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Processo nº 555/2011 Data: 22.09.2011
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Liberdade condicional.




SUMÁRIO

A liberdade condicional é de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social.
O relator,

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José Maria Dias Azedo

Processo nº 555/2011
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. A com os restantes sinais dos autos e ora preso no Estabelecimento Prisional de Macau (E.P.M.), vem recorrer da decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, motivando para, a final, concluir, imputando à decisão recorrida o vício de violação do disposto no artº 56º do C.P.M.; (cfr., fls. 114 a 118 que como as que adiante se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os legais efeitos).
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Sem resposta, vieram os autos a este T.S.I., e, em sede de vista, e em douto Parecer, opina o Exm° Magistrado do Ministério Público no sentido de se dever julgar improcedente o recurso; (cfr. fls. 126 a 126-v).

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Corridos os vistos legais dos Mmºs Juízes-Adjuntos, e nada obstando, vieram os autos à conferência.

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Passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Flui dos autos a factualidade seguinte (com relevo para a decisão a proferir):

– por Acórdão do T.J.B. de 01.12.2009, foi, A, ora recorrente, condenado na pena única de 4 anos de prisão, pela prática, em concurso real, de 1 crime de “detenção de armas proibidas”, 1 de “roubo” e 1 outro de “detenção ilícita de estupefacientes para consumo”;
– o mesmo recorrente iniciou o cumprimento de tal pena em 01.11.2010, e, em 30.06.2011, descontado o tempo em que tinha estado preventivamente preso, cumpriu dois terços da referida pena, vindo a expiar totalmente a mesma pena em 31.10.2012;
– se lhe vier a ser concedida a liberdade condicional, irá viver com a sua família em Macau, tencionando trabalhar como operário de construção.

Do direito

3. Insurge-se o ora recorrente contra a decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, afirmando, em síntese, que se devia considerar que reunidos estão todos os pressupostos do artº 56º do C.P.M. para que tal libertação antecipada lhe fosse concedida.

Cremos que censura não merece a decisão recorrida.

Vejamos.

— Preceitua o citado artº 56º do C.P.M. (que regula os “Pressupostos e duração” da liberdade condicional) que:
   “1. O tribunal coloca o condenado a pena de prisão em liberdade condicional quando se encontrarem cumpridos dois terços da pena e no mínimo 6 meses, se:
a) For fundamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; e
b) A libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social.
   
2. A liberdade condicional tem duração igual ao tempo de prisão que falte cumprir, mas nunca superior a 5 anos.
3. A aplicação da liberdade condicional depende do consentimento do condenado”; (sub. nosso).
   
Constituem, assim, “pressupostos objectivos” ou “formais”, a condenação em pena de prisão superior a seis (6) meses e o cumprimento de dois terços da pena, num mínimo de (também) seis (6) meses; (cfr. nº 1).

“In casu”, atenta a pena única que ao recorrente foi fixada, e visto que se encontra ininterruptamente preso desde 01.11.2010, expiados estão já dois terços de tal pena, pelo que preenchidos estão os ditos pressupostos formais.

Todavia, e como é sabido, tal “circunstancialismo” não basta, já que não sendo a liberdade condicional uma medida de concessão automática, impõe-se para a sua concessão, a verificação cumulativa de outros pressupostos de natureza “material”: os previstos nas alíneas a) e b) do nº 1 do referido artº 56º.
Na verdade, e na esteira do decidido nesta Instância, a liberdade condicional “é de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir óbviamente matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 20.01.2011, Proc. nº 30/2011 e o de 27.01.2011, Proc. nº 25/2011).

Assim, detenhamo-nos na apreciação de tais pressupostos de natureza material.

Ponderando na factualidade atrás retratada, poder-se-á dizer que é fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, mostrando-se a pretendida liberdade condicional compatível com a defesa da ordem jurídica e paz social?

Cremos que de sentido negativo deve ser a resposta, pois que atento o passado criminal do ora recorrente (cfr., fls. 17 e segs.), com várias condenações em penas de prisão, inviável é o referido juízo de prognose favorável, afigurando-se-nos também ser a pretensão em causa incompatível com a defesa da ordem jurídica e paz social.

De facto, antes da condenação na pena que agora cumpre cometeu o recorrente idêntico crime de “roubo”, importando também ter em conta a repercussão deste tipo de crime na sociedade, (e, especialmente, nos ofendidos), o que equivale a dizer que não podem ser postergadas as exigências de tutela do ordenamento jurídico; (cfr., F. Dias in “Dto Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, pág. 528 e segs.), havendo igualmente que salvaguardar a confiança e as expectativas da comunidade no que toca à validade da norma violada através do “restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada”; (cfr., F. Dias in “Temas Básicos da Doutrina Penal”, pág. 106).

Assim, em face das expostas considerações, e verificados não estando os pressupostos do art. 56°, n.° 1, al. a) e b) do C.P.M., há que confirmar a decisão recorrida.

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Pede também o recorrente apoio judiciário na modalidade de dispensa do pagamento de custas.
Sendo o mesmo residente da R.A.E.M. e atenta a situação em que se encontra, considera-se verificado o pressuposto legal enunciado no art. 4° do D.L. n.° 4/91/M, concedendo-se o peticionado apoio.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam negar provimento ao recurso, concedendo-se o pretendido apoio judiciário.

Custas pelo recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 4 UCs, (não tendo que as suportar enquanto se mantiver na situação de insuficiência económica).

Honorários ao Exm° Defensor no montante de MOP$900.00.

Macau, aos 22 de Setembro de 2011


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José Maria Dias Azedo
(Relator)

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Chan Kuong Seng
(Primeiro Juiz-Adjunto)

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Tam Hio Wa
(Segundo Juiz-Adjunto)

Proc.555/2011 Pág. 10

Proc. 555/2011 Pág. 1