Processo n.º 645/2008
(Recurso civil e laboral)
Data: 30/Junho/2011
Recorrente: S.T.D.M.
Recorrida: A (na qualidade de sucessora do autor B)
(A – 作為原告B之繼承人)
Recorrente (DO RECURSO INTERLOCUTÓRIO) : S.T.D.M.
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I - RELATÓRIO
B, melhor identificado nos autos, patrocinado por advogado, entretanto falecido e tendo-se habilitado como sua sucessora nos autos (cfr. despacho de fls 767) a sua filha, A, veio interpor contra Sociedade de Turismo e Diversões de Macau, S.A.R.L.”, Sociedade Anónima de Responsabilidade Limitada, com sede em Macau, Região Administrativa Especial de Macau, no Hotel Lisboa, 9º andar, acção de processo comum de trabalho, pedindo a condenação da Ré, a título de créditos laborais a pagar- lhe a quantia de MOP$1.178.486,76, acrescida dos respectivos juros a contar desde a citação.
Julgada a causa, foi decidido condenar a Ré a pagar o montante de MOP$479.512,33 acrescido de juros de mora à taxa legal a contar da sentença.
Foi proferido despacho saneador por força do qual foi julgada improcedente a prescrição arguida na contestação dos créditos reclamados.
Inconformada com esta decisão, veio a Ré recorrer interlocutoriamente para este Tribunal de Segunda Instância, a fim de obter a revogação da mesma.
A este recurso não respondeu o A.
Da decisão final vem recorrer a STDM, Sociedade de Turismo e Diversões de Macau, S.A.R.L., R. alegando, em rotunda síntese:
Carece de fundamento legal a condenação da ora Recorrente por falta de prova de um dos elementos essenciais à prova do direito de indemnização da parte A., ora recorrida, i.e., a ilicitude do comportamento da R., ora Recorrente.
Deve considerar-se que o salário do trabalhador era um salário diário.
Cabia ao trabalhador provar que a empregadora obstou ou negou o gozo de dias de descanso.
Não concluindo pelo tratamento mais favorável ao trabalhador resultante do acordado entre as partes consubstanciado, sobretudo, nos altos rendimentos que auferia - incorreu o Tribunal a quo em erro de direito, o que constitui causa de anulabilidade da sentença ora em crise.
A aceitação do trabalhador de que aos dias de descanso semanal, anual e em feriados obrigatórios não corresponde qualquer remuneração teria, forçosamente, de ser considerada como válida.
Ao trabalhar voluntariamente em dias de descanso (sejam eles anual, semanal ou resultantes de feriados), o trabalhador optou por ganhar mais, tendo direito à correspondente retribuição em singelo.
O trabalho prestado em dias de descanso foi sempre remunerado em singelo.
As gorjetas dos trabalhadores de casinos não são parte integrante do conceito de salário, e bem assim as gorjetas auferidas pelos trabalhadores da STDM.
Os juros só devem ser contados a partir do trânsito.
Pronunciando-se sobre quais as fórmulas aplicáveis, pugna pela procedência do recurso.
O A. não contra-alegou.
Oportunamente, foram colhidos os vistos legais.
II - FACTOS
Vêm provados os factos seguintes:
“Da confissão e das provas documentais resultam provados os seguintes factos:
Matéria de facto provada
a) Durante o período compreendido entre 21 de Abril de 1984 e 11 de Outubro de 2001 o Autor prestou trabalho para a aqui Ré.
b) Entre 21 de Abril de 1984 e 30 de Junho de 1989 o Autor teve uma retribuição fixa diária de MOP$4,10, entre 1 de Julho de 1989 e 30 de Abril de 1995, teve uma remuneração fixa diária de HKD$10,00 e a partir de 1 de Maio de 1995, a remuneração passou ser de HKD$15,00.
c) Além disso, o Autor, ao longo do período referido na alínea a) recebeu um a quota-parte, variável, do total das gorjetas entregues pelos clientes da Ré a todos os trabalhadores, cujo montante era diariamente reunido e contabilizado e, em cada dez dias, distribuído por todos os seus trabalhadores, lidassem ou não directamente com os clientes e de acordo com a respectiva categoria profissional.
d) Desde o início da relação laboral e até à sua cessação, o Autora recebeu da Ré as seguintes quantias:
- Ano de 1984: MOP$64.978,00
- Ano de 1985: MOP$81.507,00
- Ano de 1986: MOP$58.137,00
- Ano de 1987: MOP$56.320,00
- Ano de 1988: MOP$84.092,00
- Ano de 1989: MOP$101.431,00
- Ano de 1990: MOP$ 102.184,00
- Ano de 1991: MOP$ 103.782,00
- Ano de 1992: MOP$108.652,00
- Ano de 1993: MOP$101.338,00
- Ano de 1994: MOP$123.703,00
- Ano de 1995: MOP$120.221,00
- Ano de 1996: MOP$122.318,00
- Ano de 1997: MOP$ 115.630,00
- Ano de 1998: MOP$98.746,00
- Ano de 1999: MOP$83.674,00
- Ano de 2000: MOP$101.195,00
- Ano de 2001: MOP$76.895,00
e) Até 1998, o Autor trabalhava em ciclos contínuos de três dias:
- No primeiro dia começava a trabalhar às 14.00 horas e interrompia às 18.00 horas, recomeçava às 22.00 horas e acabava às 2.00 horas.
- No segundo dia, começava às 10.00 horas e interrompia às 14.00 horas, depois recomeçava às 18.00 horas e acabava às 22.00 horas.
- No terceiro dia, começava às 6.00 horas e interrompia às 10.00 horas, depois recomeçava às 2.00 horas e acabava às 6.00 horas.
f) A partir de 1998, o Autor passou a trabalhar em ciclos contínuos de 9 dias:
- No primeiro, segundo e terceiro dias, o Autor começava às 7.00 horas e acabava às 15.00 horas;
- No quarto, quinto e sexto dias, começava às 23.00 horas e acabava às 7.00 horas;
- No sétimo, oitava e nono dias, começava às 15.00 horas e acabava às 23.00 horas.
g) Em Julho de 2003, o Autor recebeu da Ré, na sequência de cálculo efectuado pela então DSTE, a quantia de MOP$14.568,10, a título de compensação pelos dias de descanso semanal, anual e feriados obrigatórios.
h) Sempre que o Autor não prestou trabalho efectivo para a Ré não auferiu qualquer remuneração.
i) O Autor acordou com a Ré que, como contrapartida do seu trabalho, receberia uma importância diária fixa nos termos que constam da alínea b) da matéria de facto assente e uma importância variável correspondente à quota-parte referida na alínea c) da matéria de facto assente.
j) A Ré nunca fixou ao Autor o período de descanso semanal.
k) Nem lhe fixou o período ou períodos de descanso anual.
1) A Ré nunca dispensou o Autor da prestação de trabalho em dias de feriado obrigatório.
m) No ano de 1984 o Autor não gozou de 36 dias de descaso anual, de 4 dias úteis de descanso anual, de 2 dias de feriados obrigatórios remunerados e de 3 dias de feriados obrigatórios não remunerados.
n) Entre os anos de 1985 e 2000, inclusive, o Autor não gozou, em cada ano, 52 dias de descanso semanal, 6 dias descanso anual e 6 dias feriados obrigatórios remunerados e 4 dias de feriados obrigatórios não remunerados.
o) No ano de 2001, até 11 de Outubro, o Autor gozou de 41 dias de descanso semanal, 4,5 dias de descanso anual, 6 dias de feriados obrigatórios remunerados e 3 dias de feriados obrigatórios não remunerados.
p) Pelo trabalho prestado nos dias de descanso semanal, de descanso anual e nos dias de feriado obrigatório que a Autor não gozou, este não recebeu da Ré qualquer compensação salarial.
q) Nem foi compensado com outro dia de descanso semanal em que trabalhou.
r) Por causa das condições de trabalho impostas pela Ré, o Autor viu-se privado de gozar a companhia dos seus familiares e amigos.
s) Deixou de poder viajar e passar férias com a sua família.
t) O Autor viu-se, ao longo dos anos, exposto à inalação continuada de poluentes como o alcatrão, a nicotina e o monóxido de carbono.”
III - FUNDAMENTOS
São dois os recursos a conhecer:
A - Recurso do saneador sobre a prescrição
B- Recurso da decisão final
A - Recurso da Saneador
1. A Ré, na douta contestação que apresentou, invocou a prescrição dos créditos alegados pela Autora anteriores a 13/4/2002.
No entender da Ré, o prazo geral da prescrição é de cinco anos, nos termos do disposto no art. 303º, f) do Código Civil e interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima directa ou indirectamente a intenção de exercer o seu direito.
O Mmo Juiz a quo considerou que houve um reconhecimento da dívida ao ter pago as compensações a que aludem os documentos de fls 172 a 174, ao abrigo do disposto no artigo 325º, n.º, n.º 1 do CC.
2. Importa apreciar.
A legislação de Macau respeitante às relações laborais a partir de 1984, ou seja, o DL 101/84/M, de 25 de Agosto e o vigente DL 24/89/M, de 3 de Abril, não contém um regime específico sobre a prescrição dos créditos emergentes das relações jurídico-laborais.
Reconhece-se que, na falta de norma laboral específica, é de aplicar a norma geral resultante do Código Civil, 20 anos no CC de 66 e 15 anos no CC de 99.
A primeira abordagem a fazer é a da aplicação da lei no tempo, ou melhor dizendo, - o Código Civil regula a sucessão das leis de alteração de prazos de forma autónoma em relação à regra da sucessão de leis no tempo1- importa indagar qual o prazo que se aplica, se o da lei velha ou o da lei nova? 20 anos do CC velho ou 15 anos do CC novo?
O novo prazo aplica-se aos prazos que já estiverem em curso, mas conta-se apenas o tempo decorrido na vigência da nova lei, salvo se daí resultar um prazo mais longo do que o da lei anterior, caso em que o prazo continua a correr segundo esta lei (artigo 290º do Código actual).2
Claro que para a escolha do prazo aplicável, vista a salvaguarda feita na parte final daquele preceito, sempre importará indagar do prazo a quo, isto é, a partir de que momento se iniciará a sua contagem.
Em bom rigor pode dizer-se que é a nova lei que se aplica aos prazos que já estão a decorrer, importando não esquecer que a lei só dispõe para o futuro. Mas como no caso em apreço, em qualquer das situações a ponderar, no que respeita aos créditos no domínio da lei velha, o início do prazo sempre seria de computar antes da data da cessação da relação laboral, ou em qualquer outra data a atender em termos de vencimento do direito, necessariamente anterior àquela, donde, pela sua aplicação (lei nova), à data da vigência da nova lei, 1 de Novembro de 1999, sempre resultaria um prazo mais longo, teremos de fazer apelo à previsão da parte final do n.º 1 daquela norma e aplicar a lei antiga, já que ao abrigo da mesma sempre faltará menos tempo para o prazo se completar.
O prazo a aplicar, visto o início do mesmo e o tempo decorrido até 1 de Novembro de 1999, é, pois, o prazo de 20 anos.
E não de 5 como se chega a defender, já que se não trata aqui de uma prestação renovável.
Importa não esquecer que os créditos não são os salários, mas sim as compensações por direitos não gozados. E esses direitos não são prestações renováveis, pela razão simples, desde logo, que não se chegaram a verificar.
E mesmo em relação aos salários dos trabalhadores, a prestação de trabalho não se coaduna com a natureza de uma qualquer prestação renovável, antes se traduzindo na contrapartida de um serviço prestado durante um certo período, sob direcção e instruções da entidade empregadora, correspondendo cada salário a um trabalho próprio, não se podendo dizer que o salário seguinte é a renovação do anterior.
Ainda, a não consideração de um prazo curto de prescrição insere-se num entendimento que leva a considerar que a relação de proximidade existente pode condicionar o exercício do direito pela parte do trabalhador, pelo que deve ele mostrar-se protegido, como acontecia anteriormente para o serviço doméstico e agora para as relações de trabalho em geral.
3. Em relação ao argumento usado pelo Mmo Juiz. Relativo ao reconhecimento da dívida, tal argumento não colhe.
Pela razão simples de que desses documentos não se retira que haja um reconhecimento das dívidas em relação às compensações ora reclamadas.
Pela razão de que tais pagamentos ocorreram no âmbito de um processo de contravenção da DSAL, como que foram impostos e não correspondem às compensações ora reclamadas.
Quanto ao pretenso valor remissivo a que a Ré alude também tal não resulta da análise da documentação junta aos autos.
4. Vejamos agora qual o momento a partir do qual se iniciará a contagem do prazo da prescrição.
Para a análise do tema, há que considerar o seguinte quadro legal:
Estabelece o art. 306º do Código Civil de 1966 que “o prazo de prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido; se, porém, o beneficiário da prescrição só estiver obrigado a cumprir decorrido certo tempo sobre a interpelação, só findo esse prazo se inicia o prazo da prescrição”.
Não está prevista, de modo expresso, entre as causas bilaterais de suspensão reguladas no art. 318º do Código Civil de 1966, a situação que agora nos ocupa e relativa a créditos emergentes de relação de trabalho não-doméstico.
Com efeito, o Código Civil de 1966, prevendo embora a figura do contrato de trabalho, relegou para legislação especial a sua regulamentação – cfr. art. 1152º e 1153º do Código Civil de 1966.
Essa regulamentação no ordenamento jurídico português teve lugar, essencialmente, através do Decreto-Lei 49408, de 24 de Novembro de 1969, o qual, no seu art. 38º, estabeleceu um prazo de prescrição de um ano para todos os créditos resultantes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, quer pertencentes à entidade patronal quer ao trabalhador, contando-se esse prazo “a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho”.
O art. 318º do Código Civil de 1966, regulando sobre as causas bilaterais da prescrição, determina, entre o mais que agora não releva, que a prescrição não começa nem corre “entre quem presta o trabalho doméstico e o respectivo patrão, enquanto o contrato durar” (al. e) do art. 318º do Código Civil).
5. Por aplicação da regra geral, dir-se-á que o prazo de prescrição em relação a cada um dos créditos aqui reclamados iniciou o seu curso com o respectivo vencimento, uma vez que, a partir daí o Autor passou a estar em condições de exercer os seus direitos.
Assim, em relação aos créditos vencidos relativos ao período situado entre o início da relação laboral e o dia 15 de Março de 1987, (vinte anos antes da notificação para a tentativa de conciliação), ter-se-á verificado a prescrição.
6. Pensamos que não há lacuna na presente situação.
A lacuna, como diz o Prof. Oliveira Ascensão, é uma fatalidade, uma incompleição do sistema normativo que contraria o plano deste3. Fatalidade que vai ao ponto de se negar a sua própria existência, porquanto no ordenamento jurídico não pode haver verdadeiras lacunas, enquanto ausência de solução jurídica para o caso omisso.4
Deixemos no entanto a asserção lata do conceito - vazio do ordenamento jurídico para regulamentação do caso - para indagar se há uma lacuna no conceito mais vulgar, isto é, de falta, entre as fontes de Direito vigentes, de uma disposição que se aplique directamente a determinada matéria. E só perscrutando, interpretando e valorando o ordenamento podemos dizer se há ou não uma lacuna.
Ora, na obediência daquelas tarefas, logo se divisa uma norma genérica que abarca a situação em apreço, norma essa que decorre do disposto no artigo 306º, n.º 1 do CC66 - aplicável ao tempo da relação laboral invocada -, complementada pelo art. 307º que estipula para os casos de rendas perpétuas ou vitalícias ou para os casos de prestações análogas, em que a prescrição do direito do credor corre desde a exigibilidade da primeira prestação que não for paga.
Há uma norma geral que abarca a situação que se configura, sendo-lhe directamente aplicável a sua estatuição, na falta de regulamentação especial decorrente do regime laboral - não esquecendo que o Direito Laboral, enquanto ramo de Direito Privado, é especial em relação ao Direito Civil comum e não excepcionada por nenhuma norma que estabeleça qualquer causa de suspensão do prazo do começo ou decurso da suspensão, normas estas que afastam o regime geral do início do curso da prescrição.
Nem se diga que se trata ali de uma norma genérica e o que se procura regulamentar é uma situação concreta. É óbvio que assim acontece sempre que se aplica uma norma de carácter genérico; a sua aplicação projecta-se necessariamente sobre uma situação concreta e o que vai determinar a sua especialidade é a autonomia jurídica da especificidade de uma situação que leva a uma regulação especial ou excepcional em relação à normatividade genérica. E só quando há ausência de qualquer regulamentação positiva ou costumeira5 do caso se diz que é omisso, lacunoso. Claro está, desde que juridicamente devesse ser regulado.
7. Temos assim a regra relativa ao início da prescrição e as situações em que o legislador quis que o prazo se suspendesse, tendo a preocupação de elencar, entre milhentas situações possíveis, apenas umas tantas e, no que respeita às causas bilaterais da suspensão, somente uma meia dúzia de casos. Pretendeu o legislador que essa previsão fosse meramente exemplificativa? Seguramente que não. A letra e o espírito da norma, afastam essa possibilidade. As situações, causas de suspensão da prescrição, são demasiado concretas, específicas e particulares para comportarem essa natureza.
No que ao trabalho doméstico respeita é particularíssima essa previsão, não podendo o legislador ignorar que a par desse tipo de relação de trabalho existiam todas as restantes relações laborais, não fazendo sentido que teleologicamente pretendesse abranger todas as relações laborais a partir daquela particularização.
Se o legislador excepcionou para o serviço doméstico uma causa de suspensão de prescrição, a interpretação analógica está vedada em relação às normas excepcionais - art. 11º do CC66 e 10º do CC99.
8. E em termos de interpretação teríamos de considerar que o legislador, ao dizer que a prescrição não começa nem corre entre quem presta o trabalho doméstico e o respectivo patrão, enquanto o contrato durar, quis dizer entre quem presta o trabalho e o respectivo patrão. Seria uma interpretação supressora do âmbito da previsão e extensiva do elenco das situações a abranger.
Ainda que o princípio não seja absoluto, estamos em crer que vale aqui o brocardo ubi lex voluit dixit, ubi noluit tacuit. Nem por razões teleológicas se aceita uma interpretação extensiva como se pretende. São por demasiado evidentes todas as razões que podiam justificar uma protecção do trabalhador por via desse instituto, dadas as particulares relações, teias, dependências, receios, anseios, instabilidades que se criam nas relações laborais, que nem vale a pena desenvolver por demais o tema, aliás, bem focalizado na decisão recorrida. Mas são igualmente diferentes e visíveis as diferenças entre a relação laboral comum e o serviço doméstico. Este, a merecer um tratamento autónomo em Macau e no direito Comparado e apartar-se daquele.
Ora são essas razões de diferença que fazem perceber a opção do legislador e tanto basta para afastar uma razão teleológica de aplicação da causa de suspensão da prescrição estabelecida para o serviço doméstico em relação a todas as relações laborais.
Tanto assim, que no Direito Comparado Português lá se legislou um artigo 38º. Tanto assim que, aquando da aprovação do novo CC99, o legislador da RAEM entendeu por bem alargar o âmbito da previsão da al. c) do art. 311º, passando, a par do serviço doméstico, a abranger outros tipos de relações laborais.
E não se deixou até, no seio da respectiva Comissão revisora de explicar essa alteração que, ainda que não publicada, não se deixa de referir, pela própria evidência do acrescento: “procurou-se que em estados de dependência não haja lugar à prescrição. Se esse regime parece ser adequado em Portugal, parece, por maioria de razão ser estendido a Macau, uma vez que a lei laboral em Macau a não regula, mas sobretudo por a precariedade do emprego ser em Macau, face à legislação vigente, muito maior, pelo que a relação de dependência e medo de represálias por pedir o crédito ser muito mais acentuada”.6 Aliás, na Nota Justificativa do CC não se deixa de referir essa preocupação, não só pelo alargamento do termo do prazo da causa de suspensão, bem como ainda pela necessidade dos interesses de estabilização e segurança ao nível daquele instituto.
Embora se percebam perfeitamente as razões subjacentes à decisão recorrida, afigura-se não se estar perante uma situação não prevista nem regulada, não sendo legítimo ao aplicador da lei substituir-se ao legislador no aperfeiçoamento e melhoria do sistema laboral e protecção do trabalhador. Admite-se que possa haver alguma limitação na liberdade e na vontade do trabalhador, mas importa não esquecer que todas as situações que o legislador contemplou contêm sempre alguma razão que pode justificar a sua inércia e passividade. E dessa constatação será legítimo extrapolar para se considerar suspensa a prescrição quando se suspeite desse inibição? Afigura-se que essa há-de ser uma opção do legislador.
9. Ex abundantis
Apenas alguns argumentos finais. Esta interpretação é a que melhor se enquadra numa interpretação sistemática, estabelecendo-se uma diferença de regimes que são tratados diferentemente pelo legislador. A não se interpretar desta forma, não deixaria de ser então legítimo, por razões meramente teleológicas e favor laboratoris, aplicar o regime de outros institutos mais proteccionistas do Regime das Relações Laborais comum ao Regime doméstico, sendo certo que o desfavor destes trabalhadores é manifesto em relação aos demais e considerar não faltar aí um campo fecundo de matérias lacunosas.
Depois, importa anotar que a natureza dos créditos excepcionados no art. 318º do CC de 66 não se limita apenas aos créditos laborais e o legislador de 99 excepcionou nas relações entre empregado e patrão, não domésticas, apenas os créditos laborais e o art. 38º do Diploma português (citado apenas em termos de Direito comparado) salvaguarda tanto os créditos dos trabalhadores, como os dos empregadores. Será que a lacuna a integrar abrangerá qualquer das situações inovadoras contidas naqueles diplomas e o regime a aplicar será com o alcance que tem para o serviço doméstico, quando qualquer dos diplomas posteriores e acima citados não consagrou esse alcance?
Acresce que a aplicação do presente regime, ainda em nome do princípio do benefício da parte mais desfavorecida, não deixa de ser mais benéfico, em certo sentido, do que a opção do legislador (no caso, do português, importando saber qual a opção do legislador de Macau), já que, pela aplicação do regime da RAEM se estabelece um prazo de prescrição de 20 anos desde o vencimento das prestações, a poder ser exercido muito para além da cessação do contrato, ao passo que no regime do referido art. 38º do DL 49408ou do disposto no art. 311º, n.º 1, c) do CC 99, se prevê uma prescrição extintiva apenas dentro do ano, ou dois anos, após a cessação do contrato de trabalho. O que, aliás, não se deixa de compreender, face às dificuldades de prova que a não limitação temporal e a falta de ligação com o local de trabalho podem acarretar (daí até a exigência da prova documental idónea para os créditos resultantes de indemnização, por falta de férias, sanções abusivas e trabalho extraordinário há mais de 5 anos, cfr. n.º 2 do citado artigo).
Nesta conformidade, sem necessidade de outros desenvolvimentos somos a julgar parcialmente procedente o recurso interposto e a considerar, um prazo normal de prescrição de 20 anos, a iniciar-se com o vencimento de cada uma das prestações em dívida, ou seja, estão prescritos os créditos vencidos anteriores a 15 de Março de 1987, vinte anos anteriores à data da notificação da tentativa de conciliação ( art. 27º, n.º 3 do CPT) e momento em que a empregadora se viu confrontada com a reclamação de tais créditos.
B - Recurso da decisão final
1. O objecto do presente recurso passa pela análise das seguintes questões:
- Da natureza jurídica do acordo celebrado entre as partes;
- Do salário justo; determinação da retribuição; as gorjetas auferidas pelos trabalhadores de casino integram ou não o seu salário?
- Do não gozo de dias de descanso semanal, descanso anual e feriados obrigatórios;
. prova dos factos; prova do impedimento do gozo;
. liberdade contratual; da admissibilidade de renúncia voluntária ao gozo de dias de descanso semanal, anual, feriados obrigatórios;
- Integração da natureza do salário; mensal ou diário;
- Determinação dos montantes compensatórios dos dias de trabalho prestado em dias descanso e festividades.
- Dos juros.
As diferentes questões foram abordadas em vários e abundantes arestos dos Tribunais de Macau, referindo-se que em praticamente todos eles se conseguiu uma unanimidade de entendimento, tanto na 1ª Instância, como neste Tribunal de Segunda instância.7
Depois disso, sobrevieram algumas decisões do TUI8, que decidiu contrariamente à posição que granjeara unanimidade total numa questão fundamental, qual seja a de saber se as gorjetas dos trabalhadores dos casinos da STDM integravam o salário.
Perante tais decisões daquele Alto Tribunal, essa questão, bem como as outras que se colocavam, foram já tratadas devidamente numa série de acórdãos deste Tribunal de Segunda Instância e nesta secção em particular, aí se explicando, com o devido respeito, as razões do não acatamento da interpretação do TUI, cientes de que a responsabilidade pela uniformização da Jurisprudência não pode depender unicamente do critério de cada julgador, devendo ser implementada pelo legislador.9
Por essa razão, nessa, bem como nas restantes questões, remetemo-nos para a Jurisprudência deste Tribunal de Segunda Instância.
Ressalva-se a inflexão nessa Jurisprudência, a partir de 31/3/2011, v.g. com o processo n.º 780/2007, de 31/3/2011, deste TSI, apenas para os cálculos de algumas compensações relativamente aos descansos não gozados.
2. Posto, isto, passa-se de imediato à abordagem das questões que vêm colocadas no recurso, o que se fará, pelas razões acima aduzidas, em termos sintéticos.
A primeira questão que se deve apreciar é a da caracterização da relação jurídica existente entre a recorrente e a recorrida, o que se reconduz, no fundo, a saber se estamos ou não perante um contrato de trabalho entre ambos celebrado.
Em face do artigo 1079.º do Código Civil, artigos 25º e 27º do anterior RJRL - cfr. artigos 1º, 4), 9º, 2), 57º da actual LRT, Lei 7/2008, de 12 de Agosto, em princípio não aplicável aos contratos findos, face à redacção do disposto no art. 93º -, art. 23°, n.º 3 da Declaração Universal dos Direitos do Homem, art. 7º do Pacto sobre Direitos Económicos Sociais e Culturais e pela Convenção da OIT n.º 131, direitos que por essa via não deixam de ser tutelados pela própria Lei Básica no seu artigo 40º, decorre, face à factualidade apurada, que parece não restarem quaisquer dúvidas de que nos encontramos perante um verdadeiro e puro contrato de trabalho entre a parte autora e a ré, em que aquela, mediante uma retribuição, sob autoridade, orientações e instruções desta, começou a trabalhar na área de actividade ligada à exploração de jogos de fortuna ou azar.
Temos assim por certo que o contrato celebrado entre um particular e a Sociedade de Turismo e Diversões de Macau, S.A., para aquele trabalhar naquela área dos casinos, sob direcção efectiva, fiscalização e retribuição por parte desta, deve ser qualificado juridicamente como sendo um genuíno contrato de trabalho remunerado por conta alheia, contrato esse que deve ser remunerado com uma retribuição justa.
3. Fundamentalmente, o que está em causa é saber se as gorjetas integram o salário do trabalhador. Anote-se que o que interessa é a consideração do que seja o salário para efeitos das compensações a contemplar, face ao que reclamado vem nos autos.
O cerne da questão residirá em saber se, face à matéria de facto, melhor apreendida pelas Instâncias, filtrada e burilada através de tantos e tantos outros processos, se ela não predispõe num outro sentido compreensivo mais abrangente da realidade com que deparamos nos casos da STDM e neste em particular.
A questão não pode ser desenquadrada do seu todo, do rendimento efectivo expectável, da prática adoptada e reiterada anos e anos a fio, da natureza específica da exploração e actividade de um casino, da realidade diversa da de outros ordenamentos em termos de Direito comparado.
O carácter de liberalidade e eventualidade das gorjetas é contrariado pelo facto de as mesmas, no caso dos casinos da STDM, serem por esta reunidos, contabilizados e distribuídos e não se diga que o sistema de contabilização e distribuição pela empresa representa o sistema mais justo e que mais beneficia o trabalhador não é argumento decisivo, pois que sempre se pode entender que essa prática se insere no próprio processo contratual entre as partes e que por isso mesmo o trabalhador espera com uma forte probabilidade vir a auferir uma massa de rendimentos, só por via dela anuindo à celebração daquele contrato de trabalho.
É verdade que quanto à perspectiva tributária incidente sobre as gorjetas esse argumento não se mostra decisivo.
Na perspectiva tributária de direito público, o imposto profissional é um imposto parcelar, estruturado cedularmente, mediante o qual se submete a regime específico de incidência, determinação da matéria colectável e taxa os rendimentos decorrentes do trabalho, por conta de outrem ou por conta própria. Englobam-se nesse tipo de rendimento as gratificações ou gorjetas espontânea e livremente entregues, na sequência de uma reiterada prática social, pelos beneficiários de um determinado serviço ou trabalho, e por causa deste, aos que executaram esses serviço ou trabalho.10
Não obstante o princípio da autonomia privada, há que ter em conta, principalmente no que respeita à liberdade de estipulação do conteúdo, determinadas normas que não podem ser afastadas pela vontade das partes, as quais limitam a liberdade contratual, impondo, pelo menos, um conteúdo mínimo imperativo.
As gorjetas dos trabalhadores da STDM, na sua última ratio devem ainda ser vistas como "rendimentos do trabalho", sendo devidos em função, por causa e por ocasião da prestação de trabalho, ainda que não originariamente como correspectividade dessa mesma prestação de trabalho, mas que o passam a ser a partir do momento em que pela prática habitual, montantes e forma de distribuição, com eles o trabalhador passa a contar, estando nós seguros de que sem essa componente o trabalhador não se sujeitaria a trabalhar com um salário que na sua base é um salário de miséria.
Não se deixam de encontrar no Direito Comparado situações em que a gorjeta integra o valor da remuneração, assim acontecendo no Brasil, compreendendo-se na remuneração do empregado, para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago directamente pelo empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber e considerando-se gorjeta não só a importância espontaneamente dada pelo cliente ao empregado, como também aquela que for cobrada pela empresa ao cliente, como adicional nas contas, a qualquer título, e destinada à distribuição aos empregados.
Salvaguardando a diferença de sistemas, assim acontece igualmente nos EUA.
Assim acontece em Hong Kong, onde o Court of Final Appeal decidiu ratificar o entendimento do Court of Appeal no sentido de que as gorjetas deviam integrar o salário com argumentos próximos dos acima expendidos.11
Por outro lado, em Portugal, não minimizando a douta doutrina citada pelo TUI, não se deixa de assinalar, como acima se referiu, que a realidade fáctica diverge em ambos os ordenamentos e num ponto que se nos afigura essencial, qual seja o de em Portugal o rendimento mínimo estar garantido por lei.
4. Do não gozo de dias de descanso semanal, descanso anual e feriados obrigatórios;
. prova dos factos
. liberdade contratual; da admissibilidade de renúncia voluntária ao gozo de dias de descanso semanal, anual e feriados obrigatórios.
Provou-se que o trabalhador em questão trabalhou nos dias de descanso semanal, anual e também feriados obrigatórios e não recebeu qualquer acréscimo.
Para que haja erro manifesto na apreciação da prova tem de resultar da alegação da parte recorrente e dos elementos dos autos a probabilidade de existência de erro de julgamento, o que decorre da indicação não só dos pontos considerados incorrectamente julgados, como da indicação dos concretos meios probatórios que impunham uma decisão diversa (cfr. artigo 599º, n.º 1, a) e b) e 629º do CPC).
No que ao ónus da prova respeita só importaria apreciar a questão em caso de falta de prova dos factos alegados pela parte a quem cabia o ónus de provar os factos integrantes do seu direito(cfr. o n.º 1 do art. 335° do CC), de forma a daí retirar as devidas consequências.
5. Da liberdade contratual.
Ao interpretar e aplicar qualquer legislação juslaboralística em sede do processo de realização do Direito, temos que atender necessariamente ao “princípio do favor laboratoris”, princípio que para além de “orientar” o legislador na feitura das normas juslaborais (sendo exemplo paradigmático disto o próprio disposto no art.º 5.º, n.º 1, e no art.º 6.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril), deve ser tido pelo menos também como farol de interpretação da lei laboral, sob o qual o intérprete-aplicador do direito deve escolher, na dúvida, o sentido ou a solução que mais favorável se mostre aos trabalhadores no caso considerado, em virtude do objectivo de protecção do trabalhador que o Direito do Trabalho visa prosseguir.
Do que acima fica exposto decorre que se A. e Ré podiam acordar nos montantes da retribuição (e o problema que se põe nessa sede não é já o do primado da liberdade contratual mas sim o da determinação da vontade das partes quanto à integração dessa retribuição) já o mesmo não acontece quanto ao gozo dos dias de descanso, férias e feriados e sua remuneração.
6. Da errada interpretação e aplicação do n.° 4, do art. 26° do RJRT - da violação do n.° 2 do art. 564º do CPC
E ainda da configuração do salário como mensal.
As características e natureza do trabalho, tal como vem provado, harmonizam-se mais com o considerar que se tratava de um salário mensal, estando a remuneração não já dependente do resultado de trabalho efectivamente produzido, nem, tão-pouco, do período de trabalho efectivamente prestado.
Da redacção do n.º 4 do artigo 26º decorre uma consequência importantíssima na interpretação das normas que atribuem as compensações pelo trabalho prestado nesses dias. É que o n.º 1 do art.º 26.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, atentos os termos empregues na redacção da sua parte final, - os trabalhadores que auferem um salário mensal...não podendo sofrer qualquer dedução pelo facto de não prestação de trabalho nesses períodos (períodos de descanso semanal e anual e feriados obrigatórios) - visa tão-só proteger o trabalhador contra eventual redução do seu salário mensal por parte do seu empregador sob pretexto de não prestação de trabalho nesses períodos e, por isso, já não se destina a determinar o desconto do valor da remuneração normal na compensação/indemnização pecuniária a pagar ao trabalhador no caso de prestação de trabalho em algum desses dias.
Essa posição, no respeitante ao tipo do salário da parte A., releva para aplicação do n.º 6 do art.º 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, na actual redacção dada pelo artigo único do Decreto-Lei n.º 32/90/M, de 9 de Julho, já que na hipótese de pagamento do trabalho prestado em dia de descanso semanal, por força do n.º 6, é ao disposto na sua alínea a) que se atende e já não ao determinado na sua alínea b).
7. Da lei aplicável.
Ainda aqui nos remetemos para o desenvolvimento feito nos acórdãos já citados.
Posto isto, assim se entra na análise da correcção da sentença recorrida quanto ao apuramento das compensações devidas pela entidade patronal, por violação dos diferentes tipos de descanso do trabalhador e assim do invocado erro de direito em relação às pertinentes normas reguladoras daquelas compensações.
Neste caso particular acompanhamos as fórmulas adoptadas na Jurisprudência quase unânime deste Tribunal, unanimidade que sofreu até ao momento apenas a excepção da compensação do trabalho prestado em dias de feriados obrigatórios e a inflexão a partir de 31/3/2011, com o processo n.º 780/2007, de 31/3/2011, deste TSI .12
Donde resultam as seguintes fórmulas:
No âmbito do
Descansos semanais
Descansos anuais
Feriados Obrigatórios
DL101/84/M
X1
X1
X1
DL24/89/M
X2
X1
X3
8. Os rendimentos deste processo constam da matéria acima dada como provada.
Ano
Salário Médio Diário
1
1984
254.82
2
1985
223.31
3
1986
159.28
4
1987
154.30
5
1988
230.39
6
1989
277.89
7
1990
279.96
8
1991
284.33
9
1992
297.68
10
1993
277.64
11
1994
338.91
12
1995
329.37
13
1996
335.12
14
1997
316.79
15
1998
270.54
16
1999
229.24
17
2000
277.25
18
2001
270.76
Importará reter que nos cálculos a efectuar só relevarão os créditos não prescritos, tal como acima decidido, ou seja, os vencidos depois de 15 de Março de 1987, vista a decisão acima tomada, levando-se em conta o termo da relação laboral, em 11 de Outubro de 2001.
9. Trabalho prestado em dia de descanso semanal
Em sede do DESCANSO SEMANAL nada a alterar, uma vez que não obstante não terem sido consideradas compensações no âmbito do DL 101/84/M, não foi interposto recurso pelo trabalhador e foi adoptada a mesma fórmula x2, no âmbito do DL 24/89/M, na sentença recorrida, tal como é pacífico neste Tribunal.
10. Descanso anual
Em sede de DESCANSO ANUAL, considerando que as fórmulas da sentença no âmbito do DL 101/84/M se têm por correctas e as do âmbito do DL 24/89/M são as mesmas propugnadas pela recorrente, não fazendo assim parte do objecto do recurso, manter-se-ão as fórmulas utilizadas, importando apenas subtrair o montante das compensações relativas ao período da prescrição.
Há assim que subtrair os montantes relativos aos anos de 1984, 1985, 1986 e a parte proporcional de 1987 (até 15/3/87), ou seja MOP$3.036,60, no âmbito do DL 101/84/M.
O que significa que, a este título, haverá que condenar, no âmbito do DL101/84/M, apenas em MOP2.493,53 e não em MOP5.530,13.
11. Feriados obrigatórios
Nada a alterar por se ter entrado na sentença com os critérios seguidos por este Tribunal de Segunda Instância.
12. Dos juros
Segue-se a Jurisprudência uniforme adoptada nas diferentes matérias e onde se inclui a questão dos juros.
Assim se tem decidido13 que, não tendo havido qualquer alteração nesta Instância dos valores encontrados, se consideram líquidos os créditos do trabalhador em causa sobre a Ré, tal como liquidados na 1ª instância, devendo ser a partir daí que se devem contar os juros de mora. Os juros são devidos a partir da liquidação operada na 1ª Instância, se ela vier a ser mantida na 2ª Instância. A remissão para o trânsito abrangerá as situações em que a liquidação só se assuma definitiva nesse momento.
Esta a orientação que tem sido adoptada e aqui se adopta, não tendo razão o recorrente quando pretende um cálculo de juros a partir de um momento de vencimento sobre uma quantia cuja liquidação não se mostra pacífica.
Este entendimento, aliás, recentemente confirmada em acórdão do TUI tirado em sede de uniformização de jurisprudência (Ac. de 2/03/2011, Proc. n. 69/2010).
13. Concluindo,
Os valores encontrados para a compensação dos descansos semanais e feriados obrigatórios não se alteram;
Apenas em relação aos descansos anuais, face ao recurso da STDM importará corrigir para menos o valor apurado conforme acima explicado.
Conclui-se assim pela não existência dos apontados vícios de erro de facto e de direito no recurso da decisão final.
Tudo visto e ponderado, resta decidir,
IV – DECISÃO
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam os Juízes que compõem o Colectivo deste Tribunal de Segunda Instância, em conferência, em:
- julgar parcialmente procedente o recurso interlocutório interposto pela STDM, julgando prescritos os créditos vencidos anteriores a 15 de Março de 1987;
- parcialmente procedente o recurso da decisão final, também por ela interposto e, assim, em condenar a Ré STDM a pagar à A. apenas a quantia de MOP2.493,53, a título de compensação pelos descansos anuais, no âmbito do DL 101/84, conforme o acima consignado, assim revogando, nessa parte, o decidido;
- em condenar no pagamento dos juros de mora, a contar a partir do momento desta decisão, vista a alteração verificada em relação à liquidação feita em 1ª Instância.
- mantendo o mais que foi decidido na sentença proferida em 1ª Instância, à excepção dos juros que serão contados nos termos do Ac. Uniformizador do TUI, Ac. de 2/03/2011, Proc. n.º 69/2010.
Custas do recurso do recurso interlocutório e da decisão final pela Ré e pelo A., na proporção dos respectivos decaimentos.
Macau, 30 de Junho de 2011,
_________________________
João Augusto Gonçalves Gil de Oliveira
(Relator)
_________________________
Ho Wai Neng
(Primeiro Juiz-Adjunto)
_________________________
José Cândido de Pinho
(Segundo Juiz-Adjunto)
1 - Mário Brito, CCAnot., I vol., 1968, 377
2 - CCA, Pires de Lima e A. varela, nota ao artigo 299º
3 - Int.Est. Dto, 1970, 309 e 355
4 - Galvão Telles, Int. Est. Dto, Reimp., 2001, 260
5 - Isabel Magalhães Colaço, DIP, 63
6 - Notas do Coordenador do Projecto, ainda não publicadas.
7 - Processos 241/2005, 297/05, 304/05, 234/05, 320/05, 255/05, 296/05, respectivamente de 23/5/06, 23/2/06, 23/2/06, 2/3/06, 2/3/06, 26/1/06, 23/2/06, 330/2005 , 3/2006, 76 /2006.
8 - Processos 28/2007, 29/2007, 58/2007, de 21/7/07, 22/11/07 e 27/2708, respectivamente
9 - Cfr. processos, deste TSI, de 19/2/09, 314/2007, 346/2007, 347/2007, 360/2007, 370/2007
10 - Parecer da PGR n.º P001221988, de 18/11/88
11 - Proc. 55/2008, de 19/1/09, betweeen C and D Limited, in http://www.hklii.org/hk
12 - Vd. douto voto vencido nos Acórdãos 234/2005 e 257/2007, de 2/3/06 e 9/3/06, respectivamente
13 - Ac. TSI, proc. 2007-45-A, de 7/6
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645/2008 1/31