打印全文
Processo nº 437/2011 Data: 06.10.2011
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Acidente de viação.
Indemnização por danos patrimoniais.
Indemnização por danos não patrimoniais.




SUMÁRIO

1. O montante da indemnização por danos patrimoniais depende da (efectiva) prova dos prejuízos (e seu quantum) cabendo a quem invoca tais prejuízos o ónus da sua prova.

2. Por sua vez, a indemnização por danos não patrimoniais tem como objectivo proporcionar um conforto ao ofendido a fim de lhe aliviar os sofrimentos que a lesão lhe provocou ou, se possível, lhos fazer esquecer.
Visa, pois, proporcionar ao lesado momentos de prazer ou de alegria, em termos de neutralizar, na medida do possível, o sofrimento moral de que padeceu, sendo também que em matérias como as em questão inadequados são “montantes miserabilistas”, não sendo igualmente de se proporcionar “enriquecimentos ilegítimos ou injustificados”.


O relator,

______________________
José Maria Dias Azedo


Processo nº 437/2011
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Em audiência colectiva no T.J.B. respondeu A, com os restantes sinais dos autos, vindo a ser condenado pela prática de 1 crime de “ofensa à integridade física por negligência”, p. e p. pelo art. 142°, n.° 3 do C.P.M. na pena de 1 ano e 9 meses de prisão suspensa na sua execução por 2 anos.

*
Em relação ao pedido de indemnização civil enxertado nos autos, decidiu o Colectivo julgá-lo parcialmente procedente, condenando a Companhia de Seguros B a pagar à demandante C, o montante total de MOP$580.656.40 a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais por aquela sofridos; (cfr., fls. 512 a 512-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

*

Inconformado, o demandante civil recorreu para, em síntese pedir um aumento da mencionada indemnização; (cfr., fls. 532 a 538-v).

*

Respondendo, pugna a recorrida Companhia de Seguros pela improcedência do recurso; (cfr., fls. 553 a 563).

*
Nada parecendo obstar, passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Dão-se aqui como integralmente reproduzidos os factos dados como provados no Acórdão recorrido e que constam a fls. 509 a 509-v.

Do direito

3.1. Do “recurso interlocutório”.

Com o recurso da decisão final subiu também um recurso interlocutório interposto pela Companhia de Seguros B.

Tendo a mesma pedido que se dê sem efeito tal pedido, assim se decidirá.

3.2. Do “recurso da decisão final”.
O presente recurso tem como objecto o segmento decisório ínsito no Acórdão do T.J.B. com o qual se deu solução ao pedido de indemnização civil pela demandante, ora recorrente, enxertado nos autos.

Na então apresentada petição inicial pedia a ora recorrente uma indemnização no montante global de MOP$2.333.984,90, assim justificando o mesmo:

“a) MOP$39.574,50 (trinta e nove mil e trezentas e quarenta e nove patacas e cinquenta avos) em despesas médicas, hospitalares, de operações cirúrgicas, de tratamentos subsequentes e medicamentosas na vertente de danos emergentes, apenas até ao presente momento;
b) MOP$7.624,60, em despesas relacionadas com os produtos alimentícios e vitaminas para ajudar a recuperação do estado de saúde da ofendida na vertente de danos emergentes, apenas até ao presente momento;
c) MOP$28.750,50 em despesas relacionadas com as diversas deslocações por via aérea entre Taiwan/Macau/Taiwan, na vertente de danos emergentes, apenas até ao presente momento;
d) MOP$4.481,80 em despesas relacionadas com a estadia e alojamento durante as diversas deslocações para Macau, pela ofendida e seus familiares acompanhantes, na vertente de danos emergentes, apenas até ao presente momento;
e) MOP$228.947,40, relacionado com as remunerações pagas a uma empregada qualificada para prestar os serviços de cuidado especial (durante 24 horas) e normal à ofendida, durante os períodos de 10.3.2007 a 10.08.2007 e 11.08.2007 a 10.02.2008, na vertente de danos emergentes;
f) MOP$4.606,10, relacionado com as chamadas internacionais feitas por motivo do acidente em causa, na vertente de danos emergentes;
g) MOP$1.020.000,00 (um milhão e vinte mil patacas), correspondente a perda dos rendimentos mensais que se acumula( de Fev/2007 até Julho/2008), apenas até à presente data, a título de lucros cessantes,
h) MOP$l.000.000,00 (um milhão de patacas) a título de danos morais, nomeadamente pela dor, sofrimento e as marcas e cicatrizes, sobretudo pelo estado actual de saúde e a perda de memória, a tontura, dor de cabeça, a instabilidade emocional, narcolepsia, a falta de concentração, a perda da capacidade de proceder cálculos e de compreensão”; (cfr.,fls. 120 a 121).

Apreciando tal pretensão, e como se deixou relatado, fixou o Colectivo a quo o quantum de MOP$580.656,40, resultante da soma de MOP$39.799.50 a título de despesas médicas, MOP$7.624.60 a título de suplementos alimentares, MOP$28.750.50 a título de despesas de transporte dos familiares da ofendida, MOP$4.481.80, a título de despesas de alojamento e alimentação, (perfazendo o total de MOP$80.656.40 fixado a título de danos patrimoniais), e MOP$500.000,00, a título de danos não patrimoniais.
E, com o presente recurso, pede agora a recorrente que lhe seja arbitrado o montante total de MOP$2.330.884.00, como resultado das seguintes parcelas:

- MOP$41.079.76, por despesas médicas;
- MOP$7.624.60, por despesas com suplementos;
- MOP$28.750.50, por despesas de transporte;
- MOP$4.481.80, por despesas de alojamento e alimentação;
- MOP$228,947.40 pela despesa na contratação de uma enfermeira;
- MOP$1.020.000,00, por perda de rendimentos; e,
- MOP$1.000.000,00, por danos não patrimoniais.

Verificando-se assim que o inconformismo da recorrente assenta na diferença entre o montante peticionado a título de “despesas médicas” e “danos não patrimoniais”, e no não arbitramento de qualquer indemnização a título de “perda de rendimento” e “despesa com a enfermeira” que alega ter contratado, vejamos se lhe assiste razão.

Comecemos pelos “danos patrimoniais”.
Pois bem, em sede da matéria de facto, deu o Tribunal como provado que a ora recorrente teve prejuízos (materiais) num total de MOP$80.656.40, indicando precisamente as quantias que constituíam as parcelas indemnizatórias que atrás se deixaram especificadas, dando também expressamente como não provado qualquer “perda de rendimentos” por parte da ofendida (MOP$1.020.000,00), assim como a despesa com a “contratação de uma enfermeira”, (MOP$228.947.40).

Inexistindo qualquer vício na decisão da matéria de facto, em especial, o de “erro notório na apreciação da prova”, pois que não violou o Tribunal a quo as regras sobre as provas de valor tarifado, as regras de experiência e legis artis, (nota-se que os documentos com os quais pretendia a ora recorrente provar a sua profissão e perda de rendimentos são meras fotocópias, sendo o último datado de 2005, e certo sendo que o acidente ocorreu em 2007), sem demoras se nos mostra de dizer que na parte em questão, (quanto aos danos patrimoniais), improcede o recurso.

De facto, a quem invoca um direito cabe o ónus da prova dos factos que o sustentam, e sem prova dos ditos factos, impossível é reconhecer qualquer direito.

Quanto aos “danos não patrimoniais”.

Pedia (e pede) a recorrente MOP$1.000.000,00, e fixou o Colectivo a quo MOP$500.000,00.

Provado está que do acidente de viação em causa resultaram para a recorrente lesões graves na sua cabeça, com fractura craniana, como se pode constatar dos documentos de fls. 14, 49, 62 e 64 dos autos, (cujo teor foi dado como assente).
Como é sabido, “a indemnização por danos não patrimoniais tem como objectivo proporcionar um conforto ao ofendido a fim de lhe aliviar os sofrimentos que a lesão lhe provocou ou, se possível, lhos fazer esquecer.
Visa, pois, proporcionar ao lesado momentos de prazer ou de alegria, em termos de neutralizar, na medida do possível, o sofrimento moral de que padeceu”; (cfr., v.g., o Ac. de 03.03.2011, Proc. n° 535/2010), sendo também de considerar que em matérias como as em questão inadequados são “montantes miserabilistas”, não sendo igualmente de se proporcionar “enriquecimentos ilegítimos ou injustificados.

Nesta conformidade, tendo também presente o estatuído no art. 487° do C.C.M., e atenta a culpa exclusiva do arguido cremos que adequado é o montante de MOP$600.000,00.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos que se deixam expendidos, acordam declarar extinto o recurso interlocutório, julgando-se parcialmente procedente o recurso.

Custas do recurso interlocutório pela respectiva recorrente, e do recurso final, pelo recorrente e recorrida na proporção dos seus documentos.

Macau, aos 06 de Outubro de 2011
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa






Proc. 437/2011 Pág. 12

Proc. 437/2011 Pág. 1