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卷宗編號: 184/2017
日期: 2019年07月11日
關鍵詞: 事實事宜的篩選

摘要:
- 倘仍存有具爭議的事實,原審法院不應否定當事人舉證以證實相關事實的訴訟權利。
- 在沒有其他阻卻情節下,需按《民事訴訟法典》第430條之規定作出事實事宜的篩選,並繼續其後的訴訟程序。
裁判書製作人
何偉寧















民事及勞動上訴裁判書

卷宗編號: 184/2017
日期: 2019年07月11日
上訴人: A(原告)
被上訴人: B(被告)
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一. 概述
原告A,詳細身份資料載於卷宗內,不服初級法院家庭及未成年人法庭於2016年07月20日作出的決定,向本院提出上訴,理由詳載於卷宗第479至505背頁,有關內容在此視為完全轉錄1。
被告B就上述上訴作出答覆,有關內容載於卷宗第518至 540 頁,在此視為完全轉錄。
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二. 理由陳述
1. 關於裁判無效方面:
原告認為被上訴的批示存有《民事訴訟法典》第571條第1款b)項的無效情節,即未有詳細說明作為裁判理由之事實及法律依據。
被上訴批示的內容如下:
“…
卷宗第439頁至第450頁、第453頁至第457頁:閱。
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  本案中,原告A向本法庭提起訴訟離婚之訴,其指出其與被告B於1979年3月9日在廣東省佛山市登記結婚,由於未能向法庭提交證明原告和被告間之婚姻事實的結婚證,其分別向本法庭提交了第﹝90﹞佛市証字第3649號及第﹝80﹞禪証字第107號之結婚證明書的認證繕本或副本(見卷宗第6頁至第9頁、第52頁及第53頁、第291頁至第294頁、第303頁),以證明二人間之婚姻事實。
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  被告B於其答辯狀中提出婚姻不產生效力/不存在的先決問題,其指出於1979年3月9日,被告獨自前往婚姻登記機關提出結婚申請,獨自填寫結婚申請書,並簽署了自己的姓名,代簽了原告的姓名。事後,原告沒有在結婚申請表上補簽姓名,雙方亦沒有獲得頒發結婚證,認為二人之間不存在婚姻關係。
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  同時,被告在我國內地法院針對與原告之婚姻行政登記提起行政訴訟,請求確認有關婚姻登記行政行為無效。
  及後,廣東省佛山市中級人民法院作出確定性裁判,指出由於所訴之1979年的婚姻登記行為不屬於行政法調整的範疇,即,不屬於行政訴訟的受案範圍而應予駁回有關請求。
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  隨後,被告向法庭提交了廣東省佛山市珠江公証處發出之複查決定書的認證繕本(見卷宗第449頁及第450頁),當中指出該公証處決定:對(80) 禪証字第107號之《結婚証明書》、(90) 佛市証字第3649號《結婚証明書》均予以撤銷。上述公証書自始無效。
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  關於二人之間是否存在婚姻關係之問題,被告向法庭提交了法律意見書,有關意見書指出,由於二人沒有獲頒發《結婚証》,故二人間尚未確立婚姻關係(見卷宗第139頁至第148頁)。
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  原告亦向法庭提交了法律意見書(見卷宗第313頁至第324頁)。
  廣東C律師事務所發出之法律意見書,當中指出佛山市公証處於1980年3月7日出具的《結婚証明書》是合法有效的。
  澳門大學法學院D副教授摘寫了法律意見書,當中指出假定原告與被告沒有完全完成婚姻登記程序,收到由婚姻登記機關頒發的《結婚証》,但因雙方已經符合成立婚姻的要件,仍然形成事實婚姻關係,其效力應受到中華人民共和國法律的認可和保護,也應當受到澳門法律的保護。
  其指出根據三項司法解釋(1956年最高人民法院《關於未登記的婚姻關係在法律上的效力問題的複函》、1957年最高人民法院《關於男女雙方已達婚齡未進行登記而結婚的一方提出離婚時應如何處理問題的批複》、1979年最高人民法院《關於貫徹執行民事政策法律的意見》),其認為事實婚姻由於未完成婚姻登記、發放《結婚証》這一法定形式要件不合法、應予以批評和補正的同時,規定應當有條件地將不符合婚姻登記要件的事實婚姻關係糾紛認定為一般婚姻糾紛,對其婚姻關係予以承認,在一方提出離婚時,應作為一般離婚案件處理。
  其解釋,雖然根據1950年《婚姻法》的一般規定,男女雙方必須親自到婚姻登記機關辦理婚姻登記手續、由政府民政部門發放結婚證,婚姻關係才成立,但是由於當時中國大陸民眾的文化程度和法律意識普遍偏低,缺乏婚姻登記的意識和習慣,最高人民法院以司法解釋的形式有條件地認可了事實婚姻的法律效力,滿足上述條件的男女雙方成立被法律承認的事實婚姻關係;當一方提出離婚時,應當作為一般離婚案件處理,而不應認定雙方婚姻關係自始無效。
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  現在讓我們按照本澳的法律制度就二人之間是否存在婚姻關係作出分析。
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  按照《民法典》第48條之規定:「結婚人結婚或訂立婚姻協定之能力,受其各自之屬人法規範;該屬人法亦為確定有關立約人之意思欠缺或瑕疵之制度之準據法。」
  根據《民法典》第49條第1款之規定:「一、結婚方式受婚姻締結地法規範,但不影響下款規定之適用。」
  按照雙方所提交的法律意見書,均承認按照1979年3月9日生效的中國內地法律(1950年《婚姻法》第6條和1955年《婚姻登記辦法》),原告與被告必須親自到婚姻登記機關辦理婚姻登記手續,由政府民政部門發放結婚證,婚姻關係才成立。
  換言之,按照原告與被告締結婚姻時之婚姻締結地法(中國內地法律),由於原告沒有親自到婚姻登記機關辦理婚姻登記手續,二人之間的婚姻關係尚未成立。
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  按照《民法典》第50條第1款之規定:「一、夫妻間之關係受雙方共同常居地法規範,但下條所規定者除外。」
  根據《民法典》第53條之規定:「離婚適用第五十條之規定。」
  按照《民法典》第58條之規定:「一、事實婚之要件及效力,受具有事實婚關係之雙方之共同常居地法規範。二、如無共同常居地,則適用與有關情況有較密切聯繫地法。」
  根據《民法典》第30條規定:
  「一、屬人法即個人之常居地法。
二、個人實際且固定之生活中心之所在地視為個人之常居地。
  三、為着以上各款之效力,以澳門為常居地並不取決於任何行政手續,但推定有權領取澳門居民身分證之人為澳門地區之常居民。
  四、如個人之常居地多於一地,而其中之一為澳門,則以澳門地區之法律為屬人法。
  五、如無常居地,則以與個人生活有較密切聯繫地法為屬人法。
  六、然而,按表意人國籍國法在該國作出之法律行為,在澳門予以承認,只要該法律認為本身為準據法。
  七、如表意人所屬國籍國有多個法制共存,而表意人之常居地在該國,且該常居地之法律認為本身為規範有關關係之準據法,則不適用上款之規定。」
  至於二人間是否存在中國內地法律所賦予之事實婚姻關係,又或可否在本澳提出離婚請求,本法庭認為應屬夫妻間之關係,而非締結婚姻時結婚人之能力或結婚方式之問題,故應適用二人現時之共同常居地法。
  由於原告與被告均持有澳門特別行政區身份證,二人之共同常居地應推定為本澳,即適用本澳之法律。
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  按照《民事訴訟法典》第72條之規定:「如原告需要採用司法途徑為合理者,則有訴之利益。」
  根據本澳之法律制度,雖然承認事實婚關係,在某程度上給予事實婚關係一定之法律保障,但事實婚關係並非完全等同於真正的婚姻關係,亦沒有設立針對事實婚關係提出離婚之法律規定。
  離婚訴訟是以婚姻登記有效為前提,倘有關婚姻為無效,則不存在離婚的可能。
  由於本案未能證實二人之間存在婚姻關係,且本澳現行法律制度沒有設立針對事實婚關係提出離婚之法律制度,故原告提出之離婚請求屬明顯理由不成立且屬無訴之利益的情況。
  基於此,根據《民事訴訟法》第72條、第230條第1款e)項和第413條h)項之規定,本法庭裁定本案無訴之利益的延訴抗辯理由成立,並駁回由原告A針對被告B提起之離婚訴訟。
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  訴訟費用由原告承擔。
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  登錄及作出通知。
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  作出通知及採取必要措施…”。
從相關內容可見,原審法院駁回原告的離婚訴訟的理由是其沒有證明婚姻的存在,而澳門雖然給予事實婚某些法律效果,但沒有將之等同於正式合法婚姻。
在尊重不同見解下,我們認為就駁回決定而言,原審法院已作出了適當的理由說明,被上訴批示並不存有原告所指控的無效情節。
至於有關理由是否正確或卷宗資料是否足以讓原審法院作出該決定,則不是判決無效這一形式瑕疵層次的問題,而是下面我們將要討論和審理的實體問題。
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2. 本案的核心問題:
原審法院認為原告沒有提交適當證據(結婚證)證明婚姻的存在,而所提交的結婚證明亦已被內地具權限機關撤銷了,因此,不存在離婚的前提,即沒有證據證明當事人之間存有合法有效的婚姻。
在尊重不同見解下,我們認為原審法院過早下定論了,有關婚姻是否合法存在,仍有待進一步證實和論證。
根據被告在答辯的陳述,結婚申請均是由其本人所簽署,原告當時並沒有親身到場。另一方面,內地具權限當局當時並沒有發出結婚證,故認為婚姻並沒有依法締結,屬無效婚姻。
原告否定有關說法,指當時是親身到場並簽署有關結婚申請,而內地具權限當局曾發出朝結字156號的結婚證,但該證已遺失了(見原告之反駁第74至77條,卷宗第228至248頁)。
這些都是仍具爭議的事實,故原審法院不應否定當事人舉證以證實相關事實的訴訟權利。
事實上,有關婚姻,倘存在,發生於1979年03月09日,距今已有40年了。存在證明文件遺失,特別是結婚證(倘存在過),也是正常的,故原審法院不應僅憑原告沒有提交結婚證或結婚證明便立即否定婚姻的存在。
如上所述,有否發出過結婚證是一仍待調查的事實。
另一方面,倘沒有發出結婚證,是否代表原告和被告間不存在合法有效的婚姻這一法律問題,亦需進一步論證,例如依被告所陳述,結婚申請是他本人簽署及代女方,即原告,簽署;倘這一事實獲得證實,這一代簽名行為在法律上有否效力?雙方多年來,特別是女方,從沒有對此提出異議是否代表該代簽行為已獲得追認/補正?1950年的《婚姻法》和1955年的《婚姻登記辦理》行政法規要求結婚當事人親身到場辦理結婚手續的立法精神是什麼?是否就是《婚姻法》第一條所指的“廢除包辦強迫、男尊女卑、漠視子女利益的封建主義婚姻制度。實行男女婚姻自由、一夫一妻、男女權利平等、保護婦女和子女合法權益的新民主主義婚姻制度”?如是,該立法精神在本案的具體情況中應如何適用?
這些問題均不能在清理批示中作出解決,因卷宗並不存在充分資料讓原審法院作出決定。
基於此,被上訴的決定應予以廢止,原審法院在沒有其他阻卻情節下,需按《民事訴訟法典》第430條之規定作出事實事宜的篩選,並繼續其後的訴訟程序。
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3. 就展開檢閱後提交的文件和法律意見:
《民事訴訟法典》第616條第2款規定如下:
  “二、嗣後文件得於法官開始檢閱卷宗前附具;在法官開始檢閱卷宗前,亦得附具律師、法學家或技術人員之意見書”。
從上述轉錄的法規可見,所有在展開檢閱後提交的文件和法律意見書均屬違法,理應著令將之抽出退還並科處相關提交人繳付抽出費用,然而考慮到上述的發還重審的決定,不著令抽出退還,留待原審法院處理。
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三. 決定
綜上所述,廢止原審決定,將卷宗發回原審法院作適當處理。
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訴訟費用待審理完結後再計算。
作出適當通知。
2019年07月11日
何偉寧
司徒民正
馮文莊
1 原告的上訴結論如下:
1. Vem o presente recurso interposto do douto saneador-sentença de fls. 460 e seguintes que, nos termos dos artigos 72.º, 230.º, n.º 1, alínea e) e 413.º, alínea h), todos do CPC, decidiu pela procedência da excepção dilatória de falta de interesse processual e, em consequência, absolveu o Réu da instância.
2. É, porém, com grande dificuldade que se alcança a fundamentação da sentença recorrida dificuldade que é fruto de uma ausência dos fundamentos de facto e de direito em que assenta a decisão.
3. Efectivamente, escudando-se unicamente nos pareceres jurídicos juntos pelas partes o Meritíssimo Juiz a quo conclui que, de acordo com a Lei Matrimonial da República Popular da China de 1950 e o Regulamento do Registo de Casamento de 1955 - que, por força dos artigos 48.º e 49.º do Código Civil (CC), o Meritíssimo Juiz a quo considera, e bem, como a lei aplicável para aferir da forma do casamento celebrado entre Autora e Réu - "a relação matrimonial só será estabelecida quando a Autora e Réu tratem pessoalmente das formalidades do registo de casamento junto da conservatória do registo de casamento, e seja emitido o livrete de casamento pelos serviços de administração civil do Governo".
4. E como, segundo o Meritíssimo Juiz a quo, sem que o explique por que motivo ou com base em que elemento probatório, ficou provado que a Autora não tratou pessoalmente das formalidades do registo de casamento junto da competente conservatória, "a relação matrimonial entre as partes não foi estabelecida".
5. No que concerne à alegação da Autora de que uma eventual violação das normas relativas à forma ou constituição da relação matrimonial previstas na Lei Matrimonial da República Popular da China de 1950 e do Regulamento do Registo de Casamento de 1955, nunca teriam como consequência a inexistência do casamento, tendo a relação entre as partes os mesmos efeitos ou tutela legal do casamento, a mesma é rejeitada pela sentença recorrida com o argumento de que nesse caso estar-se-ia perante uma "união de facto" à qual, por as partes terem actualmente em Macau a sua residência habitual, se lhe aplicaria a lei de Macau, e que esta não atribui às uniões de facto os mesmos efeitos do casamento, nomeadamente a dissolução através de processo de divórcio.
6. Ora, por força da alínea b) do nº 1 do artigo 571º do CPC quando não especifique os fundamentos de facto e de direito a sentença é nula.
7. Doutro passo, na altura do despacho saneador os factos que podem ser considerados na decisão que conheça de uma excepção são, por força do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 429.º do CPC, unicamente os factos notórios e daqueles que o juiz tem conhecimento em virtude das suas funções (vide artigo 434.º do CPC), aqueles que resultam de confissão judicial (vide artigo 349.º, n.º 1 do CC), de acordo expresso ou tácito das partes nos articulados (vide artigo 489.º, n.º 2 do CPC), do funcionamento de presunção legal inilidível (vide 343.º, n.º 2 do CC) ou de documento com força probatória bastante (vide artigos 365.º, 370.º e 371.º, do CC).
8. Ou seja, na fase do saneador a prova de qualquer excepção não poderá resultar nunca do exercício da livre apreciação da prova pelo julgador, mas sim do funcionamento de disposições legais acima referidas que constituem um justificado resíduo do sistema da prova legal.
9. Destarte, o cumprimento do ónus de fundamentação de facto no caso de uma decisão de procedência de uma excepção proferida no despacho saneador requer, para além daquilo que se disse supra no ponto 8, a indicação concreta do meio (facto notório ou daquele que o juiz tem conhecimento em virtude das suas funções, confissão judicial, acordo expresso ou tácito das partes nos articulados, presunção legal inilidível ou documento com força probatória plena) em que o tribunal se baseou para considerar provados os factos em que assenta a decisão.
10. Analisando a sentença recorrida dúvidas não restam de que a mesma enferma, de modo ostensivo, do vício de falta de fundamentação, tanto ao nível dos fundamentos de facto, como dos de direito e é, por isso, nula.
11. Com efeito, em momento algum do seu texto a sentença procede a um elenco discriminado dos factos que considera relevantes para a decisão da causa segundo as várias soluções de direito possíveis, não separando, nem individualizando ou sequer discernindo a matéria factual em que assenta a sua decisão.
12. A única tímida referência a um eventual facto relevante para a decisão da causa, nos termos em que mesma foi decidida pelo Tribunal a quo, é aquela que é feita no final do parágrafo 8.° da sentença em que, do nada, se dá por assente o "facto de a Autora não ter tratado pessoalmente das formalidades do registo de casamento junto da conservatória do registo de casamento".
13. Além do mais, a mencionada referência genérica feita na sentença recorrida à alegada não comparência pessoal da Autora junto da conservatória do registo para tratamento das formalidades do casamento é desacompanhada da menção ao elemento de prova constante dos autos em que a mesma assenta, sendo certo que, como se disse, tal prova apenas poderia resultar de um facto notório ou daquele que o juiz tem conhecimento em virtude das suas funções, de confissão judicial, de acordo expresso ou tácito das partes nos articulados, ou em função de presunção legal inilidível ou de documento com força probatória bastante.
14. Do supra exposto decorre, pois, a absoluta falta de fundamentação ao nível factual da sentença recorrida, falta essa que é causadora da respectiva nulidade, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 571.º do CPC e que agora se argui para todos os efeitos legais.
15. Doutro passo, o Meritíssimo Juiz a quo não explica também por é que, no seu entender, a suposta ausência in persona da Autora no tratamento das formalidades do registo do seu casamento com o Réu é, nos termos da lei Matrimonial de 1950 e do Regulamento do Registo de Casamento de 1955 da República Popular da China, causa determinante da inexistência da relação matrimonial.
16. Esta explicação seria tão ou mais importante, quando se constata que os supra mencionados diplomas legais não estabelecem qual a sanção ou consequência do incumprimento dos requisitos de forma aí previstos para a celebração do casamento.
17. Neste particular, o aresto recorrido limita-se a remeter para os pareceres jurídicos juntos pelas partes ou seja para os fundamentos que estas invocam em abono das suas teses o que equivale a falta de fundamentação e gera a nulidade da sentença.
18. Termos em que, vem a Recorrente, para todos os efeitos legais, arguir a nulidade da sentença por a mesma não especificar os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (vide alínea b) do n.º 1 do artigo 571.º do CPC), sentença que, em virtude dessa falta de fundamentação, viola igualmente o disposto no artigo 108.º do mesmo diploma legal e terá, por isso, de ser revogada.
19. Por outro lado, importa recordar que a excepção dilatória (falta de interesse processual por não estar estabelecida a relação matrimonial entre as partes) que o Meritíssimo Juiz a quo deu como procedente no despacho saneador foi alegada pelo Réu na sua contestação pelo que, por força do disposto no n.º 2 do artigo 335.º do Código Civil (CC), competia a este fazer prova da mesma.
20. No presente caso e sendo indubitável que a procedência desta excepção não poderá ter resultado da consideração de qualquer facto notório ou daquele que o juiz teve conhecimento em virtude das suas funções, de confissão judicial, de acordo expresso ou tácito das partes nos articulados, ou em função de presunção legal inilidível, importa apurar se consta dos autos algum documento com força probatória plena que prove que a Autora não compareceu pessoalmente juntamente com o Réu no acto de registo de casamento, como este alega.
21. Neste particular está-se em crer que o Meritíssimo Juiz a quo terá assentado a sua decisão no documento de fls. 449 e 450, isto porque, todos os restantes elementos de prova juntos ao processo e nomeadamente as decisões do Tribunal de Foshan na acção que o Réu intentou com o único fito de obter a declaração de nulidade/inexistência do seu casamento com a Autora e que indeferiram essa pretensão, já constavam dos autos e já haviam sido objecto de análise antes da prolação da sentença recorrida.
22. Esta decisão do Meritíssimo Juiz a quo, constitui uma patente violação do princípio da igualdade das partes, consagrado no artigo 4.º do CPC.
23. Efectivamente, conforme o expressou em diversas ocasiões (vide despachos de fls. 223, 352 e 436), o Meritíssimo Juiz a quo não considerou as certidões notariais juntas pela Autora (objecto do despacho de cancelamento proferido por um Cartório Notarial de Foshan) como documento com força probatória bastante ou plena para comprovar a existência do casamento entre Autora e Réu, mormente que este casamento foi celebrado em observância dos preceitos formais previstos na lei matrimonial aplicável, nomeadamente aqueles que dizem respeito ao registo do casamento, relegando o conhecimento desta questão para a fase de discussão e julgamento da matéria de facto.
24. Destarte, é verdadeiramente extraordinário que o Tribunal a quo considere agora o cancelamento dos referidos documentos como bastante para a prova da excepção alegada pelo Réu, quando antes do respectivo cancelamento, numa altura em que esses documentos se mantinham válidos, nunca os mesmos foram considerados, por si só, suficientes para prova do facto alegado pela Autora.
25. Esta desigualdade de tratamento ao nível da valoração dos documentos juntos pelas partes é ainda demonstrada pela circunstância de o Tribunal recorrido nem sequer se ter dado ao trabalho de escalpelizar as razões que determinaram o dito despacho de cancelamento proferido por um Cartório Notarial de Foshan, conforme o comprova a total omissão no texto recorrido a qualquer menção quanto a este facto.
26. A igualdade substancial, pressuposto do princípio consagrado no artigo 4.º do CPC, implica a paridade simétrica das posições das partes perante o tribunal, fica no presente caso inevitavelmente prejudicada quando se recusa ao documento junto pela Autora um determinado efeito e se aceita atribuir o efeito contrário quando esse documento deixa de valer.
27. E é ainda mais gritantemente violado quando se inibe a parte de fazer oportunamente a prova dos factos por documentos e testemunhos. Estando nesta situação, entre muitos outros, todos os inúmeros documentos e testemunhos que comprovam que Autora e Réu casaram e que o Réu, desde 1980 até á data em que apresentou a sua contestação na presente acção de divórcio, sempre se identificou perante todas as entidades e autoridades públicas como sendo casado com a Autora, tendo designadamente sido ele próprio que, em 6 de Março de 1980 pediu às autoridades competentes da China uma segunda via do certificado do seu casamento com a Autora.
28. Por outro lado, de modo algum resulta provado do documento de fls. 459 e 450 que a Autora não compareceu pessoalmente no acto de registo de casamento, a razão pela qual, segundo o Meritíssimo Juiz a quo, é causa da inexistência do casamento entre as partes, por violação da Lei Matrimonial da República Popular da China de 1950.
29. Efectivamente, tal despacho do Cartório Notarial de Foshan surge na sequência e refere-se somente ao cumprimento da decisão do Tribunal Popular de Segunda Instância do referido município junta com o requerimento da Autora de 31.05.2016 e a fls. 421 e seguintes.
30. Com efeito, conforme resulta da decisão judicial acima referida, a razão do cancelamento das mencionadas certidões notariais consistiu apenas no facto de, no âmbito do processo movido pelo Réu no interior da China, o Tribunal de Segunda Instância do Município de Foshan ter considerado que no processo de registo do casamento entre a Autora e Réu não se logrou encontrar o acto/documento confirmativo do registo de casamento, pelo que, segundo o entendimento desse mesmo órgão judicial, tais certificados notariais, por si só, não seriam suficientes para atestar o matrimónio em apreço.
31. Neste âmbito importa ainda notar que, conforme claramente resulta do respectivo texto, a decisão do Cartório Notarial a que se vem fazendo referência não emite qualquer juízo sobre a inexistência ou invalidade do casamento entre a Autora e o Réu, nomeadamente por verificação do vício que o Réu lhe aponta.
32. E a verdade é que tal juízo jamais poderia ser emitido por um cartório notarial que, inclusive, segundo o entendimento perfilhado pelo Réu, respaldado nos pareceres por ele juntos com a contestação, não teria sequer capacidade legal para, no âmbito das suas funções, atestar o casamento sendo que, por maioria de razão, não teria, nem tem competência para julgar a sua inexistência ou irregularidade formal, tarefa que cabe em exclusivo aos tribunais que na acção proposta pelo Réu com esse fito (o de declarar a inexistência/invalidade do casamento) rejeitaram em dupla instância essa pretensão.
33. Ademais, importa ainda referir que o facto de o dito Tribunal do interior da China ter concluído, no âmbito do processo intentado pelo Réu, não se ter encontrado o referido acto de registo, tal não significa obviamente que o mesmo não tenha existido mas apenas que não se logrou encontrar.
34. Resulta, assim, demonstrado do supra exposto a inexistência de qualquer elemento de prova nos autos, nomeadamente o documento de fls. 449 e 450, comprovativo da excepção dilatória em apreço (que o processo de registo do casamento entre Autora e Réu enferma de um vício gerador da sua inexistência por aquela não ter comparecido pessoalmente no acto de registo do casamento), pelo que nunca a mesma poderia ser declarada procedente no despacho saneador.
35. Como tal, ao decidir em sentido oposto o Meritíssimo Juiz a quo incorreu num erro de julgamento, que consubstancia uma violação dos artigos 72.º, 230.º, n.º 1 e 413.º, alínea h) e 429.º, n.º 1, alínea a) e b) do CPC.
36. Ao invés, do que decorre da sentença recorrida, aquilo que se impunha ao Meritíssimo Juiz a quo perante as provas constantes dos autos era ter declarado no despacho saneador a total improcedência de tal excepção.
37. Com efeito, são numerosas as provas constantes dos autos, algumas das quais dotadas de força probatória plena, que demonstram precisamente o contrário daquilo que o Meritíssimo Juiz a quo deu como assente: a comparência pessoal da Autora na conservatória a fim de proceder ao registo do seu casamento com o Réu e inexistência de qualquer vício neste registo, com a consequente validade do casamento entre as partes.
38. Em lugar cimeiro, e como documento com força probatória bastante capaz para sustentar em sede despacho saneador a existência do casamento entre Autora e Réu, estão, desde logo, as decisões proferidas pelo Tribunal Popular do Município de Foshan em primeira e segunda instância.
39. Desde logo porque a acção intentada pelo Réu junto dos tribunais do interior da China com o único propósito de obter a declaração de inexistência/invalidade do seu casamento com a Autora, considerada causa prejudicial em relação à presente acção, foi julgada improcedente na íntegra por ambas as instâncias que se pronunciaram sobre o caso, com transito em julgado.
40. Por outro lado, malgrado ter sido considerado que o acto do registo do casamento se encontrava fora do seu âmbito de apreciação, os tribunais de Foshan, que julgaram a acção intentada pelo Réu para declaração de inexistência/invalidade do casamento, analisaram o objecto daquilo que constituiu a questão prejudicial que esteve na origem da suspensão da presente instância e que mais não é do que a alegada falta de registo do casamento entre Autora e Réu, por aquela não ter comparecido pessoalmente na conservatória.
41. Efectivamente, os tribunais de Foshan, onde correu a causa considerada prejudicial e que determinou que o Meritíssimo Juiz a quo sobrestasse na decisão a proferir nos presentes autos até à decisão daquele processo, julgaram os factos que integram e compõem a relação jurídica material controvertida constituída pela excepção invocada pelo Réu de inexistência do casamento.
42. Ora, aquilo que ficou provado em primeira instância (conforme resulta do doc. n.º 1 junto com o requerimento da Autora de 14.04.2016), segundo as provas homologadas pelo Tribunal, sem que esta decisão tenha sido revogada pelo Tribunal de Segunda Instância, foi, em suma, que o registo de casamento não enfermou de ilicitude grave e grosseira.
43. É a própria Conservatória do Registo competente, recorrida no processo a que se vem fazendo menção, que confirma que Autora e Réu comparecerem pessoalmente no acto do registo de casamento e que, tendo sido, feita uma análise ao pedido de registo de matrimónio entre as partes o mesmo foi deferido, algo que foi dado como assente pelo Tribunal.
44. Doutro passo, ao invés do que o Réu sempre tentou fazer crer, foi dado como assente que o livrete de casamento foi emitido mas que o mesmo se extraviou, facto que foi comunicado pelo próprio Réu às autoridades do interior da China, nomeadamente ao Cartório Notarial de Foshan, junto do qual aquele requereu, no ano de 1980 em virtude desse extravio, a emissão do certificado notarial (que veio agora a ser cancelado) a confirmar o seu casamento com a Autora a fim de o mesmo servir de prova desse matrimónio junto das autoridades de Macau!
45. Em suma, os factos dados como assentes pelos tribunais de Foshan, que resultaram de uma criteriosa observância do princípio do contraditório em que intervieram Autora, Réu e a conservatória do registo, confirmam sem margem para dúvidas que o casamento entre a Autora e o Réu foi registado e que este registo não enferma de qualquer vício.
46. Aqui chegados, importa recordar que o Meritíssimo Juiz a quo atribuiu à acção administrativa intentada pelo Réu junto dos Tribunais de Foshan a natureza de causa prejudicial, consistindo a questão prejudicial a existência/validade do casamento entre Autora e Réu e que na base desta decisão, de que resultou a suspensão da instância, esteve a circunstância de a causa de pedir invocada pelo Réu na acção administrativa que intentou junto dos Tribunais de Foshan ser idêntica aos fundamentos em que fez assentar a excepção agora declarada procedente na sentença recorrida.
47. Ora, tendo os tribunais do interior da China proferido um juízo probatório sobre a referida causa de pedir/questão prejudicial (com a sujeição dos respectivos factos a um rigoroso exercício do contraditório, com a apresentação de provas e respectiva homologação), considerando-a não provada e, ao invés, dando como assente que o casamento entre as partes não padece de qualquer vício, outra solução não restava ao Meritíssimo Juiz a quo se não a de, no despacho saneador, declarar, com base na factualidade apurada na causa prejudicial, totalmente improcedente a excepção invocada pelo Réu.
48. Ao decidir de distinta maneira, o Tribunal a quo não só violou o artigo 27.º do CPC, entrando em contradição com anterior decisão por si proferida como, salvo o devido respeito, desrespeitou uma vez mais o princípio da igualdade das partes.
49. Efectivamente, não se compreende e não se pode aceitar que se atribua a uma determinada questão natureza de questão prejudicial, suspendendo-se, inclusive, a instância e quando tal questão é objecto de julgamento de facto pelos tribunais considerados competentes, este julgamento seja, pura e simplesmente, desprezado e esquecido.
50. Por outro lado, a sentença recorrida ao não declarar a improcedência da excepção invocada pelo Réu optando, ao contrário, por a considerar improcedente violou também a excepção de caso julgado e a autoridade de caso julgado.
51. Quanto à excepção de caso julgado importa reiterar que era ao Réu quem competia provar a inexistência do casamento entre ele e a Autora tendo, para tal, intentado uma acção juntos dos Tribunais do interior da China, a qual foi considerada prejudicial em relação aos presentes autos.
52. Nessa acção o pedido formulado é idêntico àquele que consubstancia a excepção aqui invocada, a causa de pedir é idêntica e há também uma identidade de partes pois a Autora participou também nessa acção.
53. Tendo o pedido aí formulado pelo Réu sido rejeitado, tal rejeição tem força de caso julgado no presente processo e deveria, forçosamente, ter determinado, já no despacho saneador a improcedência da excepção de falta interesse processual da Autora.
54. Por outro lado, ainda que se entendesse que os Tribunais do interior da China não proferiram um juízo jurídico sobre a existência/validade do casamento da Autora com o Réu o certo é que, como acima se mencionou, os mesmos analisaram e julgaram os factos que dizem respeito a esta questão, pelo que essa decisão tem força de caso julgado.
55. Efectivamente, o alcance e autoridade do caso julgado não se limita aos estreitos contornos definidos nos artigos 416. e seguintes do CPC para a excepção do caso julgado, antes se estendendo a situações em que o fundamento daquela figura jurídica está notoriamente presente.
56. A autoridade de caso julgado importa a aceitação de uma decisão proferida em acção anterior, que se insere, quanto ao seu objecto, no objecto da segunda, visando obstar a que a relação ou situação jurídica material definida por uma sentença possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença.
57. Tendo as decisões proferidas pelos Tribunais do interior da China definido em concreto a situação ou os factos que permitem afirmar que o casamento entre a Autora e o Réu foi celebrado em observância dos preceitos legais aplicáveis, os factos ali dados como assentes têm autoridade de caso julgado no presente processo impondo que a excepção invocada pelo Réu seja declara improcedente e, ao contrário, seja dado como assente que Autora e Réu casaram em 9 de Março de 1979, no município de Foshan, República Popular da China.
58. Na hipótese, que apenas por dever de patrocínio se aventa, de se considerar que as decisões do Tribunal de Foshan não poderiam, já no despacho saneador, conduzir à improcedência da excepção invocada pelo Réu e sendo certo que não existe nos autos qualquer documento com força probatória bastante para demonstrar a procedência da excepção da falta de interesse processual da Autora, o certo é que tais decisões, juntamente com a restante prova carreada para os autos pela Autora, sempre seriam mais do que suficientes para destruir o espírito de certeza que parece presidir ao aresto de fls. 460 e remeter a decisão desta questão para a fase de julgamento.
59. O Meritíssimo Juiz a quo incorre ainda num erro de julgamento quando decide aplicar a lei de Macau às consequências de uma eventual irregularidade na forma do casamento entre Autora e Réu na República Popular da China.
60. Efectivamente, o que aqui está em causa é a forma do casamento e, eventualmente, o regime da falta e dos vícios da vontade dos contraentes, o que é regulado, em ambos os casos, pela lei do interior da China, local onde as partes casaram (artigo 49.º do CC) e onde tinham a sua residência habitual à altura do casamento (artigo 30.º aplicável ex vi artigo 48.º do CC).
61. Dito de outro modo, a validade extrínseca (e também intrínseca), ou seja, a validade formal, é regulada pela lei do lugar em que o acto tenha sido celebrado, conforme dispõe o artigo 49.º do CC, norma que tem carácter imperativo e pelas mesmas razões é também essa a lei competente para determinar as sanções que resultam do incumprimento das leis que disciplinam as condições de validade do casamento, quer sejam as condições de validade substancial, quer sejam as condições validade formal.
62. "É à lei que incumbe determinar os pressupostos de validade de um determinado acto que incumbe dizer também quais as consequências resultantes da violação desses pressupostos de validade. Portanto, a questão da admissibilidade dos efeitos e da extensão do casamento putativo é disciplinada pela lei competente nos termos dos arts. 48.º e 49.º do CC, com uma excepção: os efeitos do casamento putativo relativamente aos filhos, questão essa que há de ser tratada quanto ao estabelecimento da filiação pela lei competente nos termos do art. 54.º do CC e, quanto às relações entre pais e filhos, pela lei competente nos termos do art. 55.º do CC".
63. A Lei Matrimonial da República Popular da China de 1950, e não a lei de Macau, conforme defende o Tribunal a quo em violação e errada interpretação dos artigos 30.º, 48.º, 49.º, 50.º, 53.º e 58.º do CC, é, pois, a lei competente para ditar as consequências da violação dos requisitos formais (e substanciais) de validade do casamento, sendo a este lei que se terá de recorrer para apurar dos efeitos dessa violação.
64. Ora, conforme resulta do parecer de fls. 324 e da decisão judicial ora junta como doc. n.º 2, o casamento celebrado sobre a égide da Lei Matrimonial da República Popular da China de 1950 e do Regulamento do Registo de 1955 em violação das respectivas regras de forma, nomeadamente ausência de registo, conquanto tenha preenchido os pressupostos de substância (idade e capacidade dos nubentes) produz os mesmos efeitos (pessoais e patrimoniais) do casamento celebrado validamente e merece idêntica tutela legal, nomeadamente para efeitos de divórcio.
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184/2017