Proc. nº 34/2011
Acordam no TSI da RAEM
I- Relatório
Do despacho de fls. 2343 – que indeferiu a matéria exceptiva invocada pelo Ex.mo Chefe do Executivo da RAEM na sua douta contestação – veio o excepcionante apresentar reclamação para a conferência, concluindo-a do seguinte modo:
“i. O Despacho do M.mo Juiz Relator julgou improcedente a questão da ilegitimidade passiva suscitada pela Entidade Recorrida , aqui Reclamante;
ii. O Despacho Reclamado está ferido de ilegalidade, poerquanto as declarações do Ex.mo Senhor A implicam a aplicação do artigo 34º do CPAC, o qual estatuiir que “Não pode recorrer quem, sem reserva, total ou parcial, tenha aceitado, expressa ou tacitamente, o acto, depois de praticado” e no número 2 do mesmo artigo, preceitua que “A aceitação tácita é a que deriva da prática espontânea de facto incompatível com a vontade de recorrer”.
iii. As declarações do presidente da Las Vegas Sands indicam claramente a intenção de desistir de lutar pelas parcelas 7 e 8 do Cotai pelas razões já expressas na presente e na Contestação.
iv. Neste sentido, deverá concluir-se das referidas declarações que as Recorrentes tiveram um comportamento incompatível com a vontade de impugnar, o que é, aliás, defendido pela melhor doutrina e jurisprudência que versa sobre esta matéria, ao contrário do que foi decidido pelo Mmo Juiz Relator.
v. O Despacho declamado enferma de erro de direito, por errada interpretação do estatuído no artigo 34º do CPAC.
vi. Facto que implicaria, ao contrário do que concluiu o Despacho reclamado, a ilegitimidade das Recorrentes, o que constitui excepção dilatória e importa a absolvição da instância.
vi. Pugnando-se pela improcedência do recurso apresentado, à liz do referido preceituado”.
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“Venetian Macau, SA” e “Venetian Oriente, Limitada”, pronunciaram-se contra o deferimento da reclamação em termos que aqui, com a devida vénia, damos por reproduzidos (cfr. fls. 2361).
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Cumpre decidir.
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2- O Direito
A questão que se aprecia tem que ver com eventuais declarações que o Director Executivo da “Las Vegas Sands” teria proferido publicamente no sentido de que já não estava mais interessado nas parcelas 7 e 8 do COTAI. E, portanto, como o presente recurso contencioso tem, precisamente, por objecto a decisão administrativa que indeferiu o pedido de concessão dos referidos lotes, na tese do digno Reclamante as recorrentes teriam perdido legitimidade para o recurso.
Vejamos o teor do despacho reclamado, na parte que aqui mais interessa:
«Não está em causa que o Ex.mo Director Executivo tivesse proferido as palavras que, segundo a imprensa, teria proferido. Mas o facto de as poder ter proferido – e não há elementos seguros que as tivesse dito ou que as tivesse utilizado com esse propósito exacto – não envolve, necessariamente, uma abdicação do seu direito ao recurso. Em primeiro lugar, a vontade não se manifesta em declarações para o público, mas em actos concretos de que resulte, sim, o firme propósito de não manter o litígio. Em segundo lugar, uma declaração desse género não é vinculativa para o seu autor, nem, nesse sentido, é irrevogável. A todo o momento o declarante pode inflectir a vontade antes manifestada. Enquanto a declaração não for acompanhada de acções no mesmo sentido daquela, ela é ineficaz no tocante aos seus efeitos, Deste modo, não se vê como possam as declarações em apreço – se realmente prestadas - ser sinal de despojamento do seu interesse na construção nas parcelas 7 e 8 do Cotai, o que vale por dizer corresponder a uma aceitação do acto e que tenha efeitos de ilegitimidade superveniente. A prova disso está na circunstância de a peça de fls. 2286 contrariar eventuais propósitos de renúncia, desistência ou perda de interesse.
Pelo exposto, julga-se improcedente a “excepção”.
Sem custas».
Apreciando.
A Conferência mantém o despacho reclamado, por traduzir a melhor interpretação do art. 34º do CPAC.
Acrescenta-se apenas que, efectivamente, o preceito em causa, antes de mais nada, está gizado para uma situação anterior à própria introdução em juízo da matéria da impugnação contenciosa. Quer dizer, ele pressupõe uma actuação concreta do recorrente da qual decorra uma espécie de “ilegitimidade originária” e não superveniente no sentido adjectivo e estrito do termo. Ora, o acontecimento que o digno Reclamante invoca teria ocorrido já depois da apresentação do recurso contencioso, o que exclui a aplicação da referida norma. Nesse caso, o problema deixa de ser relevante do ponto de vista da aceitação, para eventualmente passar para o plano de desistência. Só que esta, para surtir os devidos efeitos, deve ser manifestada “dentro do processo” pela forma prevista na lei, e tal não foi o caso. O simples anúncio de um propósito fora dos autos (quod non est in actis non est in mundo) de que o recorrente se desinteressou das parcelas em causa não tem aqui qualquer eficácia, enquanto a vontade não for manifestada por actos expressos e objectivamente dirigidos a esse fim.
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3- Decidindo
Nos termos expostos, acordam em, sem mais considerandos, indeferir a reclamação e confirmar o despacho reclamado.
Sem custas.
TSI, 21 / 07 / 2011.
Presente José Cândido de Pinho
Vítor Coelho Lai Kin Hong
Choi Mou Pan