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Proc. nº 451/2010
(recurso cível e laboral)
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 10 de Novembro de 2011
Descritores: Matéria de facto
Impugnação
Fundamentação

SUMÁRIO:
I- Não se acha necessário fazer voltar os autos à 1ª instância para os efeitos do disposto no art. 629º, nº5 do CPC, se o recorrente, ao mesmo tempo que requer a remessa ao tribunal “a quo”, por entender que o tribunal não foi esclarecedor, nem preciso na motivação das respostas, também impugna a matéria de facto, mostrando saber que nenhuma prova foi feita no sentido das respostas dadas a determinado ponto da matéria de facto.
II- Neste caso, porque o recorrente está a par de todas as provas, incumbe-lhe proceder como manda o art. 599º, nº1, al. a) e b) e nº2, do CPC, sem o que o tribunal de recurso não poderá efectuar a reapreciação das provas.





Proc. nº 451/2010
(Recurso Cível e Laboral)

Acordam no Tribunal de Segunda Instância

I- Relatório

A, com os demais sinais dos autos, intentou acção no TJB contra “B Engineering Co, Ltd” pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de Mop$ 699.148,34 e juros respectivos.
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Tendo a ré contestado e deduzido reconvenção, prosseguiram os autos os seus normais trâmites e no final foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e procedente a reconvenção, indo o autor condenado a pagar ao reconvinte a importância de Mop$ 781.000,00 acrescida de juros legais.
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É dessa decisão que ora vem interposto o presente recurso jurisdicional, em cujas alegações o autor formula as seguintes conclusões:
1. Vem o presente recurso interposto da decisão final que julgou improcedente a acção interposta contra a R./Reconvinte e procedente, por provado o pedido reconvencional da R./Reconvinte, condenando a A./Reconvinda a pagar a quantia de MOP$ 781.000.00, acrescida dos respectivos juros, nos termos então designados.
2. Essencialmente, não se conforma a Recorrente com a decisão proferida porquanto, salvo melhor opinião e o devido respeito, a decisão ora recorrida é nula porque deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar; não motivou devidamente as respostas dadas aos quesitos da base instrutória, situação que impede, em sede de recurso, um juízo concordante ou divergente com a mesma; e finalmente, julgou incorrectamente a matéria de facto perante a prova produzida no processo.
3. No caso em apreço, veio a A./Reconvinda, em sede de réplica, suscitar a falsidade do documento junto aos autos pela R. Reconvinte, que corporiza uma “Acta de Conversações”, alegadamente assinada por ambas as partes.
4. O referido documento foi sujeito a prova pericial, cujo relatório final, considerou, numa escala de 70% a 85%, ser muito provável que o documento tenha sido assinado pelo representante da A./Reconvinda.
5. Ora, havendo ainda esta percentagem de dúvida, deve entender-se que um documento intelectualmente falso é documento produzido com o intuito de desfigurar a realidade, especialmente quando se menciona no mesmo a prática de algum acto ou facto que não ocorreu.
6. Ora, perante a percentagem final do relatório pericial, e da percentagem de dúvida existente, que se poderá compreender entre 15% a 30%, não se deverá considerar a sua força probatória plena, principalmente se é com base neste documento e nesta dúvida que se sustenta a procedência do pedido reconvencional da R/Reconvinte.
7. Por outro lado, não obstante o grau de probabilidade da falsidade das assinaturas apostas, o douto Tribunal não se pronunciou sobre a falta ou vício de vontade de quem alegadamente o subscreveu, ou seja não se pronunciou sobre a sua validade.
8. Pelo que, entende-se que, deveria, pois o douto Tribunal “a quo” ter-se pronunciado sobre a falsidade de tal documento com a decisão da causa, que se revela de extrema importância para a procedência do pedido reconvencional da R/Reconvinte.
9. Situação que tipifica uma nulidade de sentença, nos termos do art. 571º, n.º 1, alínea d) do CPC, impondo-se o reenvio do processo para novo julgamento, uma vez que o documento em causa tem uma manifesta influência na decisão da causa.
10. Por outro lado, entende a Recorrente, salvo o devido respeito, que o douto acórdão não está devidamente motivado, como impõe o art. 556º, n.º 2 do CPC. 11. Na verdade, entende-se que a motivação apresentada no acórdão da matéria de facto, por genérica, não permite, o controle crítico da lógica que presidiu à decisão, impedindo o Tribunal de Recurso de formar um juízo concordante ou discordante com o mesmo.
12. Com que base se dá como provado que, em resposta ao quesito 37º “as três partes depois de terem assinado o documento mencionado na alínea C) da matéria dos fados assentes, procederam à alteração do seu conteúdo, mantendo-se a R. na gestão na obra e no fornecimento de materiais para a mesma”?
13. Por outro lado, existe uma contradição entre os factos provados e a própria motivação, senão vejamos: por um lado, o douto Tribunal “a quo” considera que não se consegue determinar as exactas alterações ocorridas ao acordo das partes, e quais as funções que cada parte exercia, e refere também que não se consegue precisar se a Ré cumpriu totalmente o acordo ou não, mas, por outro lado considera que a Ré se mantém na gestão da obra e no fornecimento de materiais.
14. Ora, é muito importante para a A./Reconvinda entender a linha de raciocínio que levou a esta decisão, a fim de recorrer adequadamente, pois, salvo o devido respeito, a decisão da matéria de facto não advém da prova produzida em audiência e da prova documental.
15. Sendo impossível de se apurar a motivação do Tribunal “a quo” na matéria de facto, bem como de analisar criticamente o testemunho das Testemunhas da Ré, impondo-se o reenvio do processo, nos termos do disposto no art. 629º, n.º 5 do CPC.
16. Por outro lado, a A./Reconvinda impugna também a decisão da matéria de facto, a qual, salvo o devido respeito, conforme referido, não advém da prova produzida em audiência e da prova documental junta aos autos.
17. E isso nota-se se atentarmos nos depoimentos das testemunhas da Ré/Reconvinte que mentiram ao afirmarem que a Ré mobilizou trabalhadores nos âmbitos das obras, da gestão e do projecto de obras, para formar uma equipa do projecto, a fim de coordenar a realização das obras e a respectiva gestão, quando na verdade a própria Ré junta um documento comprovativo de que apenas tem licença para trabalhar na R.P.C., e não em Macau, estando impossibilitada de disponibilizar os seus empregados para virem trabalhar para Macau, sem uma prévia autorização.
18. Estão, assim reunidos os pressupostos da impugnação da matéria de facto, previstos nos n.º s 1 e 2 do art. 599º, estando o Tribunal “ad quem” em condição de determinar a renovação dos meios de prova produzidos em primeira instância que se mostrem indispensáveis ao apuramento da verdade.
Termos em que, deverá ser dado provimento ao presente recurso nos termos supra referidos. Assim se fazendo JUSTIÇA!

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Não houve contra-alegações.
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II- Os Factos

A sentença recorrida deu por provada a seguinte factualidade:
- O autor é um empresário individual, dono da Empresa de Decorações e Obras XX (XX裝修工程公司) sita na Rua de XX, sem número, Edf. XX, Loja F, rés-do-chão, Taipa. Número de cadastro em Contribuição Industrial: 849XX(al. A) dos factos provados)
- A ré é uma sociedade limitada registada na República Popular da China. (al. B) dos factos provados)
- Em 20 de Maio de 2005, o autor, a ré e a Companhia de Construção Civil XX, Lda. assinaram um “acordo de cooperação para as obras de remodelação do átrio e edifício bloco A do Hotel XX Macau” que consta de fls. 21 a 33. (al. C) dos factos provados)
- Em 22 de Maio de 2005, o autor e a ré celebraram em Macau o acordo de forma oral. (al. D) dos factos provados)
- Segundo o acordo acima referido, os respectivos materiais devem ser transportados ao local de obra tempestivamente, conforme à programação da execução desta. (al. E) dos factos provados)
- Foi acordado que os materiais fornecidos pela ré devem preencher as exigências de MACAU XX HOTEL MANAGEMENT (INTERNATIONAL) LTD., da Companhia de Construção Civil XX, Lda. e dos respectivos projectores e consultores de obras. (al. F) dos factos provados)
- Antes do fornecimento, deve a ré submeter ao autor as amostras à aprovação e verificação das pessoas e companhias acima referidas (al. G) dos factos provados)
- No início, a ré submeteu as amostras à aprovação e à verificação das pessoas e companhias acima referidas. A ré também transportou tempestivamente os materiais ao local da obra, conforme à programação da execução desta. (al. H) dos factos provados)
- A ré forneceu ao autor materiais apenas no valor de MOP$1.954.610,08. (al. I) dos factos provados)
- O autor pagou à ré MOP$I.954.610,80. (al. J) dos factos provados)

Base instrutória
- Em data não apurada, a “Companhia de Construção Civil XX, Lda.”, e a Companhia “Macau XX Hotel Management (Intemational) Ltd.” combinaram que competiria àquela realizar, para esta, as obras de decoração nos átrio e edifício bloco A do Hotel XX Macau (art.º 1.º da base instrutória)
- As obras tinham a duração de 90 dias, desde 16 de Maio de 2005 a 13 de Agosto de 2005 (fls. 26) (art.º 3.º da base instrutória)
- Os materiais de construção deveriam satisfizer as condições fixadas pela “Companhia de Construção Civil XX, Lda.”. (fls. 27) (art.º 5.º da base instrutória)
- Antes de fornecimento dos materiais de construção, as amostras dos materiais tinham que ser submetidas à aprovação e à verificação “Companhia de Construção Civil XX, Lda.”. (art.º 6.º da base instrutória)
- Em 16 de Maio de 2005 iniciaram-se as obras. (art.º 7.º da base instrutória)
- O Autor, a Ré e a “Companhia de Construção Civil XX, Lda.” celebraram o documento mencionado na alínea C) da matéria dos factos assentes. (art.º 11.º da base instrutória)
- As três partes, depois de terem assinado o documento mencionado na alínea C) da matéria dos factos assentes, procederam à alteração do seu conteúdo mantendo-se a R. na gestão na obra e no fornecimento de materiais para a mesma. (art.º 37.º da base instrutória)
- As obras de decoração no edifício bloco A do Hotel XX iniciaram-se em 16 de Maio de 2005, tendo a Ré mobilizado empregados no âmbito de obras, da gestão e do projecto de obras, para formar uma equipa do projecto, a fim de coordenar a realização das obras e a respectiva gestão (art.º 42.º da base instrutória).
- Em 28 de Julho de 2005, quanto aos direitos e deveres das duas partes nas obras, o autor e a ré celebraram um documento que se chama “acta da conversação de 27 de Julho de 2005”. (art.º 46.º da base instrutória)
- Foram estabelecidos 4 acordos. (art.º 47.º da base instrutória)
- O segundo acordo regula que o autor deve pagar a ré uma despesa de gestão no valor de 4.5% de MOP$8.200.000,00 acrescido de MOP$2.500.000,00 (valor de obras posteriormente acrescidas) (art.º 48.º da base instrutória)
- Cinquenta por cento daquela despesa de gestão foi pago antes de 10 de Agosto de 2005. (art.º 49.º da base instrutória)
- O outro cinquenta por cento foi pago antes de 27 de Agosto de 2005. (art.º 50.º da base instrutória)
- O terceiro acordo trata-se dos lucros de materiais, devendo o autor pagar à ré lucros de materiais no valor de MOP$300.000,00. (art.º 51.ºda base instrutória)
- Valor este foi pago antes de 3 de Setembro de 2005. (art.º 52.º da base instrutória)
- O autor ainda não pagou à ré a despesa de gestão no valor de MOP$481.500,00 e lucros de materiais no valor de MOP$300.000,00. (art.º 56.º da base instrutória).
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III- O Direito
1- Introdução
O autor mostra-se inconformado com a sentença recorrida, que julgou a acção improcedente e procedente o pedido reconvencional que a ré contra si deduziu.
Em primeiro lugar, defende o recorrente que a sentença é nula (conclusão 2ª):
a) Por ter deixado de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar;
b) Por não ter motivado devidamente as respostas dadas aos quesitos da base instrutória;
Defende ainda que o tribunal julgou incorrectamente a matéria de facto perante a prova produzida no processo.
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2- Da nulidade da sentença
2.1- Quanto ao primeiro ponto, na tese da recorrente a nulidade decorreria da circunstância de o tribunal recorrido não se ter debruçado sobre a genuinidade de um documento apresentado pela ré/reconvinte.
Na opinião da recorrente, tendo a perícia efectuada concluído que o documento em causa teria sido, numa percentagem variável entre 70% a 85%, assinado pelo representante da autora/reconvinda, não estaria demonstrada totalmente a veracidade da assinatura. Ou seja, seria provavelmente falso.
Caso em que, perante a dúvida subsistente (entre 15% a 30%), não se deveria considerar a sua força probatória plena, principalmente se foi com base nele que a sentença sustentou a procedência do pedido reconvencional.
Mas, diz a recorrente, o tribunal não se pronunciou sobre a validade do documento, nem sobre a sua eventual falsidade.
E estaria, assim, encontrada a nulidade de que trata o art. 571º, nº1, al. d), do CPC. Vejamos.
Está em causa o documento nº 6 referido nos pontos 99 a 108 da contestação. Para o recorrente aquele documento nunca foi assinado por si (nem a sua designação corresponde ao da parte A que nele consta) e além disso a designação da parte B não corresponde à da ré (a parte B não chegou, de resto, a assinar o documento). Seria, assim, um documento falso!
Ora bem. Tal documento foi sujeito a uma perícia realizada no âmbito da Polícia Judiciária e o resultado é aquele que se encontra a fls. 421 a 424 dos autos: A assinatura do documento por parte do autor é muito provavelmente feita pelo próprio. Ou seja, o grau de probabilidade foi de 70 a 85%, fugindo a essa probabilidade uma margem que se situa apenas entre 15% e 30%.
O referido documento visava demonstrar que as três partes envolvidas assinaram um documento (a que chamaram “Acta de conversação”) em que o autor se comprometeu a pagar despesas de gestão e parte dos lucros obtidos na utilização dos materiais. Foi matéria que ficou inscrita nos artigos 46º a 52 da Base Instrutória, os quais mereceram resposta afirmativa.
O autor apresentou reclamação às respostas aos quesitos (fls. 555). Mas na respectiva peça, concretamente no que concerne a tal matéria limitou-se a dizer no ponto 11: “Os factos nºs 42, 46 a 52 e 56 contidos na base instrutória não devem ser confirmados”. Nada mais. Na decisão sobre a reclamação, também o colectivo nada especificamente disse (fls. 558).
Diz agora o recorrente que o tribunal não se pronunciou na sentença sobre a validade de tal documento! Mas tinha que pronunciar?
Sobre esta questão, as regras do direito aplicável são as seguintes:
- O tribunal julga a matéria de facto e as partes podem deduzir reclamação: art. 558º do CPC;
- A reclamação é decidida por meio de acórdão e da decisão não cabe nova reclamação (art. cit.), nem recurso jurisdicional autónomo, o que não significa, porém, que as mesmas partes não possam impugnar essa matéria de facto no recurso da sentença final no âmbito do art. 629º do CPC.
- A sentença discrimina os factos que considera provados (os factos seleccionados assentes e os provados em audiência) e aplica as normas jurídicas correspondentes (art. 562º, nº2, do CPC).
- Na sentença, o tribunal faz o exame crítico das provas de que lhe cumpra conhecer (art. 562º, nº3, “in fine”, do CPC).
Ora, ao contrário do que o afirma o recorrente, a sentença fez o exame crítico da prova aos quesitos 46º e sgs. (v.g. documento assinado pelas partes) e tirou as consequências jurídicas consequentes: o de que o consenso obtido através do documento obrigaria ao pagamento pelo autor/recorrente à ré do valor de Mop$ 481.500,00 a título de gestão, e de Mop$ 300.000,00 a título de lucros pelos materiais fornecidos (ver fls. 72 da sentença).
Sendo assim, não vemos em que medida é que a sentença deixou de se pronunciar sobre a matéria de facto concernente a este assunto, sendo até certo que não tinha que voltar a fundamentar a prova feita, nomeadamente regressar à análise do referido documento, uma vez que ele já tinha sido expressamente levado em consideração nas respostas do colectivo à matéria de facto.
Se o tribunal na altura própria deu por bom o resultado da perícia e se do documento extraiu as devidas consequências ao nível da prova, não tinha que incidir novamente a sua atenção sobre ele, mesmo que ainda restassem 15% a 30% de possibilidade de a assinatura nele aposta não ser do autor. A verdade é que a convicção do tribunal estava já formada e não tinha a sentença que confirmar ou desdizer a convicção já anteriormente obtida. Quer dizer, não está em causa a força probatória que o recorrente diz ter sido extraída do documento. O que acabou por ser valorado foi o resultado da perícia e o conjunto da prova reunida e, por fim, a convicção com que o tribunal ficou acerca do assunto discutido.
Razão pela qual não se pode dar por verificada a referida nulidade, improcedendo as conclusões 1 a 6 das alegações do recurso.
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2.2- O documento em causa foi objecto de uma perícia realizada pela Polícia Judiciária. Entende também o ora recorrente que o tribunal deveria ter feito uma pronúncia expressa acerca da validade do documento (conclusão 7-9 das alegações do recurso).
Mas também aqui carece de razão. Afinal de contas, o que estava em apreciação era simplesmente um exame para reconhecimento de letra tendente ao apuramento da autenticidade de uma assinatura constante do documento. O caso está, assim, inscrito na previsão do art. 503º do CPC. Uma vez feito o exame, haveria que dar conhecimento ao interessado do respectivo relatório (art. 508º, nº1, do CPC) e tal foi feito, pois dele foi o autor notificado (fls. 513 dos autos), nada dizendo, nem reclamando.
Ora, sendo o documento um meio de prova e estando impugnada a veracidade da letra (art. 469º do CPC), o resultado do relatório vem constituir um instrumento de auxílio à prova que o tribunal aprecia livremente, segundo a sua convicção e no conjunto de outras (testemunhais, etc), mas sobre o qual o mesmo tribunal não tem que emitir pronúncia específica. Isto é, o tribunal não tem que tomar nenhuma decisão judicial subsequente (Ac. R. L, de 10/05/2007, Proc. nº 1612/2007).
De qualquer modo, mesmo que se pense que o tribunal deve ajuizar acerca da genuinidade do documento em face da assinatura nele aposta, então pode dizer-se que a resposta ao quesito 46º já contém implícita essa decisão: o tribunal, afinal, considera que uma das assinaturas do documento é do autor, o mesmo é dizer, que considera verdadeira a letra e assinatura.
Improcedentes, pois, vão as conclusões 7 a 9 das mesmas alegações.
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2.3- Vem depois o recorrente sustentar que o Ex.mo juiz não apresentou, como devia, e lho impõe o art. 556º, nº2 do CPC, a motivação.
Em sua opinião, a motivação constante do acórdão sobre a matéria de facto, por genérica, não permite o controlo crítico da lógica que presidiu à decisão.
Refere-se o recorrente ao acórdão de fls. 550 a 554 dos autos, que motiva assim as respostas: “A convicção do tribunal no julgamento da matéria de facto baseou-se nos documentos juntos aos autos, mas especificamente os de fls. 10 a 295, 319 a 336, 359 a 364 e 400, no relativo1 pericial de fls. 399 a 512, no depoimento das testemunhas ouvidas em audiência, que depuseram com isenção e imparcialidade sobre os quesitos constantes da acta, cujo teor se dá por reproduzido aqui para todos os efeitos legais e que tinham conhecimento pessoal, o que permitiu formar uma síntese quanto à veracidade dos apontados factos”.
Sobre este ponto, a jurisprudência divide-se: Para uma parte dela, basta uma referenciação alusiva aos meios de prova de que o tribunal se tenha servido para as respostas aos quesitos; para outra, é preciso especificar, descer à minúcia de cada quesito e sobre cada um dar uma explicação cabal por que se decidiu num sentido e não noutro.
No caso presente, somos a entender não estarmos perante um grande modelo de perfeição a seguir nesta forma de motivar, por tão lacónica, genérica, sintética e conclusiva, uma vez que não estão especificados os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador, relativamente aos factos concretos. Embora a convicção do julgador resulte de um processo íntimo, quase insondável, a verdade é que o Código obriga o juiz a revelar a transparência do iter dessa convicção. Para tanto, impõe-lhe um mínimo de substanciação na indicação clara e inteligível sobre quais os meios de prova de que se socorreu para a análise dos factos dados por provados e não provados.
Mas, ainda assim, cremos que o modo como o tribunal respondeu e motivou as respostas, bem como decidiu a reclamação (fls. 557 e 558) com adição de nova motivação, é minimamente ilustrativo da exteriorização da razão da convicção do tribunal (neste sentido, v.g., Ac. STJ de 16/12/2004, Proc. nº 04B3896).
E esta conclusão não cria qualquer obstáculo ao direito de obtenção de uma motivação fáctica que permita um mais eficaz ataque à decisão, pois é certo que o art. 629º, nº5 do CPC permite que o processo baixe à 1ª instância se a parte, insatisfeita e impossibilitada de impugnar satisfatoriamente a matéria de facto, requerer que o tribunal “a quo” motive e explicite com precisão algum facto essencial. O que, aliás, o recorrente aqui também fez (ponto 15 das conclusões).
Ora, o que está em causa aqui é, concretamente, a matéria do quesito 37º da Base Instrutória. Não entende o recorrente com que base o tribunal deu a resposta afirmativa e explicativa a esse facto. Mas, o que é surpreendente é que o recorrente tenha apresentado reclamação (fls. 555 e 556 dos autos) e nela feito referência à resposta a esse mesmo quesito (ponto 2 da reclamação) e mesmo assim tenha deixado escapar qualquer ataque à motivação a respeito dele e só agora o venha fazer. Quer dizer, na altura própria o reclamante não desferiu nenhum protesto ao modo como o tribunal de 1ª instância deu tal resposta ou como a motivou e agora pretende que o processo volte ao TJB para o efeito! Não faz sentido.
Aliás, o recorrente também acha haver contradição entre os factos provados e própria motivação. Diz: “13. por um lado, o douto Tribunal “a quo” considera que não se consegue determinar as exactas alterações ocorridas ao acordo das partes, e quais as funções que cada parte exercia, e refere também que não se consegue precisar se a Ré cumpriu totalmente o acordo ou não, mas, por outro lado considera que a Ré se mantém na gestão da obra e no fornecimento de materiais. 14. Ora, é muito importante para a A./Reconvinda entender a linha de raciocínio que levou a esta decisão, a fim de recorrer adequadamente, pois, salvo o devido respeito, a decisão da matéria de facto não advém da prova produzida em audiência e da prova documental. 15. Sendo impossível de se apurar a motivação do Tribunal “a quo” na matéria de facto, bem como de analisar criticamente o testemunho das Testemunhas da Ré, impondo-se o reenvio do processo, nos termos do disposto no art. 629º, n.º 5 do CPC”.
E esta matéria está na linha do ponto 2 e 3 da dita reclamação. Mas até a isso o tribunal respondeu com clareza e coerência (ver fls. 557 e vº). Realmente o facto de estar provado um acordo inicial (alínea C) da Especificação) não obsta a que posteriormente tenham procedido á alteração do seu conteúdo, tal como respondido no quesito 37º, em virtude do qual a ré ficaria na gestão da obra e no fornecimento de materiais para a mesma. Nada disto é contraditório com a matéria da alínea C). Da mesma maneira, nenhuma contradição avistamos entre aqueles dois factos (alínea C) e resposta ao quesito 46º da Base Instrutória) porque se reportam a circunstâncias distintas, justificadas pelo decurso da relação entre os intervenientes nesta obra e separadas no tempo. Em nossa opinião, andou bem o tribunal “a quo” na resposta que sobre o assunto deu à reclamação.
Mas, quanto à necessidade de fazer voltar os autos à 1ª instância para efeitos do quesito 37º, efectivamente não se vê razão justificativa para tal, não só porque o tribunal recorrido assentou a sua convicção em várias provas, mas também em virtude de o recorrente contrariar o julgamento feito pelo tribunal “ a quo” sobre a matéria de facto. Ou seja, o recorrente não se limitou a declarar-se impossibilitado de compreender a razão pela qual foi dada por provada determinada factualidade, antes foi ao ponto de a impugnar por considerar que a prova produzida não podia ter levado o tribunal recorrido a julgar a matéria de facto daquele jeito. Isto é, o recorrente fez um juízo crítico sobre a matéria de facto, mostrando estar à vontade para o fazer, sem constrangimento sobre o conhecimento do que entendia estar e não provado. Basta ler a sua peça alegatória para isso mesmo se concluir (ver pag. 586).
E se assim é, se o recorrente diz que não foi feita prova daquele facto, deveria ter procedido como manda que se faça o art. 599º, nº1, indicando quais os meios concretos probatórios que impunham decisão diversa (al. b)) e indicando as passagens da gravação em que se funda (nº2), sem o que o tribunal “ad quem” não pode fazer a reapreciação da prova feita. E isso não fez o recorrente.
Aliás, na mesma página das alegações, o recorrente até acaba por dar razão ao tribunal (relativamente à forma como decidiu a matéria de facto) ao afirmar que as testemunhas da ré “mentiram”. Poderia até ter sido com base nessas testemunhas que o tribunal formou a sua convicção, mas o certo é que o recorrente acaba por admitir ter havido “prova” no sentido das respostas dadas. Para impugnar esta matéria deveria, portanto, ser preciso e minucioso, apontando os pontos da gravação de onde se pudesse inferir coisa contrária à provada.
Eis a razão pela qual se nega procedência à matéria dos pontos 10 a 15 das conclusões alegatórias.
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3- Por fim, o recorrente impugna a matéria de facto nas conclusões 16 a 18 das suas alegações.
Mas o assunto não merece mais alongadas considerações do que aquelas que acabámos agora mesmo de referir: não pode o tribunal sindicar a matéria impugnada, por nem ter sido feita uma indicação precisa dos factos sobre os quais mostra divergência de prova, como ainda por o recorrente não ter respeitado as exigências formais previstas no art. 599º, nº 1, al. a) e b) e nº2 do CPC.
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Tudo, para dizer, em suma, que o recurso não pode proceder.

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IV- Decidindo
Nos termos expostos, acordam em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.
Custas pelo recorrente.
TSI, 10 / 11 / 2011
José Cândido de Pinho
Lai Kin Hong
Choi Mou Pan




1 Quereria, talvez, dizer-se “relatório”.
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