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 Processo n.º 5/2001. Recurso jurisdicional em matéria cível.
Recorrente: A.
Recorrido: B.
Assunto: Custas em recurso.
Data da Sessão: 27.6.01
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Sam Hou Fai e Chan Kuong Seng.

SUMÁRIO:
Se num recurso de decisão de mérito de primeira instância, o Tribunal de Segunda Instância anula a decisão oficiosamente, o recurso para o Tribunal de Última Instância deve ser isento de custas se o Tribunal revoga a decisão recorrida e o recorrido não aderiu a esta nem a acompanhou.

O Relator,
Viriato Manuel Pinheiro de Lima

ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

Reforma quanto a custas
1. No recurso interposto por A, e em que foi recorrido B, a final decidiu este Tribunal de Última Instância dar provimento ao recurso e revogar a decisão recorrida, para que o Tribunal de Segunda Instância, pelos mesmos Juízes, conhecesse do objecto do recurso, se outro motivo a tal não obstar.
E condenou em custas o recorrido B.
Vem este pedir a reforma quanto a custas, isentando-o das custas, pois que:
- O douto acórdão do Tribunal de Segunda Instância deliberou dar parcial provimento ao recurso interposto pelo A, embora com outra fundamentação, “anulando o despacho saneador sentença que deve ser substituído por outro que, caso outro motivo não impeça, ordene nos termos consignados”.
- O recorrido B, nas suas contra-alegações contrariou as razões de fundo aduzidas pelo recorrente, entendendo que o recurso não merecia provimento, isto no sentido de que o pedido formulado pela mesma recorrente – revogar-se a decisão recorrida e decidir-se que a acção é procedente – não merecia ser atendido.
- O recorrido, ora requerente, não apresentou nas suas contra – alegações quaisquer argumentos para reforçar a fundamentação daquele aresto da Segunda Instância, nem pediu a manutenção do ali doutamente decidido, apenas sustentou que esse Venerando Tribunal de Última Instância não devia decidir pela procedência da acção.
- Ora, o douto acórdão desse Venerando Tribunal revogando embora o decidido pela Segunda Instância não deu satisfação ao pedido formulado pelo recorrente.
- Tudo isto significa que o recorrido além de não ter dado causa à decisão recorrida, não aderiu expressamente à mesma, nem a acompanhou.
- Afigura-se, assim, que nos termos da al. i) do n.º 1 do art.º 2.º do Regime das Custas nos Tribunais, a recorrida deve beneficiar da isenção de custas.
Ouvido o recorrente, defendeu a manutenção do decidido.

2. De acordo com o disposto no art. 376.º, n.º 1, do Código de Processo Civil «A decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas tiver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito».
«Entende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for» (art. 376.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).
Estas normas foram transpostas nos seus precisos termos do Código anterior e não inovaram.
A inovação veio no novo Regime das Custas nos Tribunais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 63/99/M, de 25.10.
Na parte que agora nos interessa foi acrescentado um novo fundamento de isenção subjectiva de custas para “Os recorridos que, não tendo dado causa ou expressamente aderido à decisão recorrida, a não acompanhem” [art. 2.º, alínea i)].
Importa, assim, interpretar e relacionar as normas pertinentes e resolver se a decisão deve ser reformada quanto a custas.

3. O Ex.mo Juiz de primeira instância proferiu saneador-sentença, absolvendo os quatro réus do pedido, entre eles B, ora requerente.
O autor recorreu, mas o Tribunal de Segunda Instância não conheceu do mérito do recurso. Entendeu que havia necessidade de apurar um facto e, oficiosamente, anulou o saneador-sentença (o que implicava que o processo regressasse à primeira instância para que tal facto fosse apurado e então se proferisse nova decisão, se fosse caso disso).
O autor discordou e recorreu para o Tribunal de Última Instância, pedindo a revogação do Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, mas pretendendo que o Tribunal conhecesse o fundo da decisão da primeira instância e, desse razão ao autor, julgando a acção procedente.
No texto da alegação, o autor abordou as duas questões, a relativa à decisão do Tribunal de Segunda Instância e a relativa à questão de mérito da causa.
Só B contra-alegou, terminando a sua peça processual da seguinte maneira: «Pelo exposto, entende o recorrido que o recurso não merece ser provido. Assim será feita JUSTIÇA». Mas no texto da contra-alegação nunca se pronunciou sobre o Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, apenas abordando a questão de mérito, que a sentença de primeira instância havia apreciado e decidido.
O Acórdão deste Tribunal de Última Instância apreciou se o Tribunal de Segunda Instância tinha ajuizado bem ao decidir, como decidiu. E considerou que não tinha, que a anulação da sentença de primeira instância fora indevida, porque o facto que o Tribunal de Segunda Instância queria apurar não tinha relevância para a decisão final da acção. Por isso, revogou o Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, para que este voltasse a apreciar o recurso da sentença de primeira instância. E condenou em custas o recorrido B.

4. O autor ganhou o recurso, na medida em que pretendia a revogação do Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, e obteve-a. É certo que pretendia que o Tribunal conhecesse de fundo, o que não aconteceu, mas nem por isso se pode dizer que ficou parcialmente vencido.
Aparentemente, o recorrido B ficou vencido, porque pediu o não provimento do recurso. Mas será mesmo assim?
Apreciando atentamente o texto da sua contra-alegação verificamos, como já dissemos, que nunca se pronunciou sobre o Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, apenas apreciando a questão de mérito que a sentença de primeira instância havia apreciado e decidido (o recorrido terá, porventura, agido erradamente do ponto de vista processual, já que o objecto do recurso era a decisão do Tribunal de Segunda Instância e não a da primeira instância, mas isso não releva para o que agora nos ocupa).
Ora, o recorrido B não deu causa ao Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, pois nunca pediu a anulação do saneador-sentença.
E, bem vistas as coisas, não aderiu ao Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, nem acompanhou esta decisão, pois nunca se referiu a ela nem à questão que a decisão recorrida apreciou e resolveu.
É certo que para não suscitar dúvidas devia ter esclarecido que a conclusão, com que finalizou a sua peça processual (que deveria ser negado provimento ao recurso), apenas valia para o mérito da causa e não para a questão decidida pelo Tribunal de Segunda Instância.
Ou seja, B, na conclusão, foi para além do que alegara na narração da sua contra-alegação.
A qual das partes devemos dar prevalência, para o fim agora em causa?
Atendendo a que o recorrido parece ter dito na conclusão mais do que queria dizer, e que a substância deve ter prevalência sobre a forma, impõe-se relevar a incorrecção da conclusão e atender ao conteúdo da contra-alegação.
Afigura-se-nos, assim, que o recorrido B deve beneficiar da isenção de custas a que se refere o art. 2.º, alínea i) do Regime das Custas nos Tribunais.

5. Face ao expendido, defere-se ao requerido e reforma-se o Acórdão de 23.5.2001, quanto a custas, ficando o recurso isento de custas.
Macau, 27.06.2001
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
                       Sam Hou Fai
                      Chan Kuong Seng




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