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卷宗編號: 425/2022
日期: 2022年10月20日
關鍵詞: 遺漏審理、經濟房屋、善意原則

摘要:
- 只有當法院沒有就司法上訴人提出的問題表明立場時,才存在“遺漏審理”的裁判無效瑕疵。
- 當申請人及其家團成員在提交申請之日前的10年內直至簽訂買賣預約合同之日曾為:
1. 澳門特別行政區居住用途的都市房地產、獨立單位或土地的預約買受人、共同預約買受人、所有人或共有人,不論當中所佔的份額為何,但因繼承而取得不動產的情況除外;
2. 澳門特別行政區私產土地的承批人,
那行政當局必須根據第10/2011號法律第34條第4款之規定,解除相關購買經濟房屋的合同。相關行為是一受拘束的行政行為。
- 善意原則並不適用於受拘束的行政活動中。
裁判書製作人
何偉寧







行政、稅務及海關方面的上訴裁判書

卷宗編號: 425/2022
日期: 2022年10月20日
上訴人: A(司法上訴人)
被訴實體: 澳門房屋局局長
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一. 概述
司法上訴人A,詳細身份資料載於卷宗內,不服行政法院於2022年02月17日作出的決定,向本院提出上訴,有關內容如下:
1. Por despacho proferido pelo Exmo. Sr. Director do Instituto de Habitação em 12 de Abril de 2021 exarado no relatório n.º 0679/DAJ/2021 foi tomada a decisão de resolução do contrato-promessa de compra e venda da habitação económica (fls. 13 a 15).
2. Outro, no entanto, podia e devia ter sido o sentido da decisão recorrida.
3. Desde logo, porque a decisão ora recorrida não se pronunciou sobre as questões sumariadas nas conclusões C) e N) das alegações do recurso, tendo por isso incorrido em nulidade por omissão de pronúncia - art.º 571.º, n.º 1, alínea d), por violação do disposto no art.º 562.º, n.º 3, ambos do CPC, ex vi dos art.ºs 1.º e 149.º, n.º 1, ambos do CPAC, pelo que deverá ser anulada, com as legais consequências.
4. Depois, porque o acto administrativo em causa na sentença recorrida, ou seja, o despacho do Exmo. Sr. Presidente do Instituto de Habitação, de 12.04.2021, é inválido por preterição de audiência prévia da A, dado não se ter verificado nenhuma das situações a que aludem os artigos 96.º e 97.º do CPA e sem que a preterição da formalidade essencial imposta no art.º 93.º, n.º 1 e 94.º, n.º 2 do CPA se pudesse ter degradado em irregularidade irrelevante.
5. A falta de audiência prévia da B viola o disposto no art.º 68.º, c) e 93.º, n.º 1, do CPA por ser evidente que o “Boletim de inscrição de promitentes-compradores do regime de contrato de desenvolvimento para habitação” de 30 de Março de 2004 não habilitar a A a representar as pessoas que compõem o seu agregado familiar nas várias fases do concurso público da Lei de Habitação Económica, nem no procedimento administrativo de resolução do contrato-promessa de compra e venda de fracção de habitação económica, nem em qualquer outro processo relativo a esse contrato.
6. Isto por a audiência de interessados prevista no 93º, n.º 1, do CPA não ser uma das fases do concurso público previsto na Lei de Habitação Económica, mas um procedimento administrativo distinto e autónomo, cujo início tinha de ter sido comunicado às duas promitentes-compradoras (e ao C), nos termos e para os efeitos do art.º 58.º, n.º 1, do CPA.
7. A decisão ora recorrida constituiu para a Recorrente A uma decisão-surpresa, devendo ser declarada nula (art.º 122.º, n.º, al. d), do CPA) ou anulada (art.º 122.º, n.º, al. d), do CPA) por violação do disposto nos artigos 59.º, 86.º, n.º 1, 88.º, n.º 1, 10.º, 93.º, n.º 1, 94.º (ou 95º), 96.º (à contrário) e 97.º, todos do CPA.
8. De sorte que o acto recorrido mostra-se inválido, tanto por preterição da audiência prévia de interessados, como por total ausência de fundamentação no que respeita à dispensa do cumprimento do disposto no art.º 93º n.º 1 do CPA.
9. Ainda que assim não se entenda, sempre o acto recorrido seria ineficaz porque não foi notificado a ambos os promitentes-compradores, designadamente à promitente-compradora B, pelo que o mesmo é ineficaz em relação a ela face ao disposto no artigo 121.º, n.º 1, a contrario, do CPA e nos artigos 430.º, n.º 1 e 216.º, n.º 1, 1.ª parte, ambos do Código Civil, aplicáveis ao caso “sub judice” por força do art.º 61.º da Lei da Habitação Económica.
10. Por outro lado, o não cumprimento dos requisitos previstos no art.º 14.º, n.º 8, da Lei da Habitação Económica é um dos fundamentos de exclusão do concurso dos adquirentes seleccionados até ao acto de celebração do contrato-promessa, conforme resulta do art.º 28.º, n.º 1, (1), desse diploma,
11. mas não constitui fundamento de resolução após a celebração desse contrato, a menos que tal não-cumprimento se mantenha após o acto da celebração do contrato e/ou ocorra ex nuovo durante a vigência da relação contratual, conforme resulta da interpretação do art.º 34.º, n.º 4 da Lei da Habitação fixada na cláusula resolutiva 14.ª do contrato-promessa de fls. 117 a 119 da pasta 2 do processo administrativo.
12. Por conseguinte, não era possível à entidade recorrida ter validamente resolvido o contrato.
13. Isto dado os promitentes-compradores não terem violado nenhuma das obrigações resultantes do contrato-promessa de fls. 117 a 119 do processo administrativo designadamente na sua cláusula 6.ª, nem posteriormente à sua celebração em 28/12/2012 se ter verificado a hipótese resolutória prevista na sua cláusula 14.ª ex vi do art.º 34.º, n.º 4, da Lei da Habitação Económica, designadamente a superveniência do não-cumprimento dos mesmos requisitos previstos nos parágrafos 1) e 2) do n.º 8 do artigo 14.º desse diploma.
14. Por outro lado, também se formou “caso decidido” ou “caso resolvido” vinculativo para a entidade recorrida sobre todos os pressupostos (de facto e de direito) dos seguintes actos administrativos constitutivos de direitos ou interesses legalmente protegidos, na acepção do disposto no art.º 110.º do CPA: (1) “acto de selecção dos adquirentes”, (2) “acto de apreciação dos requisitos do candidato e dos elementos do respectivo agregado familiar”, (3) “acto de atribuição da habitação”, (4) despacho do Presidente do IH que autorizou a celebração do contrato-promessa de fls. 117 a 119 da pasta 2 do processo administrativo e (5) despacho SATOP de 28/8/2012 exarado no relatório 0112/DEIA/2012.
15. Logo, de duas uma:
- ou antes da celebração do contrato-promessa de fls. 117 a 119 da pasta 2 do processo administrativo, o IH excluía os adquirentes seleccionados do concurso nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 28.º, n.º 1, 1) da Lei da Habitação Económica, por não reunirem os requisitos legais de acesso à compra de fracções de habitação económica;
- ou após a sua celebração em 28.12.2012, o IH resolvia o contrato-promessa de fls. 117 a 119 da pasta 2 do processo administrativo nos termos e para os efeitos da sua cláusula 14.ª e do art.º 34º, n.º 4, da Lei da Habitação Económica, imputando para tanto aos promitente-compradores e/ou os elementos do seu agregado familiar, o não-cumprimento superveniente dos mesmos requisitos previstos nos parágrafos 1) e 2) do n.º 8 do artigo 14º do mesmo diploma.
16. Sucede que o IH não fez uma coisa nem outra.
17. O que IH fez foi, em 12.04.2021, resolver o contrato-promessa de fls. 117 a 119 da pasta 2 do processo administrativo celebrado em 28.12.2012, com base numa situação de não-cumprimento inexistente desde 20/04/2004.
18. Ora, o art.º 34.º, n.º 4, da Lei da Habitação Económica não o consente.
19. Isto por a resolução ser a destruição da relação contractual (validamente constituída) operada por um dos contraentes, com base num facto posterior à celebração do contrato. - Cf Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, vol. II, 7.ª ed., p. 275.
20. Caso na redacção do art.º 34.º, n.º 4, da Lei da Habitação Económica se quisesse ter incluído as situações (já sanadas) de não cumprimento anteriores à celebração do contrato-promessa - e não se quis - o legislador da RAEM teria optado por conjugar o verbo “cumprir” na 3.ª pessoa do plural do pretérito perfeito (“não cumpriram”) ou na 3.ª pessoa do plural do pretérito mais-que-perfeito do indicativo (“não cumpriram”), em vez de o ter conjugado, como conjugou, na 3.ª pessoa do plural do presente do indicativo (“não cumprem”).
21. Não o fez, pelo que o art.º 34.º, n.º 4, da Lei da Habitação Económica só se refere às situações de não cumprimento que se verifiquem na vigência do contrato-promessa.
22. Isto por força da presunção legal estabelecida no art.º 8.º, n.º 3, do Código Civil, já que o intérprete deve presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.
23. A interpretação de que o art.º 34.º, n.º 4, da Lei da Habitação Económica só se se refere às situações de não cumprimento dos requisitos previstos no n.º 8 do artigo 14.º que se verifiquem na vigência do contrato-promessa é também a única que tem em conta a unidade do sistema jurídico prevista no art.º 8, n.º 1, do Código Civil.
24. Afigura-se, pois, evidente que o legislador da RAEM não quis reinventar (nem subverter) a figura da resolução do contrato, de forma a que ela pudesse também passar a basear-se em situações inexistentes à data da sua celebração.
25. Nem se diga que esta interpretação art.º 34.º, n.º 4, da Lei da Habitação Económica derrotaria a finalidade da política de habitação económica por permitir que tivessem acesso a fracções de habitação económica pessoas que a elas se não poderiam ter candidatado.
26. Isto porque, a verificar-se erro-vício quanto à habilitação dos candidatos, o contrato-promessa validamente celebrado com os adquirentes seleccionados ser anulável pelo IH nos termos da lei substantiva.
27. A interpretação de que o art.º 34.º, n.º 4, da Lei da Habitação Económica só se se refere às situações de não cumprimento dos requisitos previstos no n.º 8 do artigo 14.º que se verifiquem na vigência do contrato-promessa é também a interpretação que melhor se coaduna com a redacção da cláusula resolutiva expressa prevista na cláusula 14.ª do contrato-promessa de fls. 117 a 119,
28. pela qual tal interpretação do art.º 34.º, n.º 4, da Lei da Habitação Económica foi sufragada pela entidade recorrida e incorporada na cláusula 14.ª do contrato-promessa, a qual, por se tratar de uma cláusula modelo resultante da lei, consta de todos os contratos-promessa de compra e venda de habitação económica.
29. Por conseguinte, o acto administrativo objecto da sentença recorrida não podia ter sido praticado ao abrigo do disposto no art.º 34.º, n.º 4, da Lei n.º 10/2011 da Lei da Habitação Económica, dado os promitentes-compradores já cumprirem, desde 20//04/2004, os requisitos previstos no n.º 8 do artigo 14.º desse diploma e a resolução em 12/04/2021 do contrato-promessa celebrado em 28/12/2012, por definição, só poder ter como fundamento um facto superveniente à sua celebração e não um facto a ela anterior.
30. Outra interpretação que não esta conflituaria com o propósito da política de habitação económica.
31. É o que resulta do ponto 3.2 Alteração do prazo em que não é permitido ser proprietário da “Nota Justificativa da Proposta de Lei intitulada “Alteração à Lei n.º 10/2011 - Lei da Habitação Económica” in www.al.gov.mo/uploads/ attachment/2018-11/556535bdffd84288fi.pdf,
32. na qual o legislador conjugou o verbo “ser” no infinitivo pessoal “ser” (proprietário) e não no particípio passado “sido” (proprietário), precisamente para afastar a resolução do contrato-promessa em situações como a ora em apreço.
33. Caso assim não se entendesse, a entidade recorrida excedido os limites impostos pela boa fé no caso “sub judice”, incorrendo no exercício ilegítimo de um direito [artigo 326.º do Código Civil],
34. o que…equivale à falta do direito, gerando as mesmas consequências jurídicas que se produziram quando uma pessoa pratica um acto que não tem o direito de realizar. - vidé, por todos, Inocêncio Galvão Telles, in “Obrigações”, 3.ª ed., p. 58.
35. Isto por nada justificar a resolução em 12/04/2021 do contrato-promessa de fls. 117 a 119 com base numa situação de não-cumprimento inexistente desde 20/04/2004,
36. quando o que resulta da cláusula resolutória 14.ª do mesmo contrato-promessa é que o período em que o não cumprimento dos mesmos requisitos previstos nos parágrafos 1) e 2) do n.º 8 do artigo 14.º da Lei da Habitação Económica releva para efeitos da resolução do contrato validamente celebrado entre as partes é apenas o tempo que medeia entre o acto da sua celebração e acto de emissão do termo de autorização.
37. Por último, sempre o acto administrativo em causa seria anulável por frustração do investimento da confiança tutelado no art.º 8.º, n.º 2, do CPA.
38. Assim não entendeu o Tribunal a quo pelo que sempre deverá o recurso proceder, revogando-se a sentença recorrida e anulando-se a decisão de resolução do contrato promessa de fls. 117 a 119 da pasta 2 do processo administrativo tomada no Despacho do Presidente do Instituto de Habitação, de 12.04.2021 exarado no relatório n.º 0679/DAJ/2021 (fls. 13 a 15) por violação do disposto no art.º 8.º, n.º 2, do CPA, com as legais consequências.
39. Em suma, a sentença recorrida incorreu em erro de actividade por violação do disposto no art.º 571.º, n.º 1, alínea d) e art.º 562.º, n.º 3, ambos do CPC, ex vi dos art.ºs 1.º e 149.º, n.º 1, ambos do CPAC.
40. A sentença recorrida incorreu ainda em erro de julgamento por o Despacho do Presidente do Instituto de Habitação, de 12.04.2021, exarado no relatório n.º 0679/DAJ/2021, se tratar de um acto ineficaz e anulável.
41. Isto por ter sido proferido em violação do disposto no art.º 121.º, n.º 1, a contrario, do CPA e dos art.ºs 430.º, n.º 1 e 216.º, n.º 1, 1.ª parte, ambos do Código Civil, aplicáveis ao caso “sub judice” por força do art.º 61.º da Lei da Habitação Económica, do disposto nos art.ºs 93.º, n.º 1 e 94.º, n.º 2 do CPA, do disposto no art.º 110.º do CPA por violar o “caso decidido” ou “caso resolvido” formado sobre os actos administrativos constitutivos de direitos ou de interesses legalmente protegidos anteriormente praticados no concurso, do disposto nos art.ºs 28.º, n.º 1 e 34.º, n.º 4, da Lei da Habitação Económica, do art.º 426.º, n.º 1 do Código Civil, da cláusula 14.ª do contrato-promessa de fls.117 a 119, do art.º 8.º, n.º 1 e 3 ou do art.º 326.º, do Código Civil e do art.º 8º, 2, a) do CPA.
42. E se tratar de um acto contrário aos princípios da legalidade (art.º 3/1 do CPA), da prossecução do interesse público no respeito pelos direitos e interesses dos residentes (art.º 4 do CPA) e da boa fé (art.º 8/1 do CPA) e, por conseguinte, da finalidade da política de habitação económica referida no art.º 2.º (1) da Lei da Habitação Económica, conforme resulta do ponto 3.2 do documento denominado “Nota justificativa da Proposta de Lei intitulada “Alteração à Lei n.º 10/2011- Lei da Habitação Económica”.
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被訴實體澳門房屋局局長就有關上訴作出答覆,內容載於卷宗第194至205頁,在此視為完全轉錄。
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檢察院作出意見書,內容載於卷宗第214至218背頁,在此視為完全轉錄。
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二. 事實
原審法院認定的事實如下:
- 2004年03月26日,司法上訴人購買取得位於澳門馬場東大馬路XXXXXXXX號X樓X座的居住用途獨立單位,並於同年05月12日出售該單位(見行政卷宗一第18頁至第21頁與行政卷宗二第189頁)。
- 2004年03月30日,司法上訴人以家團代表身份向房屋局遞交房屋發展合同競投報名表,家團成員包括司法上訴人、其配偶C及其女兒B(見行政卷宗二第9頁至第10頁及背頁) 。
- 2012年08月29日,房屋局通過編號1208240085/DAH公函通知司法上訴人選擇單位(見行政卷宗第70頁至第71頁)。
- 2012年12月28日,房屋局與司法上訴人及B簽訂了位於澳門鴨涌馬路青葱大廈第X座X樓X座單位的買賣預約合同 (見行政卷宗二第117頁至第119頁) 。
- 2020年10月12日,房屋局法律事務處處長作出批示,指出司法上訴人於2004年03月26日至04月20日期間為位於澳門馬場東大馬路XXXXXXXX號X樓X座單位的所有人,不符合申請購買經濟房屋單位的要件,房屋局得解除買賣預約合同,故決定開展書面聽證程序,並於2020年10月19日透過公函通知司法上訴人提交書面解釋(見行政卷宗一第22頁至第25頁) 。
- 2020年11月03日,司法上訴人向房屋局提交書面解釋 (見行政卷宗一第26頁至第30頁) 。
- 2021年04月12日,被上訴實體在編號0679/DAJ/2021號建議書內作出同意批示,指出司法上訴人由提交申請之日至在選擇單位之日,曾為澳門特別行政區居住用途獨立單位的所有人,不符合申請取得經濟房屋單位的要件,故根據第13/2020號法律第3條第1款及第4款、第13/2020號法律修改的第10/2011號法律《經濟房屋法》第14條第8款、結合第10/2011號法律《經濟房屋法》第60條第5款1項及第11/2015號法律修改的第10/2011號法律《經濟房屋法》第34條第4款的規定,決定解除房屋局與司法上訴人簽訂的買賣預約合同(見行政卷宗一第37頁至第41頁,有關內容在此視為完全轉錄) 。
- 2021年04月16日,房屋局通過編號2104120056/DAJ公函將上述決定通知司法上訴人 (見行政卷宗一第42頁至第45頁) 。
- 2021年05月20日,司法上訴人針對上述決定向行政法院提起司法上訴。
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三. 理由陳述
檢察院就司法上訴人提出的問題作出以下意見:
“…
1. Quanto à nulidade por omissão de pronúcia
Nas alegações do recurso jurisdicional em apreço, a recorrente invocou, alegadamente de acordo com os preceitos na alínea d) do n.º1 do art.571.º e no n.º3 do art.562.º do CPC ex vi art.1.º e n.º1 do art.149.º do CPAC, a nulidade por omissão de pronúncia, arguindo que o MM.º Juiz a quo não pronunciou sobre as questões sumariadas nas conclusões C) e N) da petição inicial do recurso contencioso.
1.1. Fundamentando a “violação de lei” assacada ao acto contenciosamente recorrido, a recorrente arrogou a conclusão C): Segundo, por a ora recorrente não ter incumprido nenhuma das obrigações contratuais que assumiu no contrato promessa em 28/12/2012, nem se ter verificado a hipótese resolutória prevista na sua cláusula 14.ª.
Ora, ensinava o saudoso professor José Alberto dos Reis (vide. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO, Volume V, Artigos 658.º a 720.º (Reimpressão), Coimbra Editora, 1984, pág.143): quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.
Em esteira, colhemos que a sentença em escrutínio não enferma da nulidade por omissão de pronúncia, dado que o MMº Juiz a quo não ficou obrigado a emitir a pronúncia específica sobre conclusão C), na medida em que a redacção desta C) patenteia incontroversamente que na qual, a recorrente não colocou uma verdadeira questão, mas apresentou uma argumentação destinada a sustentar a arguição da violação de lei.
Além disso, o que é mais decisivo é que o MMº Juiz a quo tomou a posição explícita sobre conclusão C). Com efeito, ele asseverou, nessa sentença, que a recorrente preenchia o requisito negativo previsto no n.º8 do art.14.º da Lei n.º10/2011 na redacção dada pela Lei n.º13/2020 e, por isso, ela caiu na resolução prevista no n.º4 do art.34.º da Lei n.º10/2011 na redacção anterior à alteração introduzida pela Lei n.º13/2020.
1.2. Na conclusão N), a recorrente invocou: Décimo-primeiro, caso assim não se entenda sempre o acto recorrido seria ineficaz porque o acto recorrido não foi notificado a ambos os promitentes-compradores, designadamente à B (B), pelo que o mesmo é ineficaz face ao disposto no artigo 121.º, n.º1, a contrário, do CPA e no art.º 430.º, n.º1, do Código Civil.
Note-se que B (B) é elemento do agregado familiar da recorrente que agiu na qualidade da candidata (doc. de fls.9 a 10 do volume 2/2 do P.A.), daí que o seu estatuto no respectivo procedimento do concurso da habitação económica é acessória e dependente do da recorrente, pelo que a Administração não ficava obrigada a notificar B (B) do despacho de resolução contenciosamente recorrido, e a não notificação dela não germina a ineficácia do mesmo despacho.
De qualquer modo, a falta de notificação arrogada pela recorrente é certamente insignificante, visto ser assente que a falta e a deficiência da notificação de acto administrativo não constituem causa de invalidade do mesmo, a notificação em si mesma não pode ser objecto de recurso contencioso e este não é sede própria para suscitar a falta da notificação (cfr. Acórdãos do TUI nos Processos n.º1/2004 e n.º25/2012, do TSI no Processo n.º15/2016).
Tudo isto leva-nos a colher que o MMº Juiz a quo não fica adstrito a tomar posição explícita sobre conclusão N), portanto, a inexistência da posição directa sobre essa conclusão não dá luz à omissão de pronúncia contemplada na alínea d) do n.º1 do art.571.º do CPC.
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2. Quanto à falta da audiência
Nos termos do disposto na alínea n.º3 do art.6.º da Lei n.º10/2011 e à luz da reputada definição concebida pelo saudoso Professor Freitas do Amaral (Direito Administrativo, Vol. III, Lisboa 1989, p.89), afigura-se-nos errado que o MM.º Juiz a quo qualificou o despacho contenciosamente recorrido no acto colectivo. Pois, colhemos que o “agregado familiar” não se equipara nem equivale ao órgão colegial ou organismo da Administração Pública.
No entanto, inclinamos a acreditar que o erro da qualificação supra apontado é insignificante e inoperante, visto que devido às duas ordens de razões, não podemos deixar de entender que o despacho de resolução atacado em sede do recurso contencioso não ofendeu o direito de audiência, nem incorreu na indevida preterição da formalidade essencial.
Recorte-se que o estatuto procedimental (no concurso da habitação económica) da B (B) que é um simples elemento do agregado familiar cuja candidata é apenas a recorrente tem de ser acessória e dependente do desta, portanto, àquela não assiste o direito de audiência autónomo e próprio. Daí decorre que o Instituto da Habitação de Macau não carece de notificar B (B) para exercício deste direito.
Por força do princípio da colaboração consagrado no n.º1 do art.9.º do CPA, impende na recorrente o dever de colaboração com o Instituto da Habitação de Macau. E não há mínima dúvida de que ela recebeu o ofício n.º2010120007/DAJ (docs. de fls.55 a 56 dos autos). Tudo isto conduz razoavelmente a que ela deveria chamar B a prestar explicações ou informações, caso ela entendesse ser úteis as explicações ou informações da B (B). Daí flui necessariamente que na mera hipótese de assistir direito de audiência à B (B), a preterição desta é imputável à conduta negligente ou dolosa da recorrente.
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3. Quanto à ofensa do caso decidido e à violação de lei
Nas conclusões 41 e 42 das alegações do recurso jurisdicional em examinação, insistiu a ora recorrente em assacar ao despacho objecto do recurso contencioso a ofensa do caso decidido e a violação dos preceitos legais e princípio gerais aí aludidos.
3.1. Ora, o disposto nos arts.19.º a 36.º da Lei n.º10/2011 revela que o procedimento respeitante à venda da habitação económica se culmina com a outorga da escritura púbica, o acto administrativo final deste procedimento se traduz no “termo de autorização” contemplado no art.34.º desta Lei. E o seu art.29.º tem constantemente estabelecido: O IH pode confirmar, a todo o tempo, as informações prestadas pelo candidato e pelos elementos do seu agregado familiar no processo de candidatura (com a alteração introduzida pela Lei n.º13/2020, este preceito passa a ser nº2).
Este quadro legal mostra, com toda a certeza, que são meramente preparatórios e instrumentais os seguintes actos e operações – a graduação e ordenação (art.24.º), a selecção de adquirentes (art.26.º), a apreciação dos requisitos do candidato e dos elementos do respectivo agregado familiar, a atribuição da habitação e o despacho do presidente do IH de autorizar a celebração dos contratos-promessa. Apenas as exclusões e resoluções previstas nos art.23.º, 28.º e 34.º são destacáveis em sentido próprio.
É verdade que a Lei n.º13/2020 encurta o tempo de espera, no sentido de que os requisitos negativos consignados no n.º8 do art.14.º da Lei n.º10/2011 na actual redacção têm a duração máxima até à data de celebração do contrato-promessa de compra e venda, em vez de até à data da correlacionada escritura pública (vide. n.º3 do art.14.º na redacção original).
Porém, e ao abrigo do disposto no art.29.º da Lei n.º10/2011 (actual n.º2 deste artigo), colhemos tranquilamente que todos os actos-trâmites que não sejam destacáveis não dão luz ao caso decidido, nem podem vincular as subsequentes tramitações e decisões, por isso, parece-nos que não têm virtude de caso decidido os supramencionados actos e operações.
Na Inf. n.º0112/DEIA/2012 que é denominada pelos recorrentes como Relatório, o IH solicitou ao Exmo. Senhor STOP a aprovação (核准) para os efeitos de “有關‘許可LOTE4住宅單位進行預售’- 決議”. (doc. de fls.99 do Vol. 2/2 do P.A. do Processo n.º425/2022, que se junta como doc n.º1 deste Parecer para se facilitar a consulta). Essa Informação indica que a referida solicitação do IH tem como base legal a alí.6) do art.2.º do Regulamento Administrativo n.º24/2005, segundo a qual compete ao Chefe do Executivo autorizar a alienação ou oneração de bens do património imobiliário do IH e a aquisição, a título oneroso ou gratuito, de bens imóveis.
Sucede, na realidade, que o Exmo. Sr. STOP lançou simplesmente o despacho de “閱” na supramencionada Informação. Interpretado à luz da alínea 6) supra aludida, tal despacho do Exmo. Sr. STOP produz efeito meramente interorgânico que se traduz em autorizar o IH a preparar e celebrar contratos-promessa quanto às fracções autónomas no Lote-4.
Ora bem, não há dúvida de que esse despacho do Exmo. Sr. STOP não tem virtude de suprir o não preenchimento (por qualquer candidato) de qualquer dos requisitos do acesso à habitação económica, ou de sanar os erros emergente na apreciação processada pelo IH, e não cria ou traz nenhum direito ou interesse legalmente protegido à recorrente que, em boa verdade, nem sequer é destinatária do mesmo despacho.
Nesta linha de raciocínio e com todo o respeito pelo melhor entendimento em sentido diverso, afigura-se-nos que a arguição da ofensa do caso decidido/resolvido (pela recorrente) é infundada, aquele despacho do Exmo. Sr. STOP não impede o IH de voltar a indagar se a recorrente preencher ou perder os requisitos de acesso à habitação económica.
3.2. No caso sub judice, são plenamente provados e incontestáveis os seguintes três factos: A,於2004年3月26日購入澳門屬居住用途的獨立單位(位於澳門馬場東大馬路XXXXXXXX號X樓X座),於2004年4月20日出售,她於2004年3月30日向房屋局提交申請表,故,A由提交申請之日至在選擇單位前,曾為屬澳門特別行政區居住用途獨立單位的所有人.
Ora, determinava a alínea 1) do n.º3 do art.14.º da Lei n.º10/2011 na redacção original: Os candidatos não podem ser ou ter sido, nos 5 anos anteriores à data da apresentação da candidatura e até à data de celebração da escritura pública de compra e venda da fracção promitentes-compradores ou proprietários de prédio urbano ou fracção autónoma com finalidade habitacional ou de terreno na RAEM. Bem, a Lei n.º11/2015 alterou este n.º3 para o n.º4 deste artigo, mantendo intacta a disposição.
Por sua vez, o n.º8 do art.14.º na redacção dada pela Lei n.º13/2020 prescreve minuciosamente: O candidato e os elementos do seu agregado familiar não podem ser ou ter sido, nos 10 aos anteriores à data da apresentação da candidatura e até à data de celebração do contrato-promessa de compra e venda: 1) Promitentes-compradores, co-promitentes-compradores, proprietários ou comproprietários de prédio urbano ou de fracção autónoma com finalidade habitacional, ou de terreno na RAEM, independentemente da quota-parte que possuam, salvo quando a aquisição do imóvel se deu por motivo de sucessão.
Esta evolução legislativa demonstra inequivocamente que ao apresentar a candidatura em 30/03/2004, a ora recorrente tinha ficado sempre no âmbito do requisito negativo consignado sucessivamente nos n.º3/1, n.º4/1 e n.º8/1. do art.14.º aludido.
Rezava o n.º4 do art.34.º da Lei n.º10/2011 na redacção original: O IH procede à resolução do contrato-promessa caso verifique, durante o período entre a celebração do contrato-promessa de compra e venda e a emissão do termo de autorização, que o promitente-comprador e os elementos do seu agregado familiar não cumprem os requisitos previstos no n.º3 do artigo 14.º, salvo o incumprimento daqueles a favor de quem seja transmitida a posição contratual por morte do promitente-comprador ou dos elementos do seu agregado familiar.
A única alteração operada pela Lei n.º11/2015 consiste em a alusão ao “n.º3” ser substituída pela ao n.º4. Estabelece o n.º4 do art.34.º na redacção introduzida pela Lei n.º13/2020: O IH procede à resolução do contrato-promessa caso verifique, que o promitente-comprador e os elementos do seu agregado familiar não cumprem os requisitos previstos no n.º 8 do artigo 14.º, salvo o incumprimento daqueles a favor de quem seja transmitida a posição contratual por morte do promitente-comprador.
Este esquema legal leva-nos a inferir seguramente que a resolução do contrato-promessa é a única solução legal, e o despacho de resolução proferido pelo presidente do IH é são e inatacável, sem infringir nenhum dos normativos referidos na conclusão 41) das apontadas alegações.
3.3. Todas as redacções do n.º4 do art.34.º constatam indiscutivelmente que este n.º4 tem sito rigorosamente imperativo, nunca conferindo margem de livre apreciação ao IH, pelo que é, sem dúvida, vinculado o poder da resolução (do contrato-promessa) aí consagrado.
Repare-se que é firmemente consolidada a brilhante jurisprudência que inculca (a título exemplificativo, cfr. Acórdãos do TUI nos Processos n.º32/2016, n.º46/2015, n.º54/2011, n.º36/2009, n.º7/2007, n.º26/2003 e n.º9/2000): os princípios de igualdade, de proporcionalidade, da justiça e de boa fé só se aplicam ao poder discricionário, e é inoperante aos actos administrativos vinculados.
Em harmonia com tal orientação jurisprudencial, acreditamos que a arguição da violação do princípio da boa fé não faz mínimo sentido. E em reforço, convém destacar que, na nossa modesta opinião, não pode deixar de ser incuravelmente vácua a invocação da violação do princípio da boa fé, na medida em que a recorrente nunca prestou qualquer prova ou, até, indício apto de substanciar e suportar tal invocação.
Para todos os devidos efeitos, importa ter sempre presente que “A於2004年3月26日購入澳門屬居住用途的獨立單位(……)及於2004年4月20日出售,於2004年3月30日向房屋局提交申請表”. Daí resulta inevitavelmente que ao apresentar a candidatura em 30/03/2004, ela estava no requisito negativo consignado sucessivamente nos n.º3/1, n.º4/1 e n.º8/1 do art.14.º da Lei n.º10/2011, e que ela nunca adquiriu direito ou interesse legalmente protegido para obter habitação económica. O que conduz necessariamente, a que na verdade, a celebração do contrato-promessa identificado nos autos seja ilícita e, sobretudo, imputável à recorrente.
Assim que seja, e visto ser sem sombra de dúvida que o despacho objecto do recurso contencioso visa a defender o interesse público traduzido na justa distribuição de habitação económica, estamos convictos de que a assacada violação do princípio consagrado no art.4.º do CPA tem de ser irremediavelmente descabida.
***
Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do presente recurso jurisdicional.
…”。
我們完全同意檢察院就有關問題作出之論證及意見,故在訴訟經濟快捷原則下,引用上述意見作為本裁判的依據,裁定上訴理由不成立。
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四. 決定
綜上所述,裁決司法上訴人之上訴不成立,維持原審決定。
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訴訟費用由上訴人承擔,司法費訂為8UC。
作出適當通知。
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2022年10月20日
何偉寧
唐曉峰
李宏信
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米萬英



8
425/2022