Processo nº 373/2009
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 28 de Julho de 2011
Descritores: Responsabilidade civil extracontratual
Falta do serviço
Princípio da colaboração
Informações
Responsabilidade por acto lícito
SUMÁRIO:
I- A responsabilidade civil extracontratual da Administração por erradas informações, nos termos do art. 9º, nº2, do CPA (principio da colaboração), é independente da culpa desde que sejam prestadas por escrito.
II- Não se pode falar em falta do serviço se a Administração muda de orientação a propósito de um tema após a prestação de uma informação com base naquela que vinha sendo a orientação anterior, especialmente se a nova posição pretende acolher a solução que deriva da vinculação legal.
III- A responsabilidade baseada em facto lícito pressupõe que o interessado sofra, por causa deste, prejuízos especiais e anormais.
Proc. nº 373/2009
Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM
I- Relatório
A, com os demais sinais dos autos, interpôs no T.A. acção para efectivação de responsabilidade civil extracontratual contra o Fundo de Pensões que, por decisão de 17/02/2009, foi julgada improcedente.
*
Dessa sentença interpôs então recurso jurisdicional, em cujas alegações apresentou as seguintes conclusões:
l.ª Na petição inicial, o Autor/Recorrente fez recair a responsabilidade da administração não apenas sobre a funcionária que lhe prestou uma informação, mas sobre todo o serviço do Réu/Recorrido.
2.ª No exercício da actividade administrativa, a administração pública e os particulares devem relacionar-se segundo as regras da boa-fé, devendo ponderar-se, nomeadamente, os valores da confiança suscitada na contraparte pela actuação em causa.
3.ª Os órgãos da administração e os particulares devem actuar em estreita colaboração recíproca, devendo prestar as informações e esclarecimentos solicitados;
4.ª A Administração Pública deve ser estruturada e funcionar de modo a aproximar os serviços das populações, a fim de assegurar a economia e a eficiência das suas decisões.
5.ª O preço da falta de coordenação existente nos serviços da Recorrida, onde alguns funcionários dão uma informação enquanto ao mesmo tempo outro funcionário trabalha na elaboração de um parecer que invalida essa informação prestada não pode ter que ser suportado pelos cidadãos.
6.ª A Recorrida violou com a sua actuação o Princípio da Boa-fé, o Princípio da Tutela da Confiança e o Princípio da Colaboração.
7.ª O dever de informar por parte do serviço público radica no Princípio da Colaboração, bem como na própria natureza dos serviços, pois se o serviço tem funcionários para atendimento e informações ao público, devem cumprir essas funções com zelo e diligência, nos termos do Estatuto de Pessoal da Função Pública.
8.ª A responsabilidade funcional ou responsabilidade de serviço nos presentes autos provém de uma sequência de actos da administração que, considerados no seu todo, enfermam de uma contradição capaz de induzir o Recorrente a perder o direito a receber a pensão de sobrevivência.
9.ª Não se provou que o Recorrente tenha sido alertado para a possibilidade de lhe ser retirado esse direito.
10.ª A conduta do Fundo de Pensões foi eticamente reprovável e antijurídica, por ter sido contrária aos princípios da boa-fé, da tutela da confiança e da colaboração.
11.ª A funcionária que prestou a informação ao Recorrente era uma chefia funcional do Núcleo de Inactivos da então divisão de subscritores, não era uma qualquer funcionária sem formação ou conhecimentos na matéria.
12.ª Após o casamento, o recorrente ainda recebeu durante dois meses a pensão de sobrevivência.
13.ª O facto ilícito praticado pela Recorrida tem que ver com a implementação de um determinado tipo de procedimentos internos que conduziram à perda do direito à pensão pelo Recorrente.
14.ª Pois, se o Recorrente soubesse que iria perder esse direito, não teria casado.
15.ª Existe um dever de competência da administração.
16.ª A culpa do serviço não depende do apuramento do comportamento censurável de certo e determinado funcionário ou agente, e afere-se da mesma maneira que a culpa de serviço pela diligência do funcionário zeloso e cumpridor dos seus deveres funcionais.
17.ª O apelo do legislador ao conceito do “bom pai de família” vertido no art. 480 do C.C. quando transposto para o âmbito da responsabilidade dos entes públicos, implica a comparação do comportamento ilícito apurado, com o que seria exigível a um funcionário ou agente zeloso e cumpridor.
18.ª A grande dimensão da Administração pública, a complexidade das suas funções, a constante variação dos seus servidores, a morosidade dos seus processos de trabalho, a rigidez das suas regras financeiras, e tantos outros factores de efeito análogo, transformam muitas vezes uma sucessão de pequenas faltas desculpáveis, ou até de dificuldades e atrasos legítimos, num conjunto unitariamente qualificável, ex post, como facto ilícito culposo.
19.ª A teoria da culpa funcional ou culpa do serviço implica que, nestes casos, a responsabilidade da Administração perante as vítimas não pode ser posta em dúvida: e todavia não há na sua base um comportamento individual censurável.
20.ª Verificam-se todos os pressupostos da responsabilidade da administração por factos ilícitos, nomeadamente: facto, ilícito, culpa, dano e nexo de causalidade.
21.ª A prestação de uma informação verbal com o conteúdo de que a contracção de um novo matrimónio não faz perder o direito à pensão, prestada pelo Fundo de Pensões, entidade pública com competência exclusiva nessa matéria, é um acto idóneo a gerar no particular que pretende não perder o direito à pensão que beneficiava a convicção de que não perderá essa qualidade ao casar novamente.
22.ª Essa informação é susceptível de relevar para a formação da sua decisão de contrair novo casamento.
23.ª A douta sentença recorrida deveria ter dado provimento ao pedido principal, mas não o tendo feito, sempre deveria ter julgado o pedido subsidiário procedente por se verificarem todos os requisitos da responsabilidade da administração por actos administrativos legais ou actos materiais lícitos.
24.ª Ainda que se entenda que não houve prática de qualquer facto ilícito pelo Recorrido, sempre se verificaram a prática de actos materiais lícitos por causa do interesse geral causadores de prejuízos especiais e anormais.
25.ª A informação prestada ao Recorrente estava em vigor no momento em que foi prestada, a decisão do Conselho de Administração do Réu de retirar a pensão ao Recorrente é legal (foi impugnada judicialmente sem sucesso) e o parecer que a fundamentou não é um acto administrativo. Porém,
26.ª O Recorrente não participou na elaboração desse parecer jurídico e agora há uma “nova interpretação” da lei que o Réu irá aplicar a todos os casos futuros, ou seja, com carácter de generalidade e abstracção, quer dizer, esse parecer foi feito no interesse geral.
27.ª O dano é a perda que o lesado sofreu em consequência de certo facto, nos interesses que o direito violado ou a norma infringida visam proteger.
28.ª Ao lado do dano real aparece o dano patrimonial, que é o reflexo daquele no património do lesado.
29.ª O dano abrange não apenas o dano directo mas também os danos indirectos, que são as consequências media tas ou remotas do dano directo.
30.ª A douta sentença recorrida negou a pretensão ao Recorrente com fundamento em considerações de ordem moral e social, sem qualquer suporte legal.
31.ª Considerações que, não só não resultaram dos factos provados nos presentes autos, como inquinam a douta sentença recorrida de ilegalidade, porquanto
32.ª Embora o art. 9.º, n.º 2, do C.P.A. estabeleça que «a Administração Pública é responsável pelas informações prestadas por escrito aos particulares», deve interpretar-se esta norma no sentido que, atribuindo a lei aos seus órgãos o dever jurídico de informar no âmbito das suas funções administrativas [alínea a) do n.º 1 do mesmo artigo], a Administração é responsável por informações dadas por esses órgãos por qualquer forma, inclusivamente as prestadas oralmente.
33.ª A douta sentença recorrida violou as normas jurídicas constantes do Artigo 83º da Lei Básica, Artigos 5º/1 e 8º/1 da Lei de Bases da Organização Judiciária, Artigos 8º/1 e 2, 9º/1 e 2-a) do Código do Procedimento Administrativo, dos Artigos 472º/2 e 480º/2 do Código Civil e ainda os artigos 2º, 4º, 7º e 10º do Decreto-Lei nº 21/98/M, de 22 de Abril.
*
A entidade recorrida, concluiu as suas alegações do seguinte modo:
a) O presente recurso tem por objecto a efectivação da responsabilidade civil extracontratual ao abrigo do disposto no Decreto-Lei nº 28/91/M, de 22 de Abril, não se afigura adequada nem admissível a discussão da invocada questão sobre a legalidade do acto administrativo então praticado pela Entidade recorrida - a decisão de cessação do pagamento da pensão de sobrevivência ao Recorrente na base da (recente e correcta) interpretação do preceito legal do artº 271º do ETAPM - a qual foi já definitivamente decidida por esse Venerando Tribunal e constituindo um caso julgado neste momento;
b) A questão ora em litígio deve exclusivamente cingir-se na verificação (simultânea) ou não dos quatro pressupostos: i) o acto ilícito, ii) a culpa, iii) o dano e iv) o nexo de causalidade, requisitos que a lei manda fundamentar a responsabilidade civil extracontratual das entidades públicas e dos seus titulares e agentes por actos de gestão pública;
c) No caso sub judice, não foi provada nenhuma situação de procedimento administrativo deficiente que conduziu à violação do direito do Recorrente ou de uma disposição legal destinada a proteger os seus interesses,
d) Nem tão-pouco a existência de situação de violação de normas legais e regulamentares ou de princípios gerais aplicáveis ou de actos materiais que infrinjam estas normas e princípios ou ainda das regras de ordem técnica e de prudência comum que devam ser tidas em consideração;
e) Conforme a matéria de facto dada como provada, a funcionária do Fundo de Pensões não actuou de forma negligente mas apenas prestou uma simples informação verbal com base na interpretação que tem vindo a ser adoptada e considerada correcta, na altura, pelo Fundo de Pensões, perante a questão levantada pelo Autor, aquando da sua deslocação às instalações do Fundo de Pensões a propósito da comunicação da alteração da sua morada (cuja proprietária é a sua actual cônjuge) e tratamento das respectivas formalidades;
f) Nem está em causa a violação de qualquer disposição legal, uma vez que a informação em causa reveste a natureza de simples informação verbalmente solicitada (pelo Autor) e prestada (pela referida funcionária), sem ser no seio de qualquer procedimento em curso;
g) Nem houve violação do princípio da boa fé ou do princípio de tutela de confiança, em virtude de a informação ter sido prestada pela referida funcionária de acordo com a interpretação ainda então adoptada pelo Fundo de Pensões, na convicção de que se comportava ao direito, não tendo qualquer intenção de prejudicar ninguém;
h) Dada a circunstância objectiva em que o próprio Fundo de Pensões apenas veio a saber que a interpretação até então adoptada (há mais de 12 anos) não era a mais correcta, na sequência do parecer 2/2005 cujo objectivo inicial era de esclarecer dúvidas suscitadas num caso de cessação de pensão de sobrevivência relativamente a um descendente dum falecido aposentado, a funcionária nunca podia prestar uma informação que mesmo a própria e o Fundo de Pensões não conheciam na altura;
i) A elaboração do aludido parecer teve início em finais de Maio de 2005, na sequência das dúvidas suscitadas no processamento do caso supra citado; contudo, no decurso do estudo, considerou-se indispensável a análise de todo o regime de atribuição e cessação de pensão de sobrevivência, pelo que, o âmbito do estudo tem sido sucessivamente alargado, abrangendo também as situações de atribuição e cessação de pensão de sobrevivência relativamente a outros beneficiários;
j) O alargamento do âmbito do estudo foi decidido em tempo posterior, tendo as dúvidas quanto à manutenção do direito à pensão de sobrevivência em relação aos cônjuges sobrevivos que contraísse novo casamento sido suscitadas apenas em finais de Junho de 2005 (isto é, após a prestação da informação em causa);
k) O referido parecer foi finalmente concluído em 25.07.2005, e perante as inesperadas conclusões relativamente às situações de cessação de pensão de sobrevivência quanto aos cônjuges sobrevivos, o Fundo de Pensões decidiu solicitar parecer dos SAFP sobre a matéria, tendo em conta a grande divergência das interpretações obtidas dos dois pareceres (parecer nº 046/AST/FPM/93, de 22.07.1993, e parecer nº 2/2005, de 25.07.2005);
1) Dada a natureza da informação e a circunstância temporal do caso sub judice, não se verifica a alegada situação de procedimento administrativo deficiente no Fundo de Pensões que possa ser enquadrada no conceito legal de ilicitude do acto para efeitos de responsabilidade civil extracontratual nos termos do aludido Decreto-Lei nº 28/91/M;
m) No que se referem aos acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo português citados pelo Recorrente, importa realçar que, independentemente dos entendimentos perfilhados pelo tribunal português sobre a matéria, não se considera existirem a aproximação da situação de factos entre os casos invocados o o caso sub judice;
n) A funcionária prestou, sem negligência e com boa fé, uma simples informação verbal conforme a interpretação que, ainda na altura, na sua convicção e na do próprio Fundo de Pensões, era considerada correcta;
o) Conforme oportunamente exposto na contestação bem como os elementos constante do processo administrativo ora apenso aos autos, em face das circunstâncias concretas da situação, nem o Fundo de Pensões nem a funcionária podiam ter, no momento da prestação da informação, agido de outro modo, senão de basear-se na interpretação efectivamente adoptada na altura, e que na sua convicção era correcta e se comportava ao direito;
p) Não teve o Fundo de Pensões nem a sua funcionária a intenção de induzir o Autor em erro, muito menos conduzí-lo, através da prestação de informações erradas e práticas contraditórias, a agir de forma a que resulta na perda do seu direito à pensão de sobrevivência;
q) Após conhecimento de que as conclusões preliminares quanto à questão referida na alínea i) supra se apontavam para uma interpretação divergente à então adoptada, os funcionários da subunidade responsável pela execução do regime foram devidamente informados da situação;
r) E, após confirmação da nova interpretação pelos SAFP, o Fundo de Pensões procedeu às necessárias diligências no sentido de divulgar a informação tanto a nível interno como a todos os beneficiários de pensão de sobrevivência (cônjuges sobrevivos), dando-lhes conhecimento da referida interpretação
s) A referida interpretação rectificada pelo Fundo de Pensões não foi tomada com o objectivo de lesar o direito deste ou aquele pensionista, muito menos com a intenção de prejudicar os direitos do ora A;
t) Após confinnação da nova interpretação, o Conselho de Administração do Fundo de Pensões deliberou no sentido de mandar cessar o pagamento da Pensão de sobrevivência ao Recorrente, por motivo de perda da qualidade de cônjuge sobrevivo (do casamento anterior), apenas a partir do mês de Agosto de 2005, o mês em que o Fundo de Pensões recebeu a confirmação da nova interpretação por parte dos SAFP (e não retroactivamente da data do novo casamento do Recorrente);
u) Conforme decidido pelo Tribunal a quo na douta sentença recorrida, não foi provada a existência de ilicitude e de culpa do Fundo de Pensões e/ou da sua funcionária que prestou a informação ao Recorrente;
v) O direito à pensão de sobrevivência atribuído aos cônjuges sobrevivos não é perpétuo nem vitalício, uma vez que está sujeito às vicissitudes previstas no artº 271º do ETAPM e pode cessar antes do falecimento do beneficiário, nomeadamente, por renúncia ou quando este vier contrair novo casamento ou mesmo passar a viver com alguém em situação de união de facto;
w) Mesmo que, por mera hipótese académica, se consideram preenchidos todos os requisitos acima indicados para efeitos de efectivação de responsabilidade civil, a indemnização só poderia, no entendimento da Entidade recorrida, ser realizada em prestações mensais correspondentes às pensões mensais de sobrevivência a que o Autor teria direito, até à verificação de qualquer uma das causas de cessação do respectivo direito à pensão de sobrevivência (e não apenas por falecimento do Recorrente, alegadamente, aos 79 anos);
x) Com o casamento que o Autor alega não teria celebrado se não fosse a informação prestada pela funcionária do Fundo de Pensões, o mesmo obteve e passou a gozar os benefícios inerentes a essa relação matrimonial, nomeadamente, o direito à cooperação, à assistência e à sucessão;
y) Os pedidos formulados na presente acção são infundados, inadequados, desajustados e exagerados;
z) O casamento é fonte das relações familiares e, juridicamente, um contrato livremente celebrado entre duas pessoas de sexo diferente que pretendem constituir família mediante uma plena comunhão de vida. (cfr. os artºs 1461º e 1462º do Código Civil);
aa) E a vontade e a decisão de contrair casamento, embora seja sempre de livre vontade dos nubentes, não pode ser tomada unilateralmente por qualquer um deles, nem pode estar sujeito a qualquer condição;
bb) É absolutamente inconcebível que a decisão de contracção de casamento esteja meramente dependente (ou sujeito às condições) do direito à pensão de sobrevivência que uma ou ambas as partes tem vindo a beneficiar na qualidade de ex-cônjuge sobrevivo de outrem;
cc) Se assim acontece, tal acto ou negócio seria contra os bons costumes e, sobretudo, a ordem pública, legalmente proíbido no Direito de Macau. (artº 264º do Código Civil);
dd) Tendo em conta o curto lapso de tempo entre as datas da prestação da informação e da celebração da convenção antenupcial, toma-se evidente de que na altura a relação estabelecida e mantida entre os então nubentes já se atingira um certo nível de estabilidade e intimidade;
ee) Mesmo que seja admitida a tese do Autor, de que o mesmo não teria contraído matrimónio com B, caso soubesse que implicaria a perda da pensão de sobrevivência, e que os mesmos iriam optar pela manutenção da relação de intimidade estabelecida, e continuar a coabitar na nova morada (comunicada pessoalmente ao Fundo de Pensões no próprio dia em que a informação em causa foi prestada - 20.6.2005) em condições análogas às dos cônjuges, o Recorrente acabaria igualmente por perder o direito à pensão de sobrevivência (deixada pelo seu ex-cônjuge) pelo facto de ter constituído ou vir a constituir uma situação de união de facto;
ff) O que significa que a consequência seria eventualmente a mesma, não se resultando, na prática, o valor dos danos que o Recorrente alega, na sequência da dita simples informação verbal dada pela funcionária do Fundo de Pensões;
gg) Por outro lado, se a contrição do novo matrimónio tivesse sido decidido pelo Autor apenas na base da simples informação verbal prestada pela funcionária, esse contrato jurídico padecia do vício de vontade que acarreta a sua anulabilidade, nos termos do artº 1504º, al. b) do Código Civil;
hh) No caso em apreço, não se verifica o nexo de causalidade entre a informação prestada pela funcionária do Fundo de Pensões e o dano alegado pelo Autor, seja qual for o montante;
ii) Em conclusão, não se encontrando preenchidos os requisitos legais para efeitos da responsabilidade civil extracontratual consagrado no Decreto-Lei nº 28/91/M, de 22 de Abril, logo, não haverá lugar a obrigação do Fundo de Pensões para indemnizar ao Autor;
jj) No que se refere ao pedido subsidiário formulado pelo Recorrente nos termos do artº 10º do Decreto-lei nº 28/91/M, a situação prevista no referido artº 10º (Responsabilidade por actos lícitos) não tem nada a ver com o caso sub judice;
kk) Conforme doutamente decidido pelo Tribunal a quo que a situação do Recorrente não constitui situação de interesse público para efeitos do artº 10º do Decreto-lei nº 28/91/M;
ll) Pelo que ao contrário do que o Recorrente defende, o Fundo de Pensões não tem obrigação de lhe indemnizar, nos termos do citado artº 10º do Decreto-Lei nº 28/91/M, em virtude de não preencher os requisitos legais nele previstos;
mm)Pelo exposto, a douta sentença recorrida é legal, adequada e justa, e não sofreu de nenhum vício de legalidade e/ou violação de lei que possa comprometer a nulidade ou a sua anulação, devendo, assim, ser mantida e confirmada nos seus precisos termos.
*
O digno Magistrado do MP opinou no sentido do improvimento do recurso.
*
Cumpre decidir.
***
II- Os Factos
A sentença impugnada deu por provada a seguinte factualidade:
O autor casou-se, no Regime de Comunhão de Adquiridos, com C em 11 de Janeiro de 1988.
C, esposa do autor, era contribuinte do Fundo de Pensões.
Com o falecimento de C em 31 de Janeiro de 2003, o autor tomou-se viúvo e cônjuge sobrevivo que podia gozar da pensão de sobrevivência de C.
Depois do falecimento da esposa, o autor requereu a pensão de sobrevivência, recebendo o valor líquido de MOPI0.470,50 por mês.
Em 20 de Junho de 2005, o autor deslocou-se ao Fundo de Pensões a fim de solicitar informações designadamente se ele perderá ou não o direito à pensão com novo casamento. O funcionário do réu, D, ex-chefia do grupo de aposentados da Divisão dos Contribuintes respondeu-lhe que não vai perder.
O autor ainda ficou informado de que casos semelhantes ao dele foram tratados da mesma forma.
O autor casou-se em 4 de Julho de 2005 com B.
O autor recebeu a pensão do mês de Julho de 2005.
Em 25 de Julho de 2005, o consultor jurídico do réu apresentou, através do parecer n.º 2/2005 o seguinte:
“49. De acordo com n.º 1 do art.º 270º no respectivo regime, a situação de aposentado extingue-se nos casos de:
a) Prescrição do direito;
b) Renúncia ao direito à pensão ou ao capital;
c) Perda da nacionalidade exigida para o exercício do cargo pelo qual o interessado foi aposentado;
d) Falecimento.”
Tendo chegado à conclusão seguinte: “a) a perda do direito à pensão de sobrevivência significa a extinção da habilitação do pensionista. A perda do direito à pensão verifica-se quando: o cônjuge sobrevivo contrair novo matrimónio (al. a) do n.º 3 do art.º 271).”
Existindo contradições entre afirmações jurídicas constantes no referido parecer e praxes do Fundo de Pensões, em 12 de Agosto de 2005, o Fundo de Pensões solicitou informações de direito, através do ofício n.º 02639/506/DS/FP/2005, à Direcção dos Serviços de Administração e Função Pública.
Em 12 de Agosto de 200S, a referida Direcção respondeu o seguinte através do ofício n.º 05081200007:
“De facto, o artigo 271º do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau não indicou explicitamente os casos de perda do direito à pensão, mesmo o nº 5 deste artigo limitou-se apenas à perda do direito à pensão. No entanto, devemos entender a situação segundo as disposições do art.º 271º e os assuntos relacionados a este artigo - a pensão dos membros familiares dos contribuintes. ……Por isso, caso o cônjuge sobrevivo contrair um outro casamento, terá razão suficiente de ele perder o direito à pensão do seu cônjuge falecido, razão pela qual consideramos correcto o entendimento do Fundo de Pensões acerca do assunto em causa.”
Em 25 de Agosto de 2005, através da notificação n.º 560/DS/FP/2005, cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido, o autor foi notificado de que o presidente do Conselho de Administração do Fundo de Pensões decidiu cancelar a concessão da pensão ao autor a partir do dia 1 de Agosto de 2005.
Em 5 de Setembro de 2005, o autor apresentou reclamação contra a decisão acima referida, mas posteriormente, isto é, em 2S de Setembro foi notificado de que a decisão foi mantida.
Em 21 de Outubro de 2005, o autor interpôs recurso hierárquico ao Conselho de Administração do Fundo de Pensões.
Em 24 de Novembro de 2005, o autor foi notificado de que o Conselho de Administração do Fundo de Pensões proferiu uma deliberação, determinando que o autor perde o direito à pensão por ter contraído novo casamento.
Em 16 de Dezembro de 2005, o autor interpôs ao Tribunal Administrativo o recurso contencioso da decisão acima referida, o qual foi julgado improcedente. No recurso interposto ao Tribunal de Segunda Instância, este decidiu manter a decisão.
A sentença que declarou do direito à pensão do autor foi transitada em julgado em Fevereiro de 2007.
O Fundo de Pensões deixou de conceder pensão ao autor quando ele tinha 45 anos.
O autor celebrou a convenção antenupcial na Conservatória do Registo Civil de Macau em 22 de Junho de 2005.
O autor decidiu contrair novo casamento tendo acreditado em que ele não perderá por isso o direito à pensão, porque ele tinha consultado ao réu, segundo este, desde 1993, mesmo beneficiários de pensão contraírem novo casamento, o réu continuava a conceder-lhes a pensão.
Se o autor tivesse sabido a perda do direito à pensão, não contrairia o casamento com a B.
***
III- O Direito
A causa de pedir da acção recorta-se numa errada informação que teria sido prestada ao autor e da qual lhe teriam advindo prejuízos.
Numa rápida pincelada, o quadro factual pode ser desenhado do seguinte modo:
A, na qualidade de viúvo, solicitou informação ao Fundo de Pensões sobre se, acaso de novo contraísse matrimónio, perderia ou não o direito à pensão de sobrevivência que estava a receber pela sua falecida esposa. A resposta foi negativa por parte de uma funcionária, face àquilo que era o entendimento do Fundo para situações similares. A casou, então, novamente em Julho de 2005. Todavia, em Agosto de 2005 o autor fora notificado de que o Presidente do Fundo de Pensões decidira cancelar a pensão a partir do dia 1 desse mês. Interposto recurso contencioso, a sua pretensão impugnativa naufragou em ambas as instâncias (TA e TSI). O prejuízo agora invocado resulta do valor correspondente ao número de meses (402) em que deixará de receber a pensão até aos 79 anos de idade, limite fixado nos termos do art. 270º do ETAPM).
A sentença recorrida, porém, não lhe reconheceu direito a indemnização com base na responsabilidade civil extracontratual invocada e a nossa tarefa é ver se a decisão tomada está certa.
Vejamos, pois.
Tudo nasce para o autor de uma alegadamente errada informação administrativa, com base na qual diz determinado a sua vida futura. Quer dizer, o casamento em 2ªs núpcias do autor só o celebrou, diz ele, por o Fundo de Pensões, através de uma funcionária, o ter esclarecido que a concretização dessa intenção não lhe traria desvantagens à sua esfera, concretamente, não perderia o direito à pensão de sobrevivência pelo falecimento de sua esposa dois anos antes do pedido de informação sobre o assunto. É que, acrescenta o ora recorrente, se lhe tivessem dito que perderia o direito à pensão, não teria casado! Tal qual.
No caso concreto, o autor limitou-se a chamar à colação na petição inicial a responsabilidade civil extracontratual, invocando no art. 41º da p.i., a violação dos princípios da boa fé e da confiança dos particulares na Administração (art. 8º, nº2, al.a), do CPA), bem como o da colaboração previsto no art. 9º, nº1, al. a), do mesmo Código. Isto é, se bem interpretamos o seu pensamento, tanto radica o direito à indemnização na actuação do funcionário que lhe prestou a informação (no caso da violação do princípio da colaboração do art. 9º, nº1, al. a), CPA), como também na actuação deficiente dos serviços, os quais, contrariamente ao que lhe fora dado a perceber e a confiar, agiram em sentido contrário ao da informação (art. 8º do CPA).
Comecemos pela invocação do princípio da colaboração com os particulares (art. 9º, do CPA). Um dos corolários por que ele se desdobra é o dever da Administração em prestar informações aos administrados (nº1, al. a), cit. artigo). Trata-se de um preceito que impõe esse dever, quer a informação seja procedimental e decorra portanto da existência do procedimento (art. 63º do CPA), ou não.
E a amplitude deste princípio é tão grande que foi ao ponto de gerar responsabilidade civil extracontratual pelas informações prestadas (nº2, do art. citado). Esta responsabilização pelas informações orais, segundo parece mais plausível, tem natureza objectiva porque independente da culpa de quem as prestou1.
Todavia, o Código pressupõe que a responsabilidade que dali emerge se baseie numa informação prestada por escrito, pretendendo afastar toda e qualquer informação fornecida oralmente, o que sem dúvida se admite suceda diariamente na miríade de organismos públicos que povoam a Administração, quantas vezes de forma não definitiva, simplesmente indicativa e por quem não tem o conhecimento cabal, profundo do caso, e até mesmo por quem não tem competência para se pronunciar responsavelmente sobre a questão concreta. Para fugir a esta problemática e ao perigo que representaria uma responsabilização sem limites nesses casos2,o legislador afastou do espectro da responsabilidade as informações orais. Mas, como se viu, a informação dada ao autor foi oral, pelo que escapa ao âmbito de incidência da norma e, assim, à possibilidade de accionamento da responsabilidade com base na “errada” informação.
É certo que a ideia de culpa do serviço pode ir além do que acabamos de dizer, pois geralmente dela também se costuma falar nos casos em que o facto ilícito danoso não deriva do comportamento de um funcionário ou agente em particular, mas antes de faltas diversas não discrimináveis de um conjunto de servidores da pessoa colectiva no seu conjunto3. Mas, como se viu, todo o problema em redor deste caso parte, nas palavras do então autor, da informação recebida de uma funcionária determinada, por sinal, “chefia funcional do núcleo de inactivos da então divisão de subscritores”. Quer isto dizer que, nesta perspectiva, também não podemos falar em falta do serviço.
Por outro lado, também não podemos concordar com o recorrente nas suas alegações quando à falta de serviço imputa aquilo a que chama falha de organização e de comunicação entre os departamentos da recorrida. Na verdade, o seu pensamento agora é dirigido contra uma actuação deficiente do Fundo, enquanto organismo. Mas acontece que nada obrigava o Fundo a permanecer na mesma posição, se a partir de dada altura chegou à conclusão que o seu comportamento passado em relação a certos casos estava errado do ponto de vista legal. A mudança de orientação, sobretudo se for para corrigir procedimentos e actuações ilegais anteriores e desse modo acolher a vinculação legal, mais do que falha de organização, representa antes a assunção do dever geral de observância do princípio da legalidade por parte da Administração.
Por conseguinte, deste ponto de vista também não estamos perante culpa do serviço.
*
E poderemos, ainda assim, accionar o mecanismo da responsabilidade com base na pretensa violação do princípio da confiança e da boa fé?
Um dos princípios por que a Administração Pública deve pautar a sua actividade é, efectivamente, o da boa fé. A boa-fé implica que se aja conforme a previsão normativa (significação objectiva) e que o comportamento assente numa convicção ou consciência de acção conforme o direito (significação subjectiva)4. A confiança implica que os cidadãos confiem na actuação da Administração. Todavia, essa confiança deverá ser consistente, de maneira a que, para se diga estar ferida, haja necessidade de uma referência relacional a uma situação anterior que sustente a fundada esperança numa dada solução a uma situação posterior5. Ora, no caso, aquilo que levou o autor a pedir a informação foi a desconfiança, assim supomos no mínimo, de que eventual segundo casamento podia fazer perder o direito à pensão. Quer dizer, ele não tinha a convicção segura e firme de que o casamento nada interferia com a percepção da pensão, pois, de outro modo, não traduziria a incerteza através da formulação de uma questão concreta. Logo, é porque o recorrente tinha dúvidas a respeito disso.
Mas, porque assim é, não havia um quadro relacional que o levasse a pensar (a confiar) que a Administração agiria de uma determinada maneira. A invocação do princípio só é feita a partir da informação ou por causa dela. Foi a partir dela que o autor (ora recorrente), convicto de que nenhumas consequências adviriam para a sua esfera, tomou a atitude de casar. Da mesma maneira, não podia ele ser levado a pensar que a Administração agiria conforme a previsão normativa ou a inferir que a acção se conformaria com o direito. Nada disso, porém, está em causa e os exemplos que vêm dos acórdãos citados nas alegações não correspondem ao caso concreto, que daqueles é bem diferente. Portanto, não é uma questão de boa fé ou de protecção de confiança nesta específica situação. Aliás, tanto uma (boa fé), como outra (confiança), representam limites da actuação discricionária da Administração e o fundamento que a levou a decidir coisa diferente da informação foi precisamente o cumprimento da lei substantiva, que alegadamente lhe imporia uma actuação vinculada no sentido da cessação da atribuição da pensão. Portanto, a situação em análise não é subsumível aos ditos princípios.
*
Estará afastada a hipótese de indemnização, mesmo assim?
A doutrina inclina-se para responder negativamente a esta questão6. Mas, para isso, o apelo ao DL nº 28/91/M parece inevitável, com o que o mecanismo da culpa deve ser chamado em socorro do caso.
O que dizer, então?
Como é sabido, os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual dos entes públicos, de verificação cumulativa, são: o facto ilícito, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto ilícito e o dano (cf. artº 2º, 3º e 4º do DL 28/91/M, de 22 de Abril e artº 477ºº do CC).
Para efeitos da responsabilidade civil extracontratual prevista no citado DL 28/91/M «…a ilicitude consiste na violação do direito de outrem ou de uma disposição legal destinada a proteger os seus interesses» (art. 7º, nº1), sendo certo ainda que “serão também considerados ilícitos os actos jurídicos que violem as normas legais e regulamentares, ou os princípios gerais aplicáveis e os actos materiais que infrinjam estas normas e princípios ou ainda as regras de ordem técnica e de prudência comum que devam ser tidas em consideração» (art. 7º,nº2).
Mas a verdade é que, como vem sendo considerado, «… não é qualquer ilegalidade que determina o surgimento de um acto ilícito gerador de responsabilidade civil. Para haver ilicitude responsabilizante, é necessário que a Administração tenha lesado direitos e interesses legalmente protegidos do particular, fora dos limites do ordenamento jurídico, ou seja, é necessário que a norma violada revele a intenção normativa de protecção do interesse material do particular, não bastando uma protecção meramente reflexa ou ocasional»7
Ou seja, o conceito de ilicitude não se reconduz, sem mais, ao conceito de ilegalidade, antes pressupõe a violação de uma posição jurídica substantiva (direito subjectivo ou interesse legalmente protegido) do particular, pois nem todas as normas têm por finalidade a protecção de direitos e interesses individuais dos particulares, sendo que é necessário, para que a ilegalidade gere ilicitude, que a norma violada revele uma intenção normativa de protecção do interesse cuja lesão o particular invoca, ou, como refere Gomes Canotilho, é necessário existir uma «conexão de ilicitude entre a norma e princípio violado e a posição juridicamente protegida do particular»8.
Ora, da actuação da funcionária em causa não resulta a violação de direitos substantivos do recorrente ou a violação de norma concreta que proteja os seus interesses. Dessa violação só se poderia falar se o recorrente se arrogasse titular de um direito ou se entrevisse nalguma norma o direito que a pessoa em causa negaria. Ora, o que se passou foi uma mera informação, a qual, por natureza, não concede, nem tira direitos e que, por isso também, é incapaz de violar qualquer norma que os tenha previsto. O único direito que o autor, aqui recorrente, pode invocar a este respeito é o direito a obter uma informação certa ou correcta. E só se a informação for errada é que pode nascer um direito novo na esfera do particular: um direito ao ressarcimento dos prejuízos que eventualmente a informação provocou.
Por outro lado, não vemos como se possa dizer em que medida a dita funcionária (até mesmo o organismo em que ela se integra) possa ter violado as normas legais e regulamentares, os princípios gerais aplicáveis e as regras de ordem técnica e de prudência comum que devessem ser tidas em consideração. Com efeito, ela não fez mais do que transmitir ao recorrente aquilo que era do seu conhecimento a respeito de casos similares ao deste interessado, ou seja, cumpriu a sua missão comunicando a posição do Fundo até àquele momento. Para dizer, pois, que não se descobre aqui nenhuma causa de ilicitude (não foi ilícita a sua informação), nem da sua parte, nem do próprio Fundo. Aliás, a própria decisão do recurso contencioso interposto da decisão do Fundo que lhe retirou a pensão, devidamente transitada, concluiu pela inexistência da apontada ilegalidade.
E se a funcionária agiu neste quadro (repete-se, num quadro de normalidade relativamente àquela que tinha vindo a ser a posição do Fundo sobre a matéria) igualmente nenhuma culpa (informou o que sabia ser a posição comum do Fundo sobre a matéria) lhe pode ser assacada se o destinatário da informação se veio a sentir prejudicado por uma mudança de orientação da pessoa colectiva em apreço.
Em suma, não pode o mecanismo da culpa abrigado no DL nº 28/91/M acudir à pretensão do recorrente9.
*
Mas o ora recorrente havia também formulado o “pedido subsidiário” de pagamento dos alegados prejuízos com base no art. 10º, nº1, do citado DL nº 28/91/M. Isto é, admitindo que a actuação do Fundo foi legal e lícita (sem discriminar se se referia à informação, se à decisão de cancelamento do pagamento da pensão), então teria ainda direito a ser indemnizado segundo a previsão daquele normativo.
Só que, como se sabe, esta responsabilidade civil extracontratual pressupõe a existência de prejuízos especiais e anormais. E prejuízos especiais e anormais, para serem considerados no âmbito desta responsabilidade por actos lícitos, não podem ser aqueles que a generalidade das pessoas sofreria em igualdade de circunstâncias. Por prejuízo especial entende-se aquele que não é imposto à generalidade das pessoas, mas a pessoa certa e determinada em função de uma específica posição relativa; por prejuízo anormal aquele que não é inerente aos riscos normais da vida em sociedade, suportados por todos os cidadãos, ultrapassando os limites impostos pelo dever de suportar a actividade lícita da Administração10. Ora, a situação que o recorrente descreve não é diferente daquela que todas e quaisquer outras pessoas teriam nas mesmas circunstâncias de vida em sociedade e no mesmo estado civil (viúvo) e na mesma situação de interessado (beneficiário de pensão de sobrevivência). Isto é, a perda desse “rendimento” atingiria essa categoria abstracta de pessoas e o prejuízo seria sentido por todas elas, em medida mais ou menos semelhante.
Por conseguinte, porque não se verifica o aludido pressuposto, também não podemos falar em responsabilidade civil extracontratual por actos lícitos.
***
IV- Decidindo
Nos termos expostos, acordam em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.
Custas pelo recorrente.
TSI, 28 / 07 / 2011.
_________________________ _________________________
José Cândido de Pinho Vitor Manuel Carvalho Coelho
(Relator) (Presente)
(Magistrado do M.oP.o)
_________________________
Lai Kin Hong
(Primeiro Juiz-Adjunto)
_________________________
Choi Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)
1 L. Ribeiro e C. Pinho, in Código de Procedimento Administrativo de Macau, anotado e comentado, pag. 111.
2 Neste sentido, Mário Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e J. Pacheco Amorim, in Código de Procedimento Administrativo, 2 ª, pag. 122).
3 Freitas do Amaral, Direito Administrativo, III, pag. 503-505. Também, Ana Raquel Moniz, in CJA, nº 50, Março/Abril de 2005, pag. 18.
4 Ac. TCA, de 30/11/2000, Proc. nº 256/97.
5 Ac. TCA, de 26/04/2001, Proc. nº 2010/98
6 F. Amaral e outros, in Código de Procedimento Administrativo, 2ª ed., pag. 38/39.
7 Neste sentido, entre outros, os acs. STA de 04.11.98, rec. 40.165, de 01.02.2000, rec. 44.099, de 24.03.2004, rec.1690/02, de 29.06.2006, rec. 1300/04 e de 15.05.2007, rec.1025/06 ainda, na doutrina, Gomes Canotilho, O Problema da Responsabilidade do Estado por Actos Ilícitos, pp 74 e Margarida Cortêz, Responsabilidade Civil da Administração por Actos Administrativos Ilegais e Concurso de Omissão Culposa do Lesado, p.65 e segs.
8 Apud, Gomes Canotilho, anotação ao Ac. STA de 12.12.1989, RLJ, ano 125º, nº3816, p.84 e Margarida Cortês, ob. citada, p. 76 e 80.
9 Nem mesmo o art. 478º, nº2 do CC lhe abriria as portas à indemnização.
10 Neste sentido o Ac. do STA de 2/12/2010, Proc. nº 0629/10.
---------------
------------------------------------------------------------
---------------
------------------------------------------------------------