打印全文
ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

1. O Relator elaborou o seguinte parecer:
   «No presente processo de querela, em recurso jurisdicional de decisão proferida pelo tribunal colectivo, interposto para o Tribunal Superior de Justiça, foi o réu A condenado na pena de quatro anos de prisão e no pagamento de indemnizações.
Entretanto, o réu recorrente interpôs recurso de constitucionalidade para o Plenário do Tribunal Superior de Justiça, que foi admitido, alegando que a decisão recorrida fez aplicação de norma violando princípio e normas da Constituição da República Portuguesa.
Contudo, o art. 70º, n.º 2, alínea 3) , da Lei n.º 9/1999, de 20.12, veio dispor:
“É extinta a instância nos processos pendentes relativamente aos recursos das decisões dos tribunais que tenham recusado a aplicação de norma com fundamento na sua inconstitucionalidade, ou que tenham aplicado norma cuja inconstitucionalidade, em ambos os casos por violação da Constituição da República Portuguesa, haja sido suscitada durante o processo”.
Ouvido o Digno Magistrado do Ministério Público, promoveu se declarasse extinta a instância, nos termos da referida norma.
Deste modo, impõe-se julgar extinta a instância, fazendo aplicação da norma acabada de citar».
Ouvido o recorrente , nada opôs.

2. Entende-se que o recorrente não deve suportar as custas do recurso, pelo que não haverá tributação no presente recurso.
   É certo que o art. 447º do Código de Processo Civil anterior, aplicável aos autos, dispõe que quando a instância se extinguir por impossibilidade ou inutilidade da lide, as custas ficam a cargo do autor, salvo se a impossibilidade ou inutilidade resultar de facto imputável ao réu, que nesse caso as pagará.
   Literalmente, deveria o recorrente pagar as custas já que a impossibilidade ou inutilidade não resulta de facto imputável ao recorrido.
   Considera-se que esta norma tem de sofrer aplicação restritiva, não se aplicando a casos como os dos autos, em que a instância se extinguiu por força de acto legislativo, que provocou a ablação de um direito processual da parte.
   Na verdade, no nosso sistema, paga as custas quem a elas deu causa (princípio da causalidade), sendo que dá causa às custas a parte vencida (princípio da sucumbência), nos termos do art. 446.º, n.º 1, do Código de Processo Civil anterior (art. 377.º, n.º 1, do Código vigente actualmente).
   Mas, por força do princípio da proporcionalidade, na modalidade de proibição do excesso, por exemplo, a parte responsável pelas custas não paga os actos e incidentes supérfluos, nem as despesas a que não deu causa (art. 448.º, n.º 1, do mesmo Código de Processo Civil) e são isentos de custas os adiamentos ordenados por motivos respeitantes ao próprio tribunal (art. 44.º do Código das Custas Judiciais).
   Logo, por força deste mesmo princípio, não deve o recorrente suportar as custas do presente recurso.
   Por outro lado, no direito de Macau vigora hoje indiscutivelmente o princípio do processo equitativo. Dispõe o n.º 3, do art. 6.º da Lei de Bases da Organização Judiciária, aprovada pela Lei n.º 9/1999, de 20 de Dezembro:
   «Todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo».
    Tem-se entendido que um processo equitativo é um processo legal, justo e adequado, quando se trate de legitimar o sacrifício da vida, liberdade e propriedade dos particulares, pois o processo devido (due process) deve ser materialmente informado pelos princípios da justiça.1.
A figura de processo equitativo não pode ser definida em abstracto, antes deve ser verificada segundo as circunstâncias particulares de cada caso2.
   Pois bem, não tendo o recorrente dado causa à extinção da instância, não lhe sendo esta manifestamente imputável, nem beneficiando com a extinção da instância de recurso, não seria justo e adequado que suportasse as custas3.
   Assim se decide que o presente recurso não seja tributado em custas.

3. Face ao expendido, acordam em aprovar o referido parecer, que aqui dão por reproduzido e, assim, em julgar extinta a instância de recurso de constitucionalidade.
Sem custas.
Após trânsito em julgado, remeta os autos ao Tribunal de 2ª Instância, a fim de ser apreciado o requerimento de interposição de recurso penal para o Tribunal de Última Instância.
   Macau, 2.2.2000
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
Sam Hou Fai
                          Chu Kin

1 Cfr. J.J.. GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 3.ª ed., 1999, p. 460-462.
2 IRENEU BARRETO, Notas para um processo equitativo, Documentação e Direito Comparado, 1992, nos 49/50, p. 90.
3 Mais duvidosa seria a solução se o recorrente visse a instância ser extinta por força de acto legislativo, mas beneficiasse com a mesma, ou se pudesse opor-se à extinção, como sucedeu em casos de extinção de instância de recursos contenciosos de decisões disciplinares punitivas, por impossibilidade da lide, em virtude de amnistia de infracções disciplinares. Sobre esta questão, a jurisprudência dividiu-se.
---------------

------------------------------------------------------------

---------------

------------------------------------------------------------

1


4
Processo n.º 2000/4