Processo n.º 97/2020
(Autos de recurso em matéria penal)
Relator: Fong Man Chong
Data : 16 de Setembro de 2021
Assuntos:
- Posse de arma branca e posse justificada
SUMÁRIO:
I – Está em causa um crime de detenção de arma imputado ao arguido (Recorrente), previsto e punível pelo artigo 262.°, n.º 3, do Código Penal de Macau, a fim de justificar a sua posse, o arguido alegou que a faca era para ser usada para protecção pessoal e para cortar frutas. À luz do critério defendido pela doutrina maioritária, a posse de arma só será justificada quando a arma é afecta a uma daquelas finalidades normais e necessidades legítimas e compreensíveis da actividade do ser humano no seu dia a dia.
II - A desculpa alegada pelo arguido não é evidentemente uma justificação de posse, pois, o agente traz a arma para a usar como instrumento de agressão, seja para se defender, seja para atacar, a posse não está obviamente justificada.
III - Não existe qualquer alteração não substancial que obrigasse à comunicação nos termos do artigo 339.° do CPP. A punição nos termos do artigo 262.°, n.º 2, do Código Penal, norma que consta da acusação, não exige qualquer referência a normas do Regulamento aprovado pelo DL 77/99/M, nomeadamente à alínea f) do seu artigo 1.º, n.º 1, pois não está em causa uma arma proibida, mas apenas uma arma branca, que tem capacidade para ser usada como arma de agressão.
O Relator,
_______________
Fong Man Chong
合議庭裁判書
編 號:第97/2020號 (刑事上訴案)1
上 訴 人:A
上訴標的:第一審法院的有罪判決
日 期:2021年9月16日
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一、 案情敘述
2019年11月29日(開庭日期)嫌犯A在初級法院刑事法庭(第CR5-19-0330-PCS號卷宗)被控以直接正犯及既遂方式觸犯澳門《刑法典》第262條第3款結合由第77/99/M號法令所核准之《武器及彈藥規章》第1條f)項所規定及處罰的一項「持有禁用武器罪」,經庭審後隨即宣讀判決,改判嫌犯A以直接正犯及既遂方式觸犯《刑法典》第262條第3款所規定及處罰之一項「持有禁用武器罪」,罪名成立,判處三個月徒刑。根據《刑法典》第44條規定,將三個月徒刑以九十日罰金作為替代,每日罰金為一百澳門元 (MOP$100.00),合共為九千澳門元 (MOP$9,000.00);根據同一條條文第2款,被判刑者如不繳納罰金,須服所科處之徒刑。
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嫌犯A不服判決,向中級法院提起上訴,理據如下(結論部分):
I - O arguido vem acusado da prática de um crime de detenção de arma proibida previsto nos artigos 262º nº 3 do Código Penal conjugado com o artigo 1°, nº 1 alínea f) do Regulamento de Armas e Munições (doravante RAM) aprovado pelo Decreto-Lei nº 77/99/M.
II - Antes de se proceder à audiência de julgamento, a Meritíssima Juíza do Tribunal "a quo" decidiu, por despacho de 15.10.2019 (fls. 44) alterar o artigo 5. da acusação do Ministério Público acrescentando-lhe que "o arguido não conseguiu explicar logicamente a razão da detenção da arma".
III - Após realizada a audiência de discussão e julgamento, a Meritíssima Juíza do Tribunal "a quo" deu como provada toda a matéria constante da acusação, com excepção da parte final do artigo 4. quando refere que "É considerada como arma segundo o disposto no artigo 1º/1/f) (lâmina superior a 10 cm de comprimento) do DL nº 77/99/M (Regulamento de Armas e Munições) (fls. 32)", que foi considerado não provado;
IV - Assim, não se provou que o objecto apreendido fosse considerado arma segundo o disposto no artigo 1°/1/f) (lâmina superior a 10 cm de comprimento) do DL nº 77/99 /M (Regulamento de Armas e Munições).
V - Na sentença a Meritíssima Juíza do Tribunal "a quo" condenou o arguido como autor material e na forma consumada do crime de detenção de arma proibida previsto no artigo 262º nº 3 do Código Penal, sem qualquer referência ao artigo 1°, nº 1, alínea f) do DL 77/99/M, na pena de 3 meses de prisão substituída por 90 dias de multa a MOP$100,00 por dia, no total de MOP$9.000,00.
VI - O arguido não se conforma com o decidido, apontando à douta sentença recorrida a sua nulidade, desde logo porque os factos provados não são susceptíveis de serem subsumidos no crime previsto no artigo 262° nº 3 do Código Penal, pelo qual o arguido foi condenado, e ainda por haver condenado o arguido por factos não descritos na acusação.
VII - Desde logo porque do exame pericial efectuado à faca, a fls. 32 dos autos, verificou-se que a mesma tinha uma lâmina com 9 cm de comprimento, o que foi feito constar da acusação, no artigo 3º e foi dado como provado em audiência.
VIII - Por outro lado, porque, após ter sido realizado o julgamento a Meritíssima Juíza decidiu, na sentença, alterar a qualificação jurídica do crime pelo qual o arguido vinha acusado pelo Ministério Público para o crime de porte de arma proibida previsto no artigo 262°, nº 3 do Código Penal, sem qualquer referência ao artigo 1º, nº 1, alínea f) do RAM, sem que tivesse sido comunicada tal alteração ao arguido, o que consubstancia uma violação do disposto no artigo 339º do Código de Processo Penal, que o artigo 360º, nº 1, alínea b) comina com nulidade.
IX - Porém, mesmo assim, o arguido entende que não cometeu qualquer crime, porquanto prevê o artigo 262º do Código Penal no seu nº 3 que "Quem detiver ou trouxer consigo arma branca ou outro instrumento, com o fim de serem usados como arma de agressão ou que possam ser utilizados para tal fim, não justificando a sua posse, é punido com pena de prisão até 2 anos".
X - É pois necessário que o agente detenha ou traga consigo arma branca ou outro instrumento, com a finalidade de serem usados como arma de agressão ou que possam ser utilizados para tal fim, sem justificar a sua posse.
XI - E não contendo o Código Penal qualquer definição de arma (proibida ou não proibida), deve essa definição ser encontrada no Regulamento de Armas e Munições.
XII - Na RAEM, o conceito amplo de arma (e não só o de arma proibida), está previsto no RAM aprovado pelo Decreto-Lei nº 77/99/M, de 8 de Novembro.
XIII - Pelo que, para saber o que é uma arma, e de seguida para saber se essa arma é arma proibida, o intérprete tem sempre que recorrer ao que ali se prevê sobre a matéria.
XIV - Ora, o conceito de arma (seja ela proibida ou não proibida) é-nos fornecido pelo artigo 1º do RAM, que quanto ao que importa para o presente recurso, dispõe no seu nº 1, que " ... considera-se arma todo o instrumento ou engenho como tal classificado nos artigos subsequentes, designadamente:"
XV - Prevendo logo na alínea f) "Instrumentos perfurantes ou contundentes e facas com lâmina superior a 10 cm de comprimento, susceptíveis de serem usados como instrumento de agressão física, e desde que o portador não justifique a respectiva posse".
XVI - O legislador da RAEM, ciente de que que existem armas, que podem caber no conceito, mas que não são proibidas, como acontece com as espingardas de pressão de ar, as armas de competição e as armas de ornamentação, entre outras, definiu no artigo 6º do RAM quais as armas que se devem considerar proibidas.
XVII - Entre elas estão as facas com lâmina superior a 10 cm de comprimento, como se vê do artigo 6°, nº 1, alínea b) do RAM.
XVIII - Ou seja, sempre que se esteja perante uma faca, onde se incluem canivetes e navalhas, o intérprete tem de recorrer ao RAM para saber se essa faca cabe no conceito de arma ali dado e depois ver se é ou não arma proibida.
XIX - Ora, foi dado como provado, tal como constava da acusação, que o arguido trazia consigo uma faca (canivete) com 9 cm de comprimento de lâmina.
XX - O que, de acordo com o artigo 1º, nº 1, alínea f) do RAM, nem é dimensão suficiente para preencher o conceito de arma, já que este normativo só considera armas as facas que possuam mais de 10 cm de lâmina.
XXI - E muito menos o é para ser considerada arma proibida, pois o legislador não atribuiu dignidade penal, a facas (canivetes) com lâmina que não seja superior a 10 cm de comprimento.
XXII - Exigindo o artigo 262º, nº 3 do Código Penal a detenção de uma arma branca, teria sempre a Meritíssima Juíza do Tribunal "a quo" que se socorrer do disposto no artigo 1º, nº 1, alínea f) do RAM para avaliar se o objecto apreendido nos autos se podia classificar como uma arma;
XXIII - E, não cabendo a faca (canivete) detida pelo arguido na definição de arma que nos é fornecida por aquele artigo 1º, nº 1, alínea f) do RAM, nem sequer se torna necessário justificar a sua posse, pois tal justificação será necessária apenas para as facas com comprimento de lâmina superior a 10 cm.
XXIV - Mas mesmo que fosse necessário justificar a posse da faca, o arguido justificou-a com a necessidade de se proteger de uma eventual agressão e ainda para cortar frutas.
XXV - Nunca referiu que pretendia ou que a mesma serviria para agredir quem quer que fosse.
XXVI - Não compete, pois, ao Tribunal fazer interpretações "generosas" ou "securitárias" de forma a integrar quaisquer facas (vg. canivetes) no conceito de arma proibida, por as considerar susceptíveis de serem utilizadas como arma de agressão.
XXVII - Pois tal é-lhe vedado pelo princípio da legalidade, cuja força é reforçada em matéria de definição de crimes, sendo ainda proibido o recurso à analogia para qualificar um facto como crime, como resulta do artigo 1°, nº s 1 e 3 do Código Penal.
XXVIII - Assim, não restam quaisquer dúvidas que nenhum crime foi cometido pelo arguido, pelo que não podia ter sido condenado por uma conduta que a lei não pune, impondo-se por isso a sua absolvição.
XXIX - No mesmo sentido daquele que é propugnado pelo arguido e que impõe a sua absolvição, vejam-se, a titulo de jurisprudência comparada, os acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra, no processo 1950/06.6PBAVR.C1, de 1.4.2009, disponível em www.dgsi.pt/jtrc,do Tribunal da Relação de Lisboa, no processo nº 11069/08-9, de 12.12.2009, disponível em www.dgsi.pt/jtrl, do Tribunal de Relação do Porto, nos processo nº 0415643, de 19.1.2005 e nº 0845701, de 3.12.2008, ambos disponíveis em www.dgsi.pt/jtrp, e ainda o acórdão do TSI da RAEM, proferido no Processo 905/2012, de 18.07.2013, disponível em www.court.gov.mo/sentence/pt/14379.
XXX - Violou, pois, a sentença do Tribunal "a quo", o disposto nos artigos 1º nºs 1 e 3, 262º, nº 3 do Código Penal e no artigo 1º nº 1, alínea f) do RAM, e ainda no artigo 339º nº 1 do Código de Processo Penal.
XXXI - Violou ainda a sentença do tribunal "a quo" o principio do acusatório, pois do ponto 5 da acusação do Ministério Público constava que "o arguido desculpou-se dizendo que a dita faca era usada para protecção pessoal e para cortar frutas";
XXXII - E, em violação desse princípio a Meritíssima Juíza do Tribunal "a quo" por despacho de 15.10.2019 (fls. 44), proferido antes de proceder à audiência de julgamento, decidiu acrescentar ao artigo 5. da acusação do Ministério Público que "o arguido não conseguiu explicar logicamente a razão da detenção da arma".
XXXIII - Para se afirmar a verificação do tipo do crime previsto no artigo 262º nº 3 do Código Penal, exige-se a verificação cumulativa de todos os elementos objectivos e subjectivos do tipo.
XXXIV - Neste tipo de crime (posse de arma previsto no artigo 262° nº 3 do Código Penal), a não justificação da posse de uma arma constitui um elemento típico do crime imputado ao arguido, sem o que a conduta levada a cabo pelo arguido não constitui qualquer crime.
XXXV - A justificação da posse de uma arma, tal como os demais elementos típicos do crime, deve ser alegada na acusação e provada em julgamento.
XXXVI - Ora, não tendo sido alegado pelo Ministério Público, na acusação que deduziu que o arguido não justificou a posse da faca, antes tendo até alegado que "o arguido desculpou-se dizendo que a faca era usada para protecção pessoal e para cortar frutas", a acusação não continha a alegação de todos os elementos constitutivos do tipo do crime previsto no artigo 262º nº 3 do Código Penal.
XXXVII - O que, de acordo com o artigo 265º nº 3, alínea b) do Código de Processo Penal, torna nula a acusação, por não conter a narração dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou medida de segurança ... e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada.
XXXVIII - Acresce que de acordo com a estrutura acusatória do processo penal, é a acusação e os factos nela descritos que limitam e constituem o objecto do processo, estando vedado ao juiz colmatar as deficiências ou andar a esmiuçar factos para salvar uma acusação, porventura deficiente ou insuficientemente produzida.
XXXIX - Do princípio do acusatório decorre, por isso, uma vinculação temática, de que resulta que não pode haver uma alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia.
XL - Pois é em função da acusação que o arguido organiza a sua defesa, e as limitações quanto à possibilidade de conhecimento de novos factos evitam que o arguido se confronte com uma subsunção diferente daquela que constitui a acusação e em resposta à qual preparou a sua defesa.
XLI - Mesmo sabendo que o juiz detém o poder de instruir autonomamente o processo em ordem a formar as bases necessárias para a sua decisão, o que resulta do principio da investigação, a verdade é que esse princípio terá de ser compatibilizado com a estrutura acusatória do processo penal, o que importa na impossibilidade de exercer qualquer influência na conformação do objecto do processo.
XLII - O que a Meritíssima Juíza do Tribunal "a quo" fez ao integrar na acusação o segmento de frase "o arguido não conseguiu explicar logicamente a razão da detenção da arma" foi colmatar uma falha encontrada na acusação sem a qual não estariam preenchidos todos os elementos típicos do crime de posse de arma previsto no artigo 262º - nº3 do Código Penal.
XLIII - E nem mesmo com recurso ao disposto quer no artigo 339º, quer no artigo 340° ambos do Código de Processo Penal, podia o tribunal "a quo" integrar aquele facto na acusação, pois tal resultaria em transformar uma conduta atípica, e como tal não punível pela lei penal, em uma conduta típica e como tal punível.
XLIV - E se o não podia fazer com recurso ao disposto nos artigos 339° e 340° do Código de Processo Penal de Macau, muito menos o podia antes da realização da audiência.
XLV - Aliás, mesmo que aquele facto pudesse ser integrado com recurso ao disposto nos artigos 339º e 340º do Código de Processo Penal de Macau, o que não se concebe, sempre a sentença enfermaria da nulidade prevista no artigo 360º, nº 1, alínea b) do Código de Processo Penal, porquanto tais normativos apenas admitem a alteração com factos cuja verificação resulte do decurso da audiência e não antes.
XLVI - Por outro lado, tendo em conta que não constando tal facto da acusação, não estariam preenchidos todos os elementos típicos do crime, a sua inclusão na acusação consubstanciaria uma alteração substancial dos factos, na medida em que uma conduta que antes (sem aquele facto) não era susceptível de incriminação, passaria a sê-lo com a integração daquele facto.
XLVII - E em tratando-se de uma alteração substancial dos factos, os mesmos não podiam ser tomados em conta para efeito de condenação no julgamento em curso, a não ser que nisso o arguido o Ministério Público estivessem de acordo, como resulta do artigo 340º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Penal.
XLVIII - No mesmo sentido daquele que é propugnado pelo arguido e que impõe a sua absolvição, vejam-se, a titulo de jurisprudência comparada, os acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, no processo nº 413/15.3PELSB-3, de 12.7.2017, disponível em www.dgsi.pt/jtrl e o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do STJ, nº 1/2015 - DR nº 18/2015, Série I de 27-01-2015.
XLIX - Ao ter decidido como decidiu, a Meritíssima Juíza do Tribunal "a quo" violou o disposto nos artigos 265º, nº 3, 339º e 340º e 360º, nº 1, alínea b), todos do Código de Processo Penal, e bem assim o principio do acusatório, um principio estruturante do processo penal, impondo-se, por isso, a absolvição do arguido.
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檢察院對上訴作出答覆,內容如下(結論部分):
1. 上訴人認為:原審法院在審判聽證前,透過批示對控訴書作出非實質事實變更。一方面,反映出控訴書因欠缺重要事實而無效(《刑事訴訟法典》第265條第3款b項);另一方面,非實質變更是於審判聽證前,而非審判聽證期間作出,構成判決無效(同部法典第360條第1款b項結合第339條)。同時,這種做法違反審檢分立原則。對此,本檢察院不予認同。
2. 對於控訴書無效:上訴人的指責明顯不屬於《刑事訴訟法典》第265條第3款b項規定的情況,同時,對此“無效”,上訴人明顯沒有適時於《刑事訴訟法典》第107條第3款c項規定的期間內提出)。
3. 對於判決無效、以及違反審檢分立原則:必須首先強調,《刑事訴訟法典》有關事實變更的機制,是立法者在辯護權利獲得確保的前提下,審檢分立原則所容許的情況。因此,應該要從辯護權的角度,來對本案進行分析。
4. 原審法院作出有關非實質變更的批示前,已將擬增加的事實通知了辯護人;同時,有關非實質事實變更的內容,並沒有對上訴人的訴訟地位造成不利影響,上訴人亦在庭審中對此作出了解釋。
5. 實際上,原審法院在指定聽證日期批示前(審判聽證前)作出有關非實質變更的批示,相比於審判聽證時作出,反而會令辯方有更多時間和機會準備辯護(包括在答辯及庭審時作出解釋)。
6. 基於此,本檢察院認為,在本案整個非實質變更的過程中,辯護權獲到充分保障,因此,上訴人的理據明顯站不住腳。
7. 最後,上訴人認為以《刑法典》第262條第3款定罪,是適用法律錯誤。對此,本檢察院不予認同。
8. 本案中,上訴人作出完全無保留自認,辯護人對此不反對。
9. 根據已證事實,上訴人在沒有合理解釋的情況下,持有可用作攻擊用途且具有貫穿性及刺透性的摺刀(即法律上的可用作攻擊的利器),上訴人的行為已經滿足了《刑法典》第262條第3款的全部主觀及客觀構成要件。因此,原審法院以此定罪,並無不妥。
10. 綜上所述,本檢察院認為,上訴人的理據明顯不能成立,應予全部駁回。
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案件卷宗移送本院後,駐中級法院的檢察院司法官作出檢閱及提交法律意見,內容如下:
A recorre da sentença de 29 de Novembro de 2019, do 5.° juízo criminal, que o condenou na pena de 3 meses de prisão, substituída por 90 dias de multa à taxa diária de MOP$100 (cem patacas), no montante global de MOP$9.000 (nove mil patacas), pela prática de um crime de detenção de arma previsto e punível pelo artigo 262.°, n.º 3, do Código Penal.
Alega que a sentença é nula e que também não se mostram preenchidos os elementos típicos do crime pelo qual foi condenado, pelo que haverá que ser absolvido.
Na sua resposta à motivação do recurso, o Ministério Público rebate os fundamentos do recurso e defende a bondade e a manutenção do julgado.
Também se nos afigura que a argumentação do recorrente se mostra improcedente.
Vejamos a questão da nulidade.
Diz o recorrente que o Ministério Público não alegou, na acusação, a não justificação da posse da faca, e que a Mm.ª juiz não podia acrescentar, no ponto 5 da acusação, a asserção "o arguido não conseguiu explicar logicamente a razão da detenção da arma", nem podia condenar por um enquadramento punitivo diverso daquele por que o Ministério Público acusou, com o que resultou violado o princípio do acusatório, acabando o recorrente por ser condenado mediante alteração substancial e não substancial de factos, sem que fosse dado cumprimento às normas dos artigos 339.° e 340 do Código de Processo Penal.
Antes de mais, cabe dizer que o acrescento "o arguido não conseguiu explicar logicamente a razão da detenção da arma" é uma conclusão, a conclusão que se extrai da alegação factual inserta na acusação, segundo a qual o arguido disse que a faca era para ser usada para protecção pessoal e para cortar frutas. Esta desculpa do arguido, não é evidentemente uma justificação de posse. Como se ponderou no acórdão de 09.03.2006, do Tribunal de Segunda Instância, Processo 29/2006, citado por Leal-Henriques em nota ao artigo 262.° de Código Penal (Anotação e Comentário ao Código Penal de Macau, Edição do Centro de Formação Jurídica e Judiciária), a posse será justificada quando a arma é afecta a uma daquelas finalidades normais e necessidades legítimas e compreensíveis da actividade do ser humano no seu dia a dia. É claro que se o agente traz a arma para a usar como instrumento de agressão, seja para se defender, seja para atacar, a posse não está obviamente justificada. Se, como se alegou na acusação, o arguido trazia consigo a arma para se defender e para cortar frutas, ele que até nem tem ocupação que implique o uso da faca para corte de frutas, a prova desta alegação leva à óbvia conclusão de que o portador da faca não justificou a sua posse. Essa conclusão nem sequer tinha que constar da acusação, pelo que é descabida a alegada violação do acusatório.
De resto, a expressão foi acrescentada ao artigo 5.° da acusação após audição e aquiescência implícita dos sujeitos processuais, que nenhum reparo formularam. Se alguma irregularidade ou nulidade havia, deviam elas ter sido, então, objecto de arguição, e não foram. Assim, passou aquela expressão a integrar, ab initio, o objecto do processo, pelo que nenhum cabimento tem falar-se agora de alteração de factos, e muito menos de alteração substancial.
E também não existe qualquer alteração não substancial que obrigasse à comunicação nos termos do artigo 339.° do Código de Processo Penal. A punição nos termos do artigo 262.°, n.º 2, do Código Penal, norma que consta da acusação, não exige qualquer referência a normas do Regulamento aprovado pelo DL 77/99/M, nomeadamente à alínea f) do seu artigo 1.º, n.º 1, pois não está em causa uma arma proibida, mas apenas uma arma branca, que tem capacidade para ser usada como arma de agressão, sendo que o conceito normativo de arma branca tem que assentar na sua noção sociológica, pois, que saibamos, não existe uma definição normativa do que seja uma arma branca. Assim, a referência a normas do Regulamento, constante da acusação, revela-se espúria e totalmente desnecessária à incriminação. Por isso, não se pode dizer que a sentença, ao não referenciar aquela norma do Regulamento, haja operado qualquer alteração.
Nenhuma nulidade se divisa, improcedendo este fundamento do recurso.
E, no que toca aos elementos típicos do crime, todos eles estão preenchidos.
O recorrente trazia consigo uma faca, com as características e tamanho assinalados na sentença, tratando-se, sem dúvida, de uma arma branca, constituída por lâmina de aço, com gume e ponta, que faz conjunto com um cabo que permite empunhá-la e usá-la como objecto cortante e perfurante; essa arma, pelas suas características, é passível de ser usada como instrumento de agressão; e o recorrente não justificou a respectiva posse, no sentido supra aludido de afectação a uma daquelas finalidades normais e necessidades legítimas e compreensíveis da actividade do ser humano no seu dia a dia.
Também este fundamento do recurso soçobra.
Ante o exposto, e na improcedência dos fundamentos do recurso, deve negar-se-lhe provimento.
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本院接受上訴人提起的上訴後,組成合議庭,對上訴進行審理,各助審法官依法定程序檢閱卷宗,並作出評議及表決。
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二、事實方面
經庭審後原審法庭確認下列事實為既證事實:
1) 2019年5月8日中午12時35分,嫌犯A欲進入澳門何鴻燊博士大馬路347號初級法院刑事大樓,以證人身份作證。
2) 初級法院保安員B對嫌犯的隨身背包進行X光機安檢時,發現在背包內藏有一把摺刀。
3) 上述摺刀全長22CM,刀刃長9CM,刀柄長13CM。
4) 根據治安警察局鑑定,上述摺刀能輕易刺穿及割破物件,具有貫穿性及刺透性,可用作攻擊用途,用作攻擊時可令受襲者造成嚴重傷害或對生命構成威脅,屬武器。
5) 嫌犯托詞收藏上述摺刀用作自衛用途及用作切水果,其無法合理解釋持有上述摺刀之原因。
6) 嫌犯A是在自願、自由及有意識之情況下,故意藏有或隨身攜帶禁用武器,並清楚知道其行為觸犯法律,會受法律制裁。
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在庭上還證實:
1) 嫌犯聲稱具有初中畢業程度學歷,每月收入11,000澳門元,需供養妻子。
2) 根據刑事紀錄證明書,除本案外,嫌犯沒有其他刑事記錄。
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三、法律理據
Como o recurso tem por objecto a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância, importa ver o que o Tribunal a quo decidiu. Este fundamentou a sua decisão nos seguintes termos:
澳門特別行政區初級法院獨任庭判決如下:
(一) 指控事實:
澳門特別行政區檢察院控訴以下嫌犯:
A,男性,已婚,保安員,持有編號XXX之澳門居民身份證,1956年9月13日在廣東省出生,父親XXX,母親XXX,住址為澳門XXX,電話:XXX。
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控訴事實如下:
一、
2019年5月8日中午12時35分,嫌犯A欲進入澳門何鴻燊博士大馬路347號初級法院刑事大樓,以證人身份作證。
二、
初級法院保安員B對嫌犯的隨身背包進行X光機安檢時,發現在背包內藏有一把摺刀。
三、
上述摺刀全長22CM,刀刃長9CM,刀柄長13CM(第2至4頁)。
四、
根據治安警察局鑑定,上述摺刀能輕易刺穿及割破物件,具有貫穿性及刺透性,可用作攻擊用途,用作攻擊時可令受襲者造成嚴重傷害或對生命構成威脅,根據第77/99M號法令核准之《武器及彈藥規章》第一條第一款f項(刀刃長度超過10CM之刀)及第六條第一款b項之規定,屬武器(第32頁)。
五、
嫌犯托詞收藏上述摺刀用作自衛用途及用作切水果,其無法合理解釋持有上述摺刀之原因。
六、
嫌犯A是在自願、自由及有意識之情況下,故意藏有或隨身攜帶禁用武器,並清楚知道其行為觸犯法律,會受法律制裁。
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基於此,檢察院控告嫌犯為直接正犯,其既遂行為觸犯:
➢ 《刑法典》第262條第3款結合由第77/99/M號法令所核准之《武器及彈藥規章》第1條f)項所規定和處罰的一項「持有禁用武器罪」。
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審判聽證:
已確定的訴訟前提維持不變,隨後以符合法律所要求的有關程序,在嫌犯出席的情況下進行審判聽證。
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答辯狀:
嫌犯提交了載於卷宗第58頁的形式答辯狀,並請求法庭考慮卷宗內對嫌犯有利的情節。
***
(二) 庭審認定的事實:
本院依法由獨任庭對本案進行公開審理,經聽證後,下列屬已查明的事實:
(......)
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經庭審未查明的事實:
1) 案中摺刀符合第77/99/M號法令核准之《武器及彈藥規章》第一條第一款f項(刀刃長度超過10CM之刀)及第六條第一款b項之規定 (控訴書第四點部分內容)。
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事實判斷:
嫌犯A出席了審判聽證,其作出了聲明,並基本承認被指控之事實。嫌犯尤其表示其職業為保安,任職娛樂場,工作期間會與不同的人士接觸。嫌犯聲稱於2019年5月8日中午12時35分進入澳門何鴻燊博士大馬路347號初級法院刑事大樓,為一宗刑事案件作證,在進行X光機安檢時被保安員發現背包內藏有之摺刀,嫌犯聲稱該把刀自衛及切水果用途,嫌犯表示並沒有使用該摺刀用作不法用途,但表示知悉該把刀具有可能傷及他人,知悉隨身攜帶該把刀具屬違法。嫌犯表示已知道其行為有錯,承諾不會再犯。
在庭審中聽取了一名證人的證言。證人C為嫌犯之同事和朋友,已認識嫌犯八年。證人尤其指出嫌犯工作盡責,其認為嫌犯沒有暴力傾向。
在庭審中審查了被扣押於卷宗內的扣押物。
在庭審聽證中審查了卷宗所載的書證,尤其是卷宗第32頁及背頁的檢驗及鑑定筆錄。
本院根據嫌犯的聲明、證人的證言、扣押品、書證,以及其他證據形成心證。嫌犯在庭審中指出其於2019年5月8日進入澳門何鴻燊博士大馬路347號初級法院刑事大樓時,背包內藏有一把摺刀。根據卷宗第32頁及背頁的檢驗及鑑定筆錄,鑑定人指出被扣押於卷宗內之摺刀,刀刃及刀柄全長22厘米,刀刃全長9厘米,刀柄全長13厘米。鑑定結果顯示摺刀能輕易刺穿及割破物件,具有貫穿性及刺透性,可用作攻擊用途,用作攻擊時可令受襲者造成嚴重傷害或對生命構成威脅。嫌犯表示有關刀具用作切水果之用,經法庭檢視有關刀具,該刀具較一般水果刀為長,法庭認為嫌犯提出隨身帶著該把刀具作切食物之用為不合理; 嫌犯又指出其職業為娛樂場保安,擔心工餘時間在街外有特別事發生時可用作自衛之用,然而,本院認為嫌犯可以其他方式及途徑預防或應付他人作出的違法行為,而不應以持有有關物品作或有之對抗,從而認為嫌犯的解釋其不合理。
結合本案的證據,本院認定了控訴書所載的大部分事實,並足以對嫌犯作出如下判罪。
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(三) 法律適用:
現分析對該等事實適用之法律:
《刑法典》第262條規定如下:
「第二百六十二條(禁用武器及爆炸性物質)
一、不符合法定條件、或違反有權限當局之規定,輸入、製造、藏有、購買、出售、以任何方式讓與或取得、運輸、分發、持有、使用或隨身攜帶禁用武器、爆炸裝置或爆炸性物質、足以產生核爆之裝置或物質、放射性裝置或物質、又或適合用作製造有毒或令人窒息之氣體之裝置或物質者,處二年至八年徒刑。
二、如上款所指之行為牽涉下列物件,行為人處最高三年徒刑:
a)用作噴射有毒、令人窒息或腐蝕性之物質之裝置;或
b)供裝設在任何禁用武器上之推動機械裝置、彈膛、鼓型彈匣或管、滅聲器或具有相類作用之其他器械、望遠瞄準器,又或供該等武器發射之彈藥,而此等物件並非附於該等武器者。
三、持有或隨身攜帶利器或其他工具,而有將之作為攻擊性武器使用之目的,或該利器或工具係可用作攻擊者,如持有人或攜帶人並無對其持有或攜帶作出合理解釋,則處最高二年徒刑。
十一月八日第77/99/M號法令所核准之《武器及彈藥規章》第1條及第6條規定如下:
「第一條(武器及之概念)
一、為適用本規章,凡被歸類為以下數條所指武器之工具或器具,均視為武器,尤其係:
a) 任何火器;凡利用火藥作為子彈推進動力之武器,均視為火器;
b) 能以大於2j之動力發射任何子彈之氣步槍、氣左輪手槍或氣手槍;
c) 非作消防用途之任何發射有害液體、氣體、粉末或類似物質之器具,包括毒氣或麻醉氣體之噴霧器;
d) 任何能以放電方式影響他人軀體或心理之工具;
e) 經偽裝之武器、利器或火器、具尖鐵之手環及尖鐵頭;
f) 貫穿性或挫傷性之工具,以及刀刃長度超過10cm之刀,而該等武器可被用作攻擊身體之工具,且攜帶者無法合理解釋擁有之原因;
g) 手榴彈或其他本身設有點燃裝置之爆炸或燃燒器械。
二、凡特徵與警察部隊及其他保安部門作武器用之工具、機械性器具或其他物件之特徵相似之物件,即使屬不同類型者,亦視為武器。」
「第六條(違禁武器及彈藥)
一、以下武器視為違禁武器:
a) 不屬第二條至第五條之規定所指之武器;
b) 第一條c項至f項所指之武器;
c) 所有經任何方式改動或改裝之自衛武器。
二、所有僅供澳門保安部隊使用且僅為此目的進口而被特別分類之不論直徑為多少之彈藥,均視為違禁彈藥。
三、刑法所規定之有關違禁武器之處罰制度適用於上款所指之彈藥。」
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定罪:
根據已審理查明的事實,嫌犯故意藏有及隨身攜帶禁用武器,托詞收藏摺刀用作自衛用途及用作切水果,無法合理解釋持有摺刀之原因; 有關摺刀之刀刃為9厘米長,屬可用作攻擊的利器,但不屬於十一月八日第77/99/M號法令核准之《武器及彈藥規章》第1款f)項所規定的貫穿性武器。因此,嫌犯被指控觸犯的一項《刑法典》第262條第3款結合由第77/99/M號法令所核准之《武器及彈藥規章》第1條f)項所規定和處罰的「持有禁用武器罪」,應當改判為一項《刑法典》第262條第3款規定和處罰的「持有禁用武器罪」,且符合主觀和客觀構成要件,並以直接正犯及既遂之方式為之。
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量刑:
根據《刑法典》第64條,在選擇刑罰方面,如對犯罪可選科剝奪自由之刑罰或非剝奪自由之刑罰,則只要非剝奪自由之刑罰可適當及足以實現處罰之目的,法院須先選擇非剝奪自由之刑罰。
在量刑方面,根據《刑法典》第40條及第65條的規定,須按照行為人的過錯及預防犯罪之要求來確定,同時也須考慮所有對行為人有利或不利而不屬罪狀之情節,尤其包括:
a) 事實之不法程度、實行事實之方式、事實所造成之後果之嚴重性,以及行為人對被要求須負之義務之違反程度;
b) 故意或過失之嚴重程度;
c) 在犯罪時所表露之情感及犯罪之目的或動機;
d) 行為人之個人狀況及經濟狀況;
e) 作出事實之前及之後之行為,尤其係為彌補犯罪之後果而作出之行為;以及
f) 在事實中顯示並無為保持合規範之行為作出準備,而欠缺該準備係應透過科處刑罰予以譴責者。
在具體的量刑上,嫌犯本次犯罪後果為一般,故意程度中等,行為不法性一般,行為的可譴責性為一般。在本案中,嫌犯為初犯,承認犯罪。結合本卷宗有關的犯罪情節,同時考慮該類犯罪之一般預防之要求等因素,本院認為對嫌犯判處三個月徒刑為合適。
《刑法典》第44條第1款規定,科處之徒刑不超逾六個月者,須以相等日數之罰金或以其他可科處之非剝奪自由之刑罰代替之。故此,根據有關法律規定,本院以九十日罰金替代上述徒刑,每日一百澳門元 (MOP$100.00),合共為九千澳門元 (MOP$9,000.00); 根據同一條條文第2款,被判刑者如不繳納罰金,須服所科處之徒刑,而第47條第3款規定亦相應適用之。
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(四) 判決:
綜上所述,根據上述內容及依據,現判決如下:
➢ 嫌犯A被指控以直接正犯及既遂的方式觸犯《刑法典》第262條第3款結合由十一月八日第77/99/M號法令所核准之《武器及彈藥規章》第1條f)項所規定和處罰的一項「持有禁用武器罪」,改判以直接正犯及既遂的方式觸犯《刑法典》第262條第3款所規定和處罰的一項「持有禁用武器罪」,罪名成立,判處三個月徒刑。
➢ 根據《刑法典》第44條規定,將三個月徒刑以九十日罰金作為替代,每日罰金為一百澳門元 (MOP$100.00),合共為九千澳門元 (MOP$9,000.00); 根據同一條條文第2款,被判刑者如不繳納罰金,須服所科處之徒刑。
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按照八月十七日第6/98/M號法律 (規範對暴力罪行受害人之保障) 第24條第2款,判處嫌犯向法務公庫繳交澳門幣500元捐獻。
根據十月二十五日第63/99/M號法令核准之《法院訴訟費用制度》第71條第1款b)項,裁定嫌犯承擔1個計算單位司法費及其他訴訟負擔。
按照《法院訴訟費用制度》第76條第1款,結合第59/2013號行政長官批示之附件5.2及第297/2013號行政長官批示,嫌犯須向其辯護人支付報酬1,500澳門元; 根據《法院訴訟費用制度》第76條第3款,如嫌犯不在期限內自願繳付上述辯護人報酬,該報酬由終審法院院長辦公室墊支。
針對卷宗第2頁被扣押的摺刀: 根據《刑法典》第101條第1款及第3款,將之宣告歸本特區所有,並適時將之銷毀。
待判決確定後,根據《刑事訴訟法典》第198條第1款d)項,消滅所有已被採取的強制措施。
移送嫌犯的刑事紀錄證明登記表予身份證明局。
將本判決通知各相關人士。
如不服本判決,可按照《刑事訴訟法典》第401條第1款,於二十日內向本院遞交上訴狀,上訴於澳門特別行政區中級法院,上訴必須由律師代理。
按照《刑事訴訟法典》第353條第5款,依法存錄及登記本判決書。
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Quid Juris?
Apreciando:
Neste recurso o Recorrente/arguido veio a imputar o vício da nulidade à sentença condenatória e o vício da apreciação de factos e de provas, entendendo que não estão verificados os requisitos do tipo incriminador da posse de arma proibida, p. e p. pelo artigo 262o/3 do CPM.
A propósito destas questões o Digno. Magistrado do MP junto deste TSI emitiu o seguinte douto parecer:
“A recorre da sentença de 29 de Novembro de 2019, do 5.° juízo criminal, que o condenou na pena de 3 meses de prisão, substituída por 90 dias de multa à taxa diária de MOP$100 (cem patacas), no montante global de MOP$9.000 (nove mil patacas), pela prática de um crime de detenção de arma previsto e punível pelo artigo 262.°, n.º 3, do Código Penal.
Alega que a sentença é nula e que também não se mostram preenchidos os elementos típicos do crime pelo qual foi condenado, pelo que haverá que ser absolvido.
Na sua resposta à motivação do recurso, o Ministério Público rebate os fundamentos do recurso e defende a bondade e a manutenção do julgado.
Também se nos afigura que a argumentação do recorrente se mostra improcedente.
Vejamos a questão da nulidade.
Diz o recorrente que o Ministério Público não alegou, na acusação, a não justificação da posse da faca, e que a Mm.ª juiz não podia acrescentar, no ponto 5 da acusação, a asserção "o arguido não conseguiu explicar logicamente a razão da detenção da arma", nem podia condenar por um enquadramento punitivo diverso daquele por que o Ministério Público acusou, com o que resultou violado o princípio do acusatório, acabando o recorrente por ser condenado mediante alteração substancial e não substancial de factos, sem que fosse dado cumprimento às normas dos artigos 339.° e 340 do Código de Processo Penal.
Antes de mais, cabe dizer que o acrescento "o arguido não conseguiu explicar logicamente a razão da detenção da arma" é uma conclusão, a conclusão que se extrai da alegação factual inserta na acusação, segundo a qual o arguido disse que a faca era para ser usada para protecção pessoal e para cortar frutas. Esta desculpa do arguido, não é evidentemente uma justificação de posse. Como se ponderou no acórdão de 09.03.2006, do Tribunal de Segunda Instância, Processo 29/2006, citado por Leal-Henriques em nota ao artigo 262.° de Código Penal (Anotação e Comentário ao Código Penal de Macau, Edição do Centro de Formação Jurídica e Judiciária), a posse será justificada quando a arma é afecta a uma daquelas finalidades normais e necessidades legítimas e compreensíveis da actividade do ser humano no seu dia a dia. É claro que se o agente traz a arma para a usar como instrumento de agressão, seja para se defender, seja para atacar, a posse não está obviamente justificada. Se, como se alegou na acusação, o arguido trazia consigo a arma para se defender e para cortar frutas, ele que até nem tem ocupação que implique o uso da faca para corte de frutas, a prova desta alegação leva à óbvia conclusão de que o portador da faca não justificou a sua posse. Essa conclusão nem sequer tinha que constar da acusação, pelo que é descabida a alegada violação do acusatório.
De resto, a expressão foi acrescentada ao artigo 5.° da acusação após audição e aquiescência implícita dos sujeitos processuais, que nenhum reparo formularam. Se alguma irregularidade ou nulidade havia, deviam elas ter sido, então, objecto de arguição, e não foram. Assim, passou aquela expressão a integrar, ab initio, o objecto do processo, pelo que nenhum cabimento tem falar-se agora de alteração de factos, e muito menos de alteração substancial.
E também não existe qualquer alteração não substancial que obrigasse à comunicação nos termos do artigo 339.° do Código de Processo Penal. A punição nos termos do artigo 262.°, n.º 2, do Código Penal, norma que consta da acusação, não exige qualquer referência a normas do Regulamento aprovado pelo DL 77/99/M, nomeadamente à alínea f) do seu artigo 1.º, n.º 1, pois não está em causa uma arma proibida, mas apenas uma arma branca, que tem capacidade para ser usada como arma de agressão, sendo que o conceito normativo de arma branca tem que assentar na sua noção sociológica, pois, que saibamos, não existe uma definição normativa do que seja uma arma branca. Assim, a referência a normas do Regulamento, constante da acusação, revela-se espúria e totalmente desnecessária à incriminação. Por isso, não se pode dizer que a sentença, ao não referenciar aquela norma do Regulamento, haja operado qualquer alteração.
Nenhuma nulidade se divisa, improcedendo este fundamento do recurso.
E, no que toca aos elementos típicos do crime, todos eles estão preenchidos.
O recorrente trazia consigo uma faca, com as características e tamanho assinalados na sentença, tratando-se, sem dúvida, de uma arma branca, constituída por lâmina de aço, com gume e ponta, que faz conjunto com um cabo que permite empunhá-la e usá-la como objecto cortante e perfurante; essa arma, pelas suas características, é passível de ser usada como instrumento de agressão; e o recorrente não justificou a respectiva posse, no sentido supra aludido de afectação a uma daquelas finalidades normais e necessidades legítimas e compreensíveis da actividade do ser humano no seu dia a dia.
Também este fundamento do recurso soçobra.
Ante o exposto, e na improcedência dos fundamentos do recurso, deve negar-se-lhe provimento.”
Subscrevemos esta fundada argumentação que é reproduzida aqui para servir de fundamentação deste aresto, e acrescentamos ainda o seguinte:
1) - Não existe nenhuma nulidade da sentença nos termos alegados pelo Recorrente/arguido, não há nenhuma alteração substancial dos factos, o que o Tribunal recorrido fez foi requalificar juridicamente os factos, o que não viola nenhum preceito legal. Aliás, esta requalificação não só pode ser feita no julgamento de primeira instância, como também no pode fazê-lo em sede de recurso, tal como foi decidido no processo nº 1102/2020 do TSI, cujo acórdão foi proferido em 27/5/2021, em que foi decidida a mesma matéria (posse de arma proibida);
2) – A segunda questão tem a ver com a aceitação ou não da justificação da posse da arma que o Recorrente/arguido trazia, ao entrar no TJB. O Recorrente/arguido é trabalhador de casino, alegava que trazia de tal instrumento ora para cortar frutas ora para se defender em caso de necessidade, justificação esta que pouco merece credibilidade, já que tal arma não tem nada ver com a profissão ou trabalho diário dele, nem se diga que gastava horas e horas por dia para cortar frutas! Uma justificação ilógica, para além de incrível!
3) – Pelo que, seguido o raciocínio do douto parecer do MP, é de julgar improcedente o recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
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Síntese conclusiva:
I – Está em causa um crime de detenção de arma imputado ao arguido (Recorrente), previsto e punível pelo artigo 262.°, n.º 3, do Código Penal de Macau, a fim de justificar a sua posse, o arguido alegou que a faca era para ser usada para protecção pessoal e para cortar frutas. À luz do critério defendido pela doutrina maioritária, a posse de arma só será justificada quando a arma é afecta a uma daquelas finalidades normais e necessidades legítimas e compreensíveis da actividade do ser humano no seu dia a dia.
II - A desculpa alegada pelo arguido não é evidentemente uma justificação de posse, pois, o agente traz a arma para a usar como instrumento de agressão, seja para se defender, seja para atacar, a posse não está obviamente justificada.
III - Não existe qualquer alteração não substancial que obrigasse à comunicação nos termos do artigo 339.° do CPP. A punição nos termos do artigo 262.°, n.º 2, do Código Penal, norma que consta da acusação, não exige qualquer referência a normas do Regulamento aprovado pelo DL 77/99/M, nomeadamente à alínea f) do seu artigo 1.º, n.º 1, pois não está em causa uma arma proibida, mas apenas uma arma branca, que tem capacidade para ser usada como arma de agressão.
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Tudo visto e ponderado, resta decidir.
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四、裁決
據上論結,中級法院合議庭法官裁決如下:
1. 上訴人/嫌犯之上訴理由不成立,維持原審法庭之判決。
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2. 判處上訴人繳7 個計算單位之司法費,以及上訴敗訴而產生的訴訟費用。
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依法作出通知及登錄。
2021年9月16日
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馮文莊 (裁判書製作人)
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蔡武彬 (第一助審法官)
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陳廣勝 (第二助審法官)
1 Por deliberação (nº 251) do Conselho dos Magistrados Judiciais de 14/05/2021, o signatário/relator foi designado para relatar, em acumulação de serviço, os processos-crime redistribuídos nos termos fixados pela referida deliberação.
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97/2020-arma-proibida-262/3 p.27/27