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卷宗編號:775/2018
(司法上訴卷宗)

日期:2020年3月5日

主題:預測性判斷
   自由裁量權
   適度原則
   
摘要
第6/2004號法律第11條第1款3項允許行政當局可因應每個具體個案,對利害關係人是否對澳門公共秩序或安全構成威脅作出一個預測性的判斷。對於當局所作的預測性判斷,不可被法院審查。
如果被質疑的行政行為是以自由裁量權作出時,則只有在行使自由裁量權時出現明顯錯誤或絕對不合理,或以不能容忍的方式違反了行政法的基本原則時,法院才可以對此類行為的實質內容進行審查。


裁判書製作法官

_______________
唐曉峰

中華人民共和國
澳門特別行政區
中級法院合議庭裁判

卷宗編號:775/2018
(司法上訴卷宗)

日期:2020年3月5日

司法上訴人:A

上訴所針對之實體:保安司司長
***
一、 概述
保安司司長於2018年5月28日作出批示,廢止A,男性,持澳大利亞護照,詳細身份資料載於卷宗內(以下簡稱“司法上訴人”),以僱員身份持有的逗留許可。
司法上訴人不服,向本中級法院提起司法上訴,並在起訴狀中提出以下結論:
“1. A 23 de Março de 2018, foi o Recorrente notificado de um despacho proferido pelo Exmo. Senhor Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública, no qual se determinou a revogação da sua autorização de permanência na RAEM enquanto trabalhador não residente, nos termos do disposto nos artigos 11º, n.º 1, alínea 3) da Lei n.º 6/2004 e 15º, n.º 1 do Regulamento Administrativo n.º 8/2010, porquanto o Recorrente praticou um crime de fuga à responsabilidade, p.p. pelo artigo 89º da Lei do Trânsito Rodoviário (LTR), tendo sido condenado na pena de 45 dias de multa, à taxa diária de MOP$300,00, e ainda na pena acessória de inibição de condução por um período de 4 meses, nos termos do artigo 94º, n.º 2 da LTR.
2. O Exmo. Senhor Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública considerou que o alegado comportamento do Recorrente constituía um perigo para a segurança e ordem públicas da RAEM e decidiu revogar a sua autorização de permanência enquanto trabalhador não residente.
3. A 23 de Março de 2018, o Recorrente recorreu hierarquicamente da decisão acima referida.
4. A 16 de Julho de 2018, foi o Recorrente notificado da decisão proferida pelo Exmo. Senhor Secretário para a Segurança, que negou provimento ao recurso hierárquico necessário e manteve a decisão de revogação da autorização de permanência do Recorrente na qualidade de trabalhador não residente.
5. Não pode o Recorrente conformar-se com a decisão recorrida por entender que a mesma incorre quer no vício de violação de lei, p. no artigo 21º, n.º 1, alínea d) do CPAC, nas suas vertentes de erro manifesto e de total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários.
6. O presente Recurso Contencioso é praticado por um órgão com competência para a prática do mesmo.
7. O Recorrente tem legitimidade em recorrer.
8. O Recorrente apresentou oportunamente o pedido de suspensão de eficácia do acto de que ora se recorre, cujos autos correm termos neste Venerando Tribunal sob o processo n.º 689/2018, devendo esses mesmos autos ser apensados aos presentes logo que a decisão de suspensão ali tomada transite em julgado, nos termos do artigo 125º, n.º 1 do CPAC.
9. De acordo com o douto despacho recorrido, o indeferimento do recurso hierárquico necessário teve por base condenação do mesmo no crime de fuga à responsabilidade, tendo o Exmo. Senhor Secretário para a Segurança da RAEM decidido que a conduta do Recorrente, confirmada por sentença do Tribunal Judicial de Base, “(…) criou na entidade recorrida a convicção de que o Recorrente é pessoa que não se coíbe de infringir as regras mais importantes e fundamentais da sociedade (as consagradas nas leis penais) se tal lhe convier, e nessa medida, considerou que o mesmo constitui perigo para a segurança e ordem públicas da RAEM, cabendo a situação, portanto, na previsão da alínea 3) do n.º 1 do artigo 11º da Lei n.º 6/2004 (…)”, pelo que foi indeferido o referido recurso hierárquico.
10. Salvo o devido respeito, não pode a Entidade Recorrida criar tal convicção apenas com base na condenação penal do Recorrente, sendo que a referida convicção mais não é do que uma tentativa esforçada da Entidade Recorrida em fundamentar a decisão da mesma forma que os Tribunais fundamentam as decisões penais em diversos casos.
11. Contudo, a convicção dos Tribunais é formada após a audiência de julgamento e a criteriosa análise da prova aí produzida, pelo que, só assim, fica o Tribunal apto a formar, ou não, uma convicção.
12. É forçoso alegar apenas com base na sentença condenatória e sem qualquer outro facto de que está criada a convicção de que o Recorrente não se coíbe de infringir normas penais. Isto porque o Recorrente foi condenado pelo Tribunal Judicial de Base no âmbito de um crime cometido por violação de uma regra de trânsito rodoviário e não no âmbito de um crime cometido por violação de “leis penais”.
13. A Lei de Trânsito Rodoviário estabelece os princípios e as regas relativos ao trânsito rodoviário na RAEM, por sua vez o Código Penal de Macau constitui uma das traves mestras do ordenamento jurídico de Macau.
14. Apesar de se reconhecer que o Recorrente violou uma regra estradal, com uma vertente criminal, tendo violado um bem jurídico, não podemos deixar de considerar que o Recorrente cometeu um crime (sem dolo) que pode ser cometido por qualquer condutor mais desatento, tendo sido condenado apenas a uma pena de multa.
15. Considerando todas as circunstâncias que envolveram a condenação do Recorrente no processo n.º CR4-17-0067-PCS, bem como considerando as circunstâncias do crime e a condição pessoal do Recorrente, entendeu o Tribunal qualificar como “média” a medida de culpa do Recorrente e, dentro da moldura penal de até 1 ano de prisão ou pena de multa até 120 dias, prevista no artigo 89º da LTR, condenar o Recorrente na pena de 45 dias de multa.
16. De acordo com o disposto no artigo 64º do Código Penal, sempre que ao crime forem aplicadas, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o Tribunal dá preferência à segunda se não ficarem comprometidas as finalidades da punição.
17. No caso em apreço, após avaliar as circunstâncias do caso concreto, o Tribunal considerou que o Recorrente não constituía um perigo para a segurança e ordem públicas da RAEM, pelo que a pena de multa realizava de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Caso contrário, ter-lhe-ia sido aplicada pelo Tribunal a pena de prisão em detrimento da pena de multa.
18. A multa já foi totalmente paga pelo Recorrente e o mesmo já cumpriu também os 4 meses de inibição de conduzir nos termos do artigo 94º, n.º 2 da LTR.
19. Assim, deve ser rejeitada a tese avançada pela Entidade Recorrida de que o comportamento do Recorrente constitui perigo para a segurança e ordem públicas da RAEM, uma vez que, conforme já referido, a conduta do Recorrente ao embater noutro veículo representa um risco inerente à condução de veículos, os factos que ditaram a condenação do Recorrente tiveram origem num mal-entendido e o mesmo demonstrou arrependimento pelo comportamento adoptado.
20. Também o ofendido reconheceu que a situação não foi clara e que tal acontecimento não lhe causou qualquer prejuízo.
21. Igualmente, também não se considera que a conduta do Recorrente seja suficiente para “forçar” o mesmo a abandonar a RAEM, local onde reside e trabalha há mais de 4 anos e onde constituiu a sua família, encontrando-se completamente enraizado.
22. O artigo 11º, n.º 1, alínea 3) da Lei n.º 6/2004 dispõe que a autorização de permanência na RAEM pode ser revogada quando o não residente constitua perigo para a segurança ou ordem públicas, nomeadamente pela prática de crimes, ou sua preparação, na RAEM.
23. Aqui o legislador, criterioso que é na escolha das palavras, determinou que nos casos referidos no artigo acima mencionado, a autorização de permanência “pode ser revogada” e não que “deve ser revogada”, o que significa que não existe um dever imposto pelo legislador à Administração de revogar sempre e em qualquer caso de prática de crime a autorização de permanência, sendo antes avaliado caso a caso a conveniência de renovar ou revogar a referida autorização de permanência.
24. Ou seja, não existe um dever imposto pelo legislador à Administração de revogar sempre e em qualquer caso de prática de crime a autorização de permanência, tendo a Administração o poder discricionário de ajuizar caso a caso do merecimento de revogar tal autorização.
25. Todavia, a Administração assim não entendeu, e, sem indicação de qualquer critério e/ou justificação, nomeadamente socorrendo-se de factos concretos e objectivos, decretou que se mantinha a perigosidade do Recorrente para a segurança e ordem públicas da RAEM.
26. Tudo indica que a Entidade Recorrida concluiu pela perigosidade do Recorrente apenas com base na existência de um crime, sem ponderar as circunstâncias atenuantes e a as condições pessoais do Recorrente.
27. Sabemos que o Recorrente infringiu uma regra estradal, com uma vertente criminal, o que pode acontecer a qualquer condutor que em determinado momento esteja mais desatento, não tendo, por seu turno, cometido qualquer crime doloso que possa ser, de imediato, qualificado como perigo para a segurança e ordem públicas da RAEM.
28. Deste modo, e salvo o devido respeito, estamos em crer que a decisão recorrida incorre em violação de lei por erro manifesto na aplicação do Direito, existindo igualmente uma total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários, porquanto o crime praticado pelo Recorrente foi cometido de forma negligente, sem dolo, tendo o mesmo mostrado arrependimento e clarificado que não se apercebeu imediatamente que tinha batido, pensando tratar-se de um pneu furado.
29. A decisão recorrida foi pois tomada de acordo com critérios puramente subjectivos e não objectivos.
30. Como tal, deverá a decisão recorrida ser anulada por se encontrar inquinada com o vício de violação de lei, previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 21º do CPAC, conforme o preceituado no artigo 124º do CPA, devendo ser revogado o acto administrativo de revogação da autorização de permanência na RAEM aplicada ao Recorrente.
31. Sem conceder, sempre se dirá que o despacho recorrido se encontra ainda inquinado do vício por violação de Lei, previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 21º do CPAC, consubstanciado na violação dos Princípios da Proporcionalidade e da Justiça, previstos nos artigos 5º, n.º 2 e 7º do CPA.
32. No despacho recorrido, o Exmo. Senhor Secretário para a Segurança confirmou a decisão proferida pelo Exmo. Senhor Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública, o qual se baseou unicamente na existência de um crime para considerar que o Recorrente constituía um perigo para a segurança e ordem públicas da RAEM e assim revogar a sua autorização de permanência enquanto trabalhador não residente.
33. Considerou a Entidade Recorrida ser adequada e proporcional a medida aplicada ao Recorrente.
34. A medida de revogação da autorização de permanência na RAEM é uma medida policial de prevenção que pode ser aplicada pela Administração no âmbito da margem de discricionariedade que lhe é conferida pela Lei.
35. Os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade, princípios jurídicos fundamentais a que as actividades administrativas devem respeito, constituem limites internos da discricionariedade conferida pela Lei à Administração.
36. O princípio da proporcionalidade encontra-se o mesmo previsto no n.º 2 do artigo 5º do CPA.
37. Este princípio impõe a proibição do excesso e a necessidade de adequação entre o meio empregue e o fim a alcançar, numa tripla vertente: adequação, necessidade e equilíbrio.
38. No caso em apreço, se compararmos os interesses prejudicados do Recorrente com os interesses de ordem e tranquilidade públicas pretendidos pela Entidade Recorrida, verificamos, salvo o devido respeito, que existe uma manifesta violação do princípio da proporcionalidade, sendo a medida de revogação da autorização de permanência na RAEM aplicada ao Recorrente desadequada, desnecessária e desproporcional.
39. De acordo com os factos indicados no douto despacho recorrido, o Recorrente foi condenado na pena de 45 dias de multa e na sanção acessória de inibição de conduzir por um período de 4 meses pela prática do crime de fuga à responsabilidade, p.p. pelos artigos 89º e 94º, n.º 2 da LTR, sendo que ambas as penas já foram cumpridas na totalidade.
40. Só estes factos, sem o apoio de mais qualquer outro elemento que possa suscitar aspectos negativos do Recorrente, não são suficientes para considerar que o mesmo constitui um perigo para a ordem e segurança públicas da RAEM.
41. A revogação da autorização de permanência do Recorrente na RAEM enquanto trabalhador não residente contraria manifestamente o equilíbrio entre os interesses prejudicados e o fim a prosseguir exigido pelo princípio da proporcionalidade, porquanto limita a sua liberdade de entrada e saída no território.
42. O Recorrente não tem antecedentes criminais, tem o seu centro de vida na RAEM, onde se encontra integrado profissional e socialmente, sendo sua pretensão continuar a residir na Região, pretensão essa que é acolhida pela sua empresa, que o considera uma peca fundamental para o desenvolvimento dos projectos que tem em carteira, presentes e futuros.
43. Com parte do seu salário o Recorrente auxilia ainda monetariamente a mulher, a qual se encontra desempregada, os seus sogros e os seus pais, ambos reformados.
44. A presença no Recorrente território é pois essencial para que possa continuar a desempenhar a sua actividade laboral e assim prover ao seu sustento e ao sustento do seu agregado familiar.
45. Caso seja revogada a sua autorização de trabalho, o Recorrente será obrigado a sair imediatamente da RAEM, o que criará consequências gravosas não só para o mesmo, como também para o seu agregado familiar e para a sua entidade empregadora.
46. Parece resultar claro que da ponderação dos interesses em jogo – estabilidade familiar e pessoal versus segurança e ordem públicas – a medida de revogação da autorização de permanência na RAEM aplicada pela Administração ao Recorrente se revela desadequada, desnecessária e desproporcional, sendo evidente que, salvo o devido respeito, os direitos do Recorrente forem limitados inadequadamente em comparação com o fim de proteger a ordem e a segurança públicas da RAEM.
47. A medida de revogação da autorização de permanência na RAEM é uma medida de natureza securitária, não expiatória, aplicável a não-residentes por razões de segurança e ordem pública.
48. Porém, no presente caso, não se vislumbra que o Recorrente venha a pôr em risco a ordem pública da RAEM, nem tão pouco a segurança dos que aqui residem e trabalham.
49. Assim, concluímos estar perante um caso de erro manifesto por parte da Entidade Recorrida, o que configura uma violação do princípio da proporcionalidade previsto no artigo 5º, n.º 2 do CPA, e do princípio da justiça, previsto no artigo 7º do CPA.
50. Nestes termos, deverá o douto despacho recorrido ser anulado por se encontrar inquinando com o vício de violação de lei, previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 21º do CPAC, conforme o preceituado no artigo 124º do CPA, devendo, como consequência, ser revogada o acto administrativo de revogação da autorização de permanência na RAEM aplicada ao Recorrente.
Nestes termos, requer a V. Exa. se digne anular o acto de revogação da autorização de permanência na RAEM do ora Recorrente na qualidade de trabalhador não residente, nos termos conjugados dos artigos 20º e 21º, n.º 1, alíneas d) do CPAC, por se mostrar o mesmo inquinado do vício de violação de lei, por erro manifesto e por violação dos princípios da proporcionalidade e da Justiça.”
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上訴所針對之實體在答辯時提出以下結論:
“32. Mostra-se inequivocamente comprovado no processo administrativo instrutor que o Recorrente em 2015.11.13, quando conduzia um veículo automóvel, à entrada para a Ponte de Sai Van, em direcção à Taipa, não respeitou as regras de condução, guinou para a direita e embateu num outro veículo, danificando o espelho retrovisor lateral, e o pára-choques do lado esquerdo dessa viatura. Todavia, o Recorrente não se limitou a esta conduta infractora: muito mais censuravelmente, não imobilizou o seu veículo para resolver o problema com o ofendido e eventualmente com as autoridades, antes continuou a sua marcha e, cerca de cem metros mais adiante, parou, saiu do veículo, inspeccionou-o na parte danificada, tornou a entrar e seguiu de novo a marcha, esquivando-se a qualquer responsabilidade.
33. Foi esta conduta, devidamente comprovada no processo administrativo instrutor que fez criar na Entidade Recorrida a convicção de que o Recorrente (a sua permanência na RAEM) constitui (potencia em si, prognosticamente) perigo para a ordem e segurança pública da Região.
34. Ora, a alínea 3) do artigo 11º, n.º 1 da Lei n.º 6/2004, consagra o princípio geral de que pode ser revogada a autorização de permanência ao não residente que constitua um perigo (a prática de crimes ou sua preparação é apenas uma situação a que a lei se refere exemplificativamente, como se vê pelo emprego da palavra “nomeadamente”).
35. Pelo que o acto recorrido tem motivação adequada e está adequadamente fundamentado, quer em termos de facto quer de direito.
36. Ao contrário do que alega o Recorrente, a condenação penal da sua conduta foi apenas lateralmente considerada no processo administrativo instrutor, para dar como inquestionável que a mesma ocorreu e que o Recorrente foi o seu autor
37. e para aferir da censurabilidade maior que a caracteriza, por ter sido confirmada, pelo órgão competente, a respectiva relevância penal (não se tratou de violação de regras de cortesia social, nem de simples infracção administrativa, nem mesmo de apenas contravenção).
38. Sendo absolutamente descabida, aliás, a argumentação de que “… contrariamente ao alegado pelo Exmo. Senhor Secretário para a Segurança, o Recorrente foi condenado por sentença proferida pelo Tribunal Judicial de Base no âmbito de um crime cometido por violação de uma regra de trânsito rodoviário e não no âmbito de um crime cometido por violação de “leis penais”.”
39. Uma vez que “localização” de uma lei que configura um tipo penal é irrelevante do ponto de vista essencial, que é o da elevada censurabilidade/danosidade social da conduta nesse tipo prefigurada.
40. Como descabida é, também, na ânsia manifestada de desvalorizar, de minimizar a censurabilidade da conduta, a alegação de que o crime de fuga à responsabilidade previsto no artigo 89º da Lei do Trânsito Rodoviário não é um crime doloso.
41. Por outro lado, o Recorrente pretende sobrevalorizar a sentença condenatória, no sentido de que a condenação penal bastou, tornando desnecessária a revogação da autorização de permanência.
42. Todavia, o Recorrente esquece que não é da competência do Tribunal penal avaliar se determinado indivíduo representa um perigo para a segurança ou ordem públicas da RAEM; as sentenças judiciais não decidem sobre esse aspecto.
43. Por outro lado, uma coisa não tem a ver com a outra: as sanções penais constituem reacções públicas aos crimes em si; a revogação de autorização de permanência, no entanto, não representa uma consequência directa da prática do crime pelo qual o Recorrente foi condenado: representa, isso sim, uma medida policial de prevenção tomada em consequência da análise de personalidade e situação pessoal de um não-residente da RAEM, que se encontra na Região ao abrigo de um estatuto precário.
44. Finalmente, no que toca à alegada violação do princípio da proporcionalidade, é manifesto que a revogação de autorização de permanência é um acto ablatório, que limita os direitos da pessoa visada, máxime, o direito de permanecer na RAEM.
45. Todavia, não cabe duvidar que, apesar disso, a Administração pretendeu, mediante o acto recorrido, atingir e prosseguir interesses públicos, principalmente o interesse público de assegurar a manutenção da segurança, boa ordem e estabilidade sociais na RAEM.
46. E quanto a esta vertente do princípio da proporcionalidade, portanto (o da idoneidade do meio para atingir o fim), nenhum problema de legalidade se levanta.
47. Por outro lado, no que respeita à escolha da medida securitária, é óbvio que, neste tipo de situações, a Administração só tem duas alternativas: ou revoga ou não revoga a autorização da permanência já anteriormente concedida e ainda não expirada, sem que haja lugar à quantificação da medida da sua decisão.
48. E esta matéria tem a ver com juízos de prognose efectuados discricionariamente pela Administração, com base na conduta provada do Recorrente.
49. Sendo que, a Administração considerou, face à conduta descrita, sumarizadamente, no próprio acto recorrido, haver necessidade de prevenir a prática de outras condutas violadoras de normas essenciais de convivência e de coesão da comunidade, salvaguardando a ordem, a segurança e a tranquilidade públicas,
50. neste caso concreto, revogando o título precário de autorização de permanência, assim proibindo o Recorrente de continuar a permanecer em Macau,
51. não se vendo que essa medida seja manifestamente desproporcional aos objectivos que pretende atingir com a prática do acto impugnado.
Nestes termos, e nos mais de Direito que esse Venerando Tribunal doutamente suprirá, por não existir qualquer vício que deva conduzir à anulação do acto recorrido, deve manter-se integralmente a decisão impugnada, negando-se provimento ao presente recurso, assim se fazendo JUSTIÇA!”
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本院依法將卷宗送交檢察院檢閱,尊敬的檢察院助理檢察長就上訴發表以下寶貴意見:
   “Nos presentes autos de recurso contencioso que foi interposto por A, melhor identificado nos autos, e que tem por objecto o acto do Secretário para a Segurança, datado de 28 de Maio de 2018, que negou provimento ao recurso hierárquico necessário do despacho proferido pelo Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública que revogou a revogação da autorização de permanência do ora Recorrente na Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) como trabalhador não residente, vem o Ministério Público, ao abrigo do disposto no artigo 69.º do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC), emitir parecer nos termos que seguem:
   1.
   Por despacho de 21 de Fevereiro de 2018, o Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública determinou a revogação da autorização de permanência do ora Recorrente na RAEM, nos termos que constam de fls. 89 a 91 do processo administrativo instrutor.
   Dessa decisão interpôs ora Recorrente o necessário recurso hierárquico para o Secretário para a Segurança, ora Entidade Recorrida.
   Por decisão de 28 de Maio de 2018, a Entidade Recorrida indeferiu o dito recurso hierárquico, nos termos e com os fundamentos constantes de fls. 34 e 35 dos presentes autos (acto recorrido).
   Inconformado, o Recorrente interpôs o presente recurso contencioso, imputando ao acto recorrido os seguintes vícios:
   - Violação de lei por erro manifesto e total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários;
   - Violação de lei por violação do princípio da proporcionalidade e da justiça.
   2.
   Como resulta da fundamentação expressa do acto recorrido, este foi praticado ao abrigo da norma da alínea 3) do n.º 1 do artigo 11.º da Lei n.º 6/2004, na qual se preceitua o seguinte:
   «A autorização de permanência na RAEM pode ser revogada, sem prejuízo da responsabilidade criminal e das demais sanções previstas na lei, por despacho do Chefe do Executivo, quando a pessoa não residente:
   (…)
   3) Constitua perigo para a segurança ou ordem públicas, nomeadamente pela prática de crimes, ou sua preparação, na RAEM» (destacados nossos).
   A simples leitura da transcrita norma legal permite afirmar que, (i) por um lado, na respectiva estatuição, o legislador confere poderes discricionários à Administração na medida que lhe permite, na presença dos pressupostos tipificados na previsão da norma, escolher entre duas soluções alternativas, no caso, entre a de revogar e a de não revogar a autorização de permanência na RAEM ao não residente; (ii) por outro lado, na respectiva previsão, o legislador utilizou um conceito jurídico indeterminado, ou seja, um conceito cujo sentido não é imediatamente apreensível, antes carece de uma densificação interpretativa, e que, no caso, é o conceito de «perigo para a segurança ou ordem públicas».
   Desde há largos anos se vem debatendo a questão de saber se a Administração, na tarefa de interpretação e subsunção dos chamados conceitos jurídicos indeterminados dispõe e em que medida da chamada margem de livre apreciação.
   A este propósito, o Tribunal de Última Instância (TUI) teve oportunidade de escrever, no seu importante acórdão de 3.5.2000, tirado no processo n.º 9/2000, acolhendo o ensinamento de doutrina portuguesa relevante, que «a distinção fundamental entre discricionariedade e conceitos indeterminados está em que, enquanto no primeiro caso, o órgão tem uma liberdade actuação quanto a determinado aspecto, no segundo caso estamos perante uma actividade vinculada, de mera interpretação da lei, com base nos instrumentos da ciência jurídica.
   Aqui, nos conceitos indeterminados, não há liberdade. Logo que se apure qual a interpretação correcta da norma - e em direito só há uma interpretação correcta em cada caso – o aplicador da lei tem de a seguir necessariamente».
   Na discricionariedade, existe, na verdade, «um reduto de insindicabilidade por parte dos tribunais, face à obediência ao princípio da separação de poderes. Já na decisão que envolve a aplicação de conceitos indeterminados, o legislador não entregou à administração poderes discricionários, mas antes lhe fixa um quadro de vinculação, se bem que mitigado pela possibilidade casuística do seu preenchimento. Desse modo, deparando-se com conceitos indeterminados, cabe ao órgão decisor, desde logo, apreender-lhes o sentido e alcance através de operação interpretativa da norma em que se inserem, pois a lei há-de fornecer, em larga medida, um padrão suficientemente claro para a sua interpretação. Operação interpretativa que, sendo vinculada, também cabe ao tribunal sindicar» (assim, na jurisprudência comparada portuguesa, o Ac. do STA de 27.11.2013, processo n.º 1159/09).
   Este entendimento, além do mais, é aquele que melhor se afeiçoa e adequa à garantia de tutela jurisdicional efectiva que resulta da norma do artigo 36.º da Lei Básica, em especial do seu segundo parágrafo: «Os residentes de Macau têm o direito de intentar acções judiciais contra actos dos serviços do órgão executivo e do seu pessoal». Na verdade, uma leitura demasiado restritiva dos poderes de fiscalização e controlo por parte do tribunal em matéria de aplicação de conceitos indeterminados por parte da Administração compatibiliza-se mal com aquela garantia de natureza constitucional.
   Portanto, em princípio, a interpretação de um conceito jurídico indeterminado é plenamente controlável pelo tribunal, significando isto que o juiz também pode verificar se a norma foi aplicada em conformidade com essa interpretação.
   Esta regra da plena sindicância judicial da interpretação e aplicação de conceitos jurídicos indeterminados tem, no entanto, algumas excepções que são justamente aquelas em que se reconhece que a Administração dispõe de uma margem de livre apreciação e em que, portanto, o controlo judicial só limitadamente se admite, valendo aí as regras que são aplicáveis em matéria de fiscalização judicial do exercício de poderes discricionários em sentido estrito. Estão aí em causa, não conceitos classificatórios mas conceitos a que certa doutrina chama subjectivos, que se caracterizam pela sua extrema abertura e vastidão e que «devem presumir-se como delegações no poder administrativo, porque aí não há uma mera indeterminação conceitual e deve reconhecer-se uma prerrogativa de avaliação ou de um espaço de concretização próprio da Administração, que o juiz não pode reexaminar» (assim, JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, Lições de Direito Administrativo, 5.ª edição, Imprensa da Universidade de Coimbra, Coimbra, 2018, p. 57).
   Entre as situações excepcionais em que a interpretação e a aplicação de conceitos jurídicos indeterminados estão subtraídas ao pleno controlo judicial, é usual assinalarem-se aquelas em que a lei utiliza conceitos indeterminados de valor no âmbito de juízos sobre disposições ou aptidões pessoais ou de avaliações técnicas especializadas, incluindo a generalidade dos exames e provas académicas; decisões que implicam juízos com elementos de prognose; decisões estratégicas ou técnicas que obriguem a ponderação de interesses complexo, entre outras (Cfr. JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, Lições…, p. 58).
   Em relação ao conceito jurídico indeterminado «perigo para a segurança ou ordem públicas», a jurisprudência dos nossos tribunais superiores vai no sentido de que, «o juízo sobre se o interessado constitui ou não ameaça para a ordem pública ou para a segurança de Macau é um juízo de prognose, visto que envolve uma apreciação da hipotética conduta futura do interessado», daí que se deva entender que o legislador defere à Administração uma margem de livre apreciação na sua aplicação, com a consequência, em termos de possibilidade de sindicância judicial, que acima referimos (veja-se o Ac. do TSI de 18.10.2012, processo n.º 127/2012 e Ac. do TSI de 29.1.2015, processo n.º 619/2013).
   Ora, no campo da actividade discricionária em sentido amplo, seja de decisão, seja de avaliação, para além do desvio de poder, do erro de facto e da falta de fundamentação, consideram-se também controláveis, a partir da fundamentação apresentada pelo órgão decisor, o erro manifesto ou total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários por parte da Administração, sendo que só em casos flagrantes de mau uso do poder discricionário e de evidentes e intoleráveis violações dos princípios gerais da actividade administrativa como o da proporcionalidade ou o da justiça, deve o acto contenciosamente atacado ser objecto de anulação judicial (assim, por todos, com ampla referência a jurisprudência anterior, veja-se o Ac. do Tribunal de Última Instância de 30.4.2019, processo 35/2019).
   Revertendo agora ao caso concreto, a questão essencial que no presente recurso se coloca é a que se prende, num primeiro momento, com a fiscalização do modo como a aplicação do acima referido conceito jurídico indeterminado foi feita pela Administração e, eventualmente, no momento seguinte, sindicar a forma como a administração exerceu os poderes discricionários de decisão que a lei lhe concede na estatuição da norma aqui em causa.
   Olhemos para o acto recorrido e para a sua fundamentação.
   Aí se consignou o seguinte: «(…) em 2015.11.13, o Recorrente, quando conduzia um veículo automóvel, à entrada para a Ponte de Sai Van, em direcção à Taipa, não respeitou as regras de condução, guinou para a direita e embateu num outro veículo, danificando o espelho retrovisor lateral, e o para-choques do lado esquerdo dessa viatura. Todavia, o Recorrente não se limitou a esta conduta infractora: muito mais censuravelmente, não imobilizou o seu veículo para resolver o problema com o ofendido e eventualmente com as autoridades, antes continuou a sua marcha e, cerca de cem metros mais adiante, parou, saiu do veículo, inspeccionou-o na parte danificada, tornou a entrar e seguiu de novo a sua marcha, esquivando-se a qualquer responsabilidade.
   Esta conduta, merecedora de censura criminal, como foi confirmado em 2017.10.09, por sentença do Tribunal Judicial de Base, criou na entidade recorrida a convicção de que o Recorrente é pessoa que não se coíbe de infringir as regras mais importantes e fundamentais da sociedade (as consagradas nas leis penais) se tal lhe convier, e nessa medida, considerou que o mesmo constitui perigo para a segurança e ordem públicas da RAEM, cabendo a situação, portanto, na previsão da alínea 3) do n.º 1 do artigo 11.º da Lei n.º 6/2004».
   Portanto: (i) a Entidade Recorrida preencheu o conceito jurídico indeterminado constante da alínea 3) do n.º 1 do artigo 11.º da Lei n.º 6/2004, considerando que, face ao comportamento do Recorrente que esteve na base da sua condenação penal, a sua permanência na RAEM constitui um perigo para a segurança ou ordem públicas; (ii) considerando verificado o pressuposto contido na previsão da norma, a Entidade Recorrida pôde fazer uma escolha discricionária entre revogar e não revogar a dita autorização de permanência e decidiu no sentido da revogação.
   Como referimos, não cabe ao tribunal pronunciar-se sobre o mérito desta decisão. Trata-se, pelo que vimos, de matéria reservada por lei à Administração.
   Ao tribunal apenas cabe sindicar se, no modo como, em concreto, a Administração avaliou a situação e a enquadrou no conceito jurídico indeterminado que integra a previsão da norma e, após, na forma como exerceu o poder discricionário em sentido estrito que a estatuição dessa mesma norma lhe atribui, houve um erro manifesto ou total desrazoabilidade, nomeadamente em virtude de violação intolerável os princípios fundamentais que regem a actividade administrativa, em especial, os princípios da proporcionalidade, da imparcialidade e da justiça.
   A nosso ver, salvo o devido respeito, o acto recorrido incorreu em manifesto erro ao enquadrar a situação do Recorrente no conceito indeterminado utilizado na alínea 3) do n.º 1 do artigo 11.º da Lei n.º 6/2004: «perigo para a segurança ou ordem públicas».
   Vejamos porquê.
   Mesmo os juízos de prognose e de avaliação de risco da Administração, sob pena de se tornarem completamente incontroláveis, não podem fundar-se em meras convicções de base puramente subjectiva por parte do órgão decisor.
   Resulta do acto recorrido que a Administração considerou que a permanência do Recorrente na Região constitui um perigo para a segurança e ordem públicas, ou seja, que o Recorrente constitui uma ameaça para a segurança e ordem públicas, porque, no dizer do referido acto, o Recorrente «é pessoa que não se coíbe de infringir as regras mais importantes e fundamentais da sociedade (as consagradas nas leis penais) se tal lhe convier».
   Esta conclusão, ainda de acordo com a fundamentação do acto recorrido, terá resultado da ponderação de que, no dia 13 de Novembro de 2015, o Recorrente quando conduzia o seu veículo automóvel, embateu num outro veículo, danificando o espelho retrovisor lateral, e o para-choques do lado esquerdo dessa viatura. Para além disso, ainda de acordo com a motivação fundamentadora do acto impugnado, o Recorrente não imobilizou o seu veículo para resolver o problema com o ofendido e eventualmente com as autoridades, antes continuou a sua marcha e, cerca de cem metros mais adiante, parou, saiu do veículo, inspeccionou-o na parte danificada, tornou a entrar e seguiu de novo a sua marcha, desta forma se tendo procurado esquivar a qualquer responsabilidade.
   Sucede que, esta factualidade relativa à fuga à responsabilidade por parte do Arguido foi objecto de julgamento em processo criminal e aí, o Arguido foi condenado pela prática desse crime, previsto e punível pelo artigo 89.º da Lei do Trânsito Rodoviário com prisão até um ano ou multa até 120 dias, na pena concreta de 45 dias de multa à taxa diária de 300 patacas, num total, portanto, de 13.500,00 patacas.
   Foi, portanto, com base na referida condenação criminal do Recorrente que a Administração veio a praticar o acto que agora se encontra sob impugnação.
   Contudo, a mera condenação penal de alguém, mesmo por um crime doloso, não permite, só por si, concluir que a sua presença em Macau constitua um perigo para a ordem e segurança públicas (Ac. do Tribunal de Segunda Instância de 8.2.2018, processo n.º 183/2017).
   Argumenta a Entidade Recorrida, na sua douta contestação (cfr. respectivo artigo 4.º), que o acto recorrido não se baseou na condenação penal mas numa conduta do Recorrente. Trata-se, no entanto, com todo o respeito o dizemos, de um argumento falacioso, uma vez que a dita conduta é justamente aquela que constituiu a prática do crime pelo qual o Recorrente o condenado, não fazendo muito sentido distinguir uma coisa da outra.
   Ora, esta condenação do Recorrente numa pena de 45 de multa multa, quando a lei também prevê, em alternativa, a prisão uma moldura abstracta da pena de multa que se situa entre 10 e 120 dias, abaixo, portanto, do limite médio, só pode ter um significado: o de que o tribunal considerou que a conduta do Recorrente, embora com relevância criminal, tem um desvalor que é manifestamente baixo, quer do ponto de vista da acção quer do ponto de vista do resultado.
   Na verdade, a conduta do Recorrente não passa de uma bagatela ou de uma minudência penal. Não mais do que isso. Se fosse uma conduta gravemente atentatória dos valores fundamentais da vida em sociedade, como se afirma na fundamentação do acto recorrido, não se compreenderia uma tão leve censura penal (que a concreta censurabilidade penal do facto ilícito praticado pela pessoa atingida pela medida administrativa deve ser ponderada na avaliação do perigo é o que resulta do Ac. do Tribunal de Segunda Instância de 8.2.2018, processo n.º 183/2017).
   Por outro lado, constituir um perigo para a ordem ou segurança públicas, significa que a presença de alguém na Região representa uma ameaça para o conjunto das regras que permitem manter a paz e a ordem na Região, assegurar o bem comum, satisfazer as necessidades colectivas e, mais restritamente, garantir a tranquilidade no espaço público de forma a manter afastados quaisquer tumultos que possam perturbar os cidadãos (ordem pública) ou uma ameaça para todo o conjunto de procedimentos que impedem a desestabilização das instituições (segurança pública) (sobre estes conceitos de ordem e segurança públicas, veja-se, o Ac. do TUI tirado no Processo n.º 9/2000, antes citado).
   Donde, partir de uma condenação penal em 45 dias de multa por um crime que, mesmo em abstracto, é dos crimes mais levemente puníveis dentre os que integram o nosso ordenamento jurídico-penal, de uma pessoa que não tem outros antecedentes criminais e que, tudo indica, tem uma vida profissional estabilizada na Região, para considerar que a sua permanência na Região constitui um perigo para a ordem e segurança públicas tal como acima definiram, representa, estamos em crer e salvo melhor juízo, um erro manifesto de apreciação, ou seja, um claro erro de avaliação cometido na concreta aplicação de um conceito indeterminado com margem de livre apreciação e sobre o qual não pode existir qualquer dúvida por parte do julgador (no sentido de que, designadamente na aplicação de conceitos indeterminados, apenas se exige erro manifesto e não já erro evidente, imediato, essencial ou «palmar», veja-se JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, Lições…, p. 63).
   Portanto, avaliar prognosticamente, apenas com base nas razões externadas no acto recorrido, a permanência do Recorrente na RAEM como um perigo para a segurança e ordem públicas constitui, parece-nos e sem prejuízo de melhor opinião, um erro manifesto no exercício de poderes discricionários de avaliação ou no preenchimento de um conceito jurídico indeterminado com margem de livre apreciação que se enquadra na alínea d) do n.º 1 do artigo 21.º do CPAC e que é conducente à anulação do acto impugnado.
   4.
   Face ao exposto, salvo melhor opinião, somos de parecer de que o presente recurso deve ser julgado procedente com a consequente anulação do acto recorrido.”
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本法院對此案有管轄權,且訴訟形式恰當。
雙方當事人享有當事人能力、訴訟能力、正當性及訴之利益。
不存在可妨礙審理案件實體問題的延訴抗辯及無效之情況。
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二、理由說明
根據本案卷及行政卷宗所載的資料,得以認定以下對審理本司法上訴案屬重要的事實:
司法上訴人持有編號為XXXXXXXX的澳門特別行政區外地僱員身份認別證,到期日為2018年3月31日。
因觸犯一項逃避責任罪,司法上訴人於2017年10月9日被初級法院判處45日罰金(金額為13,500澳門元),以及禁止駕駛四個月的附加刑。
治安警察局出入境事務廳於2017年12月6日通知司法上訴人,擬廢止司法上訴人以僱員身份持有的逗留許可。(見行政卷宗第87頁)
治安警察局局長於2018年2月21日作出批示,廢止司法上訴人的逗留許可。(見行政卷宗第89至91頁)
司法上訴人於2018年3月23日向保安司司長提出必要訴願。(見行政卷宗第93至113頁)
治安警察局於2018年4月11日製作以下報告 (見行政卷宗第114至117頁):
“Informação
Assunto: Recurso hierárquico necessário. Revogação de TITNR
Recorrente: A

1. A recorrente, titular do TITNR n.º XXXXXXXX, vem impugnar o despacho através do qual foi revogada a sua autorização de permanência na qualidade de trabalhador, invocando, o seguinte:
2. Que, o despacho recorrido padece dos vícios de falta de fundamentação e de violação da lei aos princípios de proporcionalidade e justiça, nos art.ºs 5º n.º 5 e 7º do CPA.
3. De falta de fundamentação, porque o despacho recorrido não identifica as razões de facto e de direito em que se baseia a decisão, como também não especifica por que razão o recorrente constitui perigo para a ordem e segurança públicas da RAEM, pois invoca simplesmente a prática de um crime, do qual aliás as autoridades judiciais aceitaram que a culpa e punição não foram graves, pelo que a polícia não devia substituir-se aos tribunais e decidir pela perigosidade do recorrente, e que, por que razão se revoga a autorização de permanência, quando a lei não tem de ser aplicada directa e imediatamente, pois a norma em questão falta que … pode ser revogada a autorização…, e não que … deve ser revogada, pelo que por este vício de falta de fundamentação o despacho deve ser anulado por insuficiência de fundamentos que motivaram a decisão.
4. E, quanto ao vício de violação de lei concretizado na violação aos princípios da proporcionalidade e justiça, de acordo com o n.º 2 do art.º 5º do CPA, … As decisões da Administração que colidam com direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos dos particulares só podem afectar essas posições em termos adequados e proporcionais aos objectivos a realizar, pelo que ponderados os interesses do recorrente e os da Administração, existe uma manifesta desproporcionalidade; que, o recorrente apenas foi condenado na pena de 45 dias de multa (300 pts por dia) e 4 meses de inibição de condução, sanções que já foram cumpridas, pelo que por estes factos não se pode concluir que o recorrente constitui perigo para a ordem e segurança públicas da RAEM; que, por outro lado, para o recorrente seria assim a terceira penalização, o que contraria o equilíbrio entre os interesses prejudicados; que, a revogação da autorização de trabalho trará custos gravosos para o recorrente e a sua família, como também para a empresa onde trabalha, pelo que ponderados os interesses em disputa, a decisão da Administração mostra-se desadequada, desnecessária e desproporcional, pois o recorrente não constitui perigo para a segurança da RAEM, nem para os que aqui residem e trabalham
5. Pedindo, pelos fundamentos acima invocados, a suspensão da execução do acto recorrido, e a sua revogação.
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6. Em primeiro lugar, deve-se referir que os trabalhadores não-residentes quando voluntariamente se deslocam dos seus locais de origem para virem trabalhar da RAEM, não só aceitam as condições laborais que lhes são prometidas como também as leis que regulam a sua permanência, e as do restante ordenamento jurídico.
7. E que esta, pode ser revogada quando se verifiquem os pressupostos previstos na lei, para a revogação de autorização de permanência – art.º 15º n.º 1, do RA n.º 8/2010.
8. Por sua vez, no art.º 11º n.º 1 alínea 3), da Lei n.º 6/2004, vem estipulado que a autorização de permanência pode ser revogada ao não residente que constitua perigo para a segurança ou ordem públicas, nomeadamente, pela prática de crime ou mesmo por actos preparatórias.
9. Por conseguinte, salvo melhor entendimento, a prática de crime constitui perigo para a segurança, ou ordem públicas da Região.
10. E, conforme vem descrito na sentença referente ao Processo n.º CR1-16-0836-PCT, que aqui por brevidade se dá por reproduzida (a fls. 39 a 43), no passado dia 13 de Novembro de 2015, o recorrente, conduzindo a viatura com a matrícula MM XX-XX, à entrada para a Ponte de Sai Van, em direcção à Taipa, não respeitou as regras de condução, guinou para a direita e embateu no veículo com a chapa de matrícula MG XX-XX, danificando o espelho retrovisor lateral, e o pára-choques do lado esquerdo dessa viatura.
11. Apesar de saber e ter a consciência que a sua conduta era contrária à lei, não se importou de parar para resolver o problema com o ofendido e eventualmente com as autoridades, antes continuou a sua marcha e uns cem metros mais adiante parou, saiu do veículo, inspeccionou-o no local da batida, tornou a entrar e seguiu de novo a marcha, esquivando-se a qualquer responsabilidade.
12. Mas toda a sua conduta ficou gravada pelas câmaras de segurança da ponte, elementos comprovativos que levaram à condenação criminal de uma pena de multa de 45 dias, à razão de 300 patacas por dia, e inibição de condução pelo período de 4 meses, por prática do crime de fuga à responsabilidade, constante no art.º 89º da LTR.
13. Pelo exposto, entendeu-se necessário revogar a autorização de permanência do recorrente na qualidade de trabalhador, ao abrigo das referidas normas conjugadas, pela falta de confiança na observância das leis da RAEM que tinha sido concedida no acto de autorização.
14. Assim, considera-se que o acto através do qual foi revogada a autorização de permanência do recorrente na qualidade de trabalhador, não se encontra ferido de qualquer vício que possa levar à sua anulabilidade, não devendo por isso ser concedido provimento ao presente recurso.
15. À superior consideração de V. Exa.”

保安司司長於2018年5月28日作出以下批示:(見行政卷宗第119至120頁)
“DESPACHO
Assunto: Recurso hierárquico necessário – revogação de autorização de permanência
Recorrente: A

O cidadão não residente A recorre hierarquicamente do despacho de 2018.02.21, do Senhor Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública, que determinou a revogação da respectiva autorização de permanência, na qualidade de trabalhador.
Ora, compulsado o processo instrutor, verifico estar suficientemente comprovado que, em 2015.11.13, o Recorrente, quando conduzia um veículo automóvel, à entrada para a Ponte de Sai Van, em direcção à Taipa, não respeitou as regras de condução, guinou para a direita e embateu num outro veículo, danificando o espelho retrovisor lateral, e o pára-choques do lado esquerdo dessa viatura. Todavia, o Recorrente não se limitou a esta conduta infractora: muito mais censuravelmente, não imobilizou o seu veículo para resolver o problema com o ofendido e eventualmente com as autoridades, antes continuou a sua marcha e, cerca de cem metros mais adiante, parou, saiu do veículo, inspeccionou-o na parte danificada, tornou a entrar e seguiu de novo a marcha, esquivando-se a qualquer responsabilidade.
Esta conduta, merecedora de censura criminal, como foi confirmado em 2017.10.09, por sentença do Tribunal Judicial de Base, criou na entidade recorrida a convicção de que o Recorrente é pessoa que não se coíbe de infringir as regras mais importantes e fundamentais da sociedade (as consagradas nas leis penais) se tal lhe convier, e nessa medida, considerou que o mesmo constitui perigo para a segurança e ordem públicas da RAEM, cabendo a situação, portanto, na previsão da alínea 3) do n.º 1 do artigo 11º da Lei n.º 6/2004.
Por outro lado, no n.º 1 do artigo 15º do Regulamento Administrativo n.º 8/2010, prevê-se que a autorização de permanência, na qualidade de trabalhador, pode ser revogada quando se verifiquem os pressupostos previstos na lei para a revogação da autorização de permanência de quaisquer não residentes.
Na sua petição de recurso, o Recorrente invoca um risco de “duplicação” ou “triplicação” da punição, mas este argumento não colhe, desde logo, porque a medida de revogação de autorização de permanência tem natureza administrativa preventiva, securitária; não constitui uma sanção.
Quanto ao mais, nenhum dos outros argumentos apresentados é procedente, designadamente quando refere que a conduta em causa é de“escassa ilicitude e censurabilidade”e quando alega a importância dos interesses pessoais em causa, pois estes interesses individuais não devem prevalecer sobre os interesses públicos que levaram à prolação do acto impugnado.
Deste modo, tudo ponderado, afigura-se que o acto administrativo impugnado tem bom fundamento de facto e de direito e está adequadamente motivado. Assim, ao abrigo do artigo 161º, n.º 1 do CPA, decido confirmá-lo, negando provimento ao presente recurso.”
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現在讓我們就司法上訴人提出的問題作出分析。
司法上訴人認為被訴的行政行為錯誤適用第6/2004號法律第11條第1款第3項的規定,理由指針對其個人作出的違法行為司法上訴人已受到應有的處罰,加上沒有任何事實依據顯示其本人對公共安全或公共秩序構成危險,因此認為被訴行為沾有絕對不合理行使自由裁量權的瑕疵。
根據第6/2004號法律第11條第1款3項的規定,如有關人士對公共安全或公共秩序構成危險,尤其在澳門特別行政區實施犯罪或預備實施犯罪,行政當局可廢止非本地居民在澳門特區的逗留許可。
事實上,第6/2004號法律第11條第1款3項允許行政當局可因應每個具體個案,對利害關係人是否對澳門公共秩序或安全構成威脅作出一個預測性的判斷,如是者應以公共利益為依歸,透過批示廢止相關人士在澳的逗留許可。
正如終審法院在第28/2014號合議庭裁判中所指,行政當局被賦予在面對具體情況時,就是否對公共安全或公共秩序確實構成危險作出預測性判斷的自由審議空間,該預測性判斷不可被法院審查。
基於此,本院不認為被訴的行政行為存在所指的瑕疵。
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司法上訴人又指被訴的行政行為違反適度及公正原則。
《行政程序法典》第5條第2款規定“行政當局之決定與私人之權利或受法律保護之利益有衝突時,僅得在對所擬達致之目的屬適當及適度下,損害該等權利或利益。”,而第7條則規定“公共行政當局從事活動時,應以公正及無私方式,對待所有與其產生關係者。”
Diogo Freitas do Amaral提到“O princípio da proporcionalidade proíbe, pois, o sacrifício excessivo dos direitos e interesses legítimos dos particulares; as medidas restritivas devem ser proporcionais ao mal que pretendem evitar. Se forem desproporcionadas, constituirão um excesso de poder…”1
終審法院在第38/2012案的合議庭裁判中指出,“根據這一原則,對個人權利和利益的限制必須是對確保以公權為作出的行為所欲達致的目的來講屬合適且必需的。”
另外,正如終審法院一貫的司法見解,如果被質疑的行政行為是以自由裁量權作出時,則只有在行使自由裁量權時出現明顯錯誤或絕對不合理,或以不能容忍的方式違反了行政法的基本原則時,法院才可以對此類行為的實質內容進行審查。2
終審法院在第28/2014號合議庭裁判又提到,“終審法院一直認為在審議行政機關是否遵守適度原則時,只有在行政決定以不能容忍的方式違反該原則的情況下,法官才可介入。”
在本個案中,司法上訴人因故意觸犯一項逃避責任罪而在2017年被澳門特區法院科處13,500澳門元的罰金及禁止駕駛四個月。
事實上,維護社會穩定、公共秩序及治安,無疑是行政當局的首要任務,當局有責任評估維持司法上訴人的逗留許可會否對本澳社會帶來負面影響。基於行政當局須恪守維護整體澳門居民的利益,司法上訴人的個人利益應當給予讓步。
考慮到卷宗內所載的資料,本院不認為行政當局在行使自由裁量權時出現明顯錯誤或絕對不合理的情況,從而當局廢止司法上訴人在澳門的逗留許可不屬於明顯不適度或有違公正。
有見及此,准予維持被質疑的行政行為。
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三、決定
綜上所述,本院合議庭裁定司法上訴人A針對保安司司長提起的司法上訴理由不成立,予以維持被質疑的行政行為。
司法上訴人須負擔六個計算單位的司法費。
登錄及作出通知。
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澳門特別行政區,2020年3月5日
唐曉峰
賴健雄
馮文莊
米萬英

1 Direito Administrativo,1988年,第2冊,第203頁
2 終審法院第9/2000號案,第14/2002號案,第1/2006號案,第36/2006號案
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司法上訴卷宗775/2018 第 30 頁