pessoa.
Os arguidos F e G sabiam bem que não podiam deter e utilizar os supracitados isqueiros, tesoura, palhinhas, papel de estanho, tubos de ensaio, utensílio de vidro e frasco de plástico como instrumentos e equipamentos de consumo de droga.
Os arguidos E, A sabiam perfeitamente que suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
Quando a arguida A praticou os supracitados factos encontrava-se em situação de clandestinidade em Macau.
Mais se provou:
A arguida é operária e aufere mensalmente cerca de mil e quinhentas RMB.
Tem como habilitações académicas o ensino secundário elementar e não tem ninguém a seu cargo.

O arguido é bate fichas e aufere mensalmente cerca de dez mil patacas.
Tem como habilitações académicas o 3° ano do ensino secundário e tem três filhos a seu cargo.

Conforme o CRC, os arguidos não são primários.
No âmbito dos autos CR3-09-0153-PSM, por sentença de 19/05/2009, a arguida foi condenada por prática de um crime de reentrada ilegal p.p. pelo artigo 21° da Lei n° 6/2004, na pena de três (3) meses de prisão, suspensa na sua execução por período de dezoito (18) meses.
No âmbito dos autos CR4-10-0131-PCC, por acórdão de 29/10/2010, o arguido foi condenado por prática de um crime de tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas p.p. pelo n.° 1 do artigo 8° da Lei n.° 17/2009; um crime de detenção indevida de utensílio ou equipamento p.p. pelo artigo 15° da Lei n.° 17/2009 e um crime de consumo ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas p.p. pelo artigo 14° da Lei n.° 17/2009, na pena única de quatro (4) anos seis (6) meses de prisão.
No âmbito dos autos CR3-10-0098-PCC, por acórdão de 16/12/2010, o arguido foi condenado por prática de um crime de tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas p.p. pelo n.° do artigo 8° da Lei n.° 17/2009, na pena de seis (6) anos oito (8) meses de prisão, em cúmulo com os autos CR4-10-D131-PCC, o arguido foi condenado numa pena única de oito (8) anos e nove (9) meses de prisão efectiva”; (cfr., fls. 577-v a 580-v).

Do direito

3. Vem a arguida A recorrer da decisão proferida pelo T.J.B. para pedir, (tão só), a redução da pena parcelar de 4 anos e 9 meses de prisão que lhe foi imposta pelo crime de “tráfico de estupefacientes”.

Como se consignou em sede de exame preliminar, (cfr., fls. 666), apresenta-se o presente recurso como “manifestamente improcedente”, devendo assim ser objecto de rejeição; (cfr., art. 410°, n.° 1 do C.P.P.M.).

De facto, ao crime em questão cabe a pena de 3 a 15 anos de prisão; (cfr., art. 8°, n.° 1 da Lei n.° 17/2009).

E, ponderando-se na factualidade provada, totalmente inviável se nos afigura a pretendida redução da pena.

Vejamos.

Como sabido é, na determinação da pena deve o Tribunal atender aos “critérios” do art. 65° do C.P.M., e ponderar também nos “fins das penas” enunciados no art. 40° do mesmo código.

Tem este T.S.I. entendido que na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau, no seu art. 65°, a teoria da margem da liberdade, segundo a qual a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites”; (cfr., v.g., o Acórdão de 03.02.2000, Processo n.°2/2000 e de 24.02.2011, Processo n.° 975/2010).

In casu, e nuclearmente, provado está que a arguida, encontrando-se ilegalmente em Macau, tinha sido expulsa em 20.05.2009, que em 16.09.2009 reentrou clandestinamente, e que, dias depois, começou a dedicar-se ao tráfico de estupefacientes em comunhão de esforços com E, (2° arguido), vindo a ser novamente interceptada pela P.S.P. em 25.09.2009, com 4.658 gramas de Ketamina para venda a terceiros, vindo-se ainda a encontrar no quarto onde se encontrava hospedada outra porção de Ketamina (3.909g) e outras de Metanfetamina e Cocaína.
Ponderando assim no dolo intenso e directo com que desenvolveu a conduta descrita na factualidade provada e atrás retratada, nas quantidades e diferentes espécies de estupefacientes, e certo sendo que a sua situação de “clandestinidade” não deixa de constituir uma “circunstância agravante”, (cfr., art. 22° da Lei n.° 6/2004), evidente se nos mostra que censura não merece a pena em questão.

Assim, apreciada que foi a questão colocada, motivos inexistindo para se alterar a decisão recorrida, (ainda que quanto à pena única resultante do cúmulo jurídico efectuado, pois que até se nos mostra benevolente), e sendo o recurso manifestamente improcedente, há que decidir pela sua rejeição.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam rejeitar o recurso; (cfr., art. 409°, n.° 2, al. a) e 410, n.° 1 do C.P.P.M.).

Pagará o recorrente 4 UCs de taxa de justiça, e como sanção pela rejeição do seu recurso, o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 4 do C.P.P.M.).

Honorários ao Exm° Defensor no montante de MOP$800.00.

Macau, aos 14 Julho de 2011
José Maria Dais Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa

Proc. 434/2011 Pág. 16

Proc. 434/2011 Pág. 1