ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:
1. Relatório
A interpôs recurso contencioso de anulação da decisão do Exmo. Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas de 21 de Dezembro de 2010 que indeferiu, segundo alegou a recorrente, o recurso hierárquico por si interposto, mantendo assim a decisão do Gabinete para o Desenvolvimento de Infra-estraturas da RAEM que lhe aplicou as multas de MOP$315,000.00 respeitante ao atraso injustificado do prazo em 21 dias e de MOP$60,900.00 respeitante ao encargo com a fiscalização aplicada.
Por Acórdão proferido em 17 de Maio de 2012, o Tribunal de Segunda Instância decidiu negar provimento ao recurso, mantendo o acto recorrido.
Inconformando com a decisão, vem a A recorrer para o Tribunal de Última Instância, apresentando as seguintes conclusões:
1. Vem o presente recurso interposto do douto Acórdão do Tribunal da Segunda Instância, que decidiu negar provimento ao recurso nos autos de recurso contencioso, mantendo o acto administrativo recorrido: do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 21/12/2010, que indeferiu o recurso hierárquico apresentado pelo Recorrente, mantendo a decisão do Coordenador do Gabinete para o Desenvolvimento de Infra-estruturas da RAEM constante na informação nº. XXXX/GDI/2010, datada de 30/11/2010, de aplicação da medida compulsória1 de MOP$315,000.00 respeitante ao atraso injustificado do prazo de 21 dias e de MOP$60,900.00 respeitante ao encargo da fiscalização.
2. A Recorrente, A, é uma sociedade comercial registada na Conservatória do Registo Comercial e de Bens Móveis de Macau sob o nº XXXXX(XX), que tem como objecto Construção Civil e Consultadoria dentro da RAEM.
3. De acordo com o despacho datado de 29 de Maio de 2009, decidiu o Exmo. Senhor Chefe Executivo adjudicar à Recorrente a obra de Empreitada da Passagem Superior para Peões da [Endereço] – com a referência n.º XX/2009.
4. No acórdão recorrido o Tribunal a quo deu como provado o seguinte: Facto 7º “- A Recorrente não impugnou a supra decisão.”, com todo o devido respeito, não tem razão e há erro, quando o Tribunal a quo prova que a ora Recorrente não impugnou a decisão, constante na informação no. XXX/GDI/10 de 7/04/10, porque a ora Recorrente como já sabia da impossibilidade em concluir as obras no dia 25/05/10, e em nome do princípio de Boa Fé e da Cooperação, apresentou fundamentando todas as razões o pedido de prorrogação do prazo com dois meses de antecedência, em 19/03/2010 por documento no.XX/XXXX/XXX/10, e de seguida em 12/05/2010 por documento no.XX/XXXX/XXX/10, em 19/05/2010 por documento no.XX/XXXX/XXX/10, e em 28/05/2010 por documento no.XX/XXXX/XXX/10, para acautelar todos os seus interesses, como se prova pelos documentos de folhas 364 a 365; 394 a 396 e 90 a 95, todos nos autos do recurso contencioso;
5. Referente à decisão constante na informação XXX/GDI/2010 de 7/04/2010, o Gabinete para o Desenvolvimento de Infra-estruturas (“GDI”) por ofício XXXX/GDI/2010 de 25/05/2010, veio informar à ora Recorrente de que, se não tiver motivos suficientes para justificação da prorrogação de prazo, a Entidade Recorrida irá aplicar o acto sancionatório à ora Recorrente, nos termos artigo 9º alínea 1 e 2, em que está estipulado no contrato de empreitada, e a mesma em nome do principio de boa fé e da cooperação, com a referida decisão constante na informação supra referida, em resposta a esse ofício, veio de imediato em 28/05/2010 por documento no.XX/XXXX/XXX/10, justificar a necessidade dos dias, como se prova pelos documentos de folhas 193 a 203; 386; 416 a 419, todos nos autos do recurso contencioso;
6. Não pode o Tribunal a quo considerar que não houve impugnação da parte da Recorrente.
7. Relativamente a consideração dos dias a atribuírem à ora Recorrente por mau estado de tempo, no acórdão recorrido deu o Tribunal a quo como provado o seguinte: Facto 8º “Em 19/05/2010 e 28/05/2010, a Recorrente, através dos ofícios nºs XX/XXXXX/XXX/10 e XX/XXXXX/XXX/10, pediu novamente a prorrogação dos prazos por mais 21 e 4 dias, respectivamente, ou seja no total de 25 dias, a contar desde 25/05/2010, com o fundamento de que entre o período de 19/03/2010 a 25/05/2010, houve 25 dias de chuva que não permitiram a realização de obras no campo exterior”;2 e Facto 12º “... Considerar verificado o atraso injustificado na conclusão da obra por 21 dias (entre 05/06/2010 a 30/06/2010, descontando 5 dias de chuva com precipitação superior a 20mm)”.3 E ainda Facto 13º “- O registo da precipitação do período entre Março a Junho do ano de 2010 consta de fls. 98 a 119 dos autos, cujo teor aqui se dá integralmente reproduzido”. E fundamentando que “Não resulta dos autos outros elementos que permitam afastar a opinião técnica da entidade fiscalizadora da obra, no sentido de que os dias de chuva com precipitação inferior a 20mm não impedem a realização de trabalho no campo exterior sem cobertura.”4
8. Todavia, como se prova pelos documentos de folhas 98 a 119, 371 a 384, juntos nos autos do recurso contencioso, não pode a Recorrente concordar com o Tribunal a quo, porque, em dias de chuva com precipitação inferior a 20mm, impedem toda a realização de trabalho nas obras exteriores ou obras não cobertas, que, ou pelos menos atrasem tais obras.
9. E, se entre 05/06/2010 a 30/06/2010, foram descontados os 5 dias de chuva, em concreto pelos dias 9, 10, 23, 26 e 28 de Junho de 2010, porque foram dias de chuva com precipitação superior a 20mm,5 então, o dia imediato seguinte da chuva intensa 11, 24, 27 e 29, de certeza, seria impossível executar qualquer obra no exterior, por haver muita humidade e poças de água.
10. E ainda foram os dias de Fevereiro a Junho de 2010 com humidade relativa média entre 79% a 91%, em que foi impedindo a realização de obras, contrariamente se fosse possível realizar conforme o prazo do contrato da obra de empreitada tinha em Julho a Dezembro de 2009 apenas humidade relativa média entre 55% a 70%.6
11. Com todo o devido respeito devendo o Tribunal a quo na selecção da matéria de facto dar como provados os seguintes factos XXXVI; XXXVII. e XLVI apresentados pela ora Recorrente.
12. E como não o fez, temos a opinião de que, o Tribunal a quo errou na selecção da matéria de facto e de julgamento, devendo desta forma atribuir os 25 dias, adicionando, no mínimo os 4 dias, dos dias seguintes à chuva intensa (11, 24, 27, 29/05/2010) uma vez que é impossível execução de obras com humidade e chuva. Devendo nesta forma atribuir num total de 29 (25+4) dias, no mínimo, relativamente ao mau estado de tempo por haver provas documentais e testemunhais.
13. Relativamente a consideração dos dias a atribuírem à ora Recorrente por obras adicionais, o acórdão recorrido deu como provado o seguinte: Facto 14º “- Foram realizadas as seguintes obras adicionais a pedido do dono da obra: (1) Na superfície do tabuleiro adicionar ladrilho táctil plástico de cor amarelo; (2) Nos parapeitos dos dois lados da passagem superior adicionar rodapés em aço inoxidável; (3) Na plataforma de subida/descida do acesso para manutenção, sitos nos extremos do tabuleiro, adicionar corrimão e rodapés em aço inoxidável; (4) Nos dois lados do topo da escada rolante, adicionar corrimão em aço inoxidável e vidro, e rodapés em aço inoxidável, e necessita também de adicionar um tabuleiro de suporte em aço; (5) Nas envolventes da plataforma de acesso e do poço das escadas rolantes, adicionar revestimento em argamassa de cimento; (6) No topo das floreiras adicionar tampa em painel de alumínio de cor branca.”
14. Estas supra referidas obras adicionais não foram concluídas em 30/08/10, mas sim, em 30/06/10, como: Salvo devido respeito, não é verdade que a Entidade Recorrida forneceu dois meses7 para a ora Recorrente terminar as obras adicionais alinhadas e consideradas como assentes pelo Tribunal a quo, e obviamente nunca estaria sujeito a penalização, a verdade foi que a ora Recorrente tentara através dos documentos no. XX/XXXX/XXX/10 de 12/05/2010 e no. XX/XXXX/XXX/l0 de 24/09/2010 requerer, respectivamente, os 30 dias ou 25 dias, e como prova que a Entidade Recorrida concordara da necessidade dos 30 dias pelas folhas 289, ponto III, 12, e folhas 291 (último parágrafo), 394 a 399, todas nos autos do recurso contencioso. Tanto os 30 dias como os 25 dias não foram atribuídos nem autorizados ao ora Recorrente. A Entidade Recorrida confirmou e autorizou as tais obras adicionais, apenas em 22/06/2010, todavia, como se prova pelos documentos folhas 38 ponto 15 (informação XXXX/GDI/10 de 30/11/2010- fls4); e folhas 206 (LT OGFB-040).
15. Errou também o Tribunal a quo na selecção da matéria de facto e no julgamento, porque houve um acordo entre a ora Recorrente e a Entidade Recorrida para completar as obras em Agosto de 2010 como se prova pelas folhas 40 ponto 24 (informação XXXX/GDI/10 de 30/11/2010- fls.6) folhas 295 a 306 (em particular fls. 296) nos autos do recurso contencioso, e ainda prova-se a necessidade de 6 meses (180 dias) para completar os elevadores.
16. Isto é, há uma só obra, uma só data da conclusão da empreitada em 30/08/2010 e se acordou-se acabar em Agosto de 2010, então não há atraso.
17. Referente ao atraso da obra de empreitada e da medida compulsória, no acórdão recorrido deu como provado os seguintes: Facto 2º “- De acordo com o despacho datado de 29 de Maio de 2009, foi autorizado pelo Exmo. Senhor Chefe Executivo adjudicar à Recorrente a obra de Empreitada da Passagem Superior para Peões da [Endereço] – com a referencia n.º XX/2009.” e Facto 15º “- A verdadeira data da conclusão da empreitada é no dia 30/08/2010.”; mas, sucede porém que, mediante a adjudicação da obra de empreitada supra referida, e conforme documentos de folhas 60 a 79 e 307 a 310 verso, juntos nos autos do recurso contencioso, prova-se que no mesmo contrato de empreitada estipula o seguinte: Existência de um só contrato de obra de empreitada da Passagem Superior para Peões da [Endereço] – com a referência n.º XX/2009, e de uma só data de conclusão da obra de empreitada em 30/08/2010, e sendo essa data de conclusão da obra de empreitada em Agosto de 2010, acordado entre a ora Recorrente e Entidade Recorrida, como se prova pelos documentos folhas 40 ponto 24 e folhas 295 a 306, juntos nos autos do recurso contencioso.
18. Logo, com todo devido respeito, o Tribunal a quo não podia dar como provado o seguinte: Facto 12º “- ... Considerar verificado o atraso injustificado na conclusão da obra por 21 dias ... Ao abrigo dos nºs 1 e 2 do artº 174º do DL nº 74/99/M e da al. a) do nº 1 e do nº 2 da Cláusula 9ª do Contrato de Empreitada aplicar à Recorrente uma multa no valor de MOP$315.000,00, bem como suportar as despesas de fiscalização no montante de MOP$60.900,00, pelo atraso acima referido”.
19. Existe contradição da matéria de facto: se prova que a ora Recorrente, terminou a obra de empreitada em questão, no dia 30/08/2010, data acordada, não deve então, sancionar a ora Recorrente, como verificado o atraso de 21 dias na execução da empreitada (entre 05/06/2010 a 30/06/2010, descontando os 5 dias de chuva com precipitação superior a 20mm).
20. Referente a consideração dos dias a atribuírem à ora Recorrente por feriados e fins de semana, o acórdão recorrido deu como provado: Facto 3º “- O prazo inicial para a conclusão da referida obra de empreitada era de 165 dias (a contar consecutivamente incluindo os feriados e fins de semana nos termos do DL 54/94/M), com o dever de concluir a mesma em 31 de Dezembro 2009.” Todavia, como se prova pelos documentos de folhas 308 a 317 e 358 a 361, juntos nos autos do recurso contencioso, as obras de empreitada em questão, era de 165 dias, sem excluir os feriados e fins de semana, só que, quando a ora Recorrente estava a trabalhar nos feriados e fins de semana, foi obrigada a não executar as obras de empreitada, por existência de queixas, nisto, a ora Recorrente, em 12/03/10, esteve obrigada a pedir formalmente à Entidade Recorrida a autorização da execução da obra nos feriados e fins de semana. Por conseguinte, devia-se dar como assente também os seguintes factos apresentados pela ora Recorrente: “XIII.8 e XIV”.9
21. Isto tudo, porque, a Entidade Recorrida, apenas deduziu os dias de feriados e fins de semana entre 22/04/2010 a 25/05/2010, e não os 15 (9+6) dias, que devia ter deduzidos os dias de feriados e fins de semana, nos dois períodos entre 13/03/2010 a 22/04/2010, (os 9 dias após apresentado o pedido de autorização para execução de obras nos feriado e fim de semana,), e 26/05/2010 a 30/06/2010 (os 6 dias em que já tinha autorizado a execução de obras nos feriados e fins de semana).
22. Assim, e com todo o devido respeito verifica-se, que houve erro no julgamento na matéria de facto, devendo-se, no mínimo, considerar a atribuição à ora Recorrente, dos 15 dias supra referidos por feriado e fins de semana.
23. Referente a consideração dos dias a atribuírem à ora Recorrente por encerramento da fábrica na República Popular da China no período do ano novo chinês, o acórdão recorrido deu como provado: Facto 5º “- A Recorrente pediu. por ofício nº XX/XXXX/XXX/10, de 19/03/2010 (fls. 72 e 73 da Pasta nº 5 do PA), a prorrogação do prazo para a conclusão da obra de empreitada em referência até 09/06/2010”.10 e Facto 6º “- Em consequência, por despacho do Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 16/04/2010, proferido na Informação/Proposta nº XXX/GDI/2010, foi autorizada a prorrogação do prazo até 25/05/2010, em vez de 09/06/2010 (fls. 16 e 17 da Pasta nº 7 do PA).11
24. Todavia, como se prova pelos documentos de folhas 364 a 368, juntos nos autos do recurso contencioso, requereu a ora Recorrente por oficio no. XX/XXXX/XXX/10 de 19/03/2010, fora de outras matérias que tiveram em consideração, a prorrogação do prazo por mais 17 dias, por a Fábrica na República Popular da China encontrar-se encerrada por causa do ano novo chinês. E, em resposta, a Entidade Recorrida na informação no. XXX/GDI/10 de 07/04/10 apenas atribuiu os 412 dos 17 dias, não percebendo a ora Recorrente o motivo, uma vez que, como se prova através das folhas 55, ponto 5 alínea C, e folhas 366 juntos nos autos do recurso contencioso, a fábrica realmente estava encerrada e não foi da responsabilidade do ora Recorrente.
25. Assim, e com todo o devido respeito verifica-se que, houve erro no julgamento na matéria de facto, porque devia considerar o conteúdo integral do documento XX/XXXX/XXX/10 juntos nos autos de fls. 364 a 368, e devendo considerar a atribuição à ora Recorrente dos 13 dias supra referido.
26. Nos termos tudo atrás referido, concluímos de que, há erro em considerar que o atraso na conclusão de obra, sancionando os 21 dias de atraso. Primeiro porque provou que existe apenas um só contrato da obra de empreita. Segundo porque provou que a conclusão da obra de empreitada é o dia 30/08/10.
A ora Recorrente viu-se forçada a suspender as obras, pelo mau estado de tempo, devendo atribuir 29 (25+4) dias (cfr. Supra ponto 7 a 12); pelas obras adicionais, devendo atribuir 25 dias (cfr. Supra 13, 14 e 15); pelos feriados e fins de semana devendo atribuir 15 (9+6) dias (cfr. supra ponto 20 a 22); pelo encerramento da fábrica na RPC devendo atribuir 13 dias (cfr. Supra ponto 23 a 25); adicionando os referidos dias, devendo a Entidade Recorrida atribuir num total de 82 dias ao ora Recorrente, o que é motivo legal para anulação do despacho recorrido e revogação do acórdão recorrido por facto impeditivo da realização da prestação, não imputável ao empreiteiro, a ora Recorrente.
27. Sendo, dessa forma, inexistente algum atraso, a ora Recorrente, com a apresentação do presente recurso, pretende demonstrar a esse Venerando Tribunal que deve anular o acto sancionatório, revogando o acórdão recorrido, por haver erro e contradição na matéria de facto e erro de direito.
A entidade recorrida apresentou contra-alegações, com a formulação das seguintes conclusões:
1 - A entidade ora Recorrida, Secretário para os Transportes e Obras Públicas do Governo da Região Administrativa Especial de Macau, apoia e adere à decisão do Tribunal a quo, que negou provimento ao recurso contencioso interposto pela empresa A, do acto do que lhe aplicou multa contratual, bem como lhe fixou o montante a suportar com as despesas relativas à Fiscalização, nos termos contratuais, pelo atraso injustificado verificado na conclusão da obra, o qual se deveu a motivos que lhe são única e exclusivamente imputáveis, por legalmente fundada perante os factos aí dados por provados e, logo, imune a qualquer ilegalidade alegada pela Recorrente.
2 - Toda a tese sustentada pela Recorrente encontra-se cabal e suficientemente rebatida e contrariada no Douto Acórdão recorrido.
3 - Com base na matéria de facto dada por assente no Acórdão recorrido resultam totalmente improcedentes as justificações apresentadas pela Recorrente, com as quais pretendia que lhe fosse concedida prorrogação de prazo que obstasse à aplicação da sanção compulsória, bem como à assunção da responsabilidade pelos encargos com a Fiscalização no mesmo período.
4 - Em conformidade com o parecer do Digníssimo Magistrado do Ministério Público, com o qual se concorda na íntegra, “não se divisa, minimamente, que os factores ‘relevantes’ que poderiam justificar o atraso na conclusão da obra, não imputáveis à recorrente, não tivessem sido contemplados, com a atribuição das prorrogações de prazo devidas, constatando-se, antes, que os atrasos por que a recorrente foi sancionada se terão ficado a dever a problemas surgidos com a qualidade, insuficiência e prazo de entrega de material, atraso na colocação da estrutura de aço, com erro nas especificações, falta de pessoal técnico especializado em soldadura e de mão de obra não especializada, enfim, uma panóplia de deficiências, imputáveis e só à recorrente que, em nosso entendimento constituirão ‘base sólida’ para a sanção alcançada”.
5 - Nos termos do artigo 152.º do CPAC “O recurso dos acórdãos do Tribunal de Segunda Instância apenas pode ter por fundamento a violação ou errada aplicação da lei substantiva ou processual ou a nulidade da decisão impugnada”, não conseguindo a Recorrente fundamentar que tenha havido, por parte do Acórdão recorrido, qualquer dos pressupostos que permitam o recurso jurisdicional, nas vertentes definidas no citado preceito legal.
6 - Não só não o consegue provar, como entra ab initio em erro insanável sobre a matéria de facto, nomeadamente sobre a autoria do acto que lhe aplicou a multa e fixou o montante correspondente à responsabilidade pelo pagamento dos serviços de Fiscalização.
7 - Porquanto diz erradamente a Recorrente que “O presente recurso vem interposto do douto Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, que decidiu negar provimento ao recurso nos autos de recurso contencioso, mantendo o acto administrativo recorrido: do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 21/12/2010, que indeferiu o recurso hierárquico apresentado pelo Recorrente, mantendo a decisão do Coordenador do Gabinete para o Desenvolvimento de Intra-estruturas da RAEM constante na informação n.º XXXX/GDI/2010, datada de 30/11/2010, de aplicação da medida compulsória de MOP$315,000.00 respeitante ao atraso injustificado do prazo de 21 dias e de MOP$60,900.00 respeitante ao encargo da fiscalização” (sublinhado nosso).
8 - Sendo certo que, contrariamente ao alegado pela Recorrente no recurso contencioso interposto, que repete neste recurso jurisdicional, e ao que se prova nos autos, não houve lugar a qualquer recurso hierárquico de acto decisório do Coordenador do Gabinete para o Desenvolvimento de Infra-estruturas, pela simples razão que não houve qualquer acto desta entidade a aplicar qualquer multa ou a determinar encargos com a Fiscalização, porquanto o acto foi praticado pelo Secretário para os Transportes e Obras Públicas, questão que a Recorrente não pode ignorar, pelo que, por se tratar de erro manifesto e indesculpável sobre o autor do acto recorrido, o recurso contencioso deveria ter sido liminarmente rejeitado, nos termos da alínea f) do n.º 2 do artigo 46.º do CPAC.
9 - Pois que, consta do processo administrativo em apenso aos autos de recurso contencioso que o acto que aplicou a multa contratual à ora Recorrente, por atraso na execução da “Empreitada de Concepção e Construção de Passagem Superior Pedonal na [Endereço]”, bem como fixou o valor dos encargos da Fiscalização por ela a suportar, relativo a igual período de atraso na conclusão da obra, foi praticado por despacho de 21 de Dezembro de 2010 do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, exarado sobre a informação n.º XXXX/GDI/2010, de 30/11/2010, e não por acto do Coordenador do Gabinete para o Desenvolvimento de Infra-estruturas.
10 - O contrato respeitante à empreitada em questão foi celebrado no dia 17 de Julho de 2009, perante o notário privativo da Direcção dos Serviços de Finanças, o qual dispõe na sua cláusula nona sobre as multas contratuais a aplicar pela não conclusão da obra no prazo contratualmente estabelecido, bem como sobre os encargos relativamente a atrasos de execução da obra, a suportar pelo adjudicatário com a Fiscalização, por motivo que lhe seja imputável, matéria devidamente provada pelos documentos integrantes do processo instrutor e dada por assente no Acórdão ora recorrido.
11 - No dia 20 de Julho de 2009 lavrou-se o auto de consignação da obra, com o que se deu início aos respectivos trabalhos e se fixou o termo inicial da empreitada, e do qual o empreiteiro, ora Recorrente, recebeu a correspondente cópia, veiculada pelo oficio n.º XXXX/GDI/09, de 22 de Julho do mesmo ano.
12 - Em virtude de ser necessário introduzir, por uma única vez, uma alteração ao projecto e por se considerar, não só por este facto, mas de igual modo justificáveis os atrasos de execução da obra por motivo de condições atmosféricas adversas e atrasos de fornecimento de materiais não imputáveis ao empreiteiro, o prazo inicial com termo a 31 de Dezembro de 2009 foi prorrogado, sucessivamente, por mais 46 dias até ao dia 15 de Fevereiro de 2010, por mais 21 dias até ao dia 8 de Março de 2010 e por mais 78 dias a contar de 9 de Março de 2010, fixando-se o novo termo a 25 de Maio de 2010, de acordo, respectivamente, com os despachos do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, exarados sobre as informações n.º XXX/GDI/2009, XXX/GDI/2010 e XXX/GDI/2010, onde consta toda a necessária fundamentação, complementada pelos concomitantes pareceres da Fiscalização para as sucessivas prorrogações.
13 - Mais foi concedida a prorrogação de prazo por um total de mais 15 dias, devido a precipitação registada superior a 20 mm diários (a cláusula 5.2.2 do caderno de encargos prevê que o Dono da Obra possa conceder a prorrogação do prazo quando a precipitação total for igual ou superior a 20 mm por dia), relativamente a 8 dias no período compreendido entre 19 de Março e 25 de Maio de 2010, nos 30 de Maio e 2 de Junho de 2010 e 5 dias no período decorrido entre 5 e 30 de Junho do mesmo ano.
14 - Estando os trabalhos de especialidades de estrutura, arquitectura e instalações electromecânicas do corpo da passagem aérea para peões, entre outros, relacionados com a obra das estruturas principais da empreitada, terminados à data de 30 de Junho de 2010 (quando deveriam estar a 9 de Junho de 2010, data que marca o termo normal da empreitada), concluiu-se que a obra apenas se deu por terminada 21 dias após o termo do prazo contratual.
15 - Por este facto, porque já haviam sido consideradas já todas as prorrogações graciosas passíveis de ser concedidas, tanto as derivadas da alteração ao projecto, como de condições atmosféricas adversas e ainda de atrasos que não lhe eram directamente imputáveis, foi aplicada a correspondente multa contratual ao empreiteiro (ora Recorrente), bem como este responsabilizado pelos encargos com a Fiscalização pelo mesmo número de dias de atraso, nos termos da sua cláusula nona do contrato e em conjugação com o disposto nos artigos 168.º e 174.º do Decreto-Lei n.º 74/99/M, de 8 de Novembro.
16 - Prova-se nos autos, e é dado por assente no Acórdão recorrido, que a Recorrente não impugnou as decisões de prorrogação de prazo que foram concedidas pela Administração.
17 - Está provado pela documentação constante do processo administrativo, bem como ficou líquido na sessão de inquirição de testemunhas, que todas as prorrogações de prazo admissíveis haviam sido concedidas ao empreiteiro, e que, foi ainda a Administração benevolente ao conceder graciosamente prorrogação de prazo nos dias do Ano Novo Chinês, considerando ser justo que aos trabalhadores fosse proporcionado o tradicional descanso anual.
18 - Isto apesar de contratualmente o prazo ser corrido, ou seja, incluir na sua contagem, além dos dias úteis, os fins-de-semana e os feriados.
19 - Contrariamente ao alegado na petição de recurso, bem como nas alegações facultativas da Recorrente e, ainda, neste recurso jurisdicional, não foi solicitada uma segunda alteração ao projecto, sendo concedida a adequada prorrogação de prazo para a única alteração solicitada pelo Dono da Obra, assim como para condições atmosféricas adversas impeditivas da boa execução dos trabalhos, sendo certo que, se dúvidas pudessem existir quanto à bondade e à adequação das prorrogações concedidas, elas terão ficado completamente dissipadas durante a sessão de inquirição de testemunhas.
20 - Ficou assente por prova testemunhal que a humidade relativa verificada (cujos valores registados são os normais em Macau) não foi elemento impeditivo da execução dos trabalhos, tendo-se assistido, inclusivamente, a trabalhos de soldadura em períodos de tempo chuvoso.
21 - Na sessão de inquirição de testemunhas, a Recorrente não só não conseguiu provar que os atrasos da obra se tivessem ficado a dever a factos imputáveis ao Dono da Obra, como também nela ficou provado que os atrasos de execução se deveram a problemas com a falta de qualidade de material, atraso na colocação da estrutura em aço e falta de pessoal necessário para a boa e atempada execução da empreitada, tudo factos directamente imputáveis ao empreiteiro, que só de si próprio se pode queixar.
22 - Nela se confirmou que a Recorrente tentou responsabilizar terceiros pelos atrasos da obra, nomeadamente com o alegado encerramento das fábricas dos fornecedores de materiais localizadas na China Interior, durante o Ano Novo Chinês aí celebrado, mas, afinal, ficou-se a saber pelas testemunhas apresentadas pela própria Recorrente que esta nem sequer sabia bem durante quantos dias aquelas estiveram encerradas, nem tampouco qual o período normal de encerramento durante aquela época festiva.
23 - Em todo o caso, se o eventual encerramento daquelas instalações pudesse ter alguma influência no fornecimento de materiais necessários à execução da obra, deveria a Recorrente ter tomado as medidas necessárias e suficientes para o seu atempado aprovisionamento, pois a isso estava obrigada se queria cumprir o prazo contratualmente fixado.
24 - Pelo que, o encerramento ou não das instalações dos fornecedores de material naquela época festiva, com uma alegada e eventual falta de material necessário à obra, questão que a verificar-se a Recorrente não teria atempadamente resolvido, mas cuja existência também não provou, não poderia ter provocado qualquer atraso na execução dos trabalhos ou justificado qualquer atraso de execução da empreitada.
25 - Tanto mais que o evento festivo do Ano Novo Chinês tem lugar em data fixa em cada ano de calendário, não é uma data imprevista, e se do eventual encerramento das fábricas poderiam resultar efeitos negativos para a obra, então tinha o empreiteiro, ora Recorrente, o dever de programar adequadamente os trabalhos e as encomendas para obstar à produção dos alegados efeitos, que, de resto, não se provaram nem se provam.
26 - Ademais, não poderia a ora Recorrente ignorar que aqueles factos não teriam qualquer influência na contagem do prazo da empreitada, o qual deveria correr em dias corridos, incluindo sábados, domingos e feriados, conforme se encontra claramente estipulado no contrato que assinou e declarou conhecer na perfeição.
27 - É dever de ambas as partes actuar em conformidade com o contrato, cumprindo-o nos seus exactos termos e, no que se refere à Administração, a sua execução é de natureza vinculativa, pelo que as consequências do seu não cumprimento por parte da ora Recorrente, de que resulte a aplicação de multas e imputação de custos com a Fiscalização, se impõem à própria Administração, enquanto depositária dos meios postos à sua disposição para prossecução das atribuições que lhe foram conferidas.
28 - A não aplicação de multa e a não responsabilização do empreiteiro pelo pagamento das despesas com a Fiscalização, relacionadas com atraso na obra, sempre se poderiam consubstanciar em favorecimento ilegal do mesmo e em gastos ilegítimos de dinheiros públicos.
29 - Em suma, conforme se disse na contestação ao recurso contencioso, que aqui, com a devida vénia, se dá por integralmente reproduzida, e se prova no processo administrativo apenso aos autos, todas as prorrogações de prazo, contratuais e graciosas, foram devida, adequada e proporcionalmente concedidas, sendo certo que, relativamente aos trabalhos a mais que a recorrente cita (aqueles que realmente corresponderam a trabalhos a mais), bem como à instalação de elevadores (em data que não seria possível prever por estar dependente do seu fornecimento por terceiro), realizados em período posterior à data de conclusão das obras, não foi obviamente aplicada qualquer multa contratual à Recorrente, nem esta responsabilizada pelos encargos com a Fiscalização, do que resulta ser este período neutro e inócuo para o caso de que se trata.
30 - Nos termos do disposto no artigo 20.º do CPAC, excepto disposição em contrário, o recurso contencioso é de mera legalidade e tem por finalidade a anulação dos actos recorridos ou a declaração da sua nulidade ou inexistência jurídica.
31 - Mas, porque não houve qualquer erro nos pressupostos de facto ou de direito por parte do Acórdão recorrido, tendo neste ficado provado ter havido apenas lugar ao cumprimento da lei em vigor na RAEM, em particular do disposto no Decreto-Lei n.º 74/99/M, de 8 de Novembro, e à execução do previsto no contrato de empreitada, forçoso é concluir que o Acórdão recorrido não merece reparo.
32 - No mais, reiterando tudo o que foi alegado na contestação ao recurso contencioso e nas respectivas alegações facultativas, e acompanhando o Douto Acórdão recorrido, a entidade Recorrida oferece o merecimento dos autos.
E o Exmo. Procurador-Adjunto do Ministério Público emitiu o douto parecer, entendendo que não merece provimento o presente recurso.
Foram corridos os vistos.
2. Os Factos Provados
Nos autos foram apurados os seguintes factos com pertinência:
1- A Recorrente, A, é uma sociedade comercial registada na Conservatória do Registo Comercial e de Bens Móveis de Macau sob o nº XXXXX(XX), que tem como objecto Construção Civil e Consultadoria dentro da RAEM.
2- De acordo com o despacho datado de 29 de Maio de 2009, foi autorizado pelo Exmo. Senhor Chefe Executivo adjudicar à Recorrente a obra de Empreitada da Passagem Superior para Peões da [Endereço] - com a referência n.º XX/2009.
3- O prazo inicial para a conclusão da referida obra de empreitada era de 165 dias (a contar consecutivamente incluindo os feriados e fins de semana nos termos do DL 54/94/M), com o dever de concluir a mesma em 31 de Dezembro 2009.
4- Contudo, devido à alteração posterior do projecto, o referido prazo para a conclusão da obra de empreitada em referência foi prorrogado sucessivamente para 15/02/2010, 08/03/2010 e 25/05/2010.
5- A Recorrente pediu, por ofício nº XX/XXXX/XXX/10, de 19/03/2010 (fls. 72 e 73 da Pasta nº 5 do PA), a prorrogação do prazo para a conclusão da obra de empreitada em referência até 09/06/2010.
6- Em consequência, por despacho do Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 16/04/2010, proferido na Informação/Proposta nº XXX/GDI/2010, foi autorizada a prorrogação do prazo até 25/05/2010, em vez de 09/06/2010 (fls. 16 e 17 da Pasta nº 7 do PA).
7- A Recorrente não impugnou a supra decisão.
8- Em 19/05/2010 e 28/05/2010, a Recorrente, através dos ofícios nºs XX/XXXXX/XXX/10 e XX/XXXXX/XXX/10, pediu novamente a prorrogação dos prazos por mais 21 e 4 dias, respectivamente, ou seja no total de 25 dias, a contar desde 25/05/2010, com o fundamento de que entre o período de 19/03/2010 a 25/05/2010, houve 25 dias de chuva que não permitiram a realização de obras no campo exterior.
9- Por ofícios nºs XXXX/GDI/2010 e XXXX/GDI/2010, ambos datados de 17/09/2010, o Gabinete para o Desenvolvimento de Infra-estruturas manifestou a intenção de sancionar a Recorrente pelo atraso na conclusão da obra de empreitada, notificando-a para se pronunciar sobre o que tiver por conveniente no prazo de 10 dias (fls. 387 a 393 dos autos).
10- Por ofício nº XX/XXXXX/XXX/10, de 24/09/2010, a Recorrente explicou a razão do atraso, conforme consta do documento de fls. 397 e 399 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
11- B, entidade fiscalizadora da obra, emitiu o seu parecer desfavorável quanto à justificação do atraso e ao pedido da prorrogação do prazo acima em referência, conforme consta do documento de fls. 217 e 218 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
12- Por despacho do Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 21/12/2010, proferido na Informação/Proposta nº XXXX/GDI/2010, foi determinado o seguinte:
* Autorizar a prorrogação do prazo para a conclusão da obra por mais 10 dias, com termo até ao dia 04/06/2010.
* Considerar verificado o atraso injustificado na conclusão da obra por 21 dias (entre 05/06/2010 a 30/06/2010, descontando 5 dias de chuva com precipitação superior a 20mm).
* Ao abrigo dos nºs 1 e 2 do artº 174º do DL nº 74/99/M e da al. a) do nº 1 e do nº 2 da Cláusula 9ª do Contrato de Empreitada, aplicar à Recorrente uma multa no valor de MOP$315.000,00, bem como suportar as despesas de fiscalização no montante de MOP$60.900,00, pelo atraso acima referido.
13- O registo da precipitação do período entre Março a Junho do ano de 2010 consta de fls. 98 a 119 dos autos, cujo teor aqui se dá integralmente reproduzido.
14- Foram realizadas as seguintes obras adicionais a pedido do dono da obra:
(1) Na superfície do tabuleiro adicionar ladrilho táctil plástico de cor amarelo;
(2) Nos parapeitos dos dois lados da passagem superior adicionar rodapés em aço inoxidável;
(3) Na plataforma de subida/descida do acesso para manutenção, sitos nos extremos do tabuleiro, adicionar corrimão e rodapés em aço inoxidável;
(4) Nos dois lados do topo da escada rolante, adicionar corrimão em aço inoxidável e vidro, e rodapés em aço inoxidável, e necessita também de adicionar um tabuleiro de suporte em aço;
(5) Nas envolventes da plataforma de acesso e do poço das escadas rolantes, adicionar revestimento em argamassa de cimento;
(6) No topo das floreiras adicionar tampa em painel de alumínio de cor branca.
15- A verdadeira data da conclusão da empreitada é no dia 30/08/2010.
3. O Direito
Ora, tal como resulta das conclusões formuladas nas suas alegações, pretende a recorrente impugnar o julgamento da matéria de facto considerada provada pelo Tribunal a quo, imputando “erro no julgamento da matéria de facto” e “contradição na selecção na matéria de facto”.
E o alegado “erro de direito no acórdão recorrido” acaba por incidir também sobre a matéria de facto.
1. A questão suscitada pela recorrente prende-se com a convicção formada pelo Tribunal a quo face às provas produzidos no processo.
Estando em causa a matéria de facto provada, há que ver, desde logo, se este Tribunal de Última Instância tem competência para conhecer a questão.
Ora, nos termos do art.° 47.° n.° 1 da Lei de Bases da Organização Judiciária, o Tribunal de Última Instância, quando julgue em recurso correspondente a segundo grau de jurisdição, conhece de matéria de facto e de direito, “excepto disposições em contrário das leis de processo”.
E ao abrigo do art.° 152.° do Código de Processo Administrativo Contencioso, o recurso dos acórdãos do Tribunal de Segunda Instância apenas pode ter por fundamento a violação ou a errada aplicação de lei substantiva ou processual ou a nulidade da decisão impugnada.
O que decorre desta norma é que, em recurso jurisdicional de decisões de processo contencioso administrativo, o Tribunal de Última instância aprecia, em princípio, questão de direito e não de facto.
E no que concerne ao âmbito do julgamento do recurso para o Tribunal de Última Instância, é ainda subsidiariamente aplicável a norma do art.º 649.º do Código de Processo Civil de Macau, por força do disposto no art.º 1.º do Código de Procedimento Administrativo Contencioso.
“Artigo 649.º
(Âmbito do julgamento)
1. Aos factos materiais que o tribunal recorrido considerou provados, o Tribunal de Última Instância aplica definitivamente o regime que julgue adequado em face do direito vigente.
2. A decisão proferida pelo tribunal recorrido quanto à matéria de facto não pode ser alterada, salvo se houver ofensa de disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.”
Fica assim delimitada a competência do Tribunal de Última Instância em apreciar a decisão proferida pelo tribunal recorrido quanto à matéria de facto, que é, em princípio, intocável, salvo nos caso expressamente previstos na parte final do n.º 2 do art.º 649.º.
E como foi dito no Acórdão deste TUI, de 27 de Novembro de 2002, no Processo n.º 12/2002, o Tribunal de Última Instância, em recurso jurisdicional, não pode censurar a convicção formada pelas instâncias quanto à prova; mas pode reconhecer e declarar que há obstáculo legal a que tal convicção se tivesse formado, quando tenham sido violadas normas ou princípios jurídicos no julgamento da matéria de fato. É uma censura que se confina à legalidade do apuramento dos factos e não respeita directamente à existência ou inexistência destes.
Mais se acrescentou no mencionado Acórdão, o Tribunal de Última Instância tem competência para conhecer de questões relativas a matéria de facto se forrem violadas normas e princípios jurídicos no julgamento da matéria de facto, como decorre do disposto no n.º 2 do art.º 649.º do Código de Processo Civil de Macau.
Mas não tem competência para apreciar o julgamento na matéria de facto quando se alegam violações que decorrem da mera livre apreciação das provas, quando não está em causa qualquer julgamento em violação de meio de prova plena.
É que, como adverte Rodrigues Bastos, em anotação à norma semelhante do Código de Processo Civil português, “repare-se, porém, que ainda aqui - e sempre – a actividade do Tribunal se situa no estrito campo da observação da lei; ele não faz a censura da convicção formada pelas instâncias quanto à prova; limita-se a reconhecer e a declarar, em qualquer dos casos, que havia obstáculo legal a que tal convicção se tivesse formado. É uma censura que se confina à legalidade do apuramento dos factos - e não respeita directamente à existência ou inexistência destes”.13
Esta doutrina foi reafirmada em muitos acórdãos posteriores.14
2. No caso ora em apreciação, a recorrente impugna apenas o julgamento da matéria de facto, alegando que o Tribunal a quo considerou provados factos opostos àqueles que a recorrente alegava e sobre os quais existe nos autos a prova testemunhal e documental.
Importa apurar se, na formação da sua convicção sobre a matéria de facto, o Tribunal a quo violou alguma disposição legal que expressamente exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.
No caso negativo, este Tribunal de Última Instância não tem competência para conhecer da matéria posta em causa pela recorrente.
Ora, dispõe o art.º 334.º do Código Civil de Macau que “as provas têm por função a demonstração da realidade dos factos”.
É com base na apreciação dos elementos de prova produzidos nos autos que o julgador forma a sua convicção sobre a matéria de facto.
E quanto ao julgamento da prova a lei consagra o princípio da livre apreciação das provas, segundo o qual “o tribunal aprecia livremente as provas, decidindo os juízos segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto (art.º 558.º n.° 1 do Código de Processo Civil).
Mas quando a lei exija, para a existência ou prova do facto jurídico, qualquer formalidade especial, não pode esta ser dispensada (art.º 558.° n.° 2 do Código de Processo Civil ).
E no que respeita à apreciação e graduação do valor das provas, a regra consagrada no direito processual vigente é a da prova livre.
As provas são apreciadas livremente, sem nenhuma escala de hierarquização, de acordo com a convicção que geram realmente no espírito do julgador acerca da existência do facto.
Há, todavia, algumas excepções ao princípio da livre apreciação da prova, que constituem como que justificados resíduos do sistema da prova legal.
Essas excepções sobressaem, em termos gerais, na prova por confissão, na prova por documentos e na prova por presunções legais.15
Quanto à prova testemunhal, é consabido que as testemunhas constituem sempre um meio de prova sujeito à livre apreciação do Tribunal.
No caso concreto ora em apreciação, não está em causa prova por confissão nem prova por presunções legais.
Daí que vamos ver se, na apreciação da prova documental, o Tribunal a quo violou disposições legais.
Nos termos do art.° 355.° do Código Civil, prova documental é a que resulta de documentos; e diz-se documento qualquer objecto elaborado pelo homem com o fim de reproduzir ou representar uma pessoa, coisa ou facto.
E os documentos escritos podem ser autênticos ou particulares.
Os documentos autênticos são os documentos exarados, com as formalidades legais, pelas autoridades públicas nos limites da sua competência ou, dentro do círculo de actividade que lhe é atribuído, pelo notário ou outro oficial público provido de fé pública (art.° 356.° n.° 2 do Código Civil) .
Todos os outros documentos são particulares, avultando entre eles os lavrados pelos particulares (indivíduos que não exerçam nenhum cargo de autoridade, nem desempenhem qualquer função certificadora, dotada de fé pública).
A distinção entre documentos autênticos e documentos particulares reveste assinalável interesse, por virtude da diferente força probatória de que gozam uns e outros.
A meio termo entre os documentos autênticos e os particulares, situam-se os documentos autenticados, que são documentos particulares na sua origem, que trazem consigo um reconhecimento especial (autêntico) do notário (art.° 356.° n.° 3 do Código Civil e art.° 50.° n.° 3 do Código do Notariado).
Não obstante a natureza particular da sua origem, o documento autenticado é equiparado, quanto à sua força probatória, aos documentos autênticos (art.° 371.° do Código Civil).
No que concerne à força probatória dos documentos, distinguem-se força probatória formal da força probatória material: a primeira refere-se ao aspecto de proveniência ou paternidade do documento, ou seja, para saber se o documento provém realmente da pessoa ou entidade a quem é imputado; a segunda reside em saber em que medida os actos nele referidos e os factos nele mencionados se consideram como correspondentes à realidade.
A autenticidade dos documentos autênticos é presumida e pode ser ilidida mediante prova em contrário, ao abrigo do art.° 364.° n.° 1 do Código Civil, que dispõe que “presume-se que o documento provém da autoridade pública ou oficial público a quem é atribuído, quando estiver subscrito pelo autor com assinatura reconhecida por notário ou com o selo do respectivo serviço”.
Quanto à força probatória formal dos documentos particulares, as situações são diferentes. 16
E no que respeita à força probatória material dos documentos, tudo depende: enquanto há factos compreendidos nas declarações constantes dos documentos que são de considerar provados face às normas substantivas do Código Civil, há outros que estão sujeitos à livre apreciação da prova.
Ora, a força probatória material dos documentos autênticos vem definida no art.° 365.° n.° 1 do Código Civil, segundo o qual “os documentos autênticos fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público ou notário respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com base nas percepções da entidade documentadora; os meros juízos pessoais do documentador só valem como elementos sujeitos à livre apreciação do julgador”.
Diz-se prova plena aquela que só cede perante prova do contrário. “Produzida uma prova plena, é irrelevante gerar uma situação de dúvida no espírito do julgador, porque a lei manda resolver tal situação de dúvida no sentido indicado pela mesma prova. No entanto, fica salva à contraparte a possibilidade de provar a irrealidade do facto”. 17
E “a prova legal plena só pode ser contrariada por meio de prova que mostre não ser verdadeiro o facto que dela for objecto, sem prejuízo de outras restrições especialmente determinadas na lei” (art.º 340.º do Código Civil).
Por outro lado, a força probatória material dos documentos particulares está prevista no art.º 370.º do Código Civil.
“Artigo 370.º
(Força probatória)
1. O documento particular cuja autoria seja reconhecida nos termos dos artigos antecedentes faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, sem prejuízo da arguição e prova da falsidade do documento.
2. Os factos compreendidos na declaração consideram-se provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante; mas a declaração é indivisível, nos termos prescritos para a prova por confissão.
3. Se o documento contiver notas marginais, palavras entrelinhadas, rasuras, emendas ou outros vícios externos, sem a devida ressalva, cabe ao julgador fixar livremente a medida em que esses vícios excluem ou reduzem a força probatória do documento.”
Ora, tal como ensinam Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “relativamente aos documentos particulares, seja qual for a modalidade que revistam (autenticados, legalizados, ou despidos de qualquer intervenção notarial), uma vez provada a autoria da letra e assinatura, ou só da assinatura, tem-se por plenamente provado que o signatário emitiu todas as declarações constantes do documento, sem prejuízo da arguição e prova da falsidade deste ….
Mas nem todos os factos referidos nessas declarações se têm por provados.
Como provados – plenamente provados – apenas se consideram os factos que forem desfavoráveis ao declarante; quanto aos restantes, o documento é livremente apreciado pelo julgador”.18
3. Feita a abordagem, duma forma geral e sucinta, sobre o valor probatório dos meios de prova, é a altura de voltar ao nosso caso concreto.
Ora, os factos impugnados pela recorrente incidem sobre os aspectos a seguir mencionados, indicando a recorrente as respectivas provas para fundamentar a sua pretensão.
Importa ver se os documentos são autênticos e se os factos mencionados nos mesmos se devem considerar provados face ao disposto no art.º 365.º do Código Civil.
Se assim for, importa ver se o Acórdão recorrido julgou em sentido contrário. Se o fez, pode o Tribunal de Última Instância alterar o julgamento da matéria de facto, caso contrário este Tribunal fica impedido de conhecer a matéria.
a) Sobre a não impugnação da decisão tomada na Informação/Proposta nº XXX/GDI/2010, que autorizou a prorrogação do prazo para a conclusão da obra de empreitada até 25/05/2010, em vez de 09/06/2010 pretendido pela recorrente, indicando os documentos de fls. 364 a 365, 394 a 396, 90 a 95, 193 a 203, 386, 416 a 419, 387 a 393, 397 a 399 e 400 a 401 dos autos.
Ora, o documento de fls. 364 a 365 trata-se do requerimento apresentado pela recorrente, de 19/03/2010, em que pediu a prorrogação do prazo para a conclusão da obra de empreitada em referência até 09/06/2010. E foi sobre este requerimento que caiu a decisão em causa (cfr. fls. 370 dos autos).
O documento de 394 a 396 refere-se ao requerimento da recorrente dirigido ao Gabinete para o Desenvolvimento de Infra-estruturas onde foi apresentado o preço para uma obra adicional.
E com a apresentação dos documentos de fls. 90 a 95, com data de 19/05/2010 e de 28/05/2010, a ora recorrente requereu novamente a prorrogação dos prazos por mais 21 e 4 dias, respectivamente, a contar de 25/05/2010, invocando a impossibilidade de realização da obra nos dias de chuva.
Quanto ao documento de fls. 193 (e também de fls. 386 e 389), trata-se do ofício do Gabinete para o Desenvolvimento de Infra-estruturas, datado de 25 de Maio 2010, através do qual esta entidade notificou à recorrente a possibilidade de lhe aplicar multa caso a recorrente não viesse requerer, com fundamento, a prorrogação do prazo, conforme o contrato celebrado entre a RAEM e a recorrente que se junta aos autos a fls.194 a 199.
Nos documentos de fls. 200 a 203 (e também de fls. 416 a 419) encontram-se as explicações dadas pela recorrente para tentar justificar o atraso na obra.
E resulta dos documentos de fls. 387 a 393 dos autos que, através dos ofícios nºs XXXX/GDI/2010 e XXXX/GDI/2010, ambos datados de 17/09/2010, o Gabinete para o Desenvolvimento de Infra-estruturas manifestou a intenção de sancionar a Recorrente pelo atraso na conclusão da obra de empreitada, notificando-a para se pronunciar sobre o que tiver por conveniente no prazo de 10 dias.
Notificada desses ofícios, veio a recorrente expor, com os requerimentos de fls. 397 a 399 e 400 a 401 dos autos, motivos alegadamente justificativos do atraso.
Ora, a decisão em causa, que autorizou a prorrogação do prazo para a conclusão da obra de empreitada até 25/05/2010, foi tomada em 16/04/2010 e notificada à recorrente com o ofício de 22/04/2010.
Dos documentos indicados pela recorrente, e até de outros constantes dos autos, não resulta que esta chegou a impugnar a referida decisão.
O pedido de prorrogação do prazo e a apresentação dos motivos alegadamente justificativos do atraso não podem ser considerados como meios de impugnação daquela decisão.
b) Sobre os dias a atribuírem à recorrente por mau estado de tempo, indicando prova testemunhal e documental de fls. 98 a 119 e 371 a 384 dos autos.
Ora, como é sabido, as testemunhas constituem sempre um meio de prova sujeita à livre apreciação do tribunal.
Quanto aos documentos elencados pela recorrente, são pareceres emitidos pela entidade fiscalizadora da obra, com a junção dos elementos meteorológicos registados pela Direcção dos Serviços Meteorológicos e Geofísicos no período de realização das obras.
Tratam-se dos documentos particulares que, evidentemente, não fazem prova plena sobre a matéria ora em discussão.
c) Sobre os dias a atribuírem à recorrente por obras adicionais, indicando documentos de fls. 289, ponto III, 12, fls. 291 (particularmente o último parágrafo), 394 a 399, 402, fls. 38 ponto 15, fls. 206, fls. 40 ponto 24 e fls. 295 a 306 (em particular fls. 296) dos autos.
Ora, consta dos documentos de fls. 287 a 291 dos autos uma proposta elaborada pelo Gabinete para o Desenvolvimento de Infra-estruturas, sobre a qual proferiu o Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas o despacho no sentido de autorizar a realização das obras adicionais e de cancelamento da parte dos trabalhos contidos no contrato, sento que o ponto e os parágrafos indicados pela recorrente dizem precisamente respeito a este aspecto.
Os documentos de 394 a 399 foram apresentados pela recorrente, sendo documentos particulares.
Encontra-se na fls. 402 dos autos um ofício do Gabinete para o Desenvolvimento de Infra-estruturas com vista à notificação dum despacho que autorizou o preço das obras adicionais e cancelou parte dos trabalhos contidos no contrato.
No ponto 15 de fls. 38, o técnico superior do Gabinete para o Desenvolvimento de Infra-estruturas que elaborou a respectiva proposta fez referência ao relatório da entidade fiscalizadora da obra sobre a conclusão das obras principais
Tal relatório consta nos autos a fls. 206, sendo também um documento particular.
E os documentos referidos a fls. 40 ponto 24 e referentes ao assunto de elevador constam nos autos a fls. 295 a 306, que são, obviamente, documentos particulares.
d) Sobre o atraso da obra de empreitada, indicando documentos de fls. 60 a 79, 307 a 310, fls. 40 ponto 24 e fls. 295 a 306 dos autos.
A fls. 60 a 79 e 307 a 310 dos autos constam o contrato de prestação dos serviços de fiscalização da obra celebrado entre RAEM e a entidade de fiscalização B, e o contrato de empreitada celebrado entre RAEM e a recorrente.
São documentos autênticos que detêm a força probatória plena, com os quais pretende a recorrente provar que existem um só contrato de obra de empreitada e uma só data de conclusão da obra de empreitada.
Ora, o que resulta desses documentos é que foi celebrado um contrato de empreitada, que tem como objecto uma obra de empreitada, adjudicada à ora recorrente, e foi estipulado um prazo para a sua conclusão. Nada mais.
No entanto, nada impede que possa haver obras adicionais, não referidas nos contratos, o que aconteceu efectivamente, com a devida autorização da entidade competente.
E repete-se que os documentos referidos a fls. 40 ponto 24, nomeadamente os de fls. 295 a 306, são documentos particulares.
e) Sobre os dias a atribuírem à recorrente por feriados e fins de semana, indicando os documentos de fls. 308 a 317 e 358 a 361 dos autos.
Como já vimos, os documentos de 308 a 310 dos autos reportam-se ao contrato de empreitada celebrado entre RAEM e a recorrente.
No contrato foi estipulado que é de 165 dias para concluir as obras e no caso de realizar trabalhos extraordinários fora do horário normal e por iniciativa da entidade recorrente, esta é responsável pelas despesas de fiscalização.
Os documentos de fls. 311 a 314 são particulares, tratando-se da acta de reunião entre o representante do Gabinete para o Desenvolvimento de Infra-estruturas, a recorrente, a entidade fiscalizadora e mais uma entidade.
E de fls. 315 a 317 encontram-se ofícios do Gabinete para o Desenvolvimento de Infra-estruturas, dirigidos à recorrente, que não parecem ter interesse para a matéria ora em causa.
Quanto aos documentos de fls. 358 a 362 dos autos, tratam-se dos requerimentos da recorrente em que pediu a autorização do Gabinete de Desenvolvimento de Infra-estruturas para que pudesse fazer obras nos feriados e a prorrogação do prazo para obras, respectivamente, bem como do ofício daquele Gabinete que notificou à recorrente que tinha sido autorizada a realização da obra nos domingos e nos feriados.
f) Sobre os dias a atribuírem à recorrente por encerramento da fábrica na RPC no período do ano novo chinês, indicando os documentos de fls. 364 a 368, fls. 55 ponto 5 alínea C e fls. 366 dos autos.
Constata-se nos autos que o ponto 5 de fls. 55 faz referência ao parecer emitido pela entidade de fiscalização e os documentos de fls. 364 a 368 se reportam ao requerimento da recorrente dirigido ao Gabinete de Desenvolvimento de Infra-estruturas em que pediu o prorrogação do prazo para realizar a obra.
São todos documentos particulares que estão sujeitos à livre apreciação do Tribunal.
Ora, vistos os documentos indicados pela recorrente com os quais pretende manifestar a sua discordância da matéria de facto considerada como assente pelo Tribunal e comprovar os factos por si alegados, temos para dizer que a maior parte deles são documentos particulares, que constituem meios de prova sujeitos à livre apreciação do Tribunal.
Quanto aos restantes, alguns são documentos autênticos (contratos de empreitada e de fiscalização), outros são documentos e ofícios elaborados pelo Gabinete de Desenvolvimento de Infra-estruturas que se destinam à tomada das decisões e à notificação das decisões do Governo.
E não se vislumbra qualquer obstáculo legal a que o Tribunal recorrido formou a sua convicção nem a violação das normas ou princípios jurídicos no julgamento de matéria de facto, não se detectando que o Tribunal recorrido julgou em sentido contrário ao resultante desses documentos.
Daí que este Tribunal de Última Instância não pode conhecer da matéria de facto posta em causa pela recorrente, por estar fora do seu poder de cognição, atento o disposto nos art.ºs 47.º n.º 1 da Lei de Bases de Organização Judiciária e 152.º do CPAC.
Improcede-se a questão levantada pela recorrente.
4. Decisão
Pelo exposto, acordam em negar provimento ao presente recurso.
Custas pela recorrente, com taxa de justiça fixada em 6 UC.
Macau, 14 de Dezembro de 2012
Juízes: Song Man Lei (Relatora) – Sam Hou Fai –
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Vítor Manuel Carvalho Coelho
1 Na execução da empreitada identificada nos autos do recurso contencioso.
2 Fls. 90 a 95 nos autos do recurso contencioso.
3 Fls. 382 foi descontado em Dezembro 2010 pelo despacho do SATOP.
4 O último parágrafo de Fls. 16 do acórdão recorrido.
5 Fls. 382 nos autos do recurso contencioso (que foi descontado em Dezembro de 2010 pelo despacho do SATOP).
6 Fls. 371 a 382 nos autos do recurso contencioso.
7 Fls. 17 do acórdão do TSI no. 101/2011 proferido em 17/05/2012 “No caso em apreço, apesar da empreitada ter sido considerada concluída no dia 30/06/2010 para efeitos de aplicação da medida compulsória contratual, a verdadeira data da conclusão da obra ocorreu no dia 30/08/10, ou seja, houve cerca de dois meses (período superior ao prazo de 25 dias de trabalho solicitado pela Recorrente) de trabalho a mais para a realização das obras adicionais solicitadas sem que, por tal facto, a Recorrente tenha que sujeitar a alguma penalização ou suportar despesa com a fiscalização da obra naquele período.”
8 Fls. 311 a 317 nos autos do recurso contencioso.
9 Fls. 358 a 361 nos autos do recurso contencioso.
10 Fls. 364 e 368 nos autos do recurso contencioso.
11 Fls. 54 nos autos do recurso contencioso.
12 Fls. 55 (ponto 5 c) nos autos do recurso contencioso.
13 Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, Lisboa, 2001, vol. III, 3.ª edição, p. 278.
14 Cfr. Acórdão do TUI, de 2 de Junho de 2004, 24 de Março de 2004 e 29 de Junho de 2005, Processos n.º 17/2003, 5/2004 e 3/2005.
15 cfr. Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 1985, 2.ª edição, p. 467 e segs..
16 Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 1985, 2.ª edição, p. 509 a 519.
17 J. CASTRO MENDES, Direito Processual Civil, AAFDL, Lisboa, 1987, II vol., p. 675.
18 Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 1985, 2.ª edição, p. 523 a 524.
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Processo nº 61/2012