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卷宗編號: 1194/2019
日期: 2020年03月19日
關鍵詞: 賠償責任

摘要:
- 被告僅是和土地承批人建立了法律關係;一切因應承批土地所作出的行為,均是針對土地承批人而作出。因此,該等行為倘損害了土地承批人的權益,例如無法如期利用土地而導致其需向他人作出賠償,也只能是土地承批人向被告追討賠償,而非他方第三者可直接向被告追討因土地承批人違反與其簽定的預約買賣合同的賠償責任。
- 只有在被告濫用權利,行為特別惡劣的情況下其才需負上相關賠償責任,然而本案並不存在該等情況。
裁判書製作人
何偉寧










行政、稅務及海關方面的上訴裁判書

卷宗編號: 1194/2019
日期: 2020年03月19日
上訴人: A及B (第六原告)
被訴實體: 澳門特別行政區 (被告)
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一. 概述
原告們A及B,詳細身份資料載於卷宗內,不服行政法院於2019年07月12日作出的決定,向本院提出上訴,理由詳載於卷宗第1146背頁至第1167頁,有關內容在此視為完全轉錄1。
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被告澳門特別行政區就有關上訴作出答覆,內容載於卷宗第1171至1178背頁,在此視為完全轉錄。
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二. 理由陳述
原告們認為原審判決存有以下無效瑕疵:
- 沒有根據《民事訴訟法典》第562條第2款之規定,逐一敍述獲證實的事實;及
- 沒有就裁定被告的合法行為不產生賠償責任說明理由。
此外,亦認為原審法院引用的法律觀點是錯誤的,應予以廢止。
現就有關問題作出審理。
就關於裁定被告的合法行為不產生賠償責任沒有說明理由而無效方面,我們認為有關指控是不成立的。
被上訴的原審判決內容如下:
  “…
  Pedem os Autores que sejam ressarcidos dos prejuízos resultantes da impossibilidade do cumprimento dos contratos-promessa para a aquisição das fracções autónomas do edifício denominado “C” em construção, alegadamente imputável à actuação da Ré através dos seus serviços e no decurso da execução do contrato de concessão por arrendamento, com fundamentos na sua responsabilidade por acto ilícito pela culpa do serviço, e na responsabilidade por facto lícito.
  Pese embora ser a relação jurídica material configurada pelos Autores com sua ênfase na actuação ilícita, culposa e lesiva da Ré, considero importante antes saber melhor que tipo do direito subjectivo que se considerou lesado, e determinar depois, se a sua violação, ainda que fosse inteiramente comprovada, é ou não susceptível de provocar os efeitos indemnizatórios naquele alcance almejado, no sentido de fazer responsabilizar a Ré pelas lesões provocadas.
  1. Logo à partida, os Autores alegam ser promitentes-compradores nos contratos-promessa celebrados com a Sociedade de Importação e Exportação D Limitada (doravante designada por “D”), em que aqueles declararam prometer adquirir as fracções autónomas do edifício em construção, situado no terreno de que esta era concessionária.
  Mais alegam que foram liquidados os impostos do selo e procedidos aos registos da inscrição da aquisição na Conservatória do Registo Predial.
  Além do mais, anos depois da celebração dos contratos-promessa, a supra-referida concessão do terreno veio a ser declarada caduca pelo despacho de Chefe do Executivo da RAEM de 26 de Janeiro de 2016 e que a construção projectada nunca chegou a ser executada.
  Face a esse enquadramento fáctico suposto, parece-nos ser patente que os Autores nunca adquiriram o direito de propriedade das ditas fracções autónomas em construção, por consequência, não se podem arrogar titularidade de qualquer tipo de direito real em relação às mesmas fracções, uma vez que os referidos contratos-promessa carecem da eficácia real que as partes poderiam atribuir mediante declaração expressa e inscrição no registo, de acordo com o preceituado no art.º 407.º do CCM.
  Não sendo com eficácia real, revestem-se os contratos em causa de uma natureza meramente obrigacional, que apenas confiram aos seus outorgantes o direito de crédito ou obrigacional.
  Nesta conformidade, a despeito da configuração pelos Autores da relação jurídica material assente na responsabilidade extracontratual da Ré, afigura-se-nos ser inverosímil discutir as questões de indemnização à margem dos referidos contratos-promessa já celebrados, uma vez que os danos alegadamente sofridos pelos Autores têm como fonte directa os contratos.
  2. A questão a seguir passa por saber se, não obstante a existência de um contrato-promessa, o terceiro alheio poderá ou não ser atingido pela eficácia do contrato, podendo este ser ou não titular da obrigação de indemnizações por lesões do seu direito de crédito, com uma outra fonte autónoma na responsabilidade extracontratual.
  Ou melhor dizendo, a questão consiste em saber se a eficácia do contrato se restringe às partes do contrato ou deve antes se estender para além do círculo interno das partes, aos terceiros estranhos ao contrato, que não contrataram nem sucederam na posição de qualquer das partes.
  2.1 Para os defensores da tese tradicional da relatividade do direito de crédito, não seria de reconhecer ao crédito um efeito externo que permitisse a sua protecção em relação a terceiros e a responsabilização destes pela lesão do crédito.
  Pois, do que se trata é do direito de crédito ou obrigacional que vale apenas inter partes e que só pode ser ofendido pelo devedor, o qual se contrapõe ao direito absoluto de propriedade, ou erga omnes, que é susceptível de lesão por qualquer pessoa.
  Nesta linha de consideração, a aceitação dos efeitos externos da obrigação estaria a atribuir um carácter absoluto à relação creditícia, transformando as obrigações em direitos absolutos equiparáveis aos direitos reais, contrariando o disposto do art.º 1230.º do CCM, que considera ter natureza obrigacional e não real todas as restrições ao direito de propriedade.
  O mesmo se deve concluir perante o disposto do art.º 400.º, n.º 2 do CCM, “em relação a terceiros, o contrato só produz efeitos nos casos especialmente previstos na lei”.
  Em consonância com o disposto da supradita norma, os efeitos externos do crédito apenas surgem indirecta e excepcionalmente, por exemplo, quando se atribui a eficácia real ao contrato-promessa e ao pacto de preferência (art.º s 407.º e 415.º do CCM) e quando se prevê que se converta a obrigação natural de alimentos do lesado, ex lege, em obrigação civil de alimentos do lesante em favor do alimentado pelo lesado que deixa de os poder prestar, nos termos do art.º 488.º, n.º 3 do CCM, ou ainda mais, nos casos da verificação de commodum representationis nos termos do art.º 783.º do CCM.
  Resumindo, a responsabilização de terceiro por lesão do crédito não é regra, mas sim excepção quando a lei especialmente o prevê.
  2.2 Por outro lado, os efeitos externos da obrigação defender-se-iam apenas ao nível de jure constituendo, segundo a qual se deveria admitir que os direitos de crédito deveriam ser respeitados por terceiros sob pena de responsabilidade, desde que estejamos perante uma situação em que o terceiro conhece a relação especial entre o credor e o devedor e se trate de actuação especialmente censurável, e em particular que esse efeito de responsabilização devem ser assegurados em caso de ataque directo ao crédito e em caso de ataque a um elemento do substrato do crédito, e que se deveria aceitar sempre que se estivesse perante situações de abuso de direito.
  Mesmo para os mais influentes oponentes à tese clássica da relatividade do direito de crédito, como por exemplo, o Professor PESSOA JORGE, que entende que “nada impede que a prestação, como um bem a que o credor tem direito, se torne impossível por acto de terceiro, que, dessa forma, lesa um direito subjective alheio, o direito de crédito”, diz no entanto que “É necessário, no entanto, que a sua actuação seja dolosa, ou o terceiro saiba que a obrigação existe e que vai causar um prejuízo ao credor, por impedir que o devedor cumpra, não parecendo, contudo, suficiente uma actuação meramente negligente”.
  E por sua vez, no entendimento do Professor MENEZES CORDEIRO, a responsabilidade de terceiro por lesão do crédito, colocar-se-ia em sede do que chama de oponibilidade média. Nesta se colocariam os casos de acção de terceiro que provocasse a morte do devedor, que se traduzisse na destruição de documentos ou de outros elementos instrumentais destinados a atestar ou garantir os créditos e o problema conhecido como o da responsabilidade do terceiro-cúmplice (no incumprimento).
  Como é fácil de ver, mesmo para as posições mais radicais, a tese dos efeitos externos da obrigação não se admitiria sem reserva, ou seja, não é qualquer actuação do terceiro releva para a sua responsabilização perante o credor lesado – é sempre necessário que a sua actuação seja especialmente censurável e idónea a trazer uma consequência chocante e insuportável pela exigência de boa-fé e de bom costume, como sucede nos casos de abuso de direito, ou do terceiro-cúmplice no incumprimento.
  2.3. Mais ainda, consideramos necessário ter em conta que no elenco das jurisprudências conhecidas, é sempre escassa aquela que aceitou sem reserva a tese da eficácia externa das obrigações.
  Assim como na RAEM, a posição que tem sido seguida é a de eficácia relativa da obrigação mitigada com o reconhecimento limitado da sua eficácia externa no caso de abuso de direito pelo terceiro, pela jurisprudência do TUI, no acórdão n.º 2/2002, proferido em 19 de Julho de 2002, onde tratava precisamente a questão da responsabilidade do terceiro pelo incumprimento do promitente-vendedor:
  “…Torna-se necessário apurar se o terceiro que contribuiu para frustrar a satisfação do direito do credor, neste caso, o promitente-comprador, deve ser responsabilizado civilmente pelo incumprimento do promitente vendedor, a título de cumplicidade com este. Tem sido discutido o problema da responsabilidade do terceiro na doutrina e há fundamentalmente duas correntes.
  Tradicionalmente, entende-se que não admite, em princípio, o efeito externo das obrigações. No caso de incumprimento das obrigações, mesmo com a concorrência de culpa por parte do terceiro, só o devedor incorre em responsabilidade para com o credor. Mas se a conduta do terceiro se mostra particularmente chocante e censurável, este pode responder perante o credor por ter agido com abuso do direito. Portanto, a responsabilidade do terceiro só pode ser constituída com base no abuso do direito, quando se verificarem os respectivos pressupostos.
  Diversamente, há autores que defendem a doutrina do efeito externo dos direitos de crédito, considerando que estes também produzem efeitos erga omnes em determinada medida e o regime do desrespeito do direito de crédito por terceiros reconduz-se ao art.º 483.º do CC de 1966 que dispõe sobre a responsabilidade extracontratual. Entende-se que esta norma deve ser aplicável a todos os direitos subjectivos, como o são os direitos de crédito…”
  E além do mais:
  “…Para Ferrer Correia, sem excluir a relevância de eficácia externa dos direitos de crédito, admite-se o abuso do direito sempre que o terceiro tivesse conhecimento da existência da obrigação.
  Não reconhecendo efeito externo da obrigação, Antunes Varela entende que só através doutros institutos, como o abuso do direito, será possível reagir contra a conduta reprovável do terceiro. Então, para que haja abuso do direito por parte do terceiro que viola o direito do credor, “não basta que ele tenha conhecimento desse direito, é preciso que, ao exercer a sua liberdade de contratar, ele exceda manifestamente, por força do disposto no art.º 334.º, os limites impostos pela boa fé.”
  Mais razoável será a posição ecléctica sustentada por Vaz Serra. Segundo este autor, para responsabilizar o terceiro por abuso do direito, não basta a cooperação consciente na violação do contrato. Até pode não haver abuso se o terceiro, movido com interesse próprio, tenha apenas a consciência da existência da obrigação e de causar prejuízo a outra parte. “É perfeitamente admissível que esse terceiro tenha um interesse legítimo em comprar, talvez mais legítimo até que o do promitente-comprador.”
  Considera que, para haver abuso do direito, não se afigura bastar, porém, que o terceiro conheça, ao contratar, a existência do direito do credor, sendo preciso que tenha agido manifestamente contra a boa fé ou os bons costumes, isto é, que o seu procedimento seja acompanhado de circunstâncias especiais que manifestamente ofendam a consciência social, que denunciem a sua particular censurabilidade, como se o terceiro compra só para prejudicar o credor, e não porque a coisa lhe convém, ou quando o terceiro sabe que o outro contraente não indemnizará o credor lesado com o contrato.
  Com esta posição, por um lado, atende-se aos fins visados pelo instituto, de ultrapassagem dos tradicionais quadros e molduras formalistas do conceitualismo, impregnando a Ordem Jurídica dos valores jurídicos de carácter social. Mas por outro, reconhece-se que a abertura demasiada do instituto, tal como o reconhecimento ilimitado da eficácia externa das obrigações, é susceptível de entravar significativamente o tráfico e a segurança jurídicos.” (sublinhado nosso).
  2.4 Mutatis mutantis, julgamos que ao caso vertente deve ser esta a posição que merece nossa adesão, repugnando por um lado a aceitação geral e incondicional da tese da eficácia externa do direito de crédito pelo seu radicalismo, em virtude dos argumentos conhecidos a favor da teoria clássica da relatividade dos direitos de crédito, como inoponibilidade do mesmo a terceiros pela falta de publicidade da constituição do direito, impossibilidade lógico-conceitual da violação do crédito por terceiros, risco de grave enfraquecimento do comércio jurídico no caso de aceitar a responsabilização do terceiro por lesão do crédito.
  Por outro lado, reconhecemos limitadamente a responsabilização dos terceiros que não se tenham interferido na relação jurídica creditícia, somente quando demonstrada a existência comprovada do abuso de direito por parte dos terceiros ou verificado o terceiro-cúmplice que com a sua actuação dolosa venha a frustrar o direito dos credores.
  2.5. Voltemos ao nosso caso concreto.
  Com base nas alegações dos Autores, parece-nos seguro afirmar que a Ré ocupa a posição jurídica de terceiro alheio, face à existência de uma relação creditícia emergente dos contratos-promessa, de raiz civilística, uma vez que a Ré nunca interveio nos contratos-promessa de compra e venda outorgados entre os Autores e a D e que a Ré é apenas a parte do contrato da concessão de terreno celebrado com a D, interagindo com esta no âmbito das respectivas relações recíprocas.
  E o facto de ser a Ré sujeito público não tornaria diferente esta posição e portanto, a Ré não passaria, só por este motivo, a ser um maior responsável do que qualquer sujeito particular pelas lesões que se provocaria ao direito de crédito.
  Em conformidade com a tese clássica da relatividade de crédito, não estando o caso abrangido por nenhuma excepção legal, bastaria o aludido para afastar a responsabilidade da Ré pelos danos reclamados. Não obstante veremos se se verifica uma situação de abuso de direito ou uma actuação intencional e lesiva da Ré que poderia ainda justificar a sua responsabilização nos termos limitados.
  Das alegações dos Autores resulta que se integram nas causas de pedir da presente acção os factos reportados a uma séria de condutas dos serviços da Ré, alegadamente ilícitas e impeditivas da conclusão do aproveitamento do respectivo terreno por parte da D, resumidamente, a colocação sucessiva de um conjunto de novas exigências legalmente não previstas para o estudo de impacto ambiental, e a demora injustificada na pronúncia e na comunicação à D do resultado dos respectivos estudos.
  E segundo o que se alega, trata-se de condutas que conduziram à declaração de caducidade da concessão por não aproveitamento e que inviabilizaram por conseguinte o cumprimento dos contratos-promessa por parte da D face aos promitentes-compradores.
  Porém, salvo a melhor opinião em contrário, afigura-se-me ser legítimo afirmar que as imputadas condutas, mesmo que fossem verdadeiras, não seriam aptas a indiciar a existência de uma actuação culposa da Ré para com os Autores, porque nunca aquela se intrometeu directamente na esfera jurídica destes.
  Pois, uma coisa é saber se a Ré tinha culpa no decurso da execução do contrato de concessão para com a D, coisa diversa é se a mesma agia culposamente perante os promitentes-compradores, com que não se deve confundir.
  Muito menos qualquer situação de abuso de direito que daí se poderia vislumbrar.
  Como é estabelecido na norma do art.º 326.º do CCM: “É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.” (sublinhado nosso).
  Reiterando a jurisprudência que já citámos assente na posição ecléctica quanto ao instituto de abuso de direito, a censurabilidade do abuso de direito de terceiro depende do seu conhecimento da existência do direito do credor, e o mais importante, da sua actuação que vai manifestamente para além dos limites suportáveis da boa-fé ou dos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito. Isto quer dizer que o conhecimento pelo terceiro da existência do direito do credor por si só é insuficiente para sustentar a responsabilização do terceiro.
  No caso vertente, foi alegado o conhecimento da Ré da existência dos contratos-promessa já celebrados pelos Autores e a sua consciência da provável lesão do crédito destes pela respectiva actuação. Mas o que é muito diferente de a Ré ter actuado manifestamente contra a regra de boa-fé, com intenção de os prejudicar.
  Na nossa óptica, não pode a Ré ter violado qualquer dever de boa-fé para com os promitentes-compradores, mesmo entendendo que aquela aquando da imposição das sucessivas exigências à D tivesse alguns comportamentos faltosos, esta falta terá apenas consequência directa na sua relação com a D, mas sem a repercussão para fora.
  Porque a boa-fé só se aplica no âmbito limitado às situações de relacionamento específico entre os sujeitos. Não se pode exigir a um terceiro para as pessoas com quem não mantém qualquer relação, condutas positivas segundo os ditames da boa-fé, o que se distingue da exigência do dever de respeitar o direito alheio não fundado numa relação obrigacional.
  E no âmbito do direito administrativo, a exigência da boa-fé não é algo diferente, que é apenas imposta no relacionamento entre a Administração Pública e os administrados, criado no exercício das suas actividades administrativas nos termos do art.º 8.º, n.º 1 do CPA. Tal relacionamento no caso vertente, ao que nos parece, não chegou a ocorrer.
  Também não existe a violação de bons costumes por parte da Ré.
  A actuação alegadamente ilícita da Ré era simplesmente limitada ao exercício dos direitos conferidos pelo seu estatuto de concedente no âmbito do contrato de concessão, ou dos poderes autoritários inerentes ao respectivo procedimento administrativo na sua relação com a mesma concessionária.
  Por outras palavras, dos factos alegados não se conheceria outra intenção da Ré para além daquela que tem sempre acompanhado e dominado a sua actuação administrativa, no exercício das suas funções legalmente atribuídas.
  Além disso, convém não esquecer que o acto da declaração da caducidade da concessão de terreno em causa, pelo qual se tornaram efectivas as lesões alegadas pelos Autores, e que estes parecem não querer criticar expressamente, é legalmente vinculado, cuja legalidade já não se discutiria, como foi decidido pelo Acórdão do TUI processo n.º 7/2018, proferido em 23 de Maio de 2018, “Decorrido o prazo de 25 anos da concessão provisória (se outro prazo não estiver fixado no contrato) o Chefe do Executivo deve declarar a caducidade do contrato se considerar que, no mencionado prazo, não foram cumpridas as cláusulas de aproveitamento previamente estabelecidas”.
  Como é natural, se a Ré se limitava a dar cumprimento a um comando imposto pela lei vigente na declaração da caducidade da concessão dos terrenos referidos, dificilmente se poderia concluir que exista o direito para ser abusado, ou que exista qualquer intenção por parte dela de prejudicar os interesses dos promitentes-compradores, contrária à exigência das regras de bom costume ou de ordem moral.
  Por último, também não parece que a conduta alegada da Ré exceda manifestamente os limites impostos pelo fim social ou económico do direito. Como acima referido, daí, não se conhece nenhum desvio da funcionalidade no exercício dos direitos por parte da Ré, quer como concedente do terreno em causa, quer como autoridade administrativa.
  Assim sendo, no quadro legal acima analisado, não se deve concluir que a Ré seja responsabilizada no âmbito de abuso de direito, enquanto que as outras teses elegidas pelos Autores naturalmente não nos convencem, pelas razões que se passa a expor:
  Quanto à culpa de serviço ou à responsabilidade pelo funcionamento anormal do serviço, trata-se de uma nova modalidade de responsabilidade de importação jurisprudencial, assente na responsabilização da Administração enquanto tal, pela sua própria conduta lesiva, sem necessidade da demonstração de que um determinado agente actuou com culpa, mas apenas de que o serviço no seu conjunto funcionou de modo anormal.
  Contudo parece-nos ser uma tese que vai longe demais para chamar a Ré à responsabilização. Como se sabe, a aplicação deste regime só terá lugar em relação aos danos que devam ser atribuídos ao funcionamento do serviço público e servirá para caracterizar a falta anónima ou colectiva ocorrida na actuação administrativa. Mas como acima referido, pela existência da relação creditícia emergente dos contratos-promessa no caso concreto, a actuação da Ré enquanto terceiro, seja faltosa ou não, não é susceptível de lesar, em abstracto, os direitos dos Autores.
  Aliás, sempre se diga que a culpa funcional se reporta às situações em que o facto ilícito “não se revela susceptível de ser apontado como emergente da conduta ético-juridicamente censurável de um agente determinado, mas resulta de um deficiente funcionamento dos serviços – caso em que se imputa subjectivamente o facto danoso não ao agente ou funcionário, mas tão-só à pessoa colectiva pública responsável pelo funcionamento” (cfr. Acórdão do TUI no processo n.º 23/2005, proferido em 18 de Janeiro de 2006).
  Daí que as situações típicas da culpa funcional mesmo demonstradas, naturalmente, não se compatibilizam com a exigência de uma actuação especialmente censurável e chocante da Ré fundada no abuso de direito de terceiro como pressuposto da sua responsabilização pelas lesões do direito de crédito.
  Portanto, é evidente que a referida tese não sustenta o respectivo pedido indemnizatório.
  A mesma sucede em relação à responsabilidade por facto lícito. Com a presença da relação de crédito de que os Autores são titulares, consideramos que está naturalmente quebrado o nexo de causalidade entre a alegada actuação e os danos alegadamente sofridos.
  Concluindo, inexiste nenhum título idóneo para fazer responsabilizar a Ré no caso concreto, é manifesto que os pedidos dos Autores devem ser julgados improcedentes.
IV. Decisão:
  Assim, pelo exposto, decide-se:
  Julgar improcedente a acção e em consequência, absolver a Ré Região Administrativa Especial de Macau dos pedidos formulados pelos Autores…”。
從上述轉錄的原審判決可見,原審法院是經過先前針對不法行為非合同民事責任的說明理由,解釋了為何原告們所主張的債權因不符合權利濫用制度而不能要求被告承擔責任,基於適用同樣的法律理據,原告們所主張的合法非合同民事責任亦因此不能成立。
基於此,這部分的上訴理由並不成立。
就其他上訴理由方面,原審法院在清理批示/判決中採用了葡萄牙學者Vaz Serra 的見解,即“原則上不承認債的外在效力。在不履行債務的情況下,即使其中存在第三人的過錯的競合,也只有債權人負有責任。但是,如果第三人的行為特別惡劣,應受譴責,那麼其可以因濫用權利的行為而對債權人負有責任。因此,只有在具備相關前提要件的情況下,才能以濫用權力追究第三人的責任”。
根據有關法律觀點,原審法院認為即使假設原告們所陳述的事實獲得證實,相關的訴訟請求也是不能成立而駁回所有請求。
在此前提下,應該先審查原審法院所持的法律觀點及相關認定是否正確。倘原審法院的法律觀點及認定是正確的,基於訴訟經濟和快捷原則,原審法院可直接在清理批示中對實體問題作出審理,而不需對事實作出調查(《民事訴訟法典》第429條第1款b)項之規定)。這樣,有關判決也不需要根據《民事訴訟法典》第562條第2款之規定,逐一敍述獲證實的事實,茲因該等事實的認定與否對裁判而言已不屬重要。
我們認同原審法院所採納的法律觀點,此外亦同意原審法院認定即使原告們所陳述的事實獲證實,也不存在被告濫用權利和行為特別惡劣而應負上作為第三人的賠償責任的結論所持的依據,故根據《民事訴訟法典》第631條第5款之規定,引用被提起上訴之裁判所持之依據,而裁定上訴理由不成立。
事實上,被告僅是和土地承批人,即保利達,建立了法律關係;一切因應承批土地所作出的行為,均是針對土地承批人而作出。因此,該等行為倘損害了土地承批人的權益,例如無法如期利用土地而導致其需向他人作出賠償,也只能是土地承批人向被告追討賠償,而非他方第三者可直接向被告追討因土地承批人違反與其簽定的預約買賣合同的賠償責任。如上所述,只有在被告濫用權利,行為特別惡劣的情況下其才需負上相關賠償責任,然而本案並不存在該等情況。
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三. 決定
綜上所述,本合議庭裁決原告們的上訴不成立,維持原審決定。
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訴訟費用由原告們承擔。
作出適當通知及採取適當措施。
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2020年03月19日
何偉寧
唐曉峰
簡德道 (Vencido, por entender que o saneador-sentença, ao não respeitar o art. 430°, n°1, do CPC, é ilegal. Deveria o juiz do tribunal “a quo” fixar os factos segundo as diversas soluções plausíveis da questão de direito, tal como já foi decidido por este T.S.I., no Ac. de 27/02/2020, no Proc. n° 1152/2019 (também nos Processos n°s 1144/2019; 1155/2019; 1176/2019 e 1199/2019). Entendo, pois, que este T.S.I. não está em condições de apreciar a matéria do recurso sem a referida pertinente factualidade.



1 原告們的上訴結論如下:
I. A sentença proferida é nula por falta de especificação dos factos provados, e respectiva fundamentação, e por falta de fundamentação da decisão quanto segunda causa de pedir deduzida - responsabilidade por acto lícito -, em violação do artigo 562.º, n.ºs 2 e 3, nos termos do artigo 571.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil.
II. Ao considerar a RAEM como se de um privado se tratasse, para efeitos de negar qualquer relação entre esta e os promitentes compradores, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, com violação do Código do Procedimento Administrativo, máxime do seu artigo 4.º.
III. Ao considerar a RAEM como um terceiro relativamente aos recorrentes e aos contratos-promessa celebrados, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, com violação, máxime do artigo 5.º do Código de Registo Predial.
IV. Ao considerar que a RAEM se limitou a actuar dentro dos limites conferidos pelo seu estatuto de concedente ou dos poderes autoritários inerentes ao procedimento administrativo, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, com violação, máxime, do disposto nos artigos 2.º, 4.º e artigo 167.º, alínea a), do Código do Procedimento Administrativo e 220.º da LT/2013.
V. Ao considerar que a actuação da RAEM é insusceptível, por natureza, de lesar os promitentes compradores por com eles não se ter relacionado directamente, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, com violação, máxime do disposto nos artigos 3.º, 4.º, 7.º e 8.º do Código do Procedimento Administrativo e dos artigos 2.º e 7.º do Decreto-Lei n.º 28/91/M, de 22 de Abril.
VI. Ao considerar que a culpa do serviço não opera perante actuações especialmente chocantes da Administração, fundadas no abuso de direito de terceiro, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento.
VII. Ao considerar inexistir nexo de causalidade entre o acto que declarou a caducidade da concessão e os prejuízos sofridos pelos recorrentes, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, com violação da lei, máxime do disposto no artigo 557.º do Código Civil.
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